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CAPÍTULO 1- Alternância Causativa: a análise semântica de Levin e Rappaport Hova

1.3 Síntese do Capítulo

Neste capítulo, apresentamos algumas propostas de base semântica para explicar a alternância causativa. A principal delas, de Levin e Rappaport-Hovav (1995, 2005, 2010), aponta que aspectos da estrutura de evento são relevantes no licenciamento da alternância causativa. As autoras propõem a distinção entre eventualidades causadas externamente e eventualidades causadas internamente e verbos de existência e de aparecimento como uma forma de explicar por que alguns verbos alternam e outros não. Na proposta das autoras, os predicados alternantes dizem respeito àqueles que denotam eventualidades causadas externamente. Verbos causados externamente implicam uma causa externa com controle imediato sobre o evento descrito pelo verbo, sendo esse controle realizado por algo ou alguém exterior ao evento, como um Agente, Causador ou Instrumento. Na concepção das autoras, o que distingue um predicado que alterna de outro que não alterna tem relação com a causa externa ser um agente ou não. Isto é, se a descrição do evento envolver uma causa externa sem intervenção direta de um agente volitivo, o verbo alterna; do contrário, o verbo não alterna. Desse modo, é condição essencial para a alternância o fato de a natureza do subevento causador não ser lexicalmente especificada, o que remete à possibilidade de vinculação lexical de causa externa na estrutura do evento de verbos inacusativos. Os predicados não alternantes compõem a classe de verbos que denotam eventualidades causadas internamente e a de verbos de existência, de aparecimento e de desaparecimento.

As autoras se utilizam da teoria da decomposição de predicados formada pelos elementos primitivos CAUSE e BECOME e da raiz para representar os componentes de significado relevantes para a descrição dos predicados alternantes. Defendem que o tipo ontológico do verbo (raiz) desempenha papel relevante na alternância causativa, pois se integram na estrutura do evento, seja como modificador do evento, seja como argumento,

respectivamente para verbos de maneira, do tipo run, classificados como verbos não alternantes e para verbos de resultado, do tipo break, classificados como alternantes. A proposta da raiz dos verbos é importante para nossa pesquisa porque as autoras demonstram que verbos que codificam uma raiz de tipo ontológico STATE associada ao predicado primitivo BECOME alternam. Ademais, em relação à propriedade causa, as autoras limitam o fenômeno da alternância causativa ao mencionarem que o traço semântico de causa externa pode ser subespecificado.

Souza (1999) amplia a proposta de classificação de eventos de Levin e Rappaport- Hovav (1995) para eventos de causa interna, de causa estritamente externa (em que há acarretamento de agentividade do causador) e de causa potencialmente externa (em que não há acarretamento de agentividade do causador). Considera que eventos de causa externa e eventos de causa interna não alternam. Souza (1999) sugere que os predicados alternam devido às seguintes condições: (i) ter argumento afetado, ou seja, o predicado deve apresentar as propriedades causador e afetado, as quais são associadas aos operadores CAUSE e BECOME; e (ii) admitir a reconstrução metonímica, com base em uma grande variedade de argumentos como Agente, Instrumento e Causa.

O que muda na proposta de Souza em relação à proposta de Levin e Rappaport-Hovav é a maneira como esses eventos são conceptualizados. Percebemos na análise de Souza (1999) que, não obstante o autor considere a propriedade Afetação como uma importante justificativa para os verbos alternarem, ao se utilizar da reconstrução metonímica para sustentar sua proposta, o autor parece dar mais relevância para a interpretação do sujeito do que para o sintagma verbal, ou seja, para a relação do verbo com o seu complemento.8

Ciríaco (2007) considera que as funções semânticas estão relacionadas a papéis temáticos. Similarmente a Levin e Rappaport-Hovav (1995), a autora adota a hipótese de uma forma básica para a transitividade, mas, diferentemente delas, não assume que a sentença causativo-transitiva precede a sentença ergativa. Para a autora, a construção ergativa é derivada de propriedades semânticas do verbo, sendo projetada diretamente na sintaxe. Para explicar a alternância, Ciríaco (2007) adota a proposta de Cançado (2003, 2005) de reduzir os papéis temáticos às propriedades desencadeador, afetado, estado e controle, sendo essa última verificada composicionalmente. Sob essa perspectiva, propõe que verbos alternantes do tipo

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Para uma análise alternativa, que considera mais relevantes os traços do predicado [V+DP], ainda que não elimine os traços do DP sujeito, ver Naves (2005).

quebrar devem ser compatíveis com a propriedade de desencadeador indireto com opcionalidade para controle, os quais têm a representação temática {D/(C)/(indireto); A}.

Observamos na proposta de Cançado e Godoy (2010) um refinamento da proposta de Levin e Rappaport-Hovav em termos da subdivisão de verbos que denotam diferentes resultados. Em relação a verbos alternantes de mudança de estado, as autoras descrevem o mesmo tipo ontológico STATE, mas propõem diferentes notações para o predicado que contém o participante X. Em eventos causados externamente, como quebrar, o participante X se vincula o predicado ACT, marcado como opcional para o agente. Para verbos do tipo preocupar, denominados verbos estritamente causativos, o participante X é interpretado como causa. Por fim, para verbos causados internamente como amadurecer, as autoras se apoiam nos trabalhos de Cançado e Amaral (2010) e propõem marcar opcionalidade para o predicado CAUSE, no sentido de reforçar que a mudança de estado está vinculada a uma causa interna. Já em relação a verbos de ação que não alternam, os do tipo location (locação) e locatum (localização), a decomposição de predicados desses verbos difere apenas quanto à modificação da raiz de localização PLACE para os primeiros e de complemento THING para os últimos. Para esses verbos, o participante X está vinculado ao predicado ACT, sem a notação entre parênteses, o que significa que são predicados estritamente agentivos.