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A presença da Psicologia na área educacional é bastante questionada há tempos, uma vez que, suas propostas mediante esse campo eram e ainda são muito questionáveis, em relação à suas práticas, conceitos e desenvolvimento de uma práxis psicopedagógica.

Ao longo de sua história, a Psicologia Escolar e Educacional contribuiu, no contexto escolar, para a formação de uma visão “biologizante e medicalizante da construção e do desenvolvimento do psiquismo humano e, em consequência, dos motivos que levam à não- aprendizagem” (SOUZA, 2008, p. 8). Desse modo, instalou-se no contexto educacional um psicologismo que, segundo SASS (2003), é “a redução da explicação de fenômenos sociais e políticos complexos e objetivos à esfera da subjetividade, das vontades, dos interesses e das limitações individuais” (p. 1.368).

Esse enfoque nos fatores subjetivos da educação atribui ao indivíduo seus fracassos e desempenhos, em detrimento dos fatores objetivos e sociais que são parte constituinte de todo o processo educacional, direcionando assim, uma prática clínica em detrimento da pedagógica. Essa prática também mescla funções, contextos e reais objetivos. Sass (2003) discorre sobre esse fato:

Tal modo de agir é um dos traços mais marcantes da intervenção da psicologia no campo educacional e em sua relação com a pedagogia. A contraface disso pode ser assim sintetizada: se o psicólogo é um “quase- médico”, como vaticinou um psicólogo norte-americano, no final da década de 1960, então muitos pedagogos são, guardadas as proporções, “quase- psicólogos”. Em outras palavras, uma das oscilações da pedagogia para o enfrentamento dos problemas pedagógicos, nos termos aqui apresentados, corresponde à modalidade clinicalista do psicologismo (p. 1.368).

Essa modalidade “clinicalista” por sua vez, assume um lugar de extrema importância no contexto educacional, pois, influencia e direciona as ações dos profissionais diretamente envolvidos com a escola, e consequentemente, o direcionamento do aluno. Contudo, os questionamentos dessas práticas clinicalistas já estão na trajetória da Psicologia Escolar desde os anos de 1980 quando alguns pontos foram levantados sobre: o papel social da Psicologia como Ciência e Profissão e da Psicologia Escolar como campo de atuação; dos pressupostos que norteavam a construção do conhecimento no campo da Psicologia Escolar, bem como, suas finalidades em relação à escola que dela participam (SOUZA, 2008).

Dessas discussões, o tema – fracasso escolar - se sobressaiu, passando a centralizar as questões que envolvem os estudos sobre a escola, tanto no campo da Educação quanto no campo da Psicologia, atuando entre esses dois meios, com análises ora sobre aspectos referentes ao psiquismo e ao desenvolvimento cognitivo do indivíduo, ora sobre os aspectos meramente pedagógicos (SOUZA, 2008).

Essas análises, sobretudo quando influenciadas por esses dois aspectos – Pedagógico e Psicológico – ao tratar de processos de escolarização, geralmente, deslocam o eixo de análise do indivíduo para a escola, juntamente com o conjunto de relações (sociais, políticas, históricas, psicológicas, pedagógicas) que constituem o cotidiano escolar. No entanto, esse deslocamento analisa as dificuldades no processo de escolarização como problemas de aprendizagem, e estes, por sua vez, como sintoma psicológico do indivíduo.

Ao considerar o processo de escolarização, a Psicologia Escolar passa a enfatizar a necessidade de que a escola é o espaço em que relações sociais e individuais se articulam numa rede de relações complexas e que precisam ser

analisadas como tal. Ou seja, quando o psicólogo recebe uma queixa escolar, esta se constitui em um fragmento de uma complexa rede de relações sociais com as quais ele terá que trabalhar a partir do seu campo de conhecimento. O psiquismo é um dos aspectos constitutivos do processo de escolarização e ao elegê-lo como o aspecto central de sua análise, o psicólogo ou qualquer outro profissional incorrerá no erro de desprezar inúmeras outras situações que, segundo várias pesquisas na área educacional apresentam, são constitutivas de ações realizadas pelas crianças e de reações a determinados contextos extremamente hostis. E mais do que isso, explicitará o fato de que o profissional desconhece o que se passa na escola, não tendo a dimensão de que o fracasso ou o sucesso no processo de aprendizagem escolar é muito menos determinado por questões individuais do que por mecanismos institucionais e políticos (SOUZA, 2008, p. 6).

Desse modo, essa “dificuldade” de separar as práticas profissionais cabíveis a cada contexto fez com que muitas redes de ensino, por volta dos anos de 1980, de acordo com Souza (2008), retirassem os psicólogos da área da educação para o campo da saúde, com a justificativa de que estes profissionais atuavam em uma prática clínica e diagnóstica e não educacional.

