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5. A LUDICIDADE NO ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO E NO

5.2 As atividades de Extensão

5.2.2 Programa de Formação Continuada

a) Curso Teoria e Prática do Educador de Creche

Este curso surgiu da identificação da necessidade de formação para a docência em turmas de Educação Infantil para o segmento da creche. O requisito para ser cursista era ser estudante de graduação da Faculdade de Educação da UFBA e, as vagas ociosas, foram preenchidas por professoras da Rede municipal de Salvador que já exercesse a docência na área. O curso aconteceu durante um semestre e não houve desistentes.

A professora Água do Mar, em parceria com outra professora que já fez parte da equipe pedagógica da Creche elaboraram e promoveram o Curso Teoria e Prática do Educador de Creche, com carga horária presencial de 60h. Neste curso, todas nós fomos convidadas a ministrar aula em um dos módulos abordando nossos temas de estudo no mestrado/área de pesquisa atrelados à prática pedagógica na Creche.

A metodologia de trabalho seguiu a mesma utilizada nas turmas de educação infantil, ou seja, a partir de histórias contadas, cantadas, dramatizações, canções, brincadeiras, jogos, criação de painéis, murais, pinturas, dentre outras, articulando um fazer ludo sensível às discussões teóricas que fundamentaram a prática.

b) Curso Infância e Afrodescendência

A professora Dandara organizou e promoveu um curso de Formação de Professores intitulado Infância e Afrodescendência, com duração de 20h. Este tema lhe é muito caro e o público foi de professores da Educação Infantil que estivessem interessadas em na temática das relações etnicorraciais, sendo este o objeto de estudo da professora no mestrado e, agora, no doutorado.

c) Projeto Permanente intitulado Compartilhando Saberes da Educação Infantil

Trata-se de um curso promovido pelas professoras Alice e Rute, em parceria, para professoras da Educação Infantil e graduandos do curso de Pedagogia. Tem carga horária de 20h e a periodicidade prevista é anual. Vale

ressaltar que, com os processos de qualificação docente das duas professoras responsáveis pelo projeto, essa periodicidade foi flexibilizada, já que um curso de extensão promovido por apenas duas professoras tem grande exigência de tempo para planejamento, produção de materiais, realização, elaboração de relatórios e todas as providências administrativas. As atividades de extensão são planejadas e mobilizam os saberes docentes, a ludicidade e a cujo repertório vai se ampliando à medida em que as professoras promovem as atividades potencialmente lúdicas e que vão dialogando, refletindo, avaliando, planejando novas e diferentes atividades.

Sobre a realização de atividades lúdicas na docência e na extensão durante o grupo focal as professoras revelaram o prazer, a autoria, a criatividade e a capacidade de trabalho em grupo com um objetivo comum, que é a integração do pensar, sentir e agir, um fazer que é, ao mesmo tempo cansativo e pleno de sentido e satisfação. Segue abaixo um trecho oriundo do Grupo Focal, no qual descrevo a seguir. Contexto da questão: Pergunto ao grupo de professoras como se sentem como se sentem quando realizam atividades lúdicas, seja em sala de aula ou nos projetos pedagógicos, com as crianças e com os adultos tem elementos ludo- sensíveis muito fortes e é algo que o grupo preza muito na creche. Para tensionar quis saber como elas percebem essa questão do lúdico, nesse processo de planejar, de desenvolver e de depois realizar a atividade concreta que marca cada uma e traz lembranças. Então tudo é lúdico?

- Não! Porque nada nessa vida é sempre tudo lúdico, não é? Por mais que a gente goste de fazer tem sempre aqueles nós, que a gente tem que desatar no meio do caminho que vai desde as limitações materiais, de recurso, de espaço e de recursos humanos para nos apoiarem nesse sentido, então, muitas vezes, a gente tem ideias muito grandiosas e, que, no meio do caminho ela vai se perdendo, tem que cortar daqui, tem que cortar dali, embora fique muito bonito e no final das contas mas também fica bem empobrecida diante da ideia original. Porque às vezes a gente tem ideias, eu, particularmente, tenho ideias muito maiores, aí eu não levo muito à frente porque esbarro nas dificuldades e aí, vou cortando aqui, cortando ali, quando chega lá, é um recorte daquela ideia inicial. Nem por isso esse final, ainda que recortado ou limitado, ele perde em essência porque eu acho que a essência, ela permanece! O que vai cortando são os adereços, as questões de embelezar mais, de enriquecer mais do ponto de vista dos próprios recursos e das técnicas que você poderia usar. Então, às vezes, você quer um cenário que você quer que ele seja móvel, você imagina, mas na hora é um cenário mesmo bem “pobrezinho”, colado lá na parede com um kami, tecido-não-tecido (grifo nosso) que foi reaproveitado, que descolou daqui, colou de lá, o papel que foi reaproveitado e usa o verso, etc, etc, mas, que, no final, acho que você não perde o objetivo que foi incialmente planejado e aí você consegue fazer bonito porque está imbuído

