• Nenhum resultado encontrado

Capítulo II – TRABALHO NO BRASIL E REFUGIADOS: condições objetivas na

2.2 Reestruturação produtiva no Brasil

Durante os anos 1980, quando o Brasil ainda estava distante do neoliberalismo e do processo de reestruturação produtiva, começaram a acontecer as primeiras mudanças organizacionais e tecnológicas nos processos de produção e de prestação de serviços

[...] Nesses primeiros anos da década de 1980, a reestruturação produtiva caracterizou-se pela retração de custos, mediante a redução da força de trabalho, de que foram exemplos os setores automobilístico e autopeças, e também os ramos têxtil e bancário, entre outros (ANTUNES, 2009:18).

Na década seguinte, com o governo de Fernando Collor (1990-1992) e, posteriormente, de Fernando Henrique Cardoso (1995-2003), que governaram utilizando o receituário neoliberal, aconteceram as transformações no processo produtivo, na gestão e nas relações de trabalho característicos da reestruturação produtiva do capital (ainda que com elementos do fordismo), gerando no mundo do trabalho nacional as mesmas consequências que causou em outros países, já que

[...] O ideário neoliberal baseia-se na fundamentação da necessidade de reorganização do modo produtivo, exigindo sua reestruturação para formas mais flexibilizadas e desregulamentadas, com menor intervenção do Estado nas relações de mercado e na proteção trabalhista e, com isso, traz como consequência a fragilização e a fragmentação da organização sindical (GUERRA, 2017:58).

Podemos dizer, então, que a reestruturação produtiva gerou uma precarização do mundo do trabalho no Brasil, e trouxe modificações que afetaram drasticamente a vida dos trabalhadores e as relações de trabalho. O sindicalismo, por exemplo, que nos anos 1980 era forte, foi afetado pelas “[...] tendências econômicas, políticas e ideológicas que foram responsáveis na década de 90 pela inserção do sindicalismo brasileiro na onda regressiva (ANTUNES, 2010:235). As diversas modalidades de trabalho precarizado – subproletariado, terceirização, baixos salários, subemprego – também cresceram e os direitos trabalhistas foram desmantelados no governo de Fernando Henrique Cardoso, após muitos anos de lutas para serem conquistados.

Para além da precarização, estão as exigências do mercado, que agora exige um trabalhador mais qualificado e apto a trabalhar com as novas tecnologias e sistemas de informação. Os trabalhadores, que necessitam sobreviver, precisam estar continuamente aprendendo e se adaptando a novos espaços e funções, num ciclo que condiciona esses indivíduos a uma situação de insegurança permanente e que pode levá-los ao desemprego se não forem considerados “úteis” ao sistema de produção.

[...] a combinação entre padrões produtivos tecnologicamente mais avançados e uma melhor “qualificação” da força de trabalho oferece como resultante de um aumento da superexploração da força de trabalho, traço constitutivo e marcante do capitalismo implantado em nosso país (ANTUNES, 2009:19)

O processo de reestruturação produtiva afeta de forma crítica os direitos do trabalhador e o mundo do trabalho, que, no Brasil, apresenta uma realidade perversa. Aqueles que buscam por emprego acabam se submetendo à realidade da precarização e suas condições, que não oferece outra alternativa ao trabalhador. Além disso, “[...] atingimos uma fase do desenvolvimento histórico do sistema capitalista em que o desemprego é a sua característica dominante” (MÉSZÁROS, 2009:31), e o exército de reserva, que já é alarmante, tende a aumentar na mesma

proporção dos avanços tecnológicos e alterações no modo de produção que extinguem postos de trabalho e lançam os trabalhadores ao mercado informal, ao desemprego e a lutas por sobrevivência muitas vezes desumanas.

