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A massa ainda comerá do biscoito fino que fabrico. Oswald de Andrade.

As discussões políticas para o teatro em Belém, a partir dos interesses dos grupos amadores, fundamentaram-se, principalmente a partir da representação e da participação de Margarida Schivazappa271, diretora artística do TEP, importante agente cultural paraense, da primeira metade do século XX, nos eventos e conjunturas políticas locais e nacionais. Professora de canto orfeônico, aluna do maestro Villa-Lobos, no Rio de Janeiro, movimentou a cena teatral local, e ganhou tanto o respeito dos intelectuais paraenses, quanto o reconhecimento nacional de seus trabalhos à frente do grupo, como pode ser visto no excerto abaixo, publicado em um jornal carioca:

A professora Margarida Schivazappa é a diretora artística do Teatro do Estudante do Pará. Na verdade, a prof. Schivazappa é o próprio movimento da mocidade paraense. Ela já dirige, com energia fora do comum, duas

271 “Professora. Belém/PA, 10/11/1895; id. 5/8/1968. Filha da soprano Corina Pinelli da Costa (1871-

1934) e de Eurico Schivazappa, estudou piano com Manuel de Matos Guerra e canto com a mãe. Quando da reinstalação do Instituto Carlos Gomes, resolveu fazer o curso regular. Diplomada, obteve bolsa de estudos para cursar o Conservatório Nacional de Canto Orfeônico e fazer um estágio no SEMA [Superintendência da Educação Musical e Artística], Rio de Janeiro com a obra e o trabalho pedagógico de Heitor Villa-Lobos. Retornando a Belém, instituiu grandes contratações orfeônicas. Uma delas, no Theatro da Paz, em 7/9/1937, reuniu 600 crianças de nove grupos escolares, com a colaboração das mestras Guiomar Azevedo, Sizelíbia Rodrigues, Luzia Cardoso, Antusa Costa e Maria Antônia Ribeiro, cantando hinos cívicos e músicas de Villa-Lobos. Foi a primeira superintendente do Ensino de Música e Canto Orfeônico no Pará, implantando o sistema em vários grupos escolares do interior do Estado. Foi também dedicada colaboradora no Teatro do Estudante e do ballet da juventude. Em 1951, na qualidade de diretora do Teatro do Estudante do Pará, participou do I Congresso Brasileiro do Teatro, realizado no Rio de Janeiro entre 9 e 13 de julho, apresentando a comunicação “Os conjuntos de amadores e o teatro no Brasil”, publicada nos Anais, pp. 126-30 e encaminhando ainda proposta de reinvindicações, idem, pp.133-5”. SALLES, Vicente. Op. Cit., (2007, p.303).

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gerações de jovens, que representaram no Teatro da Paz, movimentando os meios culturais de Belém, desde os primeiros dias de fundação do T.E.P. Vez por outra Margarida Schivazappa visita Rio de Janeiro. Isso não acontece todos os anos, pois nem sempre ela pode passar as férias nessa capital. Mas a diretora artística dos estudantes paraenses acha quase sempre um meio de escapulir de seus afazeres na província e vem tomar outros ares. Mas é preciso se dizer que a prof. Margarida não para. Mesmo com um curto período de permanência no Rio ela acha tempo para acompanhar o movimento teatral, reivindicar direitos aos jovens paraenses e nos mostrar tudo o que o seu teatro tem realizado no extremo norte272.

Esse destaque que a diretora do TEP ganhara, a nível nacional, tornou-se um ponto importante, para que o grupo pudesse reivindicar por melhorias na cena local, pois Schivazappa tinha entrada junto aos representantes dos órgãos de fomento às artes cênicas no Brasil, além de ser uma articuladora junto aos poderes locais. Ela ocupou importantes cargos, durante o Estado Novo, nas gestões das interventorias paraenses, como, por exemplo, na superintendência do ensino de música e canto orfeônico do Pará, posição que lhe permitiu desenvolver, na capital e em vários municípios do interior do estado, o referido sistema. Assim, seus posicionamentos em entrevistas, em diversas revistas e jornais locais e da capital federal, foram os caminhos trilhados para a reflexão e busca por mudanças no contexto da produção teatral paraense.