Esse “ajuste” da área para o trabalho do psicólogo identificou-o como profissional pertencente à área da saúde, vinculado sob uma perspectiva médico assistencial que não comportava a área educacional. Contudo, a partir de meados de 1990, novas formas de aproximação da Psicologia com a Educação Escolar em uma perspectiva crítica foram pensadas para rechaçar as explicações de cunho adaptacionista, advindas da Psicopedagogia e da Psicomotricidade, que até então respondiam às demandas dos professores e demais gestores escolares.

Souza (2008) discorre sobre esses dois campos:

Esses dois campos de interface de conhecimentos da Psicologia com a Educação primam por realizar diagnósticos de caráter cognitivo, afetivo, pedagógico ou psicomotor, propondo uma série de atendimentos e de acompanhamentos individuais da criança ou do adolescente, reforçando a idéia de que o problema do não aprender está na criança e que o tratamento ou acompanhamento ou ainda a reeducação permitirão que esta criança volte a aprender. De perspectiva eminentemente clínica, realizam o atendimento fora dos muros da escola, por profissionais que acabam por complementar as habilidades educacionais que não são obtidas pela criança na escola (p. 9). A cristalização desses dois modelos (Psicopedagogia e Psicometria) fortaleceu ainda mais com o advento da genética e da neuropsicologia, uma vez que, os aspectos biológicos voltaram a ser considerados a base dos problemas pedagógicos, retomando conceitos que eram discutidos há tempos atrás.

Tais conceitos retornam com explicações organicistas centradas em distúrbios e transtornos no campo da educação, bem como, com diagnósticos neurológicos e a possibilidade de medicalização das crianças e adolescentes que recebem tais laudos. Para Souza (2008) o avanço das explicações organicistas para a compreensão do não aprender retoma os velhos verbetes tão questionados na Psicologia, Medicina e Educação, a saber, “dislexia, disortografia, disgrafia, dislalia, transtornos de déficit de atenção com hiperatividade, sem hiperatividade e hiperatividade” (p. 10).

Em relação a esses “verbetes” Souza (2008) expõe:

(...) ter dificuldade de leitura e escrita não mais questiona a escola, o método, as condições de aprendizagem e de escolarização. Mas sim, busca na criança, em áreas de seu cérebro, em seu comportamento manifesto as causas das dificuldades de leitura, escrita, cálculo e acompanhamento dos conteúdos escolares. A criança com dificuldades em leitura e escrita é diagnosticada, procuram-se as causas, apresenta-se o diagnóstico e em seguida a medicação ou o acompanhamento terapêutico. E o que é mais perverso nesse processo, sob o nosso ponto de vista, é que os defensores das explicações organicistas apresentam a patologização da criança que não aprende ou não se comporta na escola, como um direito. Utilizam a mesma lógica que se faz presente para as modalidades de doenças para o processo de aprendizagem (p. 10). Desse modo, o fenômeno educativo e o processo de avaliação são transformados em ciência médica e avaliados de maneira individual. A patologia é buscada para justificar a não aprendizagem escolar, assim como, para “camuflar” as dificuldades existentes no sistema escolar que não dá conta de suas responsabilidades.

Diante desse quadro pode-se concluir que em todo o seu processo de vigência no sistema escolar, a Psicopedagogia privilegia os problemas de conduta e de aprendizagem, assim como, uma perspectiva clínica da psicologia. Segundo Saas (2003) esta pretende ser inserida como “„solução nova‟ dos velhos problemas escolares os quais tanto a pedagogia quanto a psicologia (e suas variantes psicologia da educação, psicologia escolar e psicologia clínica) fracassaram, por fatores objetivos, solenemente em resolver” (p. 1.370).

Assim, pode-se traçar esse mesmo paralelo com a real conjuntura da Educação Especial no Município, que está imbuída desse “psicologismo” que se faz notar nas suas práticas avaliativas, laudatórias, bem como, nas falas das responsáveis por esse processo (professoras, psicólogas e psicopedagogas). Processo este, que se torna ainda mais agravante, devido à questão dos alunos com necessidades educacionais especiais, que são submetidos a uma prática diagnóstica impregnada de rótulos, medicalizada e pouco ou quase nada pedagógica.

Contudo, não cabe apontar e culpabilizar apenas os responsáveis por essas práticas, uma vez que, o processo institucionalizado dessa “psicopedagogia médica” já está cristalizado por um modelo educacional, que também não fornece subsídios para realmente adotar-se uma “solução nova”.

No entanto, pode-se concluir diante desse panorama que envolve a psicopedagogia que esta aflui até os dias de hoje, com as mesmas características de tempos atrás e com os mesmos responsáveis pela sua reprodução, sejam os condutores do sistema de ensino, bem como, o próprio sistema de ensino.

5 CARACTERIZAÇÃO DO MUNICÍPIO DE LONDRINA NO ÂMBITO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL