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3 COMPORTAMENTO DO CONCRETO SUBMETIDO A ALTAS TEMPERATURAS E COM A INCORPORAÇÃO DE RESÍDUOS DE PNEUS INSERVÍVEIS

3.1 COMPORTAMENTO DO CONCRETO SUBMETIDO A ALTAS TEMPERATURAS

3.1.3 Redução das propriedades mecânicas

Quando o concreto no estado endurecido é exposto a altas temperaturas, na ação direta do fogo, ocorrem transformações físicas e químicas que levam a uma perda de resistência mecânica do material, que abrange a diminuição da resistência à compressão, do módulo de elasticidade, ocorrência de fissuração e desplacamento. (CASTELLOTE et al., 2004; FERNANDES et al., 2017).

Lima (2005) faz uma clara reflexão indicando que o ponto-chave do comportamento do concreto em altas temperaturas é que ele deve permanecer intacto, sem sofrer fissuração ou desplacamentos explosivos, de forma que as camadas mais externas continuem atuando como barreira térmica, protegendo as camadas mais internas e as armaduras.

De forma geral, as propriedades mecânicas do concreto variam com um comportamento decrescente de acordo com o aumento de temperatura no interior do material, sendo a intensidade dessa variação vinculada à taxa de aquecimento e ao tempo em que ocorrem as ações térmicas externas causadas pelo fogo. (COSTA; BRITEZ, 2011).

Hager (2013) complementa com outros fatores que afetam o nível de dano ao concreto exposto a altas temperaturas, sendo estes: temperatura máxima atingida no concreto, tempo de exposição a elevadas temperaturas, carga aplicada durante o aquecimento, teor de umidade do material, dentre outros fatores.

Neste contexto, as alterações físicas e químicas, que provocam mudanças na pasta cimentícia e nos agregados quando expostos a altas temperaturas, reforçam que a retração térmica, a fissuração e a ruptura da interface entre a matriz e o agregado contribuem para a perda da resistência mecânica.

O aquecimento do concreto provoca o aumento do volume dos agregados, causando a retração da pasta de cimento que o cerca. Como resultado, a ligação do agregado e da pasta de cimento se torna um ponto fraco no material compósito aquecido. Em grande parte, os danos ao concreto são causados por fissuras que

ocorrem devido a tensões térmicas incompatíveis entre os agregados e a matriz cimentícia. (HAGER, 2013).

Neville (2016) explica que, para fins práticos, a temperatura próxima de 600 °C pode ser considerada a temperatura limite para manter a integridade estrutural do concreto produzido com cimento Portland. O autor ressalta que a temperatura relevante nessa análise é a temperatura do próprio concreto, não das chamas ou dos gases.

O Gráfico 6 apresenta a diminuição da resistência à compressão do concreto convencional em função da temperatura e do tipo de agregado, mostrando que, em 600 °C, o percentual de redução de resistência à compressão é cerca de 45% para agregados silicosos e 60% para agregados calcários. Silva (2012) também comenta que os agregados silicosos têm comportamento inferior quando expostos ao fogo.

Gráfico 6 – Diminuição da resistência à compressão do concreto convencional em função da temperatura e do tipo de agregado

Fonte: Adaptado de Denoël (2007).

Khoury et al. (2007) esclarecem que a resistência à compressão é a propriedade mais testada do concreto quando submetido a altas temperaturas, uma vez que essa propriedade é vital para o projeto estrutural e geralmente fornece uma impressão geral da qualidade do material.

Observando um estudo sobre o concreto exposto em altas temperaturas, comparando resistência à compressão e resistência à tração por compressão diametral residuais, Neville (2016) elucida que a perda na resistência à tração por compressão diametral é similar à perda da resistência à compressão.

Fator d e r e d u ç ã o d a r e s is tê n c ia à c o mpr e s s ã o Temperatura (°C) Agregados calcáreos Agregados silicosos

Em relação ao módulo de elasticidade do concreto, Neville (2016) pontua que é fortemente afetado pelo aumento da temperatura, ocorrendo uma redução progressiva dessa propriedade entre cerca de 500 a 800 °C.

Lima (2005) aponta que o concreto terá seu comportamento melhorado em relação ao calor quando os agregados possuírem baixo coeficiente de dilatação térmica, o concreto for bem compactado, possuir baixa condutividade térmica, baixa umidade e alta resistência à tração.

3.1.4 Desplacamento

O desplacamento, ou spalling, é o fenômeno violento ou não violento de desprendimento de lascas ou pedaços do concreto da superfície de um elemento estrutural quando exposto a altas temperaturas e a rápidas taxas de aquecimento, como um cenário de incêndio. (COSTA; BRITEZ, 2011; KHOURY et al., 2007).

Tutikian e Ribeiro (2018) complementam o conceito do desplacamento descrevendo-o como um fenômeno semidestrutivo com origem na distribuição não uniforme de temperatura na seção e na quantidade de água evaporável do concreto.

Para avaliar a gravidade do desplacamento, três classes foram definidas por Ali et al. (2004), sendo elas: menor grau, maior grau e grau severo. Menor grau é descrito quando o desplacamento limita-se ao cobrimento, na superfície do concreto, sem exposição das armaduras. A categoria de maior grau abrange a exposição das armaduras. Já o grau severo implica o desplacamento em grandes profundidades, além do alinhamento das armaduras e com alta energia explosiva.

A Fédération Internationale du Béton (KHOURY et al., 2007) categoriza o desplacamento em seis grupos, sendo: o desplacamento nos agregados, o explosivo, da superfície do concreto, nos cantos e quinas, durante o resfriamento e o desplacamento completo do elemento estrutural.