Em entrevista ao jornal Correio da Manhã, Rio de Janeiro, ela afirma que “o Teatro do Estudante do Pará não tem financiadores. Vive pelo que faz. Compramos fiado e pagamos com os resultados das récitas. Andamos sempre em constante e perigoso equilíbrio, mas não devemos a ninguém, graças a Deus”273. Essa fala da diretora artística do TEP revela as dificuldades que o grupo tinha, e a falta de financiamentos externos para o desenvolvimento da arte e da cultura. É evidente que sendo uma prática amadora, a vontade de fazer teatro estava em primeiro plano, mas a necessidade de investimentos havia, porque a bilheteria, em um lugar onde a arte teatral ainda fazia um grande esforço para integrar-se a um circuito cultural na cidade, não sustentava as ações do grupo.

272 S/a. Margarida Schivazappa e o “Teatro do Estudante do Pará”. Jornal Correio da Manhã, Coluna

Teatro, domingo, 13/03/1949, (p. 15).

150 Porém, não se pode desconsiderar o fato do grupo ter acesso a mais importante casa de espetáculos da cidade, o Teatro da Paz, questão que se justifica, provavelmente, pela entrada junto aos órgãos do poder público da própria Schivazappa, e de outros integrantes do TEP. Tinha-se, ainda, o apoio dos intelectuais em suas atividades teatrais, como, por exemplo, o jornalista Otávio Mendonça, filho de Deodoro de Mendonça, secretário geral do governo de José Malcher. Essa costura de relações ajudou os estudantes paraenses na prática de suas atividades artísticas, mesmo que Schivazappa tenha relatado, na entrevista acima, a falta de apoio às artes cênicas locais.

Figura 51 - Leitura da peça “Cândida” de Shaw.

Fonte: Jornal Correio da Manhã/RJ274.

Perguntada sobre o auxílio do Serviço Nacional de Teatro, ela destaca: “penso que desta vez, com o diretor Thiera Martins Moreira, o Teatro do Estudante do Pará será contemplado com um auxílio. Não é muita coisa, porque o SNT não pode orçar com grandes gastos, mas tenho fé que conseguimos alguma coisa. E é um começo, não é?”275. Esse discurso evidencia a necessidade e o interesse de financiamento dos órgãos nacionais responsáveis pela produção cultural, em especial o criado para as artes cênicas, o SNT, durante o Estado Novo, como visto anteriormente, voltado para a subvenção de subsídios para os grupos e artistas de

274 Idem. 275 Idem.

151 todo Brasil. Porém, Schivazappa não relata se o seu grupo teria conseguido tais recursos.

Além dessa matéria, é importante destacar o comentário que Margarida Schivazappa faz na entrevista à revista Novidade, pelas comemorações do primeiro aniversário do TEP. Destaca os desafios e a luta em conseguir ajuda dos órgãos do governo. Perguntada sobre a possibilidade de financiamentos do Ministério da Educação, diz:

só poderemos pleitear o auxílio, que o plano do S. N. T. já aprovado pelo sr. Presidente da República, nos concede, depois de regularizadas algumas formalidades, de que já estamos tratando. Poderei, no entanto, dizer que seremos amparados, nessa pretensão, não só pelo diretor do S. N. T. como também pelo dr. Benjamin Lima competente diretor do Curso Prático de Teatro que, num gesto de simpatia pelo nosso Teatro do Estudante prontificou-se a auxiliar-nos. O autor de “Sinhá moça chorou” com o cavalheirismo que lhe é peculiar, espontaneamente nos ofereceu seu valioso auxílio. Maria Jacinta, atual diretora do Teatro do Estudante do Brasil, fazendo publicar na revista “Vida” no número de fevereiro, a fotografia de uma cena de “Não te conheço mais”, nossa peça de estreia, termina sua crônica lançando ao S. N. T. um apelo em nosso favor276.

As dificuldades destacadas no texto acima representam as diversas demandas que os grupos de amadores tinham, como o incentivo, por parte dos governos estadual e federal, à produção e circulação de seus trabalhos teatrais, além de financiamento e construção de um espaço de formação acadêmica na área do teatro. Acrescenta-se o relato sobre a dificuldade de o grupo fazer temporadas, pois “o T. E composto de estudantes de diferentes cursos e com outros afazeres que os sujeitam a horário não permitindo ausência demorada, não poderá fazer uma tournée com tempo indeterminado”277.

Voltando à análise da entrevista de Margarida Schivazappa à revista

Novidade, a diretora do TEP fala sobre o que levou a criação do grupo, e a articulação

com as obras literárias representantes de um ideal de teatro, presentes tanto no “cânone” universal, quanto nos autores da produção teatral brasileira.

