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6. RESULTADOS E DISCUSSÃO

6.1. ANÁLISE SOB A PERSPECTIVA DA P&D E DA TT

6.1.1. A Proteção

Verifica-se que as leis de propriedade intelectual introduzidas no Brasil a partir da década de 1990, principalmente a Lei de Proteção de Cultivares, tiveram um papel fundamental para as instituições públicas e privadas no desenvolvimento de novas tecnologias para a agricultura. Esse novo cenário influenciou diretamente as formas de parceria para o desenvolvimento de inovações para o campo.

Nesse sentido, o estudo identificou que a Embrapa lançou variedades de milho com características agronômicas semelhantes num período de cinco anos. De acordo com o melhorista Pacheco, no caso específico da variedade de milho BRS Caatingueiro, a Embrapa lançou uma nova variedade de milho com características semelhantes (a BRS Gorutuba em substituição à BRS Caatingueiro) para o mesmo ambiente porque houve problema na proteção da variedade BRS Caatingueiro.

Sobre a definição de registro e proteção de cultivar, Laudares e Paes informam que são conceitos fundamentalmente distintos:

“O registro é feito no Registro Nacional de Cultivares do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (RNC/MAPA), com a finalidade de habilitar previamente as cultivares para a produção, o beneficiamento e a comercialização no País. Já a proteção é feita no SNPC/MAPA, amparada pela Lei de Proteção de Cultivares, sancionada em abril de 1997, com o objetivo de fortalecer e padronizar os direitos de propriedade intelectual sobre a cultivar criada” (LAUDARES, questionário respondido em 08/07/2014 ).

“A finalidade do registro é habilitar a cultivar do ponto de vista legal para ser multiplicada. É comunicar ao Ministério para que fiscalize a produção de semente de acordo com as normas do próprio Ministério. Para cada cultura, existe um padrão de qualidade, de germinação, de vigor, de pureza, que o Ministério da Agricultura fiscaliza. Já a proteção assegura àquele pesquisador ou àquela instituição o direito da propriedade intelectual” (PAES, entrevista em 10/07/2014 ).

Para o melhorista Pacheco, a vantagem de se proteger uma variedade reside em limitar o seu uso por pessoas ou empresas que podem vir a produzir material sem a licença da

Embrapa e sem a devida qualidade genética (PACHECO, entrevista em 16/06/2014). O melhorista diz que mesmo protegendo o material é possível que os pequenos produtores rurais tenham acesso a esse mesmo material, e convida para uma reflexão:

“[...] quando se licencia uma variedade você dá o direito de uma empresa produzi-la, e se a empresa tem o direito exclusivo de produzir, aí de fato há um dilema [...] se existe uma empresa produzindo, por que estimular a produção social? [...] para isso, há os programas do MDA (Ministério do Desenvolvimento Agrário) que trabalham com empresas para produção de sementes. Por exemplo, há uma empresa em Primavera do Leste, Mato Grosso, que plantou 800 ha do Caatingueiro para produzir sementes destinadas ao estado de Pernambuco [...] quer dizer, o MDA compra [...], e o governo intermedeia junto ao MDA por meio de programas sociais. Em resumo, uma empresa produz a semente e o governo compra e distribui” (PACHECO, entrevista em 16/06/2014).

Sob esse mesmo ponto de vista, Paes afirma que existe uma deliberação da Embrapa, por meio de sua Política de Gestão da Propriedade Intelectual, determinando que toda cultivar deve ser protegida. A legislação esclarece que cultivares reconhecidas como de interesse público, devem ser de domínio público, mas a própria legislação também dá direito à detenção da titularidade daquilo que se desenvolveu:

“[...] se você não proteger a cultivar que desenvolveu significa que ela é de domínio público. Do ponto de vista formal, ela (cultivar) não é da Embrapa. Protegendo-a você está assegurando que aquela informação ou aquele conhecimento que foi gerado pertence à Embrapa [...] Se alguém quiser fazer uso daquele conhecimento tem que pedir autorização à Embrapa” (PAES, entrevista em 10/07/2014).

De Carli (2005) ressalta a importância da LPC para o estabelecimento de uma nova fase para as questões de propriedade intelectual das cultivares, possibilitando o pagamento de royalties aos obtentores dos materiais, mas diz que juntamente com a semente protegida surgiu a semente “pirata” que é aquela produzida e posteriormente comercializada, a partir da semente protegida, sem a devida autorização do obtentor.

Nesse sentido, Wetzel (2005, p. 30) destaca a questão da fragilidade da legislação com relação ao mercado de sementes piratas:

“Na verdade, o mercado paralelo de sementes piratas parece crescer cada vez mais no país, uma vez que não existe uma maneira eficaz de coibir esta fraude. Pelo menos, até agora, através de instrumento jurídico e da fiscalização efetiva do comércio de sementes”.

Por outro lado, De Carli (2005) traz a flexibilidade da LPC quanto à utilização das sementes protegidas. Para o autor, a Lei é flexível ao permitir que o produtor rural utilize a própria semente para a safra seguinte, ou utilize aquele material colhido no ano anterior, como

também valer-se da troca de material protegido com outros produtores rurais, de modo a assegurar os replantios necessários.

Conjugando da opinião de De Carli (2005), na questão da PI de cultivares, Paes relata que a proteção favorece o estabelecimento de contratos de licenciamento, mas isso não significa que a Embrapa não possa dispensar o pagamento de royalties quando se trata de cultivares voltadas para agricultores de base familiar ou pequenos produtores rurais:

“A Embrapa faz o contrato de licenciamento com empresas privadas e essas empresas pagam um percentual a título de royalties. Mas existe um fator importante da proteção mesmo que não gere royalties: por exemplo, as cultivares de feijão são protegidas, mas a Embrapa não cobra royalties por entender que a cultura do feijão tem forte apelo social e grande importância para a segurança alimentar dos produtores rurais. Mesmo assim, o produtor que queira produzir semente de feijão tem que pedir autorização à Embrapa. A proteção é importante porque se controla o nível técnico de quem produz e também a questão genética” (PAES, entrevista em 10/07/2014).

Semelhantemente, Laudares defende que se deve buscar avaliar o impacto social em contrapartida a modelos de negócios como licenciamento, tanto para a cultura do feijão quanto para a de milho.

“Um exemplo disso é a não cobrança de royalties para cultivares protegidas de feijão, considerando o seu alto interesse social. Para algumas variedades de milho, também está se analisando modalidades mais baratas de licenciamento, em face do público a que normalmente se destinam” (LAUDARES, questionário respondido em 08/07/2014.

Além dessas questões, Paes (entrevista em 10/07/2014) informa que a proteção possibilita um certo controle sobre aqueles que estão produzindo as sementes. Quando a cultivar é de domínio público, a Embrapa não tem como fazer esse acompanhamento. Quanto às cultivares de milho, voltadas para pequenos produtores rurais da região semiárida do Nordeste, o entrevistado acredita ser de domínio público assim como são as cultivares de feijão, de forma a baratear os custos para os governos adquirirem sementes.