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Na nossa busca por propriedades para matrizes diagonalmente dominantes que garantir˜ao a sua invertibili- dade, uma observa¸c˜ao fundamental ´e a de que se A ´e uma matriz diagonalmente dominante, ent˜ao 0 n˜ao pode ser um ponto interior de nenhum disco de Gershgorin. De fato, se λ ´e um autovalor de A interior a algum disco de Gershgorin ent˜ao devemos ter desigualdade estrita

|λ − aii| < Ri(A) = n X j=1 j6=i |aij|

para algum i. Se 0 ´e um autovalor de A interior a algum disco de Gershgorin, ent˜ao |aii| < n X j=1 j6=i |aij|

para algum i e A n˜ao pode ser diagonalmente dominante na linha i.

Uma condi¸c˜ao equivalente para que um autovalor λ de A n˜ao seja um ponto interior de nenhum disco de Gershgorin ´e que |λ − aii| > Ri(A) = n X j=1 j6=i |aij| para todo i = 1, . . . , n.

Tais pontos λ na regi˜ao de Gershgorin G (A) (n˜ao necessariamente autovalores de A) constituem precisa- mente a fronteira ∂G (A) da regi˜ao de Gershgorin. Chamaremos a fronteira de um disco de Gershgorin {z ∈ C : |z − aii| = Ri(A)} um c´ırculo de Gershgorin.

3.6 Lema. Seja A ∈ Mn(C) e λ um autovalor de A que n˜ao ´e um ponto interior de nenhum disco de

Gershgorin. Seja x = (x1, . . . , xn) 6= 0 um autovetor associado a λ e k um ´ındice tal que

|xk| > |xj| para j = 1, . . . , n.

Se i ´e qualquer ´ındice tal que

|xi| = |xk|

ent˜ao o i-´esimo c´ırculo de Gershgorin passa por λ. Se, al´em disso, aij 6= 0,

ent˜ao

|xj| = |xk|

e o j-´esimo c´ırculo de Gershgorin tamb´em passa por λ.

Prova. Como na demonstra¸c˜ao do Teorema de Gershgorin, temos |xi| |λ − aii| 6 n X j=1 j6=k |aijxj| = n X j=1 j6=k |aij| |xj| 6 |xk| n X j=1 j6=k |aij| = |xk| Ri(A) (3.15)

para todo ´ındice i. Logo, se |xi| = |xk|, temos

|λ − aii| 6 Ri(A) .

Como por hip´otese

para todo ´ındice i, segue que

|λ − aii| = Ri(A) .

Em geral, |xi| = |xk| implica que as desigualdades em (3.15) s˜ao identidades; em particular, n X j=1 j6=k |aij| |xj| = |xi| n X j=1 j6=k |aij| donde n X j=1 j6=k |aij| (|xi| − |xj|) = 0.

Esta ´e uma soma de termos n˜ao-negativos, pois |xi| > |xj|, logo se aij 6= 0 necessariamente devemos ter

|xj| = |xi| = |xk|. 

Este lema t´ecnico tem as seguintes conseq¨uˆencias ´uteis:

3.7 Teorema. Seja A ∈ Mn(C) uma matriz cujas entradas s˜ao todas n˜ao-nulas e seja λ um autovalor de A

que n˜ao ´e um ponto interior de nenhum disco de Gershgorin. Ent˜ao todo c´ırculo de Gershgorin de A passa por λ (isto ´e, λ est´a na interse¸c˜ao de todos os c´ırculos de Gershgorin de A) e se x = (x1, . . . , xn) 6= 0 ´e um

autovetor associado a λ ent˜ao

|xi| = |xj| para todos i, j = 1, . . . , n.

Prova. Decorre diretamente do lema anterior. 

3.8 Corol´ario. Se A ∈ Mn(C) ´e uma matriz cujas entradas s˜ao todas n˜ao-nulas e diagonalmente dominante

tal que |aii| > n

P

j=1 j6=i

|aij| para pelo menos alguma linha i, ent˜ao A ´e invert´ıvel.

Prova. Pois, como A ´e diagonalmente dominante, se 0 ´e um autovalor de A ent˜ao 0 n˜ao pode ser um ponto interior de nenhum disco de Gershgorin. Por outro lado, pelo teorema anterior, segue que todo c´ırculo de Gershgorin passa por 0. Entretanto, o i-´esimo c´ırculo de Gershgorin centrado em aii e com raio Ri < |aii|

n˜ao pode passar por 0. Conclu´ımos que 0 n˜ao ´e um autovalor de A, logo A ´e invert´ıvel. 

Na verdade, usando com maior cuidado a informa¸c˜ao dada pelo Lema3.6podemos obter resultados ainda melhores:

3.9 Defini¸c˜ao. Dizemos que uma matriz A = (aij) ∈ Mn(C) satisfaz a propriedade FC se para todo par de

inteiros distintos i, j existe uma seq¨uˆencia de inteiros distintos i1= i, i2, i3, . . . , im−1, im= j, com 1 6 m 6 n,

tais que todas as entradas matriciais

ai1i2, ai2i3, . . . , aim−1im

s˜ao n˜ao-nulas. 

Por exemplo, a matriz diagonalmente dominante n˜ao-invert´ıvel   4 2 1 0 1 1 0 1 1  ,

j´a vista anteriormente, n˜ao satisfaz a propriedade FC porque o par 2, 1 n˜ao admite tal seq¨uˆencia (a ´unica seq¨uˆencia poss´ıvel ´e a23, a31). J´a qualquer par de inteiros distintos i, j tal que aij 6= 0 admite a seq¨uˆencia

trivial n˜ao-nula aij, de modo que uma matriz cujas entradas n˜ao-diagonais s˜ao todas n˜ao-nulas satisfaz a

3.10 Teorema. Seja A ∈ Mn(C) uma matriz que satisfaz a propriedade FC e seja λ um autovalor de A

que n˜ao ´e um ponto interior de nenhum disco de Gershgorin. Ent˜ao todo c´ırculo de Gershgorin de A passa por λ (isto ´e, λ est´a na interse¸c˜ao de todos os c´ırculos de Gershgorin de A) e se x = (x1, . . . , xn) 6= 0 ´e um

autovetor associado a λ ent˜ao

|xi| = |xj| para todos i, j = 1, . . . , n.

Prova. Seja x = (x1, . . . , xn) 6= 0 um autovetor associado a λ e i um ´ındice tal que

|xi| > |xk| para k = 1, . . . , n.

Pelo Lema3.6,

|λ − aii| = Ri(A) .

Seja j 6= i qualquer outro ´ındice e i1 = i, i2, i3, . . . , im−1, im= j, com 1 6 m 6 n, ´ındices tais que todas as

entradas matriciais

aii2, ai2i3, . . . , aim−1j 6= 0.

Como aii2 6= 0, segue da segunda afirmativa do Lema 3.6que |xi2| = |xi|. Mas ent˜ao ai2i3 6= 0 e portanto

|xi3| = |xi2| = |xi|. Prosseguindo desta forma, conclu´ımos que

|xi| = |xi2| = . . .

xim−1

= |xj| .

Em particular, segue novamente do Lema 3.6 que o j-´esimo c´ırculo de Gershgorin passa por λ. Como j ´e arbitr´ario, isso prova o teorema. 

3.11 Corol´ario. Se A ∈ Mn(C) ´e uma matriz que satisfaz a propriedade FC e diagonalmente dominante

tal que |aii| > n

P

j=1 j6=i

|aij| para pelo menos alguma linha i, ent˜ao A ´e invert´ıvel.

Prova. Segue do teorema anterior da mesma forma que o Corol´ario3.8segue do Teorema3.7. 

Vamos tentar entender melhor o significado da propriedade FC. Note que ela se refere apenas `a localiza¸c˜ao dos elementos n˜ao-nulos de A fora da diagonal principal – os elementos da diagonal principal e os valores espec´ıficos dos elementos fora da diagonal principal s˜ao irrelevantes. Isso motiva as seguintes defini¸c˜oes: 3.12 Defini¸c˜ao. Dada uma matriz A = (aij) ∈ Mn(C) definimos o m´odulo da matriz A como sendo a

matriz

|A| = (|aij|)

cujos elementos s˜ao os m´odulos dos elementos da matriz A e a matriz indicadora de A como sendo a matriz M (A) = (µij) , onde µij =  1 se aij6= 0, 0 se aij= 0. 

O conceito de uma seq¨uˆencia de entradas n˜ao-nulas da matriz A que aparece na defini¸c˜ao da propriedade FC pode ser visualizado em termos de caminhos em um grafo associado a A:

3.13 Defini¸c˜ao. Dada uma matriz A ∈ Mn(C), o grafo direcionado de A ´e o grafo direcionado Γ (A)

com n nodos P1, . . . , Pn tais que existe um arco direcionado em Γ (A) de Pi a Pj se e somente se aij 6= 0.