Os autores destacam que o desplacamento explosivo é considerado o mais sério e preocupante dos desplacamentos em uma situação de incêndio, pois poderia resultar na remoção de cerca de 25 a 100 mm da superfície de concreto de um elemento estrutural.

Em relação ao tempo de ensaio em que geralmente é registrado o desplacamento, Khoury et al. (2007) elucidam que a ocorrência superficial nos agregados e o tipo explosivo ocorrem entre 7 e 30 minutos de ensaio. Ao ensaiarem

resistência ao fogo de pilares de concreto, Ali et al. (2004) registraram desplacamento explosivo durante os primeiros 45 minutos de ensaio.

Em relação à temperatura em que geralmente é registrado o desplacamento, Tutikian e Ribeiro (2018) indicam a ocorrência de desplacamentos superficiais entre 250 e 420 °C, sendo que Khoury et al. (2007) apontam a ocorrência do desplacamento entre 100 e 300 °C. Conforme o Quadro 9, essas temperaturas elencadas estão relacionadas à desidratação da pasta de cimento endurecida.

Kalifa, Menneteau e Quenard (2001) explicam que o desplacamento resulta de dois processos principais: o primeiro está relacionado aos gradientes de dilatação térmica, ocorrendo no elemento estrutural, denominado processo termomecânico. O segundo, processo termo-hidráulico, está associado à transferência de massa (ar, vapor, água líquida) na rede porosa, que resulta na acumulação de pressão nos poros. Portanto, os autores ponderam que o desplacamento é um processo combinado: térmico, hidráulico e mecânico.

Alguns fatores são citados por múltiplos autores como influentes no desplacamento do concreto, como taxa de aquecimento superficial, água livre interna, porosidade, teor de umidade, natureza e granulometria do agregado, idade do elemento estrutural, temperatura máxima atingida, forma e tamanho da seção transversal, presença de fissuras, taxa de aço, arranjo das armaduras e presença de fibras. (COSTA; BRITEZ, 2011; KHOURY et al., 2007; KITCHEN, 2001; TUTIKIAN; RIBEIRO, 2018).

A discussão térmica, hidráulica e mecânica acerca do desplacamento e das características isoladas ou combinadas que propiciam a manifestação do fenômeno é bastante extensa. Desta forma, esta seção enfatizou fatores ligados ao desplacamento que possuem maior relação com o programa experimental proposto. Neville (2016) cita a influência do teor de umidade, sendo que a umidade excessiva no momento da exposição ao fogo é prejudicial ao concreto, pois favorece o desplacamento. O autor esclarece que, quanto menor for a permeabilidade do concreto e maior for a velocidade de elevação da temperatura, maior será o risco de lascamento explosivo.

Kalifa, Menneteau e Quenard (2001) adicionam que, embora a permeabilidade seja um parâmetro-chave, o seu efeito está correlacionado com o conteúdo inicial de água.

Neste contexto, ao estudar a influência do teor de umidade na resistência ao fogo de placas maciças pré-fabricadas de concreto, Moreira (2017) observou que os menores teores de umidade estavam presentes em amostras com idades de cura mais elevadas, apresentando melhor desempenho quando submetidos a altas temperaturas. As idades de cura ensaiadas pelo autor foram 7, 14, 28, 56 e 84 dias.

Costa e Britez (2011) esclarecem que os experimentos envolvendo concreto submetido a elevadas temperaturas deveriam ser realizados em amostras com pelo menos um ano de idade, para que o teor de umidade, a maturidade e o grau de hidratação sejam mais compatíveis com as edificações de concreto existentes e em pleno uso.

A porosidade, a permeabilidade e a distribuição dos poros estão relacionadas à facilidade de transporte do fluido. A interconectividade dos poros é mais relevante na compreensão do desplacamento do que a porosidade total ou as dimensões dos poros. Já a permeabilidade do elemento é influenciada pelo tipo e pelas condições de cura do concreto, bem como pela relação a/c da mistura. (TUTIKIAN; RIBEIRO, 2018). Assim, pode-se entender que, quanto maior for a relação a/c da mistura, maior a porosidade do concreto e maior a facilidade com que ocorre a transferência de ar, vapor e água líquida entre os poros. Esse exemplo demonstra uma situação de menor risco de desplacamento do concreto em um incêndio.

Em relação ao uso de fibras no concreto, diversos autores citam o uso de fibras de polipropileno para prevenção de desplacamento explosivo. Sob temperaturas relativamente baixas, estágio inicial do incêndio, as fibras de polipropileno derretem, deixando uma rede de canais orientada aleatoriamente dentro do concreto, o que ajuda o vapor a escapar e a aliviar a pressão no interior do concreto, evitando desplacamento explosivo. (ALI et al., 2004; KITCHEN, 2001; MAZZUCCO; XOTTA, 2016).

Costa e Britez (2011) ponderam que o desplacamento não é um mecanismo de falha ou de colapso estrutural do elemento. O fenômeno pode ser leve ou severo e, consequentemente, conduzir ou não a uma rápida perda de seção transversal, o que poderia desencadear um mecanismo de colapso estrutural como falhas ocasionadas por flexão ou cisalhamento.

Entre os prejuízos ocasionados por spalling, Lima (2005) destaca os danos causados ao sistema de compartimentação contra o fogo em edificações, no qual a abertura de orifícios em lajes ou painéis permite a passagem da chama para o outro

ambiente e, consequentemente, o alastramento do incêndio. O autor complementa que, caso as armaduras fiquem expostas, a ação da alta temperatura é acelerada com a condução de calor desses elementos metálicos, e a resistência da seção decairá instantaneamente, sendo as vigas e as lajes os elementos mais suscetíveis de serem afetados dessa maneira.