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A adição de cal a um solo e na presença de água desencadeia uma série de reações. Quando se adiciona cal a um solo fino acontecem reações em duas etapas, uma de forma imediata (após alguns minutos de contato), devido ao mecanismo de troca catiônica, floculação, compressão da dupla camada elétrica, adsorção de cal e reações químicas. E a segunda de forma lenta (meses ou anos), caracterizada pelas reações de cimentação pozolânicas e a carbonatação. A existência e intensidade destas reações estão relacionadas com o tipo de solo, (granulometria, mineralogia das partículas), com o tipo e teor de cal, temperatura e tempo de cura, (THOMÉ, 1994).

A troca de íons é uma reação rápida e consiste na troca de base com os cátions fortes da cal substituindo os íons metálicos fracos, como sódio, magnésio e hidrogênio na superfície da partícula de argila. Esta reação diminui a plasticidade do solo. A floculação e a aglutinação ocorrem na fração de argila, com aparente mudança de textura, aglutinando as partículas de argila de maior diâmetro. A carbonatação envolve a absorção de dióxido de carbono (CO2) do ar que reage com o hidróxido de cálcio ou magnésio da cal, formando um agente cimentante fraco, ou seja, uma reação indesejável, tendo em vista que esta pode deter a reação pozolânica. A reação pozolâmica é lenta e ocorre entre a sílica ou alumínio do solo e a cal, produzindo um gel de silicato de cálcio aluminatos cimentante das partículas de solo, (BAPTISTA, 1978).

Para o melhor entendimento de cada ação, Castro (1981) considerou cinco faixas de pH.

i) pH < 4,0 - ocorre, essencialmente, troca iônica de grande parte do íon H+ e de alguns cátions;

ii) 4,0 < pH < 5,6 - O Al+3 trocável é neutralizado e pequena parte H+ depende do pH deslocado;

iii) 5,6 < pH < 7,6 - caracteriza-se pelo início da reação de polímeros terminais de hidroxi-alumina – Al(OH)3;

iv) 7,6 < pH < 10,0 - os agrupamentos silanol começam a reagir; v) pH > 10,0 - início das reações ditas pozolânicas.

Embora esta explicação seja a mais aceita, não é a única. Nóbrega (1985) afirma que a troca catiônica e floculação não podem ser consideradas como mecanismo de estabilização, porque solos saturados por cálcio reagem e melhoram com cal. Para o autor, a forte alcalinidade do meio, alterando as condições físico-químicas em nível de superfície das partículas, é a principal responsável pela mudança imediata no comportamento do material.

Castro (1988) não considera que a troca catiônica ocorra com a magnitude frequentemente considerada e que ela não justificaria a diferença de comportamento tão acentuada observada nas misturas solo-cal em prazos reduzidos. Para o autor a adsorção de moléculas de hidróxidos de cálcio seria a responsável por estas modificações de curto prazo e que as reações de características pozolânicas tem início imediato.

Do ponto de vista da engenharia, Pinto (1985) distingue dois tipos de fenômenos, a alteração das características geotécnicas do solo (floculação, modificações na plasticidade, expansividade e características de compactação) e a aglomeração dos grãos (expressa pela mudança nas características reológicas do solo). As alterações nas características geotécnicas proposta pelo autor coincidem com as reações imediatas exceto quanto à importância dada ao tempo. Já as reações de longo prazo, Pinto (1985) considera apenas os efeitos das reações de cimentação, com o nome de ação aglomerante. Esta abordagem pode ser mais satisfatória para ampliar os estudos de estabilização do solo com a cal.

2. 6.1.1 Troca Catiônica e Floculação

A troca catiônica e a floculação são as primeiras reações após a mistura solo-cal. Prusinski et al (1999), afirmam que a superfície do argilomineral é deficiente em carga e, para neutralizar essa deficiência, cátions e moléculas de água são atraídos para a superfície de clivagem com cargas negativas, resultando numa dupla camada difusa. A ordem da troca contínua de cátions adsorvidos será: cátions de menor valência por cátions de maior valência diminuindo a repulsão elétrica entre as partículas. Com a diminuição das forças de repulsão entre as partículas de argila há uma aglomeração causada pelas forças de atração dessas partículas, verifica-se assim a floculação das partículas resultando na diminuição do índice de plasticidade (IP) e expansão do solo.

