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Recuperação e purificação de bioprodutos (downstream processing)

1. Introdução e Justificativa

2.3 Recuperação e purificação de bioprodutos (downstream processing)

O downstream processing abarca as etapas de clarificação, recuperação, purificação e acondicionamento do produto obtido por bioprocessos (STRUBE et al., 2011). As etapas downstream muitas vezes são responsáveis pela maior parte dos custos do processo, e podem, portanto, tornar o processo inviável, pois muitos compostos são produzidos em baixos rendimentos, o que dificulta a recuperação destes em quantidade suficiente (JONGEDIJK et al., 2016; SERRANO-CARREÓN, 2003). Para que os produtos obtidos por biotecnologia possam então concorrer com os produtos obtidos quimicamente é necessário que haja o desenvolvimento de processos de recuperação e purificação com menor custo (KURZROCK; WEUSTER-BOTZ, 2011)

Em downstream processing é comum a divisão do processo em etapas, nomeadamente: clarificação ou separação biomassa-sobrenadante, concentração ou purificação primária, purificação secundária, polimento e acondicionamento (STRUBE et al., 2011). Essas etapas serão descritas de forma mais completa a seguir, focando especialmente nos terpenos.

2.3.1 Clarificação

A clarificação é assim chamada, por ser a etapa em que a biomassa é separada do sobrenadante, reduzindo a turbidez do meio. Além da biomassa, outros sólidos insolúveis são retirados, realizando uma purificação prévia do meio fermentado. Existem duas principais técnicas para essa etapa: centrifugação e filtração (PESSOA JR, 2005).

A centrifugação tem como princípio a separação por diferenças na densidade entre as partes que compõem o sistema, exercendo uma força que levará à precipitação dos sólidos insolúveis presentes no meio. Em escala industrial é a técnica mais utilizada por ser de mais fácil aplicação e menor custo.

A filtração, por sua vez, utiliza a diferença de tamanho entre as partículas que compõem o sistema, e é mais frequentemente utilizada em escala laboratorial. O escalonamento para escala industrial é mais complexo, e por isso essa técnica é menos utilizada em larga escala. Os principais métodos de filtração são a filtração convencional e com vácuo. A filtração convencional pode ser feita utilizando filtros de placa, filtros convencionais fechados e filtração tangencial (útil para pequenos volumes de suspensões). Para grandes volumes de suspensões microbianas, é comum o uso de filtro rotativo a vácuo (FRV) (PESSOA JR., 2005)

Após a separação dos sólidos insolúveis e do sobrenadante, é importante saber se o produto de interesse é intracelular ou extracelular. Se for extracelular, o composto alvo estará majoritariamente diluído no sobrenadante, e dessa forma a biomassa pode ser descartada, na maioria das vezes. Por sua vez, se o composto for intracelular, a biomassa é a parte a ser utilizada, e terá que ser submetida a procedimentos de rompimento celular, que podem ser mecânicos, físicos ou químicos, como por exemplo sonicação, ultrassom, moinho de bolas, prensa, calor, entre outros (STRUBE et al., 2011).

2.3.2 Recuperação/Concentração

Como citado anteriormente, um dos principais desafios da produção por biotecnologia são as pequenas concentrações de produto comumente observadas nos meios fermentados. Adicionalmente, os grandes volumes dificultam o manuseio e transporte do meio fermentado e sua subsequente purificação, que ainda é amplamente feita de modo off-line (não integrado ao processo de produção) (SERRANO- CARREÓN, 2003).

Nesse sentido, é importante retirar o composto alvo do meio de cultura, visto que o composto mais abundante, e primeiro obstáculo da purificação, é a água e, de preferência, diminuir o volume com que se trabalha facilita a execução das etapas subsequentes, diminuindo custo do processo (HECKE; KAUR; WEVER, 2014).

Para a extração de compostos terpênicos de material derivado de plantas, podem ser utilizados diversos métodos como destilação a vapor, extração com solventes, extração com fluido supercrítico, microextração com fase sólida e extração assistida por micro-ondas (FOJTOVÁ; LOJKOVÁ; KUBÁŇ, 2008). A extração com fluido supercrítico é uma das que mais tem atraído a atenção ultimamente, pela alta capacidade do solvente, e sua seletividade, além de ser uma técnica mais amigável ambientalmente (WASEEM; LOW, 2015).

