• Nenhum resultado encontrado

3 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

3.5 RECOZIMENTO: RECUPERAÇÃO E RECRISTALIZAÇÃO

O recozimento é realizado com o propósito de desenvolver uma microestrutura composta de grãos equiaxiais com baixa densidade de discordâncias a partir do estado encruado por meio dos processos de recuperação, recristalização e crescimento de grãos (HUMPHREYS e HATHERLY, 2004). A recristalização de metais e ligas possui grande importância no processamento industrial devido à necessidade do controle das propriedades mecânicas e estrutura dos grãos no produto final (DOHERTY; HUGHES; et al., 1997).

A recuperação consiste nos processos de aniquilação e rearranjo de discordâncias em uma configuração de baixa energia e causa, em pequena escala, mudanças sutis na microestrutura. No entanto, estas modificações afetam as propriedades mecânicas. Sendo assim, a dureza ou limite de escoamento são frequentemente utilizados para avaliação da recuperação de um material. A recristalização primária pode ser definida como a formação de novos grãos livres de deformação e migração de contornos de alto ângulo sobre a microestrutura deformada ou recuperada. Importante salientar que a recuperação e recristalização são processos competitivos, pois a energia utilizada em ambos os processos é a energia armazenada na deformação (HUMPHREYS e HATHERLY, 2004; DOHERTY; HUGHES; et al., 1997).

Os diferentes mecanismos de deformação que ocorrem na austenita e ferrita implicam em diferentes mecanismos de amaciamento durante o recozimento dos AIDs (REICK; POHL e PADILHA, 1998). Reick e colaboradores (1998) afirmaram que na ferrita acontece recuperação em decorrência da alta taxa de difusão, alta mobilidade e arranjo mais favorável das discordâncias (células de discordâncias). Deve-se mencionar, também, que os núcleos são formados por crescimento de subgrãos. Neste estudo, o recozimento do aço UNS S31803 foi realizado com variação de tempo entre 3 segundos a 100 horas e temperatura entre 600°C e 1000°C. Este mesmo comportamento foi reportado por Herrera, Raabe e Ponge (2012) para fase ferrítica durante o recozimento com diferentes tempos e temperatura entre 1000°C a 1100°C do aço UNS S32304.

Keichel, Foct e Gottstein (2003) citaram que associada à alta EFE, a morfologia em lamelas alternadas favorece o processo de recuperação da ferrita dos aços AIDs. Os grãos de ferrita se estendem através da espessura das lamelas, consequentemente, existe menor número de grãos ferríticos vizinhos. A menor fração de contornos de grão na fase ferrítica diminuem os sítios de nucleação preferenciais para a recristalização.

A nucleação durante a recristalização acontece em regiões pré-existentes na microestrutura deformada com alto gradiente de orientação local, ou seja, heterogeneidades de deformação, contornos de grão de alto ângulo e partículas de segunda fase. Em conjunto, a formação de contornos de alto ângulo pode acontecer por meio de migração de subcontornos e coalescimento de subgrãos, associados a metais de baixa e alta EFE respectivamente. O crescimento das regiões recristalizadas continua até que os grãos recristalizados se encontrem e toda a região deformada ou recuperada seja consumida (HUMPHREYS e HATHERLY, 2004; RIOS; SICILIANO JÚNIOR e SANDIM, 2005).

Reick e colaboradores (1998) e Herrera, Raabe e Ponge (2012) ainda afirmaram que a microestrutura deformada da austenita dos AIDs permaneceu inalterada até o início da recristalização primária. Entretanto, é importante ressaltar que a martensita induzida por deformação, quando presente na microestrutura, reverte para austenita durante o recozimento de ligas com microestrutura austenítica. Poucos trabalhos abordam esta transformação em AID quando comparado aos aços inoxidáveis austeníticos (AGUIAR, 2012). O mecanismo de reversão da martensita α’ em austenita possui grande importância tecnológica nos estudos referentes a esta classe de aços devido ao refinamento de grão provocado por esta transformação (TOMIMURA; TAKAKI e TOKUNAGA, 1991).