[...] Os obstáculos reais enfrentados pelo trabalho, no presente e no futuro próximos, podem ser resumidos em duas palavras: “flexibilidade” e “desregulamentação” [...] pois a “flexibilidade” em relação às práticas de trabalho – a ser facilitada e forçada por meio da “desregulamentação” em suas variadas formas – corresponde, na verdade, à desumanizadora precarização da força de trabalho. (MÉSZÁROS, 2009:33/4)

Essa breve análise das mudanças no mundo do trabalho, especialmente no Brasil, é de fundamental importância para prosseguirmos com o estudo acerca das condições enfrentadas pelos refugiados na busca por trabalho no país

[...] pois é por meio do trabalho que se determinam e concretizam as condições objetivas de vida das famílias (moradia, alimentação, saúde, educação, acesso ao lazer...), interferindo em questões relacionais (convivência familiar, relações de cuidado, afeto e autoridade, relações de gênero e geração...) e, ainda, na sociabilidade (acesso à informação, cultura, convivência social, construção de projeto de vida, cidadania...), ou seja, as condições de vida e trabalho determinam padrões e parâmetros de que tipo de vida em sociedade, que forma de sociabilidade estamos construindo, que cidadania (ou não) ofertamos que espelha graus de civilidade e/ou de barbárie (GUERRA, 2017:64).

Devemos considerar também as informações sobre o desemprego e a realidade objetiva que se apresenta durante o processo de tentativa de inserção no mercado laboral brasileiro, bem como quem são esses refugiados e como se apresentam na relação com o trabalho.

De acordo com o Ministério da Fazenda, o Brasil tem uma população economicamente ativa (PEA) de 61,6% de seus habitantes. Segundo o IBGE, no terceiro trimestre de 2018, o país apresentava, entre essa população, os seguintes dados:

11,9% de desempregados: pessoas que não trabalham, mas procuraram empregos nos últimos 30 dias;

6,5 % de subocupados: pessoas que trabalham menos de 40 horas por semana, mas gostariam de trabalhar mais;

6,2 % de pessoas que poderiam trabalhar, mas não trabalham (força de trabalho potencial): grupo que inclui desalentados (que desistiram de procurar emprego, mas

aceitariam trabalhar se lhes fosse oferecida uma vaga) e pessoas que podem trabalhar, mas que não têm disponibilidade por algum motivo, como mulheres que deixam o emprego para cuidar os filhos.

As tabelas abaixo mostram os números acima descritos, coletados em pesquisa do IBGE10 divulgada em 14 de novembro de 2018, com dados do 3º trimestre deste ano.

Quadro nº 9 - Taxas de desemprego nos 3 (três) primeiros trimestres de 2018

Fonte: IBGE

Quadro nº 10 - Taxas de desemprego somadas às de subocupação nos 3 (três) primeiros

trimestres de 2018

Fonte: IBGE

10 A tabela 4099 do IBGE apresenta dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua Trimestral (PNAD), que coleta informações sobre trabalho e outros indicadores, trimestralmente, em domicílios dos estados brasileiros.

Quadro nº 11 - Taxas de desemprego somadas às de força de trabalho potencial nos 3

(três) primeiros trimestres de 2018

Fonte: IBGE

Os números apresentados descortinam a realidade no Brasil no que se refere à falta de postos de trabalho e das questões econômicas que essas pessoas desempregadas/subempregadas enfrentam, bem como um alto número de indivíduos que, por falta de melhores condições objetivas de vida, fica impedido de sequer tentar uma vaga de emprego. Números que revelam a dramática realidade brasileira, de mais de 13 milhões de pessoas desempregadas/precarizadas no acesso ao trabalho no Brasil.

Devemos considerar, ainda, as taxas de desemprego apresentadas em cada região do Brasil, reveladas na tabela abaixo, e como elas se relacionam com os números mostrados anteriormente no quadro nº 8, referente à quantidade de solicitantes de refúgio por estado, que aponta uma quantidade maior desses indivíduos nas regiões sudeste, com 31% das solicitações, e a região norte, com 57%.

Quadro nº 12 – Taxa de desemprego por região do Brasil, nos 3 (três) primeiros

semestres de 2018

Esses dados desvelam, portanto, um possível agravamento nos obstáculos encontrados durante a procura por emprego, por brasileiros e estrangeiros, nos lugares onde há maior concentração da população de refugiados e solicitantes de refúgio.

Dentro da atual realidade de crise do Brasil, sem alternativas políticas frente a esse número de desempregados, a luta dos refugiados para conseguir trabalho nas regiões do país onde passaram a viver é árdua e enfrenta muitos obstáculos e barreiras a serem transpostas, as quais procuraremos analisar a seguir.

Documentos relacionados