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3 ANÚNCIOS PUBLICITÁRIOS: REFLEXOS IDENTITÁRIOS

3.1 PROPAGANDA, PUBLICIDADE E ANÚNCIO

A palavra propaganda é proveniente do verbo latino propagare (propagar), relacionado à multiplicação, à difusão, ao engrandecimento. O termo passou a ser difundido pela Congregatio de Propaganda Fide (Congregação para a Propagação da Fé), instituída pelo Papa Gregório XV no ano de 1622, em Roma. Essa Congregação era composta por cardeais encarregados de delimitar as normas de como deveria ser realizada a disseminação da fé (HOUAISS, 2001). Partindo desse prisma inicial, a propaganda pode ser concebida como as estratégias persuasivas voltadas à propagação de ideias a fim de influenciar a mente humana.

A palavra publicidade “deriva de público (do latim publicus) e designa a qualidade do que é público. Significa o ato de vulgarizar, de tornar público um fato, uma idéia” (SANT‟ANNA, 2003, p. 75).

Dessa forma, a acepção da palavra publicidade evoca o ato de divulgar algo; já a da palavra propaganda remete ao planejamento da inclusão de uma ideia ou de uma crença na mente alheia.

De acordo com Carvalho (2007, p. 9), “alguns autores [...] consideram o termo propaganda mais abrangente que publicidade”, uma vez que o primeiro estaria relacionado à promoção dos ideários políticos, religiosos, institucionais e comerciais e o segundo, voltado apenas às mensagens comerciais. A autora (2007, p. 10) enfatiza que, enquanto a propaganda remete à “esfera dos valores éticos e sociais”, a publicidade comercial “explora o universo dos desejos, um universo particular”.

Já na definição de Churchill e Peter (2000, p. 452), propaganda relaciona-se a qualquer comunicação persuasiva paga transmitida pelos meios de comunicação em massa durante um determinado período de tempo. A função principal da propaganda é “informar os clientes potenciais sobre produtos e persuadi-los ou lembrá-los para que os comprem” (p. 472). Como contraponto, a publicidade é definida, na versão da obra traduzida para o português, como uma forma de comunicação “não paga” sobre alguma empresa ou produto veiculada em algum tipo de mídia (2000, p. 454).

A publicidade pode-se manifestar em uma diversidade de formas, sendo que as mais comuns são reportagens da imprensa sobre novos produtos ou sucessos e fracassos de companhias. Outros tipos de cobertura da mídia incluem resenhas (sobre, por exemplo, um restaurante, hotel, equipes esportivas ou CDs) e transmissão de entrevistas (CHURCHILL; PETER, 2000, p. 454).

Com relação a essa variedade de significados associados às palavras propaganda e publicidade na língua portuguesa, Simões (2006, p. 198) menciona que, do ponto de vista linguístico, a língua inglesa evidencia a noção distintiva de propaganda, publicity e

advertising. No Dictionary of marketing terms11, esses termos são definidos da seguinte

forma:

Advertising – The placement of announcements and persuasive messages in time or space purchased in any of the mass media by business firms, nonprofit organizations, government agencies, and individuals who seek to inform and/or persuade members of a particular target market or audience about their products, services, organizations, or ideas;

Propaganda – The ideas, information, or other material commonly disseminated through the media in an effort to win people over to a given doctrine or point of view;

Publicity – The non-paid-for communication of information about the company or product, generally in some media form12.

Simões (2006, p. 198) sintetiza as definições mencionadas desta maneira:

Propaganda é a propaganda (política), publicity é a publicidade, que significa

“tornar algo público”, e advertising é a publicidade comercial, atividade de mercado levada a cabo pela chamada iniciativa “privada”, mas que tem em seus estatutos a compra e a venda, relações impessoais que necessitam de mediação do Estado por serem levadas a efeito em público.

Dessa forma, a definição de publicidade trazida por Churchill e Peter, na versão traduzida, remete à publicity, e a de propaganda à advertising. No que concerne à definição apontada por Carvalho, publicidade está mais próxima de advertising. Embora as palavras propaganda e publicidade apresentem significados específicos, atualmente, no Brasil, “ambas são usadas indistintamente” (SANT‟ANNA, 2003, p. 75).

11 Dicionário disponível no sítio da American Marketing Association (AMA) (www.marketingpower.com). 12Advertising – Anúncios e mensagens persuasivas veiculadas em um determinado período de tempo e espaço

pago em qualquer meio de comunicação de massa por empresas, organizações sem fins lucrativos, agências governamentais e pessoas que buscam informar e/ou persuadir os membros de um mercado-alvo ou público específico sobre seus produtos, serviços, organizações ou ideias;

Propaganda – Ideias, informações ou outro material comumente divulgados pelos meios de comunicação, a fim

de conquistar/converter as pessoas para uma determinada doutrina ou ponto de vista;

Publicity – Comunicação não paga de informações sobre uma empresa ou produto, geralmente na forma de

Para esta etapa analítica da dissertação, os termos propaganda e publicidade serão utilizados de forma igualitária, a fim de referenciar a maneira de influenciar e persuadir consumidores, bem como o anúncio veiculado para a divulgação de um evento ou produto.

O anúncio é a grande peça do imenso tabuleiro publicitário e o meio publicitário por excelência para comunicar algo com propósito de vender serviços ou produtos, criar uma disposição, estimular um desejo de posse ou para divulgar e tornar conhecido algo novo e estimular a massa ou um de seus setores (SANT‟ANNA, 2003, p. 77). O anúncio publicitário é um discurso matizado pela cultura em que está inserido, a fim de atingir um determinado público-alvo. Trata-se de uma manifestação que se vale da língua da comunidade e de imagens e temas refletores de uma identidade local.

Segundo Sant‟Anna (2003, p. 77-78), para ser atrativo, o anúncio deve ser baseado em torno do conhecimento dos instintos, dos impulsos, dos saberes e dos sentimentos, enfim, da natureza humana de quem se deseja captar.

Assim sendo, a mensagem publicitária, para ser eficaz, utiliza-se de “conotações culturais, icônicas e lingüísticas, sobretudo aquelas que veiculam estereótipos, mais facilmente codificáveis e compreensíveis” (CARVALHO, 2007, p. 107), capazes de levar o leitor ou ouvinte a identificar-se com o que é transmitido.

Para atrair o seu coenunciador, os publicitários optam por temas clássicos ou novos, envolvendo dois aspectos: a tradição e a evolução. Os temas clássicos, por sua vez, reproduzem um estereótipo cultural, uma espécie de inconsciente coletivo, e transmitem a história de uma comunidade. Um exemplo a ser mencionado é a preferência da publicidade portuguesa por temas históricos, especialmente os relacionados à época áurea dos descobrimentos (CARVALHO, 2007, p. 107).

De acordo com Hall (2005, p. 56), “as culturas nacionais são tentadas, algumas vezes, a se voltar para o passado, a recuar defensivamente para aquele „tempo perdido‟, quando a nação era „grande‟; são tentadas a restaurar as identidades passadas”. Esse mesmo autor (2005, p. 51) revela que a mídia se vale de imagens e de eventos históricos nacionais com o intento de simbolizar ou representar “as experiências partilhadas, as perdas, os triunfos e os desastres que dão sentido à nação”.

Destarte, por meio da análise do anúncio Lisboa-Dakar 2008, demonstrar-se-á como o discurso publicitário dialoga com o discurso histórico e trabalha com a memória coletiva para atingir um público-alvo específico e, consequentemente, vender uma ideia.

3.2 ANÁLISE DO ANÚNCIO LISBOA-DAKAR 2008

Em dezembro de 2007, a revista portuguesa Men’s Health, destinada ao público masculino, estampou, em uma de suas páginas, a peça publicitária da prova Lisboa-Dakar 2008. Essa prova realizar-se-ia em janeiro de 2008, não fosse a falta de segurança devido a ataques terroristas na Mauritânia, onde ocorreriam oito das quinze provas da competição, fato que obrigou os organizadores a cancelar o evento.

Figura 1: Anúncio Lisboa-Dakar 2008.

Fonte: MEN‟S HEALTH. Lisboa: Motorpress, n. 81, dez. 2007

Para a análise do anúncio em questão, é crucial enfocar os fatores extralinguísticos que o envolvem, como a história da prova Rali Dakar.