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2. GRUPO CLÃ: REFLEXOS DO MODERNISMO NA LITERATURA

2.5. AS PUBLICAÇÕES NA REVISTA CLÃ

Moreira Campos deu sua colaboração ao longo de mais de quarenta anos em treze números dos vinte e nove que compõem a coletânea da revista Clã, entre as quais: Clã n. 2, com o conto “Náufragos”; Clã n. 5 com o conto “Suor e Lágrimas”; Clã n. 7, com o conto “Lama e Folhas”; Clã n. 11, com o conto “Tem dono”; Clã n. 13, com a homenagem “O companheiro morto”; Clã n. 14 com o conto “Portas fechadas”; Clã n. 16, com o conto “Por cima dos Muros”; Clã n. 20, com “A última mentira” que é uma continuação do conto que Lúcia Martins escrevera anteriormente na revista; Clã n. 23, com o artigo “Uma excelente novela”; Clã n. 25 com o conto “Os doze parafusos”; Clã n. 26 com três contos; Clã n. 27, com o conto “O cachorro” e um depoimento; Clã n. 28, em “Presença” e com outra edição do conto “Lama e folhas” e Clã n. 29 com o depoimento “Milton não morreu”.

Pode-se dizer que o escritor publicou primeiro em revista, uma vez que seu livro de estréia, Vidas Marginais, data de 1949, e a sua primeira colaboração para Clã se dá um ano antes.

Usando temáticas modernistas, enfatizando elementos que remetam a um neo-realismo e uma “crueza neo-naturalista” (AZEVEDO, 1976, P. 482), é possível observar nos contos de Moreira Campos uma linguagem concisa, cujo jogo lingüístico é mais voltado para a sugestão, porém sem deixar de lado a preocupação com o sentimento humano, a problemática social além de, em alguns contos, jogar com o fantástico. Muitos críticos colocam o autor de Portas Fechadas no rol dos contistas mais representativos do Brasil e não é por menos, uma

vez que há em seus contos uma estruturação lingüística e um trabalho com temáticas que põem o leitor como um co-autor. Este fenômeno ocorre quando o leitor tem que imergir de tal maneira no texto – que é como um “bloco fragmentado” (MORAES, 2004, p. 99) – a ponto de ter que unificar cada parte desse “bloco” em sua mente e interpretá-lo à sua maneira.

O elenco de temas abordados nas narrativas é representado pelas situações cotidianas que quase sempre aparecem como uma espécie de “fachada” que esconde a verdadeira circunstância. O uso da linguagem é fundamental para se obter tal efeito, aliás, um dos mais marcantes traços da narrativa moreiriana é a síntese. Para Lemos Monteiro (MONTEIRO, 1980, p. 15), a obra de Moreira Campos apresenta dois momentos, sendo o primeiro mais impressionista, cuja narrativa é extensa e detalhista; e o segundo realista, no qual os períodos são mais concisos:

[...] a formação de uma atitude realista, em termos de concepção literária, começou em Moreira Campos com uma fase marcada por tendências impressionistas que se transmudou num realismo mais sóbrio e de meias palavras.

Sobre a concisão cada vez mais presente na escritura moreiriana, afirma ainda:

Comparando-se os primeiros contos aos mais recentes, é flagrante uma mudança no sentido da eliminação de todos os aspectos facilmente subentendidos, no sentido de conseguir uma maior densidade narrativa, com uma pluralidade de aberturas conotativas. Dessa forma os contos de Moreira Campos, em sua busca de definição, cada vez mais perdem em extensão e ganham em verticalidade.

Aqui, entende-se por “verticalidade” a maneira como vão ocorrendo as relações sintagmáticas e paradigmáticas ao longo do tempo nas produções do contista de Clã: como bem explica Batista de Lima: “[...] a reta horizontal que representa o sintagma, tem em alguns de seus pontos, a saída de uma reta vertical para representar o paradigma [...]” (LIMA, 1993, p. 17-18), dessa forma, é possível observar que o contista inicialmente tinha preferência por sintagmas plurioracionais, isto é, “[...] aquele sintagma que tem como determinado a oração principal dentro de um período composto por subordinação [...]”, para depois ir aderindo ao uso de sintagmas oracionais “[...] onde o determinado é o sujeito e o determinante o predicado [...]” 18

18CÂMARA JR., 1978 apud LIMA, 1993, p. 17.

ou simplesmente sintagmas nominais onde “[...] o período possui como determinado o nome [...]”.

Para Sânzio de Azevedo, a concisão na escritura de Moreira Campos vai ocorrendo de maneira tão crescente que alguns contos chegam a perder o próprio caráter de narração de um acontecimento, que é tão peculiar a esse gênero:

Este último [referindo-se ao conto “As Corujas”] chega a contrariar a etimologia do vocábulo conto, visto ser praticamente sem enredo, ou seja, um conto que rigorosamente não pode ser contado, tal o aspecto rarefeito da fabulação, o que o aproxima do poema, principalmente pela atmosfera simbolista de que se reveste.19

19 AZEVEDO, Sânzio de. Moreira Campos e a arte do conto. In: GUTIÉRREZ, A.; MORAES, V. [org]. Tributo a Moreira Campos e Natércia Campos. Fortaleza: Imprensa Universitária, 2007, p. 89.

De fato, é perceptível que o contista, ao longo de sua produção, teve a preocupação em sintetizar cada vez mais os períodos, como uma tendência à concisão e ao tipo de narrativa moderna, que veio a ser um dos principais traços de sua obra.

Batista de Lima afirma também serem os contos de Moreira Campos difíceis de enquadrar-se em determinado tempo cronológico, uma vez que é possível observar em todos os livros do autor traços tanto impressionistas quanto naturalistas e realistas:

Essa divisão [apontada por Lemos Monteiro] tem conotação bastante generalizadora, visto que não inclui as manifestações neo-naturalistas na obra do contista e não especifica o lócus, na obra, onde as mesmas são encontradas. [...] todas elas existem ao mesmo tempo, mas sem uma programação para isso. Elas surgem à vontade, em qualquer livro do autor. (LIMA, 1993, p. 3)

Certamente, numa análise mais detalhada dos contos, é possível verificar indícios das tendências citadas por Batista de Lima em toda a obra de Moreira Campos. Todavia, como bem indicou Lemos Monteiro há nos primeiros livros um forte apelo impressionista que vai cedendo lugar, nos livros seguintes, a elementos realistas, mas sem que o impressionismo deixe de se manifestar.

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