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PARTE II – AS PRÁTICAS DE CONTABILIDADE CRIATIVA NO ÂMBITO DO SISTEMA DE

2- Contabilidade criativa

2.4. A contabilidade criativa e o Justo Valor

2.5.5. Propriedades de Investimento – Norma aplicável: NCRF 11

O SNC veio introduzir grandes alterações no normativo contabilístico português, sendo

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A que fizemos referência no ponto 1.2. deste relatório.

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De referir, no caso das microentidades que aplicam a NCRF-ME, os custos de empréstimos obtidos devem ser reconhecidos como gasto, não estando prevista a capitalização dos custos de empréstimos obtidos.

38 a mensuração ao justo valor considerada uma das alterações mais relevantes, conforme referido anteriormente. No caso particular das propriedades de investimento, o SNC veio introduzir alterações, quer na designação (eram designadas por “investimentos em imóveis” no POC), quer na base de mensuração, que recai preferencialmente sobre o justo valor, mantendo a opção pelo custo histórico (Pires e Rodrigues, 2008)

De acordo com o §5 da NCFR 11: “é a propriedade (terreno ou um edifício – ou parte de um edifício – ou ambos), detida (pelo dono ou pelo locatário numa locação financeira) para obter rendas ou para a valorização do capital ou para ambas as finalidades, e não para: a) uso na produção ou fornecimento de bens ou serviços ou para finalidades administrativas; ou para b) venda no curso ordinário do negócio”

Inicialmente, uma propriedade de investimento deverá ser mensurada pelo seu custo, por inclusão dos denominados custos de transação (NCRF 11, § 20). Na mensuração após o reconhecimento inicial, é conferida à entidade a possibilidade de opção, no que concerne à política contabilística, entre: o modelo do custo e o modelo do justo valor (NCRF 11, § 29).

Saliente-se que o modelo do justo valor das propriedades de investimento não corresponde ao modelo de revalorização dos ativos fixos tangíveis23, preconizado na NCRF 7 (cuja quantia escriturada resulta da determinação de um valor revalorizado com base no justo valor, a que se deduzem as depreciações acumuladas e perdas por imparidades acumuladas subsequentes à data da revalorização). Contrariamente ao modelo de revalorização, o modelo de justo valor das propriedades de investimento implica que a quantia escriturada do ativo, em cada momento, corresponda ao próprio justo valor da propriedade de investimento, não havendo lugar ao reconhecimento de depreciações e perdas por imparidade (Monteiro, 2011).

Uma entidade que adote o modelo do custo para a mensuração subsequente das propriedades de investimento deverá aplicar, por remissão, as disposições da NCRF 7 relativamente ao modelo do custos, aplicando-o a todas as propriedades de investimento NCRF 11, § 59). Deste modo, quantia escriturada das propriedades de investimento corresponde ao seu custo menos qualquer depreciação acumulada e quaisquer perdas por imparidade acumuladas.

Uma entidade que adote o modelo do justo valor, deverá generalizar as consequências dessa opção a toda e qualquer propriedade de investimento, devendo os ganhos ou as perdas resultantes de quaisquer variações ser reconhecidos nos resultados do período (NCRF 11, §§ 34 e 36).

Saliente-se o facto de ser exigida a determinação do justo valor de qualquer propriedade de investimento: seja com o intuito de mensurar, no caso de adopção do modelo

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No tempo do POC, para os “investimentos em imóveis” era permitido a revalorização deste tipo de ativos, ao abrigo da Diretriz Contabilística n.º 16 relativa à Reavaliação de ativos tangíveis e investimentos em imóveis.

39 do justo valor24; seja com o intuito de divulgar, no caso de adoção do modelo do custo (NCRF 11, § 31).

Segundo Rodrigues (2010) a opção pelo modelo de custo ou pelo modelo do justo valor implica impactos significativos nas demonstrações financeiras. Estes efeitos resultam do facto de no modelo do custos ser possível o reconhecimento quer de gastos de depreciação quer, caso se verificarem, de perdas imparidades (em cumprimento da NCRF 12); e no modelo do justo valor não estar previsto o reconhecimento deste tipo de factos.

