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ONDAS E ENSAIOS ACÚSTICOS

2.3 FENÓMENOS QUE OCORREM COM A PROPAGAÇÃO DE ONDAS

2.3.2 Reflexão e refracção

Segundo a teoria da reflexão das ondas, quando uma onda que se propaga num material encontra uma interface é reflectida e refractada. A reflexão das ondas elásticas ocorre de modo semelhante ao das ondas de luz por um espelho: o ângulo de incidência é igual ao ângulo de reflexão. A incidência de uma onda P ou da componente vertical (pa- ra fora do plano) de uma onda S (também representada por SV) numa fronteira gera qua- tro ondas: duas SV e duas P. A incidência da componente horizontal das ondas S (tam- bém representadas por SH, oscilação no plano) gera duas ondas SH (uma reflectida e uma refractada). A Figura 2.11 faz uma síntese deste fenómeno.

Figura 2.11 – Reflexão e refracção: de uma onda P (imagem à esquerda); das componentes vertical, SV, (imagem do meio) e da componente horizontal, SH, de uma onda S (imagem à direita) (Richart, et al., 1970).

A Equação 2.22 relaciona os ângulos das ondas incidentes, reflectidas e refracta- das de acordo com o apresentado na Figura 2.11.

2 2 1 1

)

(

)

(

)

(

)

(

S P S P

V

f

sen

V

e

sen

V

b

sen

V

a

sen

Equação 2.22

A amplitude das ondas reflectidas depende da impedância acústica dos materiais. Esta propriedade relaciona-se com a densidade do material e com a velocidade de pro- pagação do tipo de ondas que se pretende estudar. Maiores impedâncias acústicas estão associadas a maiores densidades dos materiais, logo a maiores velocidades das ondas elásticas. A impedância de um meio é dada pela Equação 2.23:

C

Z



Equação 2.23

Onde:

Z

– impedância acústica;

- densidade;

C

– velocidade das ondas cuja impedância se pretende calcular.

No Quadro 2.1 apresentam-se algumas das impedâncias acústicas específicas de alguns materiais.

Em termos práticos, quando uma onda se propaga num determinado meio (meio 1) e encontra uma interface com outro meio (meio 2), a quantidade de energia reflectida se- rá maior se a impedância do meio 1 for muito superior à impedância do meio 2. A quanti- dade de energia reflectida depende, para além da impedância dos meios de propagação, (a) do ângulo de incidência, (b) da distância desde a interface até ao emissor e (c) da atenuação da onda ao longo do seu percurso (Carino, 2004).

Meio 1

Quadro 2.1 – Impedâncias acústicas específicas de alguns materiais; adaptado de (Carino, 2004).

Material Densidade (kg/m3) Velocidade das Ondas P (m/s)

Impedância Acústica especí- fica (kg/m2.s) Ar 1.205 343 0.413 Betão 2300 3000-4500 6.9-10.4x106 Granito 2750 5500-6100 15.1-16.8x106 Calcário 2690 2800-7000 7.5-18.8x106 Mármore 2650 3700-6900 9.8-18.3x106 Quartezito 2620 5600-6100 14.7-16.0x106 Solo 1400-2150 200-2000 0.28-4.3x106 Aço 7850 5940 46.6x106 Água 1000 1480 1.48x106

A amplitude de uma onda reflectida numa dada interface é máxima se a onda inci- dente formar um ângulo de 0º com a perpendicular a essa interface (a=0 na Figura 2.11). A Equação 2.24 apresenta a relação entre a amplitude de uma onda incidente e a ampli- tude de uma onda reflectida segundo um ângulo de 90º (normal) com uma interface (Carino, 2004). Verifica-se que o coeficiente de reflexão Rn tende para -1 (reflexão total da onda; o sinal menos corresponde à alteração de sentido da onda reflectida em relação à onda incidente) com o aumento de Z1 e/ou a diminuição de Z2.

1 2 1 2

Z

Z

Z

Z

R

n

Equação 2.24 Onde:

R

n – coeficiente de reflexão para um ângulo de incidência perpendicular; 

Z

1 - impedância acústica específica do meio original;

Z

2 - impedância acústica específica do meio vizinho.