Um caminho direcionado γ em um grafo Γ ´e uma seq¨uˆencia de arcos Pi1Pi2, Pi2Pi3, . . . em Γ. O

comprimento de um caminho direcionado ´e o n´umero de arcos sucessivos no caminho direcionado. Um ciclo ´

e um caminho direcionado que come¸ca e termina no mesmo n´o.

Dizemos que um grafo direcionado ´e fortemente conexo se entre qualquer par de nodos distintos Pi, Pj∈ Γ existir um caminho direcionado de comprimento finito que come¸ca em Pi e termina em Pj. 

Observe que quando Γ ´e um grafo direcionado com n nodos, se existe um caminho direcionado entre dois nodos de Γ, ent˜ao sempre existe um caminho direcionado entre estes dois nodos de comprimento menor que ou igual a n − 1.

3.14 Teorema. A ∈ Mn(C) satisfaz a propriedade FC se e somente se Γ (A) ´e fortemente conexo.

Verificar a propriedade FC a partir do grafo direcionado de A pode ser impratic´avel se o tamanho da matriz for muito grande. Existe um m´etodo computacional mais expl´ıcito para fazˆe-lo:

3.15 Teorema. Sejam A ∈ Mn(C) e Pi, Pjnodos de Γ (A). Existe um caminho direcionado de comprimento

m em Γ (A) de Pi para Pj se e somente se

(|A|m)ij 6= 0 ou, equivalentemente, se e somente se

[M (A)m]ij6= 0.

Prova. Provaremos o teorema por indu¸c˜ao. Para m = 1 a afirmativa ´e trivial. Para m = 2, temos  |A|2 ij = n X k=1 (|A|)ik(|A|)kj= n X k=1 |aik| |akj| ,

de modo que |A|2

ij 6= 0 se e somente se aik, akj s˜ao ambos n˜ao-nulos para algum ´ındice k. Mas isso ´e

equivalente a dizer que existe um caminho direcionado de comprimento 2 em Γ (A) de Pi para Pj.

Em geral, supondo a afirmativa provada para m, temos  |A|m+1 ij= n X k=1 (|A|m)ik(|A|)kj= n X k=1 (|A|m)ik|akj| 6= 0

se e somente se (|A|m)ik, akj s˜ao ambos n˜ao-nulos para algum ´ındice k. Por hip´otese de indu¸c˜ao, isso ´e

equivalente a existir um caminho direcionado de comprimento m em Γ (A) de Pi para Pk e um caminho

direcionado de comprimento 1 em Γ (A) de Pk para Pj, isto ´e, um caminho direcionado de comprimento

m + 1 em Γ (A) de Pi para Pj. O mesmo argumento vale para M (A). 

3.16 Defini¸c˜ao. Seja A = (aij) ∈ Mn(C). Dizemos que A > 0 se aij > 0 para todos 1 6 i, j 6 n e que

A > 0 se aij > 0 para todos 1 6 i, j 6 n. 

3.17 Corol´ario. Seja A ∈ Mn(C). Existe um caminho direcionado de comprimento m em Γ (A) de cada

nodo Pi para cada nodo Pj se e somente se

|A|m> 0 ou, equivalentemente, se e somente se

M (A)m> 0.

3.18 Corol´ario. Seja A ∈ Mn(C). A satisfaz a propriedade FC se e somente se

(I + |A|)n−1> 0 ou, equivalentemente, se e somente se

[I + M (A)]n−1> 0. Prova. Temos (I + |A|)n−1= I + (n − 1) |A| +n − 1 2  |A|2+ . . . +n − 1 n − 3  |A|n−1+ |A|n−1> 0

se e somente se para cada par de ´ındices i, j com i 6= j pelo menos um dos termos |A| , |A|2, . . . , |A|n−1 tem uma entrada positiva em (i, j). Pelo Teorema 3.15, isso ocorre se e somente se existe algum caminho direcionado em Γ (A) de Pipara Pj com comprimento 6 n−1. Isto ´e equivalente a A satisfazer a propriedade

FC. O mesmo argumento vale para M (A). 

Em geral, a maneira como uma matriz foi obtida (como as nossas matrizes de discretiza¸c˜ao; veja a ´ultima se¸c˜ao do cap´ıtulo) torna clara se elas s˜ao matrizes que satisfazem a propriedade FC ou n˜ao. Se isso n˜ao ´e poss´ıvel, e pretende-se verificar a propriedade FC atrav´es do Corol´ario 3.18, ´e prefer´ıvel calcular [I + M (A)]n−1, j´a que M (A) ´e uma matriz composta apenas de 0’s e 1’s.

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