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A rede associativa civil e a antiga vocação do DER na prática de vínculo associativo

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1 ORIGENS DA FAVELA DO DER NO CONTEXTO DE SÃO BERNARDO DO

3.5. A rede associativa civil e a antiga vocação do DER na prática de vínculo associativo

A entidade representativa da população do núcleo é a “Associação Comunitária do DER”, que teve a frente como presidente, por muitos anos, um ex-operário do Departamento de Estradas de Rodagens, o Sr João Francisco da Silva, mais conhecido por “seu João”. A instituição funciona como articuladora mais relevante e canal mais acessível ao poder público e ante os agentes externos. Através de voluntariado de moradores o trabalho se desenrola na mobilização política como representante junto ao poder público pleiteando as benfeitorias nas áreas de uso coletivo.

Com sua sede instalada na parte urbanizada do DER agora, à rua Matutina Rocha de Campo nº 688, tem sido utilizada como caixa postal dos moradores (endereço socializado) que residem na parte ainda não urbanizada. O correio não acessa este lado da favela e a “sedinha”, comumente denominada, tem sido o endereço informado por centenas de famílias, conforme figura abaixo. O depoimento de um morador, a seguir, denota a necessidade que sentem em um dia, serem portadores de endereço próprio para correspondência, que não seja o da favela.

“- Na parte não urbanizada se dá o endereço da sedinha, o correio não chega até lá, né? No meu caso a gente dá o endereço se tem algum conhecido na avenida principal que é a avenida Maria Adelaide, e a gente dá o endereço de uma pessoa que mora na avenida, e o correio passa e entrega as cartas, né. Mas geralmente a maioria dá o endereço da sedinha. (...).Aqui do nosso lado, percebo que o comportamento, somos todo mundo iguais, né. A diferença que noto é ali tem a urbanização e aqui não tem; só isso! Ali sim, tem um endereço, e é bom né, a pessoa ter um endereço, ele se sente outra pessoa. A pessoa ter um endereço, tem uma identificação, quando a gente não tem essa identificação ... Pra Prefeitura, se você não tiver um endereço, a gente não somos ninguém. Lá nós somos desconhecidos, não temos endereço né?

Se você for comprar um negócio nas casas Bahia, vamos dizer, se não tiver um endereço, um comprovante de luz ou de banco, não vamos ser aprovados. A gente vamos ser evitados com certeza; porque a gente não tem nenhuma urbanização, não tem o nosso endereço. ”

(R.M.S., em 29/10/2017) citação do entrevistado.

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Imagem 12- Endereço socializado na “sedinha”

Fonte: O autor

Neste período de pesquisa e observação, pudemos perceber a formação de várias práticas associativas entre moradores estabelecidos na favela, pessoas com interesses comuns, ações em grupo como forma de aquisição de capital social. Há muito o DER demonstra vocação para tais práticas. A exemplo disto citamos a criação pioneira de funerais socializados: Os moradores, ante limites financeiros escassos para enfrentar situações de custas em caso de falecimento na família e não podendo arcar com despesa de seguro de vida com o benefício de auxílio funeral institucionalizado, desenvolveram um consórcio próprio, uma “caixinha” coletiva (ação criativa que atesta a riqueza cultural desenvolvida em ambiente de periferia urbana). Os contribuintes e seus parentes, em caso de morte, tinham garantidos, urna mortuária tipo “C”, flores, carro funerário, taxa de sepultamento, documentação em cartório e até as despesas de cafezinho, bolachinha e “pinga” a serem consumidos no decorrer do velório.

Imagem 13 e 14 - Funerais socializados no DER

Fonte: Diário do Grande ABC- 1962 e 1992

Os trabalhadores do DER também, para convivência e prática associativa na área de esporte e lazer, fundaram um time de futebol que se despontou como o melhor vencedor de várzea em São Bernardo, o “Esporte Clube DER”, fundado oficialmente em 15 de janeiro de

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1953, quando se concretizou a fusão de dois times formados por operários do antigo Departamento de Estradas de Rodagem: o “Extra DER” e o “São-Paulino”, que deu muitas alegrias aos moradores da favela.

Imagem 15 - Prática esportiva socializada

Fonte: O autor

Um grupo de mulheres, voltadas a prestar assistência às pessoas em situação de grande vulnerabilidade social, se uniram e fundaram o “Clube de Mães do DER”; uma Instituição Filantrópica, sem fins lucrativos, buscando desenvolver Programas e Projetos Sociais baseados no tripé econômico, social e ambiental. Cabe aqui aludir à exploração a que as mulheres sempre sofreram e em maior medida que os homens, conforme observação de Vilhena.

“As mulheres foram ainda mais exploradas do que os homens, pois sua vulnerabilidade não está apenas em um sistema vinculado à exploração econômica. Para além das contingências da exploração econômica, elas foram cerceadas para os serviços domésticos, para a maternidade não desejada, para o espaço privado, para a sujeição ao marido, aviltadas pelo estupro e dominação, independentemente de classe.67 “ (VILHENA, 2015).

Outra entidade é a Escola de Samba Unidos das Paineiras, que, em 1977, chegou a ser a campeã dos desfiles carnavalescos promovidos pela Prefeitura. (No carnaval de 1979 o acampamento foi representado também por um bloco: Os Gaviões do Morro). Como boa favela que é, o DER não poderia deixar de ter samba, capital cultural oriundo das favelas do Rio de Janeiro. Sobre o samba na favela, Nicolini alega que ele se move desde a periferia e marca o brasileiro indistintamente, como uma crítica à ordem das elites.

67 VILHENA, Valéria Cristina. “O Cenário Sócio Histórico Brasileiro no Início do século XX: O Surgimento do

Movimento Pentecostal, Frida Maria Strandberg e As Lutas das Mulheres”. Disponível em: <http://revista.faculdadeunida.com.br/index.php/reflexus/article/view/483> Acesso em: 12/01/2018

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“O Samba, como crítica à ordem das elites, cuja eficácia está em dar voz, em instituir um falante na cidade, que pondo em questão a linguagem importada, passa a constituir nossa cultura partilhada de reconhecimento e de descentramento, de equilíbrio instável em face do desdobramento do centro de gravidade social. O Samba move-se desde a periferia e marca o brasileiro indistintamente, qualquer um, contudo, sem deixar de ser periferia. O samba do bom sujeito, o samba das boas ideias, o samba das periferias que vem a ser cantado pelos poetas. O samba nascido no Brasil e que ainda nos pode revitalizar com sua originalidade criativa e periférica. ” (NICOLINI, 2017).

Dentre os diferentes interesses que unem os indivíduos para praticas associativas, a varável religião é um elemento que amplia sobejamente a possibilidade de uma pessoa se envolver em atividades associativas na periferia urbana. O morador da favela vislumbra na mensagem dos evangélicos uma oportunidade de minimizar seu sofrimento, próprio de um ambiente de vulnerabilidade social e esta esperança se amplia na prédica pentecostal face à característica de militância proselitista aguerrida que desenvolvem.

No caso dos grupos religiosos entrevistados nesta investigação, identificamos que, embora a maioria deles frequentem a igreja no mínimo 3 vezes por semana, demonstrando tendência de apego às práticas associativas, este entusiasmo não é mesmo em relação às demais atividades associativas desenvolvidas no DER por grupos tais como: Clube de Mães, Esporte Clube DER, Associação de moradores, etc. Somente 5% dos entrevistados declararam outro vínculo associativo, além da rede religiosa à que faz parte, conforme se observa em gráfico abaixo, resultante dos questionários aplicados.

Gráfico11- Participação associativas no DER

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