No modelo de custo haverá lugar apenas ao registo de perdas de valor (via depreciações, e/ou imparidades), enquanto com a adoção do modelo do justo valor poderão existir situações de perdas ou de ganhos, conforme as alterações que se verifiquem em cada exercício, relativas à rubrica “variações de justo valor”25. O impacto nos resultados das empresas será, portanto, diferente consoante o modelo de mensuração adotado.

Segundo Rodrigues (2011), o normativo contabilístico indica uma maior orientação para o modelo do justo valor. Para a autora: “o modelo que permite o relato do valor das propriedades mais próximo do seu valor económico, em cada período, é o modelo do justo valor, e é esse que acolhe a preferência do normalizador, ainda que não o imponha de forma obrigatória para a valorização/mensuração.” (Rodrigues, 2011,198).

Um estudo realizado por Semedo (2014), numa amostra de 114 empresas sediadas e/ou legalmente registadas em Portugal, no período de 2012, concluiu que a maioria das empresas, cerca de 55%, adota o modelo do custo na mensuração subsequente das propriedades de investimento. Segundo o autor, a maior familiaridade com o modelo do custo ou a simplicidade na sua aplicação surgem como razões vulgarmente apontadas para justificar esta preferência. A reduzida adesão ao justo valor prende-se, no essencial, com os custos associados à sua utilização e, fundamentalmente, com a inexistência de mercados organizados, ativos e suficientemente competitivos.

Por sua vez, Esteves (2015), numa amostra de 26 empresas cotadas na Euronext Lisbon, concluiu que ambos os modelos de mensuração são adotados pelas empresas da amostra sem que haja uma clara preferência por nenhum dos dois. Embora a harmonização contabilística e a adoção das normas do IASB apontem como modelo preferencial o do justo valor, o estudo de Esteves (2015) não comprova esta preferência. Segundo a IAS 40, bem como a NCRF 11, as empresas que adotem o modelo custo estão obrigadas, para efeitos de divulgação no anexo, a determinar o justo valor das suas propriedades de investimento. Todavia, naquele estudo verificou-se que este requisito não está a ser cumprido pela maioria

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A entidade é incentivada, não obrigada, a sustentar a definição do justo valor em relatório de avaliador independente, devidamente credenciado.

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Para o efeito, foram criadas no quadro de contas do SNC rubricas de resultados específicas, as contas 663 - Perdas por reduções de justo valor - Em propriedades de investimento e 773 - Ganhos por aumentos de justo valor - Em propriedades de investimento).

40 das empresas da amostra que utilizam o modelo do custo.

A nível fiscal, no caso particular das propriedades de investimento, a alternativa que o normativo contabilístico permite, entre a aplicação do modelo de custo ou do justo valor, implicará diferenças de tratamento entre o que é aceite contabilística e fiscalmente. Mais concretamente no que toca às depreciações, perdas por imparidade, e reconhecimento de alterações positivas ou negativas do justo valor.

No modelo do custo, o normativo contabilístico prevê o reconhecimento de encargos com depreciações, encargos estes que vão ser aceites como gasto fiscal e consequentemente se vão traduzir numa diminuição da carga fiscal. Pelo contrário, o eventual reconhecimento de perdas por imparidade não é, regra geral, aceite fiscalmente26.

No modelo do justo valor, os ganhos ou perdas decorrentes de variações do justo valor serão reconhecidos nos resultados. No entanto, este reconhecimento não tem relevância em termos fiscais, uma vez que estas variações não serão aceites fiscalmente não contribuindo, grosso modo, para redução ou aumento da matéria tributável27.

O facto da legislação fiscal de forma diferente do normativo contabilístico, em matéria de propriedades de investimento, poderá ser um fator de ponderação no momento em que os responsáveis pela elaboração das DF´s fazem a opção pela política contabilística, preferindo à partida o modelo que maior impacto tenha quanto à redução do imposto a pagar.

Pode-se concluir que, numa perspetiva de escolha de política contabilística, os responsáveis pela elaboração das DF´s poderão, relativamente à alternativa entre o modelo do justo valor ou o modelo do custo, ter uma motivação de ordem fiscal, escolhendo aquele modelo que melhor vai ao encontro dos seus objetivos, sendo esse incentivo superior em empresas em que as propriedades de investimento apresentem um peso elevado nos seus ativos.

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