Hilt e Davidson (1960) relataram que os íons cálcio inicialmente reduzem o índice de plasticidade dos solos coesivos. Segundo os autores, há uma troca ou adsorção de cátions pela argila causando mudanças físico-químicas nas partículas do solo até que seja alcançado certo teor denominado como ponto de fixação da cal (LFP – lime fixation point). A cal acima do LFP, continua na forma molecular e é utilizada na cimentação. Assim a fixação da cal está relacionada com a capacidade de troca de cátions do solo.

Castro (1981) afirma que quando a cal é misturada a um solo argiloso juntamente com água, parte dela se dissolve na água dos poros, fornecendo Ca2+, CaOH+ e OH-. Se o solo for ácido, os íons H+ e Al+3 são neutralizados, fornecendo água e os hidróxidos de alumínio e possivelmente de ferro. Caso o solo seja alcalino não ocorrerá neutralização. Em paralelo a neutralização, os íons hidroxila interagem com os grupamentos de sílica e alumínio, presentes nas argilas, e por transferência de carga criam condições para a formação de pontes partícula- partícula, o que é efetivado pela ação dos íons cálcio. Com a intensificação deste mecanismo, a granulometria do solo começa a modificar-se passando de argilosa para siltosa com a formação de grumos resistentes à água. Segundo o autor, a troca catiônica não é responsável pela fase inicial da estabilização.

2. 6.1.2 Reação de Carbonatação

A carbonatação tem a característica de ação imediata, é uma importante reação para o mecanismo de estabiliação solo-cal. É a combinação do óxido ou hidróxido de cálcio ou magnésio com o anidrido carbônico presente nas minúsculas bolhas de ar, absorvidas ou retiradas no momento da mistura ou pela penetração do ar nos poros após a execução. A reação tende a refazer o carbonato de cálcio, na forma de um novo corpo sólido que se entrelaça com os demais constituintes do solo. Isto ocorre porque, com o aparecimento do carbonato, há também o aparecimento de grãos de dimensões bem maiores, face à diferença das estruturas cristalinas unitárias entre a do carbonato e a do primitivo hidróxido de cálcio, (GUIMARÃES, 2002).

Entretanto, para Queiroz de Carvalho (1979), o carbonato de cálcio e/ou magnésio formado é um composto cimentante fraco, que é prejudicial em termos de ganhos de resistência. Este é um composto relativamente insolúvel, que deve ser evitado através de

procedimentos construtivos adequados, (TRB, 1987).

Le Roux (1969) apud Nóbrega (1981) relata que a carbonatação da cal resulta numa perda de reatividade, pois a cal na forma de carbonato torna-se inerte, limitando o processo de estabilização. Para evitar a carbonatação é indispensável a compactação imediatamente após a execução da mistura solo-cal, neste caso a compactação tem o objetivo de reduzir a porosidade do material, principalmente os macroporos, diminuindo a circulação interna de ar.

As boas condições de cura é a melhor forma de prevenir a carbonatação do material estabilizado. Se o material possui boas características de durabilidade são mínimos os problemas causados por este fenômeno, (LITTLE, 1995). O autor sugere que como forma de reduzir o risco de carbonatação da mistura o material seja sempre mantido úmido durante a cura, evitando ciclos de molhagem-secagem; manter afastado o dióxido de carbono, minimizando o tempo de exposição da mistura ao ar; realizar a compactação da mistura logo que possível, de forma a obter maiores densidades e menor permeabilidade, reduzindo o volume de vazios.

2. 6.1.3 Reação Pozolânica

As reações de ação lenta são as responsáveis pelo ganho de resistência da mistura solo-cal com o tempo, e está fundamentada no caráter pozolânico dos minerais estabilizados. Um material com característica pozolânica é aquele que em combinação com a cal e em presença de água, sob condições de temperatura ambiente, produz compostos hidratados estáveis com propriedades ligantes, (MILLET, 1979).

