• Nenhum resultado encontrado

Recuperação das misturas betuminosas através de calor

1. INTRODUÇÃO

2.5. Recuperação das misturas betuminosas através de calor

A capacidade de autorregeneração das misturas betuminosas tem sido demonstrada tanto em testes de laboratório e no campo desde os anos 1960.

Bazin e Saunier (1967) descobriram que amostras de pavimentos, testadas até a rotura sob cargas de tração uniaxiais poderia recuperar 90% da sua força original, quando repousaram sob pressão a 25 °C.

No seguimento dos seus estudos, descobriram que misturas betuminosas em fim de vida poderão recuperar mais de metade da vida inicial se submetidas a um período de descanso de um dia e se nesse período de descanso as amostras ficassem sujeitas a uma pequena pressão nas fendas. Os períodos de descanso demonstravam assim ter efeito benéfico da recuperação da rigidez e da vida das misturas betuminosas. Assim sendo, com os períodos de repouso das misturas betuminosas, mais testes foram realizados para o estudo da recuperação da capacidade de carga e extensão de vida das misturas betuminosas. Também testes de laboratório realizados por van Dijk et al (1972) demonstraram que a vida à fadiga de uma mistura betuminosa poderia ser estendida quando os períodos de repouso foram introduzidos nos ensaios.

Como já se falou anteriormente, as misturas betuminosas dos pavimentos rodoviários quando aquecidas conseguem regenerar-se sozinhas. Assim sendo, iniciaram-se vários estudos sobre métodos para aquecer as misturas betuminosas dos pavimentos rodoviários tais como, aquecimento por indução de misturas betuminosas com partículas eletricamente condutoras e magneticamente suscetíveis e aquecimento das misturas betuminosas com micro-ondas.

Grant (2001) concluiu que a regeneração ocorre quase de imediato a alta temperatura. Também o trabalho de Kim e Roque (2006) mostrou que as misturas betuminosas se regeneram melhor em temperaturas mais elevadas.

Castro e Sánchez (2006) explicou o mecanismo self-healing das misturas betuminosas pela teoria sol-gel: A alta temperatura, o self-healing acontece devido à transição de betume de sol para gel e, se o período de descanso é suficiente, recuperação de danos será completa. A baixa temperatura, períodos de descanso não permitem a cura de danos estruturais criado pelos ciclos de carga e recuperação seria apenas parcial.

As técnicas existentes de aquecimento por indução possibilitam a aplicação do aquecimento por indução nos pavimentos para aumentarem a temperatura e deste modo reparar as fendas existentes no pavimento. Sendo assim, o aquecimento por indução é um dos métodos mais estudados para o self-healing das misturas betuminosas, havendo vários estudos em diferentes tipos de misturas.

O pioneiro do aquecimento por indução dos pavimentos betuminosos foi Minsk (1968;1971). Desenvolveu e patenteou o primeiro pavimento de asfalto eletricamente condutor usando grafite como um meio condutor com a finalidade de derreter neve e gelo em superfícies de estrada por aquecimento por indução (Tabakovic, A., 2015).

A tecnologia de indução de calor funciona do seguinte modo (Figura 2.19). Um campo magnético alternado induz correntes num condutor elétrico. O processo de geração de correntes elétricas em um condutor, colocando-o num campo magnético alternado, é chamado de indução eletromagnética de Faraday. As correntes induzidas fluem contra a resistividade elétrica do condutor, gerando calor no condutor por causa do "efeito Joule". Este método de aquecimento é muitas vezes chamado de aquecimento por indução (Liu, 2012). Assim sendo, o primeiro passo para a aplicação do aquecimento por indução nas misturas betuminosas passa por torná- las eletricamente condutoras.

Figura 2.19 – Aquecimento por indução em mistura betuminosa porosa

O aquecimento por indução apresenta as seguintes vantagens em relação aos outros métodos de aquecimento:

 Muito eficiente, convertendo 90% da energia consumida em calor útil;

 Aquece sem contacto, e deste modo não contamina a peça aquecida;

 Não acontece empenamento do produto, distorção e as taxas de rejeição são minimizadas;

 Funciona muito rápido. O arranque do aquecimento é quase instantâneo e não existe aquecimento ou ciclo de arrefecimento;

 Elimina as inconsistências e problemas de qualidade associados a aquecimentos de chama aberta ou similares;

 Quando devidamente calibrado e configurado, o aquecimento é reproduzível e consistente;

 Melhores condições de trabalho não existindo, fumo, calor residual, emissões nocivas e ruido.

