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2. Os Estudos atuais do rádio

2.1. O cenário do futuro do rádio, no passado não-muito-distante dos anos 2000

2.1.3. Rádio e internet

Bianco afirma que, com a digitalização, o rádio teria sua “sobrevivência na sociedade da informação”, sem a “centralidade entre os diversos meios eletrônicos, mas [seria] complementar às demais mídias” (2001, p.39). O fim da audiência massiva e da fidelidade do ouvinte exigiria “dos radiodifusores muita criatividade não somente para gerar conteúdos específicos, como também para enfrentar o desafio de fazer rádio para ser lido” (idem, 2004, p.309). Apesar de essa última afirmação ter sido feita especialmente sobre os serviços que seriam agregados ao rádio digital, podemos ampliar seu impacto a toda a possibilidade de digitalização dos meios sonoros (ou seja, a presença das emissoras de rádio na Rede; os serviços de áudio na internet, como webrádios e podcasts, etc.). Ferraretto cita o autor Mariano Cebrián Herreros, que desenvolve, desde o começo dos anos 2000, algumas teorias e estudos acerca dessa multiplicação de ofertas de informação:

A internet modifica as maneiras pelas quais se informam as pessoas. Os usuários passam a ter um poder que antes não possuíam, tanto para buscar e contrastar como para incorporar informação gerada ou conhecida por eles. Têm acesso à rede como um autosserviço. Esta visão modifica plenamente o panorama dos meios de comunicação e em particular do rádio. Ou o rádio busca a personalização da informação, a interatividade, o autosserviço, ou perderá a capacidade de penetração na nova sociedade. (HERREROS apud FERRARETTO, 2010b: p.31)

Sonia Virgínia Moreira faz, em 1999, algumas observações que parecem ter se comprovado no desenvolvimento atual do rádio. A autora apostava, naquele momento, que a evolução tecnológica desencadearia alterações no modo como o ouvinte se relaciona com o rádio, bem como na linguagem desse meio. Como exemplo, a autora afirma que

[...]mesmo que o rádio tenha sido concebido para ser ouvido e não necessariamente para ser lido, é crescente o número de canais radiofônicos centrados em entrevistas e bate-papos na internet[...] há cada vez mais emissoras tirando proveito da tecnologia de áudio em tempo real para transmissões ao vivo. (MOREIRA, 1999, pp. 213-214)

11 Os acontecimentos dos últimos dez anos nesse campo mostram uma queda brusca de faturamento, especialmente por parte das grandes gravadoras, mas que atingiu também pequenos atores do setor. No entanto, é possível observar a emergência do papel significativo de outras empresas na distribuição de música, como os fabricantes de hardware que passaram também a distribuir conteúdo; ou os canais independentes de distribuição que ganharam fôlego com novas formas de obter retorno financeiro, por meio de patrocínios especializados ou do contato direto artista/audiência. Esses são apenas alguns exemplos de desenvolvimentos dentro dessa esfera.

Quando Ligia Maria Trigo-de-Souza fala sobre a presença do rádio na web, em seus trabalhos no começo dos anos 2000, a autora considera que “não é só o desenvolvimento tecnológico o responsável pela expansão do rádio na rede. São vários os fatores determinantes desse sucesso, entre eles, a possibilidade de quebrar as barreiras de alcance das emissoras tradicionais.” (2004, p.295). No curto capítulo apresentado no livro de 2004, a autora aponta para a necessidade de definir um modelo comercial que case o rádio tradicional e a presença da emissora na Rede. A autora aponta, ainda, que naquele momento não se havia inovado muito com relação à interatividade, sendo que esta ficava restrita a chats e fóruns em poucas webrádios, enquanto no site das emissoras regulares predominavam funções antes atribuídas somente ao telefone, como pedido de música, promoções, etc. (ibidem, p.301).

Trigo-de-Souza apostava também no caráter local do rádio como garantia de audiência mesmo na internet, uma vez que o internauta distante fisicamente de um território poderia buscar ali informações de interesse pessoal. Apesar de concordarmos com o conceito, preferimos flexibilizá-lo um pouco mais, deixando de lado a questão simples de localização para atingir um conceito mais amplo como o de identificação. Esse conceito nos permite pensar na emissora via ondas eletromagnéticas ou via web como um centro de correspondência cultural, ilimitado em termos de região física.