Outras técnicas que podem ser utilizadas são ultrafitração e precipitação, em se tratando da recuperação dos compostos terpênicos presentes em meios fermentados. Porém, apesar da pesquisa e desenvolvimento de novas tecnologias para recuperação de compostos, que podem ser aplicadas a terpenos, a principal técnica empregada ainda é a extração líquido-líquido ou extração com solvente orgânico, que será abordada subsequentemente.

2.3.2.1 Extração líquido-líquido

A operação unitária mais comumente empregada para recuperação dos compostos terpênicos é a extração líquido-líquido, utilizando solvente orgânico. O uso dessa técnica já é bem estabelecido para a obtenção de compostos de aroma e fragrâncias do óleo essencial de plantas e apresenta baixo custo e facilidade de operação (STARMANS; NIJHUIS, 1996). A extração de compostos terpênicos pode ser feita por diferentes solventes distribuídos ao longo do gradiente de polaridade, devido à diversidade estrutural e de grupos funcionais encontrada dentro dos compostos dessa classe.

No caso de extração de óleos essenciais, em geral, essa é feita utilizando solventes apolares, como éter de petróleo, devido ao caráter hidrofóbico da maior parte dos compostos constituintes (ÖZLEM BAHADIR, 2012). A extração total do material utilizando solventes polares, como acetona, etanol e metanol aquoso, seguida de re- extração com acetato de etila, clorofórmio e hexano também é uma boa estratégia para extração de terpenoides e esteróis (ÖZLEM BAHADIR, 2012).

Dentre os compostos utilizados para extração de compostos terpênicos estão: éter etílico e clorofórmio, utilizados principalmente para extração de lactonas de sesquiterpenos, diterpenos, esteróis e triterpenoides de menor polaridade. Acetato de etila e acetona têm sido utilizados para extrair diterpenoides oxigenados, esteróis e triterpenoides. Etanol, metanol e água são utilizados com triterpenoides altamente oxigenados e polares, e com glicosídeos de esterois (ÖZLEM BAHADIR, 2012).

Para monoterpenos, objeto desse estudo, bem como para sesquiterpenoides, quando presentes em óleo essencial, o principal procedimento para sua obtenção é a destilação com vapor para extração dos óleos essenciais. A extração com solventes orgânicos não-polares, como éter de petróleo, éter etílico e hexano, também é eficaz (ÖZLEM BAHADIR, 2012). Já em estudos de biotransformação de monoterpenos, é mais comum o uso de acetato de etila como solvente orgânico na extração líquido- líquido (DE CARVALHO; VAN KEULEN; DA FONSECA, 2000; LI et al., 2006; MARÓSTICA JR et al., 2009; BICAS et al., 2010; MOLINA et al., 2015).

No caso dos produtos dos processos de biotransformação do limoneno, sugere- se que a extração com solvente orgânico possa ser feita sem a separação da prévia biomassa, pois a maior parte do limoneno se concentra junto a biomassa, bem como parte dos produtos formados, apesar desses se concentrarem majoritariamente no meio de cultura (ONKEN; BERGER, 1999). A decisão quanto ao uso ou não de ambas as

partes, no entanto, vai depender da avaliação das condições específicas de cada processo.

Molina et al. (2015) obtiveram uma eficiência de extração de 42,2% de limoneno-1,2-diol obtido por biotransformação de S-(–)-limoneno, quando utilizaram extração com acetato de etila na proporção de uma parte de solvente para cada parte de meio de cultura fermentado com agitação em vórtex por 40s.

Bier et al. (2016) utilizaram uma metodologia de extração adaptada de Shashireka et al. (2008), usando uma solução de diclorometano/n-pentano (1:1) na proporção 2:1 em relação ao meio fermentado, para recuperação dos metabólitos carveol, carvona, limoneno-1,2-diol e α-terpineol, sendo o limoneno-1,2-diol o composto obtido em maior quantidade.

Harman-Ware et al. (2016) avaliaram o efeito de quatro diferentes solventes para a extração de compostos do pinheiro: hexano, hexano:acetona (1:1, v/v), hexano:dietil éter (1:1, v/v) e hexano:acetato de etila (1:1, v/v), avaliaram também o efeito de diferentes temperaturas e tempos de extração, e viram que a condição ótima foi utilizar solução hexano:acetona (1:1), a 22ºC por 1 hora, considerando os mono-, sesqui-, di e triterpenoides presentes. Os monoterpenoides presentes foram α-pineno, β- pineno, camfeno e 3-careno.