Os mecanismos conhecidos como reversão por cisalhamento e reversão difusional são amplamente discutidos para a transformação da martensita induzida por deformação em austenita. A Figura 7 mostra uma representação esquemática de ambos os mecanismos. A formação dos grãos de austenita pela reversão por cisalhamento acontece por meio de movimentos coordenados de átomos. Durante o recozimento, os processos de recuperação e recristalização ocorrem nos grãos de austenita revertida que possuem alta densidade de discordâncias herdadas da martensita. O mecanismo de reversão difusional consiste na nucleação de finos grãos equiaxiais de austenita na matriz de martensita α’. O aumento do tempo de recozimento causa o crescimento dos grãos de austenita e o desaparecimento da martensita α’ (TOMIMURA; TAKAKI e TOKUNAGA, 1991).

Figura 7 – Ilustração dos mecanismos de reversão da martensita para austenita.

Fonte: Adaptado de TOMIMURA; TAKAKI e TOKUNAGA, 1991.

O mecanismo de reversão da martensita α’ depende da composição química do aço e temperatura de recozimento. O aumento da razão Níquel/Cromo aumenta a energia livre de Gibbs referente à mudança de estrutura cristalina CFC e CCC e diminui a temperatura para ocorrência da reversão por cisalhamento. Abaixo desta temperatura, o mecanismo de reversão será difusional (TOMIMURA; TAKAKI e TOKUNAGA, 1991). Adicionalmente, Guy e colaboradores (1983) reportaram que as temperaturas de início e término da reversão da martensita diminuem com o aumento do teor de níquel.

Padilha e colaboradores (2003) em um trabalho de revisão citaram várias faixas de temperatura e tempo para a reversão da martensita induzida por deformação dos aços inoxidáveis austeníticos reportadas por alguns pesquisadores. Estes autores afirmaram que a temperatura de reversão é menor em relação à temperatura de recristalização dos aços investigados. Adicionalmente, não há nenhuma evidência clara de que exista uma correlação entre a reversão de martensita e recristalização.

Durante a recuperação e recristalização primária da fase austenítica dos AIDs e dos aços inoxidáveis austeníticos, ou seja, metais de baixa a média EFE, maclas de recozimento são formadas. Este defeito consiste em lamelas com lados paralelos formados por falhas de empilhamento dos planos {111}, conhecidos como contornos de macla coerente. A formação de maclas é importante no desenvolvimento da textura de recristalização devido à produção de novas orientações que não existiam na microestrutura deformada (HUMPHREYS e HATHERLY, 2004).

Reick e colaboradores (1998) afirmaram que a nucleação de novos grãos na austenita acontece nas interfaces das fases de maneira mais descontínua. Estes autores concluíram que a cinética de recristalização é mais rápida na ferrita apesar do maior potencial termodinâmico para recristalização na austenita.

O tamanho de grão após processo de recozimento para ambas as fases dos AIDs são menores em relação aos respectivos aços monofásicos em decorrência da presença de contornos de fase que impedem o crescimento dos grãos. O tamanho de grão da austenita é levemente menor em comparação à fase ferrítica devido à maior mobilidade dos átomos (difusão) nesta fase (REICK; POHL e PADILHA, 1998; CHOI; JI; et al., 2012).

Regiões recristalizadas possuem baixa diferença de orientação intragranular em relação ao estado encruado. Com o avanço da técnica de EBSD, a evolução da recristalização pode ser avaliada por meio do parâmetro de espalhamento de orientação no interior dos grãos ou Grain Orientation Spread (GOS). Este parâmetro é calculado definindo o desvio médio da orientação entre cada ponto em um grão e a orientação média do grão analisado. Na literatura, GOS menor que 1° tem sido associado a grãos recristalizados (GAUSS, 2015; WRIGHT; NOWELL e FIELD,

2011; BRACKE; VERBEKEN e KESTENS, 2009; POLKOWSKI; JÓŹWIK e BOJAR,

2014; JIN; LIN; et al., 2014; LEE; HUH e ENGLER, 2012; VERBEKEN; BARBÉ e RAABE, 2009).