Era uma velha aspiração de um grupo de estudantes criar aqui esse fator do desenvolvimento intelectual, já criado em outros estados da União. Em meio do ano passado, por ocasião da representação de “Sortilégio” no T. da Paz,

276 SCHIVAZAPPA, Margarida. Entrevista. Revista Novidade, v.3, n.30, junho/1942, (p.20). 277 Idem.

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surgiu a possibilidade da almejada realização. Convidada para diretora, sem esperar merecer tão grande honra, começamos logo a trabalhar. Vencendo com a energia da boa vontade, nosso único capital, todas as dificuldades que encontramos, conseguimos no dia 4 de junho, menos de um mês de trabalho, apresentar o T. E. do Pará levando a cena “Não te conheço mais” de A. Benadetti, tradução de Joracy Camargo, como peça de estreia. Em julho apresentamos “Divorciados” de Eurico Silva e no dia 7 de setembro, com dobrado esforço, “Sinhá Moça chorou”278 de Ernani Fornari, nossa maior

realização279.

O texto acima destaca a questão dos jovens estudantes e os intelectuais envolvidos com o projeto do TEP em almejar um desenvolvimento intelectual, a partir da aspiração da juventude. Observa-se, ainda, como um programa de perfil acadêmico, articulado nacionalmente, foi representado pelo grupo paraense, na figura de Schivazzappa. Além disso, as apresentações no Theatro da Paz280, a mais importante casa de espetáculo da cidade, além de ser vista como um grande fato, por toda a história que representa, revela também a existência de poucos espaços voltados para as manifestações cênicas. Vê-se, portanto, que o teatro representou para esses sujeitos um lugar de formação artística, a oportunidade de seu desenvolvimento intelectual e a respectiva projeção no meio artístico local.

Esse ideal talvez represente o modelo de intelectual moderno, o qual acreditava no poder do saber erudito, e via, nas artes, um campo de mudanças culturais, fator preponderante na análise dos comportamentos sociais. Isso ocorre, porque, como afirma Canclini281, apesar de muitas vezes as convenções estéticas não serem vistas como uma intensa dependência entre as organizações sociais e campo artístico, elas mostram que, por exemplo, a mudança dos padrões de arte não se

278 Drama em 6 quadros, escrita por Ernani Fornari, em 1940. Segundo FISCHER (2007, p.296) “foi

levado à cena, pela primeira vez, no Teatro Serrador, do Rio de Janeiro, pela Companhia Dulcina- Odilon, em 3 de outubro de 1940. Em Porto Alegre, a peça viria a ser representada, no palco do Teatro São Pedro, apenas em julho de 1956. Estamos, indiscutivelmente, diante de um sucesso teatral, de público e crítica, quase sem precedentes no Brasil. No preâmbulo da edição de Quando se vive outra vez consta que “com Sinhá moça chorou sucedeu algo inédito na história do nosso teatro. Manteve-se em cena, no Rio de Janeiro, durante três meses consecutivos”. Além disso, a peça foi premiada pela Prefeitura de Porto Alegre e recebeu a medalha de mérito de 1940 da Associação Brasileira de Críticos Teatrais”. Ver: FISCHER, Antenor. A Literatura Dramática do Rio Grande do Sul (De 1900 a 1950), Vol. 2. Tese de Doutorado, Letras, Programa de Pós-graduação em Letras da Faculdade de Letras da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, 2007.

279 SCHIVAZZAPPA, Margarida. Entrevista. Revista Novidade, v.3, n.30, junho/1942, (p.20).

280 Sobre os primeiros 25 anos de vida desse teatro, ver: SILVA, Rose. Histórias invisíveis do Teatro da Paz: da construção à primeira reforma. Belém do Grão-Pará (1869-1890). Belém: Paka-Tatu, 2010.

281 CANCLINI, Néstor García. Culturas Híbridas: estratégias para entrar e sair da modernidade.

153 restringe, unicamente, a problemas de ordem poéticas. Pelo contrário, os questionamentos sobre as estruturas organizadas pelos artistas e intelectuais desses sistemas são necessários para a compreensão dos campos simbólicos criados ou mantidos, que os costumes e crenças dos receptores de bens culturais mostram as complexas redes de relações de pensamentos, de ideologias, de poder.

