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Este momento propõe um panorama que dispõe as noções em envolvem o discurso e sua noção de recepção, em especial a partir dos estudos de Luis Costa Lima e Hans Robert Jauss, teórico da Estética da Recepção. Em A história da Literatura como provocação à Teoria

Literária (1994), Jauss propõe que a partir do momento que há uma resposta, seja ela a gosto

ou contragosto do público que a recebe – em determinada circunstância histórica e social – assertiva ou não de uma determinada obra literária, evidencia-se aí o seu valor, sobretudo estético. Entende-se, dessa forma, que esse valor está diretamente ligado à recepção que a obra contempla. Isto é, dá-se imoportância ao elo autor, obra e leitor – insta lembrar, inclusive, que esses valores estão ligados aos processos da crítica literária:

Afinal, a qualidade e a categoria de uma obra literária não resultam nem das condições históricas ou biográficas de seu nascimento, nem tão somente de seu posicionamento no contexto sucessório do desenvolvimento de um gênero, mas sim dos critérios da recepção, do efeito produzido pela obra e de sua fama junto à posteridade, critérios estes de mais difícil apreensão (JAUSS, 1994, p. 7).

Jauss posiciona o olhar crítico – isto é, da crítica literária - sobre os textos literários clássicos tidos como obras de arte para o entendimento da estética da forma. O autor justifica um possível aspecto qualitativo às comparações dos textos novos em relação aos textos tidos como canônicos. O filósofo ressalta, também, a relação da recepção de uma obra com o leitor no dado período de criação e publicação, reconhecendo a obra – em sua estrutura – como organismo componente de uma realidade social, capaz de exercer uma função histórica.

Regina Zilberman (1982), ao debruçar-se sobre os estudos de Jauss elenca sete teses empregadas pelo autor para tipificar a Estética da Recepção. Dividida entre premissas e metodologia, elas perpassam os campos da historicidade como ferramenta de reforma articulada na relação autor-leitor, as expectativas do leitor e sua recepção, o apuro estético como constituinte e influenciador da recepção, bem como a afinidade da obra com o seu contexto histórico. Zilberman elenca uma série de convenções pelas quais ela acredita que intercedem o modus e a percepção do leitor – a partir de seu horizonte cognitivo. São elas:

- social, pois o indivíduo ocupa uma posição na hierarquia da sociedade;

- intelectual, porque ele detém uma visão de mundo compatível, na maior parte das vezes, com seu lugar no espectro social, mas que atinge após completar o ciclo de sua educação formal;

- ideológica, corresponde aos valores circulantes no meio, de que se imbuiu e dos quais não consegue fugir;

- lingüística, pois emprega um certo padrão expressivo, mais ou menos coincidente com a norma gramatical privilegiada, o que decorre tanto de sua educação, como do espaço social em que transita; - literária, proveniente das leituras que fez, de suas preferências e da oferta artística que a tradição, a atualidade e os meios de comunicação, incluindo-se aí a própria escola, lhe concedem (ZILBERMAN, 1982, p. 103).

Antes de os estudiosos da crítica e da teoria literária – a partir do século XX – passarem à problematização e lugar do leitor diante da obra, muitos se detiveram sobre as questões ligadas ao autor e ao texto como cerne da análise – por portar as tramas de sentido erigidas pelo autor. O leitor, por seu turno, está atrelado diretamente à estética da recepção, incluindo- se como fator preponderante e constituinte da messe literária nessa perspectiva teórica.

Essa questão nos leva ao Estruturalismo, sobretudo o de Barthes e o de Todorov, que apesar de hoje ser visto com certa desconfiança e desprestígio, ainda sobrevive nas análises narrativas (crítica literária) – mesmo que apenas alguns de seus componentes metodológicos tenham sido absorvidos na análise contemporânea. A corrente toma o discurso de uma obra como um conjunto abstrato de procedimentos que o compõem, lançando um olhar que vai além da análise fixa – estrutural – delas mesmas.

De acordo com os estruturalistas, as bases narrativas são universais. Não há preocupação, portanto, com as transformações dos discursos literários através da história, e tão pouco sua relação com o receptor no momento em que emergem; os estruturalistas estão atentos apenas

à estrutura narrativa. Diante dessas premissas, Jauss elabora uma série de apontamentos que questionam a fragilidade do formato, entre eles: a) o fato de um universo linguístico fechado não ter relação com um mundo e b) um sistema de signos que não tem sujeito não pode ter uma relação com a instância da produção e recepção de sentidos. Sobre o Estruturalismo e suas aparentes falhas metodológicas, Jauss (1994) é categórico ao dizer que

Ambos os métodos, o formalista e o marxista, ignoram o leitor em seu papel genuíno, imprescindível tanto para o conhecimento estético quanto para o histórico: o papel do destinatário a quem, primordialmente, a obra literária visa (JAUSS, 1994, p. 23).

Para a Estética da Recepção a relação entre autor e leitor – e aí se inclui o emaranhado de relações internas e externas – é essencial e, sobretudo as marcas históricas que montaram o panorama que balizará a recepção do leitor:

A aplicação, portanto, deve ter por finalidade comparar o efeito atual de uma obra de arte com o desenvolvimento histórico de sua experiência e formar o juízo estético, com base nas duas instâncias de efeito e recepção (JAUSS, 2002, p. 70).

Jauss retira a atenção da obra e a deposita no leitor. É a partir do leitor, e não mais do texto, que se dá o esmero da experiência literária. É por meio dele que o texto se desloca da palavra e passa a ser recepção:

Jauss, não obstante essa dificuldade, propõe tomar o conjunto de “críticas” e “comentários” contemporâneos à obra como um discurso capaz de revelar o horizonte de expectativas sociais da época e, nesse sentido, de contribuir para a compreensão dos modos como ela foi lida, avaliada e transmitida à posteridade. Essa proposta repousa na tese segundo a qual à medida que ocorre distanciamento estético da obra em relação ao seu contexto de surgimento, o conjunto de interpretações que dela se fez é transmitido e incorporado numa espécie de historia social dos efeitos. Assim, a teoria estético- recepcional não apreenderia somente o sentido da obra literária no eixo sincrônico (o das manifestações de um mesmo tempo) como também no eixo diacrônico, o que possibilitaria tratar dos sistemas de relações que existem entre manifestações expressivas e momento histórico-cultural (FILHO, 2007, p. 67).

As contribuições dos estudos de Jauss, mesmo que inicialmente partam de um princípio teórico epistemológico e menos sistemático, muito contribuíram para a elaboração de mecanismos de análise e procedimentos metodológicos.