Uma especial vantagem do aquecimento por indução no caso particular do aquecimento de misturas betuminosas é que aquece diretamente o betume sem danificar o esqueleto de agregados.

O “self-healing asphalt” ganhou ainda mais notoriedade após a palestra de Erik Schlangen no TEDxdelft na Holanda em outubro de 2012. Erik Schlangen começa a palestra por partir uma viga de uma mistura betuminosa em duas partes e de seguida coloca-a unida num micro-ondas a aquecer. Enquanto a viga aquece no micro-ondas, Erik Schlangen explica dois dos grandes problemas dos pavimentos rodoviários, tais como, o ruido produzido e a acumulação de água

nos dias mais chuvosos. A solução que ele refere para estes problemas é uma mistura betuminosa porosa, que nos pavimentos na Holanda é já bastante utilizada. Os pavimentos porosos são permeáveis pela água, evitando assim a acumulação de água sobre o pavimento e o ruido desaparece nos poros do pavimento, tornando-se assim em pavimentos muito silenciosos. Mas Erik Schlangen explica também que este tipo de pavimentos acarreta um problema, que é a desagregação da camada de desgaste, originando o aparecimento de agregados soltos na superfície do pavimento. Este problema acontece devido ao facto de o betume que une os agregados ser bastante reduzido e ao longo da vida do pavimento, devido a vários fatores, o betume que une os agregados encolhe, como se pode verificar na Figura 2.20, causando assim a desagregação dos agregados.

Figura 2.20 – Encolhimento do betume que une os agregados (Schlangen, 2012).

A solução de Erik Schlangen é o “self-healing asphalt” através da indução de calor, que consiste na incorporação de material metálico condutor nas misturas betuminosas, permitindo posteriormente o aquecimento do pavimento através de um equipamento de indução. Após ensaios em laboratório foi cedido pelo governo um troço de pavimento para que pudesse colocar em prática este método. Após a realização dos ensaios, Erik Schlangen concluiu que um pavimento com estas condições poderia atingir o dobro do tempo de vida, se a cada quatro anos se percorresse o pavimento com um equipamento de aquecimento por indução. Após a viga ter aquecido no micro-ondas, em que Erik Schlangen diz ser um método de aquecimento similar ao de indução, Erik Schlangen demonstra que as duas partes da viga colaram entre si.

O aquecimento de misturas betuminosas através de micro-ondas tem despertado algum interesse, pois nos últimos anos alguns protótipos têm demonstrado a sua fiabilidade no aquecimento de pavimentos.

apresenta algumas vantagens em relação a outros métodos de aquecimento, tais como, maior rapidez a aquecer as misturas e menor energia gasta no processo.

Alguns testes em estrada na Califórnia (Terrel e Al-Ohaly, 1987) demonstraram que as micro- ondas penetram no pavimento mais rápido do que outros métodos de aquecimento como chama e infravermelhos. Foi demonstrado que a temperatura dentro do pavimento aumenta uniformemente, sem pontos quentes. No entanto, foi verificado um gasto de energia mais do que o necessário pois, na maioria das vezes, as micro-ondas penetram mais do que necessário no pavimento. Para evitar a situação anteriormente referida, surgiu a procura de um meio para concentrar a energia das micro-ondas perto da superfície do pavimento.

A Figura 2.21 demonstra a eficácia relativa entre o uso de infravermelhos, cobertor elétrico e micro-ondas. Pode ver-se que os três métodos conseguem aquecer o pavimento até 200 ºF com uma profundidade de 3 polegadas, mas no caso dos infravermelhos e do cobertor elétrico a superfície do pavimento atingiu uma temperatura muito mais elevada.

Figura 2.21 – Características do gradiente térmico dos métodos de aquecimento de tabuleiros de uma ponte (Jepson, 1981)

Na Figura 2.22 pode ver-se que até profundidades de 3 polegadas o aquecimento por micro- ondas apenas necessitou de dez minutos para atingir uma temperatura de 185 ºF, enquanto que com infravermelhos necessitou de à volta de duas horas e com cobertor elétrico não é claro se

chegaria a essa temperatura. Sendo assim, o aquecimento por micro-ondas revela uma clara vantagem no aquecimento na relação tempo-eficiência.

