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1. CAPÍTULO Metodologias participativas para elaboração de materiais educativos

1.3. A Bacia Hidrográfica como temática em materiais educativos

1.3.1. Reflexões sobre a temática nos três casos estudados

O uso do conceito de Bacia Hidrográfica é defendido no campo da Ecologia para além dos estudos acadêmicos, como sendo o limite para trabalhar as questões ecológicas, sociais e políticas. Um dos pesquisadores mais respeitados no campo da Ecologia defende que:

O conceito de Bacia Hidrográfica ajuda a colocar em perspectiva muitos dos nossos problemas e conflitos. Por exemplo, as causas e as soluções da poluição da água não serão encontradas olhando-se apenas para a água; geralmente, é o gerenciamento incorreto da bacia hidrográfica que destrói nossos recursos aquáticos. A bacia de drenagem inteira deve ser considerada a unidade de gerenciamento. (ODUM, 1971. p.39)

A escolha de bacia hidrográfica como unidade temática dos materiais ocorreu por diferentes razões nos três projetos. Porém, é possível corroborar a ideia de Ab´Saber (1987) quando diz que o estudo da bacia hidrográfica possibilita uma visão sistêmica e integrada do ambiente, sobretudo devido à clara delimitação da mesma e à natural interdependência dos processos climatológicos, hidrológicos e geológicos que nela ocorrem, considerando, ainda, que sobre esses subsistemas atuam as forças antropogênicas e que neles as atividades e os sistemas econômicos, sociais e biogeofísicos interagem.

Santos et. al (2011) sugerem a Bacia Hidrográfica como unidade de ensino para iniciar um trabalho de interação educativa em Educação Ambiental e é exatamente isso que aparece em um dos trechos da entrevista de um dos projetos:

[...] Era trazer o conceito de Bacia Hidrográfica como um conceito integrador e útil pro dia a dia do educador ambiental. (...) uma das coisas é trazer informações sobre a bacia do Pisca, mas na verdade é uma coisa secundária. O foco é ‘Como trabalhar a Educação Ambiental a partir do conceito de Bacia Hidrográfica?’. É um conceito que ajuda a entender que tá tudo conectado” (E2P2).

A entrevistada e o entrevistado do Projeto 2 trouxeram a concepção e a conceitualização de bacias hidrográficas de um histórico de trabalho de 10 anos na bacia. Assim como a entrevistada do Projeto 1, que vem de uma ONG que trabalhou

com o conceito de bacia anteriormente para elaborar outro material. Mas no caso do Projeto 1, a entrevistada traz o conceito de bacia como um recorte para o trabalho educativo. Trazendo mais a questão física do território do que as questões ecológicas, econômicas e sociais envolvidas no conceito, a entrevistada afirma que:

“Foi porque a gente já trabalha com Bacias. Nossas unidades geográficas são bacias. É a Bacia do rio Jaú, Bacia do Tiete- Jacaré. É uma estratégia.[...] O meu doutorado, por exemplo, é com outra unidade geográfica que são as áreas protegidas. [...] o recorte foi a partir dai, desse olhar em torno de uma unidade geográfica que seriam as Bacias” (E1P1). 

Ao considerarmos que o território é a parte passível de interação física em contraponto a dimensão abstrata do conceito de bacia talvez a estratégia de explorá-lo inicialmente como unidade geográfica, para, a partir daí trabalhar as dimensões da Educação Ambiental evite a impressão de utilizar o conceito de bacia de forma superficial. O Projeto 3, por exemplo, escolheu o conceito como área de trabalho não por já trabalhá-lo como unidade, mas por trabalhar com outra unidade, a política, por bairros dentro da bacia.

O trabalho educativo com Bacias Hidrográficas pode aproveitar desde aspectos geográficos, históricos, ambientais e sociais. Acreditamos que por ser um conceito holístico permite um leque de oportunidades de aprendizagem. Segundo Oliveira (2002, p.126) “(...) a utilização da bacia hidrográfica como unidade de estudo e análise, a partir da qual se darão as diversas etapas do processo educativo e das ações originadas a partir deste, é extremamente relevante”. Ao mesmo tempo, não podemos negar a dificuldade de compreensão por ser um conceito abstrato. A dificuldade dos materiais é justamente colocar um conceito de forma que abra possibilidades e se torne mais palpável para educadoras/educadores e para educandas/educandos. Os dois trechos abaixo destacam a dificuldade de representar uma bacia.

“Desde os desenhos. ’ Olha isso aqui não existe[...]. Porque, como é que é uma Bacia Hidrográfica? ’Teve que ter essa formação sobre Bacia Hidrográfica com os fornecedores (ilustradores). Então, ‘como é a Bacia Hidrográfica?’ E a gente dizia, e ai eles iam atrás” (E1P2). “Eu lembro [...] que o mais difícil foi o desenho da Bacia Hidrográfica (risos). A gente não gostava. ‘Não. Não tá bom’ e a gente mandou ele (ilustrador) refazer umas quinhentas vezes[...] eu lembro que a gente

falou ‘tá bom, desisto. Esse aqui tá bom’. [...] e ele falou ‘mas como eu vou fazer uma Bacia Hidrográfica pra ilustrar?’”(E1P3).

 

  As dificuldades apresentadas pelo conceito podem ser trabalhadas para enriquecer o processo educativo, pois segundo Oliveira (2002, p. 126), o conceito dentro da proposta educativa “permite construir vias de superação da convicção de que a fragmentação do conhecimento, fruto da parcelização da realidade em disciplinas ou campos do saber, seja essencial ou a única forma de aprendizagem”. Nesse sentido, o conceito de bacias deve permitir que as diferentes áreas se conectem para a compreensão do todo. Não que isso seja uma tarefa simples, como destacado no trecho abaixo, já que pressupõe uma postura dialógica e geradora de autonomia.

“E foi muito difícil [...]essa coisa de conectar o tema da pessoa com a Bacia Hidrográfica e com a Bacia do Pisca. [...] A gente desafiava e perguntava: ‘E o que isso tem a ver com bacia?’É muito difícil a pessoa conseguir conectar. Algumas conseguiram conectar e outras não” (E2P2).

 

Para finalizar essa reflexão, destaco um trecho da fala do entrevistado do Projeto 2, que provavelmente pelo histórico teórico-prático coloca de forma bem sucinta a relação da unidade política e da unidade ecológica, em detrimento das decisões políticas.  

“A Bacia Hidrográfica [...] é a maior das revisões políticas, né? [...] dá vontade de rever a divisão política instalada. E acho que a maior questão política interna é “vamos começar a pensar por Bacia Hidrográfica?”(E1P2)

  Colocar questionamentos estruturantes relacionados com a qualidade ambiental preterida é fundamental para o diálogo entre os diversos atores da sociedade. Não são aspectos fáceis de trabalhar em ações educativas, representando um desafio maior na elaboração de materiais.