A título de exemplo, considere-se uma onda que se propaga no granito e que en- contra uma interface com o ar; considere-se ainda que o ângulo de incidência da onda com essa interface é perpendicular (a=0, de acordo com a Figura 2.11). Substituindo as

constantes Z1 e Z2 da equação Equação 2.24 tendo por base os valores correspondentes aos materiais referidos que constam do Quadro 2.1 (Z1=15.1x106; Z2=0.0413), obtém-se um valor de Rn=-1. Este resultado significa que a energia da onda incidente é reflectida, praticamente na sua totalidade e que a nova onda tem sentido oposto à onda incidente.

No exemplo apresentado, a energia da onda reflectida é elevada porque a impe- dância do meio de propagação da onda incidente é muito superior à impedância do meio de propagação vizinho (Z1 >> Z2). No caso de se verificar a situação oposta, ou seja, de a impedância do meio 1 ser muito inferior à impedância do meio 2, a onda, seria refractada, praticamente na sua totalidade (Rn=1). Numa situação intermédia, parte da onda seria reflectida e outra parte refractada.

Quando o ângulo de incidência numa interface não é normal à interface (a≠0) o procedimento para o cálculo das ondas reflectidas não é tão imediato. Imagine-se uma onda P que se propaga no granito e incide numa interface granito/ar segundo um ângulo de 30º com a normal a essa interface (a=30º). O cálculo dos ângulos das ondas reflecti- das pode ser realizado utilizando a Equação 2.22, tendo como referência que Vp=5500m/s e Vs=0.62xVp. O ângulo a que a onda S será reflectida (identificado por b na Figura 2.11) será de cerca de 18º. Contudo, não se conhece a quantidade de energia das ondas reflectidas.

Um fenómeno similar ao ilustrado para a reflexão de ondas em interfaces granito/ar também ocorre quando uma onda se cruza com defeitos, por exemplo, vazios nos mate- riais. A dimensão mínima para que um vazio seja “detectado”, isto é, para que se dê a reflexão das ondas que sobre ele incidem, depende da relação do comprimento da onda emitida com a dimensão desse vazio. Como regra geral, a dimensão do vazio deve ser maior ou igual ao comprimento da onda que se propaga (Carino, 2004). Por exemplo, pa- ra que um vazio com 0.2m de diâmetro existente num corpo de betão (vP=4000m/s) seja detectado, é necessário que a frequência da onda emitida seja no mínimo f=20kHz (o comprimento de onda (λ) é igual ao quociente entre a velocidade (v) e a frequência (f) das ondas propagadas, ou seja, λ=v/f).

Se uma onda tiver um comprimento superior à dimensão do objecto a detectar, re- flectir-se-á de uma forma mais reduzida nesse objecto, o que torna mais difícil essa “de- tecção”. Por outro lado, quanto menor o comprimento de onda, melhor se podem detectar objectos de pequenas dimensões. A posição de um objecto pode ser determinada atra- vés da reflexão de uma onda, com uma incerteza igual ao comprimento da onda emitida (Carino, 2001).

De uma outra perspectiva, para que um vazio seja transponível pelas ondas acústi- cas, estas devem ter um comprimento de onda superior à dimensão do vazio. Isto explica o sucesso que as ondas de frequência mais baixa (como as utilizadas nos ensaios sóni- cos) sejam mais utilizadas em materiais heterogéneos. A explicação para este facto resi-

de na facilidade que as ondas de menor frequência têm em transpor os obstáculos pró- prios dos corpos heterogéneos. Entende-se, assim, porque razão os ensaios sónicos são tantas vezes utilizados na caracterização de alvenarias (material heterogéneo) em detri- mento dos ensaios ultra-sónicos, cujos sinais, frequentemente, não são capazes de viajar desde o emissor até ao receptor. Por outro lado, também se entende porque razão se privilegiam os métodos com maiores frequências (sempre que estes se podem utilizar): a incerteza que lhes está associada é menor já que o seu comprimento de onda é menor (a incerteza é igual ao comprimento da onda utilizada).