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Região semiárida do nordeste brasileiro: bioma Caatinga

A região semiárida brasileira possui inúmeros ambientes, com heterogeneidade de vegetação, clima e condições edáficas. É localizada quase exclusivamente no nordeste do Brasil, englobando uma parte de Minas Gerais. Partindo de 3-17ºS a 35-45ºW, cobre aproximadamente 8% do território brasileiro, ocupando uma área de aproximadamente 900.000 km2 (GIULIETTI et al., 2006) (figura 3.1).

Figura 3.1 - Mapa político-administrativo mostrando o semiárido brasileiro delimitado pela linha amarela Fonte:Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2007)

De acordo com o índice de aridez (IA), adotado pelo Programa Ambiental das Nações Unidas (United Nations Environmental Programme – UNEP (2007)), que reflete a razão entre precipitação e potencial de evapotranspiração, regiões semiáridas são consideradas com IA de

0,2 a 0,5 e chuva de 200 a 800 mm. Para ter uma ideia, considerando-se os dois extremos, regiões hiper áridas possuem IA < 0,05 e precipitação < 200 mm, enquanto regiões úmidas possuem IA > 1 e precipitação > 2000 mm.

O clima faz parte de um dos sistemas mais complexos do mundo, devido não apenas à extensão da área, mas também ao sistema de ventos provenientes do Nordeste e Sudeste, criando uma instabilidade nos padrões de chuva que são concentrados em alguns meses do ano. Há grande variação na precipitação anual para a zona semiárida e costeira, flutuando de 300 a 2000 mm, respectivamente. Essas condições particulares são as responsáveis pela grande diversidade de tipos vegetacionais que caracterizam o semiárido (GIULIETTI et al., 2006).

A Caatinga, palavra derivada do tupi (“Kaa” = Mata, Floresta; “Tinga” = Branca), representa um bioma singular de 735.000 km2 e constitui um tipo de vegetação característico do semiárido. O estrato arbóreo é relativamente baixo (até 5 m de altura), não apresenta um dossel contínuo, as árvores e os arbustos têm caule fino, espinhoso e são decíduos na época seca. Com relação à pluviosidade, a vegetação predominante em áreas menos secas de Caatinga é denominada de vegetação hipoxerófila e em áreas onde a seca é acentuada, de Caatinga hiperxerófila (SÁ, RICHÉ e FOTIUS, 2003). Algumas famílias botânicas encontram-se bem representadas como as cactáceas, leguminosas e as euforbiáceas (QUEIROZ, 2006).

A família Cactaceae contém representantes que se encontram distribuídos em regiões áridas e quentes, sendo mais notáveis no sudoeste dos Estados Unidos e México, leste brasileiro e nos Andes Sul-Americanos (BARTHLOTT; HUNT, 1993). Entre as cactáceas, é possível observar características evolutivas incomuns, como as modificações nas estruturas vegetativas - perda ou redução das folhas; o córtex e a medula são transformados em um tecido próprio para o armazenamento de água; os ramos laterais são transformados em agrupamentos de espinhos centrais e radiais denominados aréolas (figura 3.2). Eles podem ter o tronco cilíndrico ou colunar, ramificado ou sem ramificações, segmentado ou não segmentado e alguns ainda podem ser globosos com a forma de uma esfera (ANDERSON, 2001). Existem quatro subfamílias. A subfamília Cactoideae, encontra-se dividida em nove tribos. A tribo Cereeae possui representantes distribuídos na América do Sul, com grande representatividade no Brasil, sendo o Nordeste o centro da diversidade (TAYLOR, 1997). Podem ser encontrados na forma arbórea ou arbustiva, com troncos não segmentados, alongados ou globosos, estriados e com muitos espinhos. As flores nascem lateralmente e podem ser noturnas ou diurnas e os frutos são bem carnudos e podem ser deiscentes ou

indeiscentes (ANDERSON, 2001). Há cinquenta e oito espécies registradas para a Caatinga, sendo quarenta e duas endêmicas. Algumas espécies representantes desta tribo são: Cereus jamacaru, conhecido como mandacaru; Pilosocereus gounellei, o xique-xique e Melocactus sp., o cabeça-de-frade (TAYLOR; ZAPPI, 2002).