e investido de um sentimento que é maior que essas tecnologias e os recursos que você gostaria de ter tido. Não é sem dor. Isso traz uma certa frustração, em alguma medida e, muitas vezes, eu particularmente, me sentia muito como se tivesse carregando uma coisa muito maior do que se eu tivesse condições outras mas, a vontade de fazer, faz com que a gente consiga chegar no final e aí ter o resultado que, para mim, satisfaz! Porque é ver as crianças envolvidas, em alguma medida ter as famílias envolvidas, ter umas às outras, pelo menos as docentes envolvidas, as auxiliares empenhadas em fazer a coisa acontecer, então isso, pra mim, termina, de algum modo, em alguma medida dizendo assim: - Foi emocionante! Foi bonito! Claro, nem sempre! A gente já teve processo também, especialmente do ponto de vista quando o clima organizacional está muito pesado, a gente tá muito frustrada, a gente está muito indignada, que comprometeu, também, algumas culminâncias de projetos. (ÁGUA DO MAR, Grupo Focal, 2016)

Essa longa fala de Água do Mar, ocorreu sem que nenhuma das professoras fizesse qualquer comentário, o que é raro nas reuniões do grupo. A ideia central desta professora posicionou o tom das falas das demais professoras e abordou aspectos fundantes que preciso destacar:

1. Embora a vivência da ludicidade esteja presente em diversas ações promovidas pelas professoras na creche, nem tudo é lúdico: há a ausência ou negação da ludicidade quando faltam recursos, condições materiais e humanas e, quando há um clima organizacional desfavorável.

Por clima organizacional estamos considerando o quanto definido por Coda (1997), como o indicador do grau de satisfação dos membros de uma empresa, em consideração a diferentes aspectos da cultura ou da realidade aparente da organização, dentre elas: a política de Recursos Humanos, o modelo de gestão adotado, a missão da empresa, o processo de comunicação, a valorização profissional, bem como, a identificação com a empresa, independentemente de tratar-se de uma empresa privada ou pública.

Já Schneider e Reichers (1990 apud Andrade, Fisher e Stefano, 2011, p. 01) consideram que clima é “a percepção compartilhada „da maneira como as coisas são no ambiente‟. Mais precisamente, clima é percepção compartilhada de procedimentos, práticas e políticas de uma organização tanto formais quanto informais.”

O clima organizacional, portanto, engloba uma percepção coletiva, envolvendo as práticas e políticas que afetam os profissionais e que se

caracterizam por ter um caráter institucional. Neste sentido, um subordinado, perceberá um clima organizacional desfavorável mas pouca influência terá para transformar aquela realidade.

Se um clima organizacional desfavorável tem continuidade ao longo do tempo, sentimentos de insatisfação, revolta e desmotivação podem tomar corpo entre os trabalhadores contribuindo para percepções negativas e podem comprometer o desenvolvimento profissional. Por outro lado, Dillon-Peterson (1981 apud García, 1999, p. 137), defendem a construção de um clima organizacional de respeito, positivo e de apoio, considerando que não garante mas contribui, decisivamente, para o bom desenvolvimento profissional docente.

No caso em questão a insatisfação que gerou frustração revelada por Água do Mar com a atitude descontextualizada da gestão interferiu em sua percepção de satisfação com a atividade lúdica que ela e o grupo pedagógico idealizou, planejou, e estava desenvolvendo na culminância do projeto didático. A culminância envolvia crianças, suas famílias e funcionários da creche, o que demanda articulação entre todos os membros da equipe. A sintonia entre as pessoas precisa estar afinada quando se realiza uma atividade lúdica. Isso porque, são várias etapas na condução da atividade e, da atuação de cada um do ambiente interno da organização, neste caso, da creche universitária, depende o sucesso da atividade planejada.

No que se refere à profissionalidade docente Contreras (2012) destaca três dimensões: a obrigação moral; o compromisso com a comunidade e a competência profissional.