Cristelo (2001) explica que a cal adicionada ao solo resulta em acréscimos consideráveis do pH, o que facilita a dissolução da sílica presente nos minerais argilosos e a entrada de cal na solução saturada, onde ocorre a combinação da sílica com o cálcio, formando silicato hidratado de cálcio. Simultaneamente, o ataque das argilas pela cal e a sua provável decomposição e destruição conduz à formação de aluminato hidratado de cálcio. Estes novos elementos encontram-se inicialmente em forma de gel, revestindo as partículas do solo formando um encadeamento que eventualmente resulta em novos compostos minerais: silicatos e aluminatos de cálcio hidratados. Ou seja, a reação da cal com os minerais origina

um gel de silicato/aluminato de cálcio insolúvel em água que, após cristalizar, leva à cimentação das partículas entre si, constituindo uma estrutura envolvente das mesmas, Figura 2.8. Contudo, este gel só se forma se houver água suficiente para permitir a transferência dos íons Ca2+e OH- para a superfície do mineral argiloso, (INGLÊS e METCALF, 1972).

Kézdy (1979) considera que a fase de formação do gel é a mais importante no aumento da resistência mecânica do solo estabilizado com cal, podendo ser facilmente identificada ao microscópio.

Figura 2.10 – Formação de material cimentante numa mistura solo-cal, (CRISTELO, 2001).

A adição de água a cal provoca uma crosta cimentante ao redor das partículas de cal. Em resultado, a parte exterior do aglomerado transforma-se em cal hidratada enquanto o núcleo permanece óxido de cálcio. A formação da crosta retarda a velocidade com que a água se mistura com a cal, pelo que as condições de equilíbrio podem não ser rapidamente atingidas. Com o tempo, porém, a crosta será dissolvida e o núcleo atingido pela água. Contudo, na presença de solo e com o passar do tempo, os produtos resultantes da reação pozolânica acabam por selar os íons presentes nos núcleos da cal viva. Na melhor das hipóteses, qualquer nova reação pozolânica irá depender da velocidade de difusão dos íons ao longo do cimento pozolânico circundante, (HILT e DAVIDSON, 1960).

Lima (1981) considera que, de um modo geral, todos os solos de granulometria fina reagem com a cal, ocorrendo trocas catiônicas e floculação que afetam, de forma benéfica, a sua trabalhabilidade, plasticidade e caráter expansivo. Contudo, as reações pozolânicas entre o

solo e a cal nem sempre ocorrem, sendo influenciadas pelas propriedades naturais dos solos, tipo e teor de cal empregada na mistura, pelas condições de cura e teor de umidade.

Lima e Rõhm (1993) mencionam que a reação pozolânica entre o solo e a cal é lenta e só se completa alguns anos depois, requerendo ainda, temperaturas acima de 21 °C. No entanto para reduzir o período de cura podem-se usar temperaturas de cura elevadas, conforme estudo de cura acelerada de Herrin e Mitchel (1961) esses autores relataram que em alguns casos, foi obtido, em 10 dias a 60°C a resistência mecânica correspondente a 4 (quatro) meses de cura a 21°C. Esse fato pode ser explicado pela aceleração pozolânica ocasionando um possível ataque de sílica (Quartzo) granular presente no solo.

Eades et al (1960) analizaram, através de difratogramas de raio X, a formação de novos minerais pela reação da cal com os argilomenerais mais comuns encontrados nos solos (caulinita, ilita e montmorilonita). Concluiram que a caulinita reage bem com a cal, sendo que para este argilomineral o ataque do cálcio inicia-se pelas arestas. Já nos argilominerais 2:1 (ilita e montmorilonita), é necessário uma saturação dos espaços entre camadas pelo cálcio, para após um ataque da estrutura dos mesmos. Os autores observaram a formação de novas fases cristalinas nas misturas de caulinita e cal, as quais foram identificadas como silicatos hidratados de cálcio (CSH).

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