Figura 3.2 - Desenho esquemático de uma parte do tecido de uma cactácea, mostrando as flores laterais e as aréolas constituídas por longos espinhos

Fonte: Modificado de Anderson (2001)

De acordo com Anderson (2001), Cereus jamacaru é amplamente distribuído pelo nordeste brasileiro. Possui porte arbóreo, com inúmeros galhos (figura 3.3). O tronco é cilíndrico e possui de quatro a seis costelas chanfradas, dois a quatro espinhos centrais com 8 a 20 cm de comprimento e cinco a sete espinhos radiais de 1,5 cm de comprimento. As flores são grandes e brancas e os frutos avermelhados (figura 3.4).

A espécie Pilosocereus gounellei, possui ampla distribuição na Caatinga e é comumente encontrada em afloramentos rochosos e solos pedregosos, mais especificamente na Caatinga de lajedo (TAYLOR; ZAPPI, 2004) (figura 3.5). É uma espécie colunar na forma de candelabro, não apresenta cefálio, uma estrutura formada por agrupamento de flores que formam uma zona reprodutiva. A altura pode variar de estatura baixa, até pequenas árvores de 3 a 4 m de altura (GORELICK, 2009).

Figura 3.3 - Fotos de Cereus jamacaru encontrado na Caatinga do semiárido nordestino, em período chuvoso (A) e de seca (B). (Fotografias da autora, 2009 e 2010)

Figura 3.4 - Fotos de partes teciduais de Cereus jamacaru. A - Tronco verde, cilíndrico e com inúmeros espinhos; B - Fruto imaturo; C- Aréolas; D - Detalhe da aréola, um agrupamento de espinhos centrais e radiais; E - Flores laterais fechadas e noturnas; F - Vista superior do tronco com seis costelas; G - Corte transversal do tronco, evidenciando as seis costelas e a parte interna bem suculenta; H - Detalhes da raiz. (Fotografias da autora, 2009 e 2010)

Figura 3.5 - Fotos de Pilosocereus gounellei encontrado com frequência em Caatinga de lajedo no semiárido nordestino (A e B). Observe o formato de candelabro (C e D). Fotografias da autora (2010)

Também são encontradas várias outras espécies de cactáceas como o cabeça-de-frade, a palma, o rabo-de-raposa, a tacinga, entre outras (figura 3.6). O cabeça-de-frade possui caule globoso na forma de cone e pode chegar até 22 cm de altura. Possui dez arestas, com aréolas de espinhos dispostos em grupos de cinco a sete; as flores são vermelhas e o fruto é uma baga de coloração rosada (Barbosa, 1998).

Figura 3.6 - Outras cactáceas representadas por: A - Palma (Opuntia sp.); B - Rabo-de-raposa (Arrojadoa

rhodantha); C - Cumbeba (Tacinga inamoena); D - Cabeça-de-frade (Melocactus sp.)

A Caatinga é a vegetação mais degradada no semiárido, com menos de 1% de sua área protegida em reservas (GIULIETTI et al., 2006). Nos últimos anos, ações antrópicas

degradadoras têm intensificado os processos de erosão e déficit hídrico do solo, contribuindo para o aumento do processo de desertificação (TRIGUEIRO; OLIVEIRA; BEZERRA, 2009). A desertificação, segundo Dregne (1976) pode ser definida como um processo que ocorre devido à ação antrópica e à seca, culminando no empobrecimento de ecossistemas áridos, semiáridos e subúmidos secos, podendo reduzir a produtividade vegetal, acelerar a degradação do solo e aumentar o risco para a ocupação humana. Entretanto, também pode ser definida como um evento em que, devido a vários processos de mudanças, são criadas condições similares com as encontradas em um deserto (GLANTZ; ORLOVSKY, 1983). Qualquer que seja a definição correta, no Brasil, fatores naturais e induzidos pela ação do homem têm levado à desertificação cerca de 30 a 60% da região semiárida do Nordeste (BRASIL, 2004; OLIVEIRA, 2000).

Os impactos da desertificação podem ser ambientais, ocasionando a redução da biodiversidade, recursos hídricos e produtividade agrícola; sociais, podendo levar à migração de pessoas para as cidades e impactos econômicos, com perda de milhões de reais para o Brasil (LACERDA; LACERDA, 2004). Vários projetos vêm sendo desenvolvidos tanto pelo governo federal quanto pelos governos