Figura 2.22 - Comparação do tempo de aquecimento para tabuleiros de pontes a 3 polegadas de profundidade (Jepson, 1981)

No aquecimento com micro-ondas, as micro-ondas excitam as moléculas do material, fazendo com que gere o próprio calor. O aquecimento em função do tempo e da profundidade varia em função do material aquecido e das caraterísticas das micro-ondas, principalmente a frequência. A penetração das micro-ondas no material aquecido aumenta à medida que a frequência diminui, como por exemplo, as ondas de 915 MHz penetram em mais profundidade do que as ondas de 2450 MHz. Os materiais não são aquecidos de igual forma pelas micro-ondas, alguns como por exemplo, água e agregados aquecem facilmente, enquanto que o papel e o betume já não aquecem tão facilmente (Terrel e Al-Ohaly, 1987).

As micro-ondas fazem parte do espectro magnético (Figura 2.23), tal como as ondas de rádio, ondas de televisão e até a luz visível. A diferença das micro-ondas em relação às outras está no seu comprimento e na frequência, como exemplo, as longas ondas de radio são medidas em milhas e as micro-ondas são medidas em polegadas (Terrel e Al-Ohaly, 1987).

Figura 2.23 - Espectro eletromagnético (Terrel e Al-Ohaly, 1987)

Quando as micro-ondas passam através de um material contendo moléculas dipolares (moléculas com cargas espaçadas, iguais em magnitude e opostas em sinais), as moléculas agem como ímanes microscópicos na tentativa de se polarizarem com o campo elétrico. Sob a influência desta grande alternância da frequência no campo elétrico, as moléculas começam a oscilar em torno dos seus eixos, criando um atrito intermolecular, que se manifesta na forma de calor. A polarização é, por vezes, classificada como eletrónica, atómica, molecular ou interfacial, como pode ver-se na Figura 2.24 (Terrel e Al-Ohaly, 1987).

Na Figura 2.25 pode ver-se vários tipos de materiais utilizados em pavimentos rodoviários que foram aquecidos por um forno micro-ondas.

Figura 2.25 - Comparação do aquecimento de vários materiais utilizados em pavimentos em micro-ondas de 500 Watt a 2450 MHz durante dois minutos (Jepson, 1981)

Hoje, os projetos das estradas são criações sofisticadas da engenharia. Apesar disso, os materiais utilizados em misturas betuminosas permaneceram praticamente inalterados nos últimos 100 anos. O principal constituinte de um pavimento moderno é o betume. Trata-se de produto derivado do petróleo bruto cuja produção está em declínio (Worth, 2014), originando o aumento do custo do betume tanto a nível financeiro como ambiental (Worth, 2014; Leggett, 2014), o que resultará num aumento dos pavimentos rodoviários (Tabakovic, 2015).

A incorporação da tecnologia de “self-healing asphalt” apresenta uma solução para algumas das dificuldades enfrentadas pelos pavimentos. Tecnologias de “self-healing” disponíveis atualmente estão pavimentando o caminho para a evolução do projeto de estradas. As tecnologias existentes demonstraram o seu potencial na reparação de pavimentos betuminosos. Eles oferecem grandes oportunidades para maior durabilidade e confiabilidade, manutenção reduzida e menor custo geral de pavimentos betuminosos. Isso inclui a indução nos recursos

(Tabakovic, 2015).

A tecnologia “self-healing asphalt” consiste na reparação de pavimentos betuminosos com recurso apenas às suas propriedades de autorregeneração, aquando ao aparecimento dos primeiros danos. Sendo assim, elimina-se a necessidade atual da manutenção de pavimentos betuminosos “in-situ”.

Desenvolver um pavimento betuminoso realmente inteligente com a capacidade de se autoavaliar e de se regenerar autonomamente, é o verdadeiro objetivo da tecnologia “self- healing asphalt”.

Segundo Tabakovic e Schlangen (2015), apesar dos progressos realizados no desenvolvimento da tecnologia de “self-healing asphalt”, são necessários mais trabalhos para se conseguir pavimentos verdadeiramente inteligentes. O trabalho futuro precisa se concentrar em:

 Deteção de dano e reparação dos elementos que desencadeiam os danos;

 Desenvolvimento de múltiplos processos de auto-recuperação;

 Desenvolvimento de mecanismos de “self-healing”.

O desenvolvimento de tais áreas de tecnologia de “self-healing asphalt” realmente revolucionará o projeto dos pavimentos betuminosos. Isso também levará a um passo mais revolucionário na construção e no projeto de estradas e trará a ideia de “self-healing” da ficção científica à realidade (Tabakovic, 2015).

Documentos relacionados