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Diante desse contexto, desde os anos 1970 o Governo do Estado do Paraná vem procurado desenvolver ações no Vale do Ribeira, “[...] compatibilizando ações de desenvolvimento econômico, combate à pobreza e conservação dos solos e da água, encontrando muitas dificuldades na ação sistêmica para alcançar essas três dimensões do desenvolvimento” (BIANCHINI, 2010, p. 123):

Sem um impacto direto do processo de modernização da agricultura em que o crédito, a pesquisa e assistência técnica e o cooperativismo com um conjunto de políticas públicas mudaram a agricultura do Paraná, o Território do Vale do Ribeira terá a partir dos anos 1970 um conjunto de ações de Programas Governamentais com ênfase na agricultura da região. Entre esses Programas podemos destacar o PRODELAR (Programa Integrado de Desenvolvimento do Litoral e Alto Ribeira (em 1976, o PRÓ- RIBEIRA (Programa de Apoio à População Carente do Alto Ribeira) em 1980, o PRÓ-RURAL (Projeto Integrado de Apoio ao Pequeno Produtor Rural), com apoio do BID de 1981 a 1986, o PARANÁ RURAL de 1986 a 1997, com apoio do BIRD, e o PARANÁ 12 Meses, executado pelo Governo do Estado entre janeiro de 1998 e abril de 2006, também com apoio do BIRD (BIANCHINI, 2010, p. 123)

Do conjunto desses Programas, o primeiro, o PRODELAR, priorizou o desenvolvimento de ações no litoral do Paraná, colocando em segundo plano o Vale do Ribeira, pois “[...] o Governo do Estado, ao lançar o PRODELAR em 1976, não viu no desenvolvimento

da agricultura do Vale do Ribeira uma das atividades motoras de um projeto de desenvolvimento para a região... A fragilidade da assistência técnica e da pesquisa, a ausência de cooperativas, de agências do Banco do Brasil e de agroindústrias e canais de mercado, impossibilitavam a consolidação de cadeias como a da horticultura, do leite e da laranja” (BIANCHINI, p. 124-125).

O segundo Programa, o Pró-Ribeira, que visava articular ações produtivas e ações sociais, consegue, por meio do serviço da Assistência Técnica da EMATER, produzir um consistente diagnóstico da região, porém, após três anos de sua execução, conseguiu apenas disponibilizar material apícola para 12 agricultores. Uma das principais dificuldades apontadas na execução desse Programa foi a falta de assistência técnica (BIANCHINI, 2010).

Nas diretrizes do terceiro Programa executado, o PRÓ-RURAL, “[...] aparece a necessidade de ampliação da estrutura da ATER19, da pesquisa, do apoio ao associativismo, criação de associações e melhoria de infraestrutura e dinamização do uso do crédito rural” (BIANCHINI, 2010, p. 129). Concretamente, o quadro técnico da EMATER foi ampliado, incentivando a adesão dos agricultores às linhas de crédito rural, incrementando as principais cadeias produtivas da região (leite), tendo alcançado um número reduzido de agricultores e beneficiado os agricultores com melhor nível de tecnologia.

Por sua vez, o Paraná Rural, Programa que previa ações de conservação do solo e das águas, priorizou áreas mais férteis e com dinâmicas produtivas intensivas do Estado (norte e oeste), classificando o Vale como a última área de prioridade de ação desse Programa, o que correspondeu, na prática, à sua tênue aplicabilidade nesse território, restringindo-se à atuação com 12 agricultores em Cerro Azul.

O Programa Paraná 12 Meses, tendo como eixos estruturadores o desenvolvimento social e produtivo, o fortalecimento institucional e o desenvolvimento tecnológico, teve como meta “[...] reduzir a pobreza rural e promover o gerenciamento dos recursos naturais do Estado[...]” (Bianchini, 2010, p. 140). Nesse sentido, as prioridades do Programa para a Mesorregião Litoral e Alto Ribeira foram o combate à pobreza rural, comunidades, manejo e conservação dos recursos naturais. Em decorrência da tipologia de agricultores beneficiários adotada, o Programa acabou privilegiando os agricultores mais capitalizados e organizados. De modo geral, suas ações se resumiram ao apoio a obras de infraestrutura, como estradas, reabilitação de asfalto, saneamento e habitação rural.

Apesar de ter como um de seus eixos estruturantes o fortalecimento institucional, contou apenas com a estrutura organizacional de Conselhos Municipais. Para Bianchini (2010, p. 144), a EMATER, vinda de processos verticalizados de Programas anteriores, “[...] não estava preparada para um forte trabalho de Planejamento Participativo, organização de grupos e projetos integrados de desenvolvimento local”. Nesse sentido, o Paraná 12 meses continuou reproduzindo a estrutura organizacional burocrática, hierarquizada e centralizada de Assistência técnica, não contribuindo com a construção social do fortalecimento institucional de organizações associativas e cooperativas de agricultores camponeses no Vale, restringindo- se às ações descritas acima.

De acordo com esse autor (2010), próximo ao final do período de execução do Paraná 12 Meses, a partir de 2004, contando com um rearranjo de agentes nas disputas do campo político brasileiro, instituídas no espaço governamental Federal e Estadual, tendo como suporte a recém criada Secretaria de Desenvolvimento Territorial, o território do Vale do Ribeira passou a ser priorizado para atuação dessa Secretaria e do Ministério do Desenvolvimento Agrário, constituindo-se como um dos oito “Território da Cidadania” do Paraná, espaços prioritários para o desenvolvimento de ações de Combate à Pobreza e Inclusão Produtiva.

Também segundo Bianchini (2010), para tanto, passaram a constituir em nível territorial, estadual e nacional, os Conselhos de Desenvolvimento Rural Sustentável, contando com assentos da sociedade civil, organizações de agricultores familiares, prestadoras de Serviço da Assistência Técnica, instâncias dos Poderes Públicos municipais e regionais, com o objetivo de articular, acompanhar as execuções, validar, deferir e indeferir a construção e execução de programas e projetos para os territórios, visando-se, dessa forma, ampliar a participação democrática e controle social da elaboração e execução de Programas e políticas públicas nesse território.

No Vale do Ribeira, esse Conselho foi constituído e atualmente conta com a participação de prefeituras e secretarias municipais, cooperativas e associações de agricultores familiares e prestadoras de serviços técnicos, tais como a Cooperativa de Comercialização da Agricultura Familiar – COOPAFI Cerro Azul, Associação dos Remanescentes de Quilombos do Bairro Sete Barras, alguns Sindicatos Rurais, o Sistema das Cooperativas de Crédito Rural com Interação Solidária – CRESOL, Cooperiguaçu – Cooperativa de Prestação de Serviços e EMATER’s regionais.

Desse modo, observa-se nas últimas décadas (1990, com ênfase nos anos 2000 - em decorrência de tais aportes governamentais oferecidos), incrementos na participação,

construção, desenvolvimento, articulação institucionalizada e representativa de organizações sociais e sociedade civil em Programas e Projetos de Desenvolvimento Territorial voltados ao Vale do Ribeira.

No entanto, mesmo com tais avanços no atendimentos das demandas do camponeses da região, Bianchini (2010) aponta que “[...] muitos projetos são inviabilizados no território[...]”, em função de que os municípios frequentemente não apresentam a documentação exigida para acessar políticas públicas, tais como certidões negativas de débitos, dificuldades de oferecerem contrapartidas exigidas pelo Governo Federal, em função de problemas orçamentários, e da falta de organizações sociais com capacidade para monitoramento das obras. Tal quadro favorece que somente aqueles grupos sociais e instituições mais capitalizadas social, econômica e juridicamente, consigam acessar recursos públicos por meio de programas governamentais, em detrimento daqueles menos capitalizados.

Bonato e Gomes (DESER, 2008, p. 54), refletindo acerca da visão governamental atual sobre o Vale, analisam que “as atuais características de elegibilidade como território de pobreza, induzem a uma avaliação sobre o Vale do Ribeira como um ‘Sistema Agrário’ estagnado, ou em declínio [...]”, cuja “qualificação desta condição de estagnação ou declínio aponta para cenários ‘sem perspectiva de desenvolvimento’. Diante de tal ‘frustração econômica’, condizente com uma visão economicista de desenvolvimento, baseada em diretrizes do Banco Mundial (Bianchini, 2010), esses autores contrapõe tais apontamentos, demonstrando a existência de sistemas agrários em transmutação no Vale do Ribeira. Baseados na experiência dos Sistemas Agroflorestais desenvolvida pela COOPERAFLORESTA nos municípios de Adrianópolis e Barra do Turvo há mais de dez anos. Os quais, vinculando-se a redes sociais agroecológicas e constituindo-se a partir de práticas metodológicas baseadas na educação popular, apontam para outros horizontes de desenvolvimento do território e de democracia.

Nesse sentido, em síntese, o que se percebe no Vale do Ribeira Paraná é a existência de uma vasta riqueza de recursos naturais, terra, água, minerais e biodiversidade, elementos constitutivos da cultura do campesinato local e regional, na atualidade, predominantemente sob o controle e exploração por empreendimentos capitalistas altamente degradantes do meio ambiente e da força de trabalho camponesa local e regional, cabocla e negra. Quadro que potencialmente tende a ser modificado, através tanto da ampliação e qualificação desses sujeitos sociais e Políticas e Programas governamentais, quanto pela emergência e desenvolvimento de iniciativas da sociedade civil, como a experiência com Sistemas Agroflorestais da COOPERAFLORESTA