Em complemento a essas perspectivas, cremos ser necessário indicar a opinião de Doris Fagundes Haussen (2004, p.61). Em texto que resume a história do meio no Brasil, a autora lembra o papel integrador do rádio, tanto em rede nacional como em reverberação por emissoras locais. As afirmações da autora, fundamentadas no caminho percorrido pelo meio, consideram que sua característica principal continua sendo a proximidade com a comunidade local, e “se a globalização e a tecnologia trazem cada vez mais as informações mundiais, cabe justamente ao rádio, devido às suas características inerentes, promover as informações locais”. Essa percepção, no entanto, não abarca o rádio na internet. A autora prossegue com observações a esse respeito:

[...]o novo panorama desenhado pelas possibilidades tecnológicas, como a internet, deve alterar a ecologia dos meios de comunicação, o que não significa o fim do rádio atual[...] concluindo, pode-se dizer, sem receio do chavão, que o rádio brasileiro tem sido „o companheiro de todas as horas‟, não só no âmbito individual, mas, principalmente, no coletivo, e que deverá continuar desempenhando esse papel por um bom tempo ainda. (ibidem, p.62)

As observações de Sonia Virgínia Moreira nos parecem condizentes com o cenário atual, quando a autora afirma que “cada meio de comunicação encontrou formas de se

adaptar aos novos tempos e conviver com outros cenários estabelecidos para a circulação de informação e de entretenimento. Mesmo assim, os meios nunca deixaram de competir entre si” (1999, p.211).

Em nossa opinião, a importância do rádio permanece na prática estabelecida que envolve o ato de “ouvir rádio”, independente do suporte12. Em artigo publicado em 2010, Luiz

Artur Ferraretto aponta para a necessidade, das emissoras de rádio, passarem a adotar de forma mais sólida os diversos canais em que podem estar presentes (ondas hertzianas, internet, celular, etc.), o oposto do que vem sendo conduzido pelas emissoras até o presente momento (2010a, p.548). O autor apresenta algumas perspectivas que, mais que previsão, constituem necessidades fundadas na observação do cenário atual de convergência:

a) do ponto de vista das emissoras, estas vão conviver, de modo crescente, com novos agentes como podcasters e operadores de webrádios, que podem, conforme o caso, ser ou não incorporadas ao cotidiano do negócio;

b) em termos de canal, as empresas precisam compreender a necessidade de utilização de todos os possíveis suportes tecnológicos na veiculação de seus conteúdos;

c) a mensagem, por considerar, mesmo que em tese, uma audiência mais participativa vai assimilar também a opinião, a informação e mesmo a produção em áudio do público, explorando mais ainda a conversa imaginária entre o comunicador e o ouvinte. (ibidem, p.554)

Encontramos opinião parecida em texto recente de Bufarah Jr.. Ao comentar pesquisa sobre as características do rádio, conduzida em conjunto pelo instituto Ipsos- Marplan e o Grupo dos Profissionais do Rádio, o autor cita alguns desafios deste meio apontados nos resultados da investigação, como: repensar o rádio como veículo principal e não de apoio, que seja foco da atenção do ouvinte; “estar atento às novidades tecnológicas do meio e capitalizá-las com criatividade, visando aproveitar ao máximo do ponto de vista de negócios as tendências adaptando a linguagem a cada público” (2010, p.584), sendo que as “novidades tecnológicas” são a transmissão via internet, o podcast, o chat, o uso de SMS, a disponibilização de vídeos, etc.

12 Durante algum tempo, especialmente diante das novas possibilidades digitais, discutiu-se bastante na esfera acadêmica uma definição sobre o que definiria “Rádio”. Tal debate parece ter chegado a um fim, conforme Ferraretto em relato sobre um encontro da Intercom, o qual copiamos: “...durante o XXXI Congresso Brasileiro de Comunicação, em Natal, no Rio Grande do Norte, o professor e pesquisador da Universidade Federal de Santa Catarina, Eduardo Meditsch, afirmava, de forma quase singela e resumindo as ideias de parcela significativa dos seus pares, que o termo rádio passava a indicar, de modo crescente, uma linguagem específica independente do suporte técnico ao qual este se associava” (FERRARETTO, 2010a, p.540). O autor lembra que o próprio Meditsch havia definido de forma muito mais rígida o conceito de rádio, anos antes.