Nota-se que o interesse do grupo TEP não era apenas apresentar trabalhos teatrais, mas criar uma política que proporcionasse possibilidades reais aos artistas locais de produzir sua arte. Para isso, Margarida Schivazappa militou por ações que possibilitassem boas condições de trabalho, tanto na esfera estadual, quanto na nacional. Destacou a importância da coletividade, do trabalho em equipe, em prol de um ideal de jovens estudantes engajados em produzir teatro “de qualidade”, apesar de serem amadores, elemento este que distinguiam os seus espetáculos dos teatros profissional e suburbano da época.

A gente que criou o T.E. não se limita a representar o papel que lhe coube. Tudo o que se vê na cena é produto de estudantes. A adaptação e confecção de cenários, desde o aparelhamento da madeira à instalação da luz está a cargo da turma masculina, ficando o guarda-roupa, ornamentação e etc. a cargo do elemento feminino. Ninguém é só ator, é operário ainda: eletricista ou carpina, contrarregra ou maquinista, costureira, enfim, o que no momento precisar ser, sem esmorecimentos nem privilégios, animados pela alegria da realização de um ideal. E assim, estreamos uma peça que, não só iniciou a temporada de 42, como revelou mais uma aptidão da turma laboriosa, que é a peça com que Mário Couto se apresentou como autor teatral, denominada “Toque a Serenata de Schubert”.

Procuramos em seguida ouvir Clóvis Malcher282. A parte financeira do T. E.

é uma questão muito séria e delicada. Bem sabemos o quanto ela é, por vezes, dramática em meio as realizações que pretendem levar a efeito. Ninguém mais que Clóvis sabe dar palpite sobre o assunto. Ele conhece os pedregulhos do belo caminho aberto pela gente moça como ele e seus companheiros do Teatro do Estudante283.

O texto acima, em sua primeira parte, revela o caráter amador dos integrantes do TEP, nenhum componente era artista de formação, mas tinham o

282 Clóvis Cunha da Gama Malcher foi advogado, professor e reitor da Universidade Federal do Pará

(1973-1977), na qual, em 1976, lançou a proposta de instituir um órgão para o desenvolvimento da pesquisa no Pará, a Fundação de Amparo e Desenvolvimento da Pesquisa (FADESP), “uma instituição privada autônoma e sem fins lucrativos, cuja missão é promover a gestão de ações de pesquisa, ensino e extensão de forma dinâmica, contribuindo para o fortalecimento da UFPA e o desenvolvimento da região amazônica. Fora da UFPA, o professor Clóvis Malcher exerceu cargos importantes, como a Consultoria Geral do Município de Belém e a Secretaria de Estado de Interior e Justiça”. Disponível no

site da UFPA: https://proad.ufpa.br/imprensa/noticia.php?cod=4580

154 interesse e faziam o esforço para a realização de seus trabalhos. Ninguém era apenas ator, mas desempenhava outras funções na construção, por exemplo, dos cenários, dos usos dos recursos de iluminação e figurino. Eles eram movidos pela intuição e pelo ofício que cada um tinha, e juntos construíam seus espetáculos. Isso representa, na visão de Schivazzappa, um processo de formação dos estudantes envolvidos com o teatro, tendo em vista que não havia em Belém uma escola de artes dramáticas.

No segundo momento, ela destaca a necessidade de organização do grupo, da estruturação como órgão que ansiava, além da produção, uma sistematização do trabalho artístico. Essa meta se estabelecia, para que o TEP conseguisse ter uma funcionalidade, como a parte financeira, ponto delicado destacado por ela, pois todo grupo precisa de recursos financeiros para trabalhar.

Em carta do 2º Secretário do TEP, na gestão de 1947-48, Luiz Fernando de Sá Leal, ao presidente do Teatro do Estudante do Brasil, Paschoal Carlos Magno, é comunicada a posse da nova diretoria, com a descrição dos cargos e seus ocupantes:

Tenho a honra de comunicar a V.S. que em sessão solene de Assembleia Geral, em data de 8 de novembro do presente ano, foi dada posse a Diretoria Geral eleita para reger os destinos desta entidade no período 1947/1948, assim constituída:

Diretoria:

Presidente: Otávio Bandeira Cascaes (reeleito) Vice-Presidente: Otavio Bittencourt Pires (reeleito) 1º Secretário: Benedito Pádua Costa (reeleito) 2º Secretário: Luiz Fernando de Sá Leal (reeleito) 1º Tesoureiro: Henrique Bernardo Lobo (reeleito) 2º Tesoureiro: José Araújo dos Santos (reeleito)284.

