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2.2 O Projeto arquitetônico

2.2.4 Projeto, gestão e qualidade

No início da década de 90, o setor da construção civil, preocupado com temas como a falta de qualidade, produtividade e desperdício do setor concluiu que, dentre os fatores que contribuíram para essa realidade, talvez o principal responsável fossem os projetos desenvolvidos sem considerar o processo construtivo.

Parte das soluções desses problemas passa pela necessidade do aperfeiçoamento da gestão do processo de projeto e de integração entre as atividades de projeto e execução. Entende-se que, para uma edificação de qualidade, com níveis elevados de competitividade, deve-se dar especial atenção ao processo de desenvolvimento do projeto desde a identificação das necessidades do cliente à melhoria do processo de desenvolvimento do produto.

Questões referentes à coordenação de projetos, transmissão de informações, comprometimento com aspectos construtivos e definição de prazos aliadas ao desenvolvimento de projeto por etapas, devolveriam aos projetistas o domínio do processo projetual, e o projeto de arquitetura passaria a cumprir seu propósito verdadeiro.

A gestão da qualidade é um dos subsistemas de gestão mais amplos da empresa de projeto.

Para Oliveira et al (2006, p.63):

(...)a gestão da qualidade, de qualquer empresa, deve ser antecedida por uma visão mais ampla das demandas de gestão – não se pode falar em qualidade dos produtos e serviços de uma empresa na qual as principais questões administrativas estejam estruturadas de forma deficiente”.

Segundo Silva et al (2003, p.27):

Ao introduzir mecanismos de gestão e controle da produção dos projetos, baseado nas reais necessidades dos agentes envolvidos, há uma significativa redução do risco de que existam problemas relativos à qualidade do projeto enquanto produto final.

Ao longo do ciclo de vida de uma edificação, diversos conceitos de qualidade são agregados a esse. Fabricio et al (2010, p.6) conseguem expor com clareza os critérios e visões de qualidade durante as diversas etapas e segundo os interesses dos diversos agentes envolvidos, assim distribuídos: na fase de lançamento de um empreendimento (critérios de aceitação do produto no mercado imobiliário); na etapa da execução da edificação (critérios de produtividade dos processos); durante o uso (a qualidade está associada ao desempenho da edificação). Os usuários finais da edificação agregam conceitos de segurança, manutenibilidade, flexibilidade funcional, entre outros, para avaliar a qualidade da edificação.

Assim, entende-se que este é o conceito de qualidade total, quando se admite que a qualidade possa assumir diferentes significados durante o processo de desenvolvimento do projeto e de desenvolvimento do produto, de acordo com cada agente do processo.

Fabricio et al (2010, p.20) afirmam que: “Não é possível alcançar os potenciais níveis de qualidade de projeto se forem deixados em segundo plano a gestão do processo de projeto e o sistema de gestão das empresas responsáveis por sua criação”.

A coordenação do desenvolvimento dos projetos, desde a concepção arquitetônica até o projeto executivo, tem como objetivo garantir o alinhamento de todos os envolvidos na implantação do empreendimento de forma racionalizada. A realização de planejamento com atividades conduzidas, através de reuniões entre todas as disciplinas de projetos envolvidas, auxilia a conduzir o processo de projeto e de desenvolvimento da edificação a uma mesma linguagem e, consequentemente, a uma maior qualidade do produto final.

Segundo Thomaz (2010, apud MOURA, p.16), a coordenação do processo de projeto pressupõe o fluxo de informações, a uniformização da linguagem e dos objetivos dos projetistas envolvidos, sua profunda interação com a produção e a

devida consideração de todos os parâmetros que norteiam a implantação de um empreendimento.

Para Silva et al (2003, p.14) não é somente a qualidade do processo de desenvolvimento de projeto que garantirá a qualidade do produto resultante. A gestão da qualidade parte do princípio de que os agentes envolvidos possuem a capacitação técnica necessária para operar seus processos. Ao mesmo tempo, apenas a capacitação técnica dos agentes envolvidos não garante a qualidade do projeto, pois tendo em vista o fato de se tratar de um processo com muitos intervenientes e interfaces entre processos, são também necessários liderança e conhecimento.

A qualidade do projeto, segundo Salgado (2010, p.23), pode ser avaliada sob diversos aspectos para que se alcance a qualidade total do processo construtivo. A autora destaca:

- a qualidade do empreendimento: corresponde à avaliação feita pelo incorporador em relação ao público a ser atendido com o projeto proposto; - a qualidade da solução arquitetônica proposta: o atendimento aos desejos e requisitos dos usuários é fundamental para a melhoria da solução do projeto proposto: funcionalidade, construtibilidade, fundamentalmente a avaliação dos requisitos dos usuários;

- qualidade de representação gráfica: a apresentação de peças gráficas, a precisão das informações e a preocupação com inteligibilidade do projeto por todos os envolvidos em todas as etapas do projeto;

- qualidade do processo de projeto. “A elaboração do projeto de edifícios compreende diversas etapas com característicos próprios e objetivos bem definidos envolvendo e estabelecendo interfaces entre os diversos agentes do processo.

Segundo Duarte et al. (2002, p.65):

A qualidade do processo de projeto está intimamente vinculada a questões de gestão, comunicação e prazos adequados para a definição dos objetivos e da transmissão das informações pertinentes ao empreendimento objetivando um real planejamento do mesmo com etapas claras e definidas podendo o projeto cumprir então o seu papel.

Salgado (2010, p.25) acrescenta que “a combinação do levantamento das exigências do usuário com as metodologias de avaliação de desempenho técnico dos sistemas construtivos permitiria a escolha mais acertada sobre as soluções de projeto”.

Rezende et al (2008, p.59) reconhece que diversas pesquisas e publicações especializadas, voltadas para a construção de edifícios no Brasil, vêm demonstrando esforços do setor em buscar soluções para problemas que envolvem projetos e

sistemas construtivos. Tais esforços são aplicados em torno de melhoria da qualidade e valorização dos projetos, sistemas de racionalização na construção, coordenação de projetos e gestão interna das empresas.

Entretanto, observam-se ainda modelos de processo de projetos tradicionais em que o ato projetual caracteriza-se pela ação solitária do arquiteto, onde a interação com os demais projetistas é adiada para as etapas finais do processo de projeto. Esse paradigma é tão sedimentado que a prática contrária ainda é de difícil entendimento por empreendedores e equipes de execução e gerenciamento de projetos.

O modelo de processo de projeto integrado pressupõe que os responsáveis pelo projeto executivo e pelos projetos das demais especialidades já estejam presentes desde a etapa do estudo preliminar, permitindo que sejam avaliados os diversos aspectos da concepção do projeto, iniciando, assim, a compatibilização e interfaces de todos os projetos.

Para Fabricio et al (2010, p.14), desde o início da década de 1990, é crescente o número de empresas incorporadoras e construtoras que passaram a contratar o projeto como um serviço dando um passo decisivo para a sua inclusão no rol de processos submetidos à gestão de qualidade, as empresas de projeto têm sido pressionadas a dar sua contribuição ao movimento pela qualidade na construção brasileira.

A implantação de novos modelos administrativos, com base na gestão de qualidade, impulsiona os profissionais de projetos a introduzir mudanças organizacionais em seus escritórios em resposta a exigências mais amplas. É numerosa a bibliografia que aborda este tema.

Fabricio et al (2010, p.15) lembra que, no início deste processo, muitos escritórios de arquitetura reagiram negativamente sob a alegação de que o processo criativo não poderia se submeter a procedimentos e controles rígidos de gestão. O mesmo autor cita o arquiteto e Professor of Architectural Technology at Loughborough da Universidade de UK, Stephen Emmitt (2007) o qual afirma que a mesma reação ocorreu entre os arquitetos britânicos:

Há uma visão estereotipada de que os projetistas criativos estão fora do controle gerencial... essa é uma imagem conveniente para alguns que se escondem atrás dela, mas a realidade é que a maioria dos projetistas criativos aprecia a gestão sensível e adequada à criatividade.

Recentemente, em publicação na Revista Téchne (2013), o consultor ambiental de arquitetos renomados como Zaha Hadid, Renzo Piano, Norman Foster e outros, engenheiro civil Klaus Böde, afirmou que seu trabalho com tais arquitetos começa “desde a fase de concepção, quando as ideias não estão totalmente materializadas na cabeça do arquiteto... Sempre negociamos as exigências técnicas e as sensibilidades estéticas da arquitetura... na busca de soluções alternativas e não pré-concebidas”.

Modelos de gestão de qualidade para empresas de projetos podem ser encontrados em bibliografias sobre o assunto por autores como Melhado e Cambiaghi (2007), Silva e Souza (2003), ou mesmo em publicações da ASBEA e em grupos de estudo do Departamento de Engenharia de Construção Civil da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP) – o Programa de Desenvolvimento Gerencial para Empresas de Projeto – PDGEP.

Segundo Fabricio et al (2010, p.16), os requisitos fundamentais para que uma empresa de projetos se qualifique são:

 capacidade da empresa de considerar em seus projetos os requisitos do contratante e dos demais agentes envolvidos;

 estabelecer confiabilidade na prestação de serviço através do cumprimento de prazos e da disponibilidade e capacidade de respostas, quando solicitado;

 melhoria em todos os subsistemas da empresa (recursos humanos, sistema de informação, marketing, etc.);

 estrutura organizacional, liderança, empreendedorismo;

 cultura organizacional de forma a reunir condições mínimas, para que o projeto seja desenvolvido com eficácia e eficiência.

É parte das novas rotinas o estabelecimento de posturas de avaliação de desempenho.

Para Oliveira et al (2006, p.60), o sistema de avaliação do desempenho deve contemplar dois enfoques: “a) avaliação do desempenho do projeto e b) avaliação do desempenho do sistema de gestão da empresa de projeto”.

O autor acrescenta que o grau de satisfação do contratante, do construtor e do usuário pode ser pautado através de instrumentos diretos de satisfação. A prática de visita às obras, a assistência técnica, um questionário ou investidas diárias de

verificação de satisfação permitem avaliar pontos de bons e maus desempenhos. Além disso, quando se alcança um resultado, a qualidade torna-se visível e, por muitas vezes, explicita a satisfação dos clientes.

Segundo Silva (1998, p.68), a competência profissional do arquiteto envolve a capacidade de criação, mas inexistirá sem a devida bagagem de conhecimento científico, tecnológico e humanístico, uma vez que essa bagagem fornece a medida da correção das ideias propostas pelo projetista de arquitetura.

A consulta às normas técnicas da ABNT fornece a bagagem de dados obrigatória aos projetistas que se traduz na melhoria da qualidade das edificações.