Em se tratando de extração com solventes, vários parâmetros são importantes na escolha do melhor processo, como o solvente utilizado, sua seletividade, o tempo de extração, a quantidade de extrações necessárias para maior recuperação. Além disso, o solvente tem que ser imiscível, e deve-se levar em conta sua toxicidade, o coeficiente de partição, densidade e estabilidade (UDACHAN; SAHOO, 2014). O solvente ―ideal‖ seria de baixo custo, não-tóxico, biocompatível, apresentar completa imiscibilidade com a fase aquosa, ser altamente seletivo e permitir uma fácil recuperação do produto (KIM; IANNOTTI; BAJPAI, 1999).

2.3.2 Purificação

A purificação, que também pode ser designada em outras classificações de

downstream processing como purificação de alta resolução, tem como objetivo separar

o composto-alvo de compostos cujas propriedades são semelhantes, como a estrutura e a polaridade. As técnicas mais amplamente utilizadas são as de cromatografia, porém outros métodos podem ser usados, como a cristalização.

2.3.2.1 Métodos Cromatográficos

A cromatografia é uma técnica de separação de componentes com base em propriedades físico-químicas. Um componente particiona entre duas fases que estão em contato, uma destas se mantém estacionária, enquanto a outra é móvel. As diferentes interações entre os componentes e a fase estacionária levam os componentes da amostra a migrarem de formar diferencial pelo sistema (COLLINS, 2006)

Para fins preparativos, a Cromatografia de Camada Delgada e a Cromatografia de Coluna Aberta são métodos simples e efetivos, em se tratando de purificação de monoterpenos (ÖZLEM BAHADIR, 2012). As fases estacionárias que podem ser utilizadas são diversas, tais como a sílica-gel, alumina, celulose, dextranas e poliamida. Dentre esses, o mais amplamente utilizado para compostos de baixa e média polaridade é a sílica-gel. A diferenciação enantiomérica de compostos quirais pode ser feita utilizando uma fase estacionária quiral, como a ciclodextrina, por exemplo (BERGER, 2009).

Wang et al. (2015) extraíram e purificaram, a partir do óleo essencial de Litsea

cubeba, R-(+)-limoneno, citral, α-pineno, β-pineno e linalool, utilizando uma

cromatografia de coluna aberta com sílica-gel e eluíram com uma mistura de solventes: inicalmente com hexano, passando por uma solução mista de hexano e acetato de etila e, por fim, acetona.

Madyastha e Renganathan. (1984) isolaram α-terpineol utilizando uma cromatografia em coluna aberta, utilizando sílica-gel como fase estacionária e uma solução 10% de acetato de etila em hexano como fase móvel, para a purificação dos outros terpenoides utilizaram como fase móvel soluções que variaram de 3-15% de acetato de etila em hexano, obtendo os terpenoides com graus de pureza maiores que 99,5%. Essa mesma metodologia foi adaptada para separação de limoneno e α-terpineol em estudos em nosso grupo de pesquisa (ainda não publicados).

O limoneno e o limoneno-1,2-diol apresentam diferentes coeficientes de partição em água, sendo que o limoneno apresenta forte caráter hidrofóbico, e o limoneno-1,2-diol apresenta tendência a se concentrar mais na fase aquosa, quando o solvente orgânico é bastante apolar (MOLINA et al., 2015; NEGRO et al., 2016). Dada esta diferença, supõe-se que a separação dos dois em coluna com sílica gel seja relativamente simples e tenha elevada resolução.

De Carvalho et al. (2000) usaram essa diferença na partição para a purificação de limoneno-1,2-diol. Eles desenvolveram um método para separar limoneno-1,2-diol

de limoneno-1,2-epóxido com base na partição deles em um sistema bifásico, utilizando uma extração líquido-líquido, seguida de uma cromatografia com sílica-gel e, como fase móvel, primeiro uma solução 40% de acetona em água para eluição do limoneno-1,2- diol, seguida de acetona 99% para retirada do epóxido. Após rotaevaporação da solução de acetona 40%, o diol permaneceu na solução aquosa e foi submetido a outra extração líquido-líquido com acetato de etila para posterior recuperação do composto utilizando rotaevaporação.

Em outro exemplo, Pinheiro e Marsaioli (2007) avaliaram a biotransformação de (R)-(+)-limoneno por Trichosporum cutaneum CCT 1903 e obtiveram (+)-(4R)-p-1- ment-1-ene-8,9-diol e (R)-(+)-limoneno-1,2-diol, que foram separados por cromatografia utilizando sílica-gel como fase estacionária e uma mistura de hexano:acetato de etila, na proporção 9:1, seguida da proporção 1:1, como fase móvel.

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