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CAPÍTULO 2- Aspecto Lexical e Aspecto Gramatical

2.1 Aspecto lexical

2.1.2.4 Ramchand (2008)

Para Ramchand (2008), a questão da composicionalidade aspectual envolve as noções undergoer e PATH. Em relação à telicidade, segundo a autora, semanticamente tem-se falado que a combinação dos componentes processo e resultado cria um Processo Culminado complexo, (cf. Parsons, 1990; Pustejovsky, 1991; Higginbotham, 2001)12. Na base de análise da autora, esses dois componentes de subeventos, além da possibilidade de serem encontrados

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separadamente ou combinados com diferentes significados verbais, também podem ser explorados para criar tipos mais complexos ou mais simples em muitos sistemas e até mesmo mudar o tipo de evento. Ramchand (2008) postula, ainda, que não há um correspondente um- para-um entre argumento interno e traço semântico [+télico], mesmo quando o argumento interno é quantificado (cf. Krifka 1987, 1992 apud Ramchand, 2008), o que lhe permite afirmar que as eventualidades de Culminação em (14) são télicas, independendemente de o argumento interno ser quantificado, caso de (14b), ou expresso, caso de (14a); por outro lado, a sentença (15) não implica telicidade, mesmo com existência do argumento interno e de um argumento quantificado:

(14) a. John stood up in a second. b. They found gold in three hours.

(Ramchand, 2008, p. 25) (15) John pushed the cart for hours. (Ramchand, 2008, p. 26)

Ramchand (2008) pretende fazer uma distinção mais fina em termos de como o objeto direto mapeia o evento. A autora equipara eventos de mudança à noção caminho e, com base nisso, pretende sustentar que o argumento interno está correlacionado à estrutura denominada PATH. Observa que, em relação à telicidade, não obstante o argumento interno sofra mudança de estado, empiricamente isso não significa que essa mudança deva implicar um estado final. Isso significa que uma mera mudança gradual no argumento pode significar uma propriedade distinta e que é separada do fator „atingir um resultado‟, como no caso do verbo melt „derreter‟ abaixo, que mostra a dependência do fator resultado para alcançar a telicidade: (16) The chocolate melted for three minutes in the back seat of the car (before we rescued

it).

(Ramchand, 2008, p. 27) Segundo Ramchand (2008), verbos que apresentam argumento afetado por uma mudança gradual, sem atingir um resultado definido, comportam-se, frequentemente, como inacusativos. A autora (op. cit., 2008, p. 28) aponta que a noção de argumento undergoer denota algum tipo de mudança ou transição que pode estar relacionado a uma localização, como em (17), a um estado, como em (18), ou ao espaço vazio, relacionado a uma propriedade material, como em (19):

(17) The ball rolled down the hill. (18) The mangoes ripened in the sun. (19) The bucket filled with rain.

A noção undergoer inclui ainda o argumento de verbos de mudança de estado, como dry „secar‟ e yellowed „amarelar‟, e de movimento, como push „puxar‟ e drive „dirigir‟. Nesse sentido, o objeto undergoer diz respeito a um estado transicional que não necessariamente implica telicidade, mesmo quando é quantificado. A autora (op. cit., 2008, p. 28) postula que há noções menos quantificadas (quantized-ness) ou de quantificação especificada (specified quantity), conforme apresentado, respectivamente, em (20) e (21):

(20) The document yellowed in the library for centuries. (21) John pushed the cart for an hour.

A autora observa que, na literatura aspectual, verbos de consumição e de criação fazem parte de uma classe que tem comportamento distinto de outros verbos em relação à noção objeto quantificado. Na esteira de Levin (1999) e outros autores, Ramchand (2008, p. 30) aponta que esses tipos de verbos dizem respeito a um caso específico de algum atributo do objeto que contribui para medida em escala, que é homomórfica com os verbos. Essa propriedade é, na visão da autora, similar à noção caminho PATH, como em Mary ran along the beach. Nesse sentido, o argumento PATH denota vários domínios: pode ser derivado de objeto como no caso de verbos de criação e de consumição, pode ser proveniente de uma escala e pode denotar um caminho explicitado por um sintagma preposicional (PP), como no caso de verbos de movimento.

A autora ressalta também que, em verbos de movimento como push (empurrar), o argumento PATH descreve a noção undergoer em termos de complementaridade. Para ilustrar, mostra que o argumento caminho PATH em (22) descreve o grau em que a noção undergoer aparece especificado pelo sintagma preposicional along the beach „ao longo da praia‟, sendo o objeto DP the coconut „o coco‟ o próprio argumento undergoer, uma vez que experiencia a mudança de localização. Ademais, somente com a especificação de localização

final dessa transição é possível gerar a telicidade, como no caso do sintagma preposicional along the beach. Segundo a autora, a classificação télico depende dos acarretamentos desencadeados pela natureza do objeto direto:

(22) John pushed the coconut along the beach. (Ramchand, 2008, p. 30) Ainda sobre os verbos de criação e de consumição, a autora aponta que o efeito de telicidade nessa classe com objetos quantificados, como em eat an apple „comer uma maçã‟, se dá nos acarretamentos semânticos e não na codificação da determinação lexical dos verbos. Em suma, a autora sustenta que há uma classe de verbos que denota transição, cujo argumento undergoer está sujeito à mudança, e outra classe de verbos em que essa mudança é denotada pelo argumento PATH. Contudo, mostra que há verbos que se comportam diferentemente por serem obrigatoriamente télicos. Esses verbos sistematicamente rejeitam o teste do modificador adverbial for an hour, visto que não sofrem mudança e já têm especificado um resultado final na entrada lexical deles. Ramchand (2008, p. 32) os denomina RESULTEE, ou seja, verbos que não dependem da interação entre argumento interno e elementos quantificados para serem interpretados como télicos (cf. (23) e (24)):

(23) John broke the stick in a second/*for seconds. (24) Mary arrived in two minutes/*for two minutes.

Segundo a autora, a telicidade para os tipos de eventos em (23) e (24) é diferente da telicidade de combinação semântica do [V + OBJETO DIRETO] (seja undergoer ou PATH). Nessa perspectiva, em termos de decomposição de subeventos, a autora postula que é necessário distinguir entre processo e mudança, e incluída nessas distinções está a realização de um estado resultante ou telos. Vale ressaltar que, na decomposição de subeventos referida pela autora, há três participantes: o iniciator (que pode ser o causador do evento), o undergoer (que se refere ao argumento direto relacionado ao processo do evento) e o resultee (que representa o estado resultante).