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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.3 VANTAGEM COMPETITIVA TRANSITÓRIA

2.3.2 O novo manual da estratégia

2.3.2.1 Reconfiguração Contínua

O processo de reconfiguração é a fórmula para permanecer relevante em uma situação de vantagens transitórias, pois em um ambiente em rápida mudança, a empresa também precisa ser capaz de mudar rapidamente. Assim, por meio de um processo dinâmico de reconfiguração, os ativos, as pessoas e as competências fazem a transição de uma vantagem à outra.

Nesse sentido, em organizações que conseguem realizar esse processo vê-se uma contínua reavaliação das atividades atuais, reconhecendo que algumas delas precisarão dar lugar a novas, o que é muito diferente de downsizings ou reestruturações radicais. Além disso, não se trata de um processo ligado a pessoas se atendo a um mesmo papel por longos períodos, assim como uma possível confusão sobre a trajetória evolucionária da empresa.

Essas organizações normalmente são capazes de incorporar a mudança em suas rotinas normais, e tendem a usar uma abordagem orientada a opções para explorar novas oportunidades, que ajudam a promover a agilidade. Ao mesmo tempo, elas são capazes de equilibrar esta agilidade com a estabilidade, mas estabilidade enraizada em áreas mais

"suaves", como visão, processo e cultura, em vez de posicionamento competitivo estático ou padrões rígidos de alinhamento de recursos (McGRATH, 2013a).

Destaca-se, portanto, que uma das características mais notáveis das empresas que até agora têm mostrado como gerenciar o processo de reconfiguração em uma base contínua é o notável equilíbrio dinâmico que elas são capazes de atingir entre estabilidade e agilidade. No que se refere à estabilidade, as empresas de crescimento discrepante criaram arquiteturas sociais que restringem a incerteza e a mudança que seu pessoal precisa enfrentar. Essa estabilidade pode vir de algumas fontes, como:

a) Ambição: trata-se da ambição aliada a um direcionamento estratégico claro. As estratégias das empresas de crescimento discrepante se fundamentaram em uma ambição que impulsiona a empresa toda, proporcionando um direcionamento para o seu pessoal. Neste caso, a ambição é essencial para impedir que as empresas se tornem complacentes e satisfeitas ao buscarem as vantagens de ontem;

b) Identidade e cultura: trata-se do investimento que as empresas fazem na criação de uma identidade, cultura e compromisso com o desenvolvimento de lideranças. Essas empresas dedicam atenção considerável aos valores, à cultura e ao alinhamento, assim como investem muito em treinamento;

c) Alocar e desenvolver: refere-se a como as empresas capazes de passar de um conjunto de vantagens ao outro decidem educar seu pessoal e desenvolver suas habilidades. O treinamento e desenvolvimento contínuos constituem mecanismos para evitar a demissão das pessoas quando as condições competitivas mudam. Dessa forma, investir na capacidade das pessoas de passar de uma vantagem à outra remove uma grande barreira à mudança, passando da pura alocação para o desenvolvimento da capacidade de transição; d) Estratégia e liderança: a estabilidade da estratégia das empresas de crescimento

discrepante foi notável. Apesar de uma época “tumultuada”, essas empresas parecem não ter internalizado o caos em seus ambientes. Nesse sentido, ter poucas prioridades estratégicas claras e simples, desenvolver a cultura e os talentos, alavancando algumas poucas competências essenciais, auxiliou os CEOs a criarem uma enorme força de estabilidade, mesmo em meio a grandes mudanças. Os líderes também contribuíram de maneira importante com a estabilidade;

e) Relacionamentos estáveis: trata-se da capacidade evolucionária das empresas de se transmutarem, acompanhando as mudanças de seus clientes e alinhando os interesses de todos os stakeholders, em vez de lançá-los uns contra os outros. Nesse processo, a

realocação de um mercado a outro e o treinamento contínuo são chaves para manter a flexibilidade e, ao mesmo tempo, reter as pessoas. Ainda que as pessoas precisem ser afastadas, a empresa se certifica de que o processo seja visto como justo e transparente.

Logo, percebe-se que mesmo em empresas que abraçam a mudança e parecem gerenciá-la bem, há elementos de tremenda estabilidade em seus negócios (McGRATH, 2013a). Contudo, em contraposição a esses elementos, também foram observados nas empresas de crescimento discrepante abordagens para instigar a mudança de maneira contínua e rotineira, ou seja, abordagens para promover a agilidade estratégica.

Essa agilidade pode vir de algumas fontes, como:

a) Mutação: diferentemente de processos de downsizing ou reestruturações drásticas, a

mudança é incorporada no cotidiano das empresas, realocando recursos de maneira flexível e contínua;

b) Orçamentação rápida e flexível: a tomada de decisões relativa relativas a grandes

desafios estratégicos conta com uma coordenação central, que possui um considerável espaço de manobra no nível da unidade de negócio. Sistemas de dados de alta qualidade e transparência absoluta ajudam nesse processo;

c) Flexibilidade: no lugar de pesados processos orçamentários anuais e valores orientados

para eficiência, as empresas de crescimento discrepante focam no aumento da flexibilidade. Por exemplo, os ajustes realizados na estratégia e as mudanças na alocação de recursos não são exercícios anuais, tendo muito mais chances de serem trimestrais. Essa lógica também se aplica a promoções e avaliações de pessoal;

d) Inovação como norma: neste caso, a inovação é um fator contínuo, já incorporado à

cultura da organização e ao trabalho de todos, ou seja, não é uma empreitada incidental e intermitente. Isso implica pensar continuamente em coisas novas como parte da rotina de todos;

e) Padrão orientado para opções para exploração de mercado: a essência dessa

abordagem é que as empresas fazem pequenos investimentos iniciais para explorar oportunidades, seguidos posteriormente de investimentos maiores, caso eles se justifiquem. Ademais, as empresas também se mostram dispostas a abandonar uma iniciativa caso ela não se desenvolva com eficácia. O fato é que um segmento entra em declínio, outros podem ser alavancados.

Constata-se, diante do exposto, que as empresas de crescimento discrepante navegam com destreza por demandas aparentemente incompatíveis. Por um lado, apresentam enorme estabilidade, traduzida em seus valores, normas culturais, estratégias essenciais, competências, relacionamentos com os clientes e liderança, que são extraordinariamente regulares ao longo do tempo. Por outro lado, elas se envolvem em muita experimentação e inovação.

Dessa forma, apesar de parecerem contraditórias, essas duas capacidades, de manter a coerência e o alinhamento ao mesmo tempo que inovam e questionam as convenções, são profundamente interdependentes. Assim, o desafio da liderança e da administração é sustentar um sistema organizacional capaz de manter a complementaridade entre as forças da inovação e as da estabilidade.