A obrigação moral deriva do fato de que o ensino supõe um compromisso de caráter moral para quem a realiza (Contreras, 2012, p. 82). Para este autor, o compromisso está acima de qualquer obrigação contratual que possa ser estabelecida na definição de emprego. O compromisso do professor é com todos os seus alunos e alunas em seu desenvolvimento como pessoa.

A obrigação moral, neste caso, aparece refletida no compromisso das professoras em promover atividades potencialmente lúdicas que

contribuam não apenas para a aprendizagem infantil mas para o seu desenvolvimento integral privilegiando atividades em que a brincadeira, o jogo, as artes (plásticas, cênicas, visuais), a literatura, estejam presentes e sejam esteticamente bonitas e agradáveis.

Ainda neste aspecto, assevera Contreras (2012, p. 86-87) a professora tem que se defrontar com sua própria decisão sobre a prática que realiza, porque ao ser ela quem pessoalmente se projeta em sua relação com alunos e alunas, geram uma influência, devem, portanto, decidir ou assumir o grau de identificação ou de compromisso com as práticas educativas que desenvolve, seus níveis de transformação da realidade que enfrenta.

2. As dificuldades encontradas pelas professoras na realização das atividades lúdicas são, em alguma medida, superadas:

a. Pela vontade e compromisso de fazer a atividade lúdica;

b. Por conseguirem garantir, de forma criativa, a essência da ideia original, manter-se imbuídas, investidas de sentimentos maiores que os experimentados na ausência de materiais e de tecnologia disponível na creche;

3. Para as professoras, vários elementos favorecem, em si, a vivência da experiência de plenitude:

a. Ver as crianças envolvidas, b. Ter as famílias envolvidas,

c. Ter umas às outras, pelo menos as docentes envolvidas; d. Ter as auxiliares empenhadas em fazer a coisa acontecer; e. Ao final, poder avaliar como emocionante, bonito, satisfatório.

Trata-se, pois, do compromisso docente com a comunidade apontada por Contreras (2012, p. 87). Esta é a segunda dimensão da profissionalidade docente que deriva da relação com a comunidade social na qual os professores devem realizar sua prática profissional.

O autor destaca ainda que “o professor só pode assumir seu compromisso moral a partir da autonomia, não da obediência, porque não

é possível resolver os conflitos e dilemas senão a partir da autonomia dos mesmos”. (CONTRERAS, 2012, p. 88).

Dito isso, para fazer as atividades potencialmente lúdicas acontecerem é exigido das professoras um compromisso, tanto moral quanto com a comunidade, de modo que as dificuldades sejam superadas e todos os sujeitos possam ter a oportunidade de vivenciar a experiência de plenitude.

A terceira e última dimensão da profissionalidade é a competência profissional. Contreras (2012, p. 91) encerra a questão afirmando que a obrigação moral dos professores e o compromisso com a comunidade requerem uma competência profissional coerente com ambos. A competência se mostra como a capacidade de realização do ensino, para o autor, do ensino a partir da promoção de atividades lúdicas, ou do uso de metáforas lúdicas.

A realização do ensino assim como o exercício de qualquer outro trabalho necessita “[...] de um certo domínio de habilidades, técnicas e, em geral, recursos para a ação didática, da mesma forma que deve conhecer aqueles aspectos da cultura e do conhecimento que constituem o âmbito ou o objeto do que se ensina” (CONTRERAS, 2012, p. 92). Não se trata, outrossim, de enfatizar o domínio técnico e didático, porque a competência profissional transcende o sentido puramente técnico do recurso didático. A profissionalidade docente é maior que o saber fazer, ela combina competências profissionais complexas que envolvem habilidades, princípios e consciência do sentido e das consequências das práticas pedagógicas.

Portanto, ao realizar o trabalho docente, de forma competente e articulada, as professoras têm consciência de que o fazer concreto é fundamental e há um compromisso ético consigo próprias, pois não querem fazer um trabalho qualquer; compromisso com os educandos, crianças, que estão sob responsabilidade das professoras e do corpo profissional que compõe a creche, merecem um ambiente onde o bem estar e o desenvolvimento integral precisam estar acima de qualquer outra questão; compromisso com as auxiliares que fazem parte do trabalho

pedagógico (professoras não atuam sozinhas), e; compromisso, tambem, com as famílias das crianças, quem compõem a comunidade da creche.