Além de mostrar a organização da gestão do TEP, o texto acima revela que a administração do grupo era desenvolvida pelos estudantes, com a supervisão de Schivazappa. As missivas285 eram uma maneira deles estabelecerem contato com

284 LEAL, Luiz Fernando de Sá. CIRCULAR N.1/47. Belém, 14/111949. Documento disponível no

Acervo Paschoal Carlos Magno, Correspondências/Teatro/Teatro Amador/Teatro do Estudante do Pará. CEDOC/FUNARTE.

285 Na pesquisa documental, realizada no Centro de Documentação, CEDOC, da FUNARTE, onde há

disponível para consulta acervos de personalidades ligadas às artes, encontraram-se cartas de intelectuais e artistas paraenses, em especial enviadas a Paschoal Carlos Magno. Com relação ao TEP, há sete, as quais relatam as atividades dos amadores do Pará, com destaque para a necessidade de auxílio às atividades artísticas locais.

155 “autoridades” dos movimentos nacionais, presentes no Rio de Janeiro, capital federal na época.

Sr. Pascoal Carlos Magno,

Tive o grande prazer de merecer da nossa querida diretora, prof. Margarida Schivazappa, a honrosa incumbência de entrar em contato com a figura culminante do Teatro Universitário do Brasil.

Aliando a primazia que tive em ser o primeiro elemento do Teatro do Estudante do Pará que vos escreve à certeza de que essa nossa liberdade será um sólido alicerce para um constante intercambio de ideais entre os pupilos de Margarida Schivazzappa e a vossa distinta e culta personalidade, conhecedora dos maiores segredos da sublime Arte que glorificou Sarah Bernhard, apresso-me a externar-vos a nossa grande e justificada satisfação286.

Além de revelar a busca pela troca de ideias, entre os artistas locais com os articuladores do movimento teatral nacional, representado por Paschoal Carlos Magno, o excerto acima destaca a influência de Schivazappa nas ações locais, e a sua experiência com a linguagem teatral. Em seguida, Gelmirez Melo afirma que o TEP compartilhava dos mesmos anseios do TEB, revelando as articulações dos amadores brasileiros, e a sua importância para a cena “tímida” local, fator este que mudaria com os trabalhos do grupo paraense:

Torna-se necessário também que nos inteire de que desde o regresso de nossa diretora, o nome de Pascoal Carlos Magno tornou-se um símbolo no meio da rapaziada alegre e esperançosa, que aqui no extremo Norte de nosso rincão brasileiro comunga nas mesmas ideias e nos mesmos ideais que habitam o vosso pensar.

E essa plêiade de jovens, comandada pela figura inconfundível da pioneira do movimento artístico estudantil no Pará, professora Schivazzappa, prepara-se novamente para apresentar ao nosso público algumas horas de lazer – roubadas a noites vazia que enchem a vida noturna da Cidade Morena – com o reprise de “O Bobo do Rei”, 3 atos que a nossa plateia não cansa de admirar e aplaudir287.

Outra questão presente na entrevista à revista Novidade, é o destaque que Schivazappa dá ao valor do reconhecimento do público local ao trabalho dos jovens estudantes, não apenas com aplausos, mas com a sua constante presença, que, segundo ela, daria ao teatro amador paraense a possibilidade de continuar existindo.

286 MELO, Gelmirez. Carta a Paschoal Carlos Magno. Belém, 5 de maio de 1947. Documento disponível

no Acervo Paschoal Carlos Magno, Correspondências/Teatro/Teatro Amador/Teatro do Estudante do Pará. CEDOC/FUNARTE.

156 Não deixa, também, de tecer críticas ao valor e ao prestígio sobre os trabalhos artísticos estudantis. Esse fato permite apontar, segundo Schivazappa, que a plateia local ainda não acreditava ou potencializava o trabalho amador dos jovens e inexperientes atores do TEP, mas revela, também, que as possibilidades de mudanças eram colocadas sobre eles. Se há a necessidade de transformações sociais, e as artes estão inseridas neste contexto, depositar à juventude o espírito de renovação e a responsabilidade de fazer algo novo, diferente, e que possa amadurecer e criar novos rumos, era preciso.

O público do T. E. numericamente falando, é muito diminuto. Aliás, não é de estranhar que tal aconteça, pois ninguém ignora que nesta terra é reduzido o número dos que acreditam em realizações de estudantes. Aqueles, porém, que têm assistido às representações do T. E. não lhe