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Entendemos que o tema do presente trabalho assume um especial relevo em situações económicas difíceis, caracterizadas por momentos de crise. Ora, perante uma economia instável, a eficiência dos mercados torna- se mais debatível e o risco de investimento aumenta. Não obstante, também a importância no cumprimento do dever de informação se verifica especialmente em relação a investimentos complexos e de alto risco concretizados por investidores não qualificados.

Consideramos assim, que o dever de informação é um meio fulcral para salvaguardar os interesses dos investidores e permitindo-lhes estabelecer a confiança que por vezes fica diminuta perante tal instabilidade económica.

É certo, que o IF deverá cumprir o dever de informação assegurando os interesses do investidor, não obstante nem sempre os interesses de ambas as partes se encontrarem em consonância por exemplo, poderemos considerar que a venda nos balcões comerciais de obrigações próprias do Banco a que o investidor se dirige, leva-nos acreditar que existe um grave

99 Sobre a necessidade de supervisão por parte da Comissão de Valores Mobiliários, vide,

MARGARIDA AZEVEDO DE ALMEIDA, Valores Mobiliários, CMVM e Protecção dos Consumidores, Estudos do Direito do Consumo, Volume IV , FDUL, 2013, pp.186 e ss.

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conflito de interesses100, não estando de todo salvaguardado os interesses

dos investidores.

Neste sentido propomos no presente labor, algumas medidas que consideramos serem essenciais para a resolução de eventuais conflitos que possam surgir no âmbito da prestação do dever de informação do intermediário financeiro, nomeadamente:

- Proibição de venda de obrigações próprias do banco ao investidor:

Consideramos existir conflito de interesses101 na venda destas

obrigações.

- Eliminação das letras minúsculas nos contratos que permitem o investimento em todos os valores mobiliários considerados complexos e que implicam uma possível perda de capital:

Consideramos que a existência das letras minúsculas dispersa atenção para as mesmas e que podem conter informação relevante e prejudicial para os investidores.

- Adopção de um tipo de letra e tamanhos específicos com aplicabilidade em todos os sectores que permitem o investimento em valores mobiliários complexos e com possível perda de capital:

Acreditamos que existem tipos de letra e tamanhos específicos que dificultam a percepção visual na leitura de um contrato, devendo neste sentido adoptar-se um tipo de letra de utilização universal como por exemplo o tipo Times New Roman com tamanho 12.

- Obrigatoriedade de estandardizar a sequência ou a página em que as cláusulas mais importantes do contrato estão mencionadas. No mínimo, os termos mais importantes devem estar sumariados na primeira ou, em alternativa, na última página.

100 Sobre o conceito de conflito de interesses, vide Kwangwook Lee, Investor Protection in European

Union: Post FSAP Directives and MiFID, 2009, p. 13 e ss.

101 Sobre o conceito de interesses do investidor, vide, FRANCISCO JOSÉ ALONSO ESPINOSA,

Intereses del inversor y derecho del mercado de valores, Revista de Derecho Mercantil, Abril-Junho, 1993, pp. 415 a 469.

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O facto de, por vezes, as cláusulas fulcrais do contrato, estarem dispersas pelo contrato, ou no entremeio de outras considerações menos importantes, facilita que escapem ao investidor particularidades cruciais para os seus interesses, nesse meio contratualizados102.

- Obrigatoriedade de um tempo de reflexão mínimo de 24 horas da decisão de investir nos valores supra mencionados:

Imaginemos a seguinte situação: o individuo A dirige-se a um Banco e decide após recomendação do IF realizar um investimento num valor mobiliário complexo. O IF solicita-lhe que assine o contrato que serve de base ao investimento, autorizando assim a realização do mesmo. A tendência será qual? A leitura cuidada do contrato, ou a assinatura precipitada do mesmo? Cremos que a maioria dos investidores optaria pela segunda. Assim, consideramos oportuno a cedência do contrato ao investidor para que o mesmo o possa ler com cuidado e reflectir sobre o conteúdo do mesmo.

- Formações obrigatórias/propostas sobre valores complexos para os investidores não qualificados:

A formação do investidor permite que o mesmo invista de uma forma mais consciente, isto porque adquire conhecimentos sobre os valores

mobiliários que de outra forma poderia não conseguir obter. Esta medida pressupõe o interesse dos investidores da mesma e portanto caso, os mesmos não o tenham, devem justificar por escrito ao IF e autorizar que o mesmo prossiga com o investimento em causa. Os formatos destas

formações podem ser presenciais, por cursos online e folhetos informativos - Proibição de objectivos profissionais do IF na venda de valores complexos:

102 Conforme um estudo britânico é comum que a informação mais sensível conste no meio do

contrato, pois costuma-se ler apenas o início e o fim, veja-se em:

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Os objectivos profissionais103 no sector financeiro, resultam

maioritariamente no número de venda de produtos financeiros e do capital investido, neste sentido não nos parece plausível que valores mobiliários complexos e de alto risco devam entrar nesta estatística profissional. Mais uma vez perante tal situação poderá existir conflitos de interesses e criar no mercado um apetite para o risco não pela espontânea vontade do tutelado, mas induzida artificialmente pelo intermediário financeiro em busca de resultados profissionais.

- Documentação escrita obrigatória do que o investidor não qualificado pretende obter com os investimentos que visa concretizar, bem como os riscos que pretende assumir, assinada por ambas as partes:

Esta medida visa a compreensão e responsabilização de ambas as partes daquilo que se pretende obter com o investimento em causa, de uma forma clara e consciente.

- Investimentos realizados através de decisões telefónicas devem ter como requisito a gravação obrigatória autorizada pelo investidor:

Perante a gravação telefónica não existirão dúvidas daquilo que foi proposto e transmitido ao investidor e aquilo que o mesmo autorizou. Obviamente que perante a não autorização por parte do investidor não deverá a chamada telefónica ser utilizada para obter qualquer tipo de decisão de investimento complexo.

- Relatórios mensais do estado dos investimentos de alto risco enviados por carta com aviso de recepção e/ou email ao investidor com informação simples eclara:

103 Para mais desenvolvimento, SPILIOS MOUSOULOS, Autorégulation, Déontologie Professionnelle et

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Permite a informação actualizada e mensal, levando ao acompanhamento escrito por parte do investidor dos investimentos que concretizou.

Chegados a este ponto, é relevante considerarmos que estas propostas pretendem evitar por um lado o incumprimento ou a falta de alinhamento de interesses do IF e o investidor e por outro lado evitar erros que os investidores tendem a efectuar perante um investimento, nomeadamente tomando decisões mais emocionais do que propriamente racionais104.

104 “Why are there more behavioural problems in financial services? For a number of reasons,

consumer choice in retail financial products and services is particularly prone to errors: i)Many products are inherently complex for most people. ii) Financial products are abstract and intangible and often have many features and complex charging structures. This contrasts with many ordinary products where consumers can easily understand what they are getting and the product has a single, simple price. Faced with complexity, consumers can simplify decisions in ways that lead to errors, such as focusing only on headline rates. Many products involve trade-offs between the present and the future. Often people make decisions against their long-term interests because of self-control problems, e.g. borrowing excessively using payday loans. iii)Decisions may require assessing risk and uncertainty. People are generally bad (even terrible) intuitive statisticians and are prone to making systematic errors in decisions involving uncertainty. So we often misjudge probabilities and make poor insurance or investment decisions. iv)Decisions can be emotional. Stress, anxiety, fear of losses and regret, rather than the costs and benefits of the choices, can drive decisions. Some products permit little learning from past mistakes. Some financial decisions, such as choosing a retirement plan or mortgage, are made infrequently, with little learning from others, and with consequences revealed only after a long delay.” Cit. Estudo Britânico disponível em:

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CAPÍTULO III

A responsabilidade do intermediário financeiro

1. Os intermediários financeiros são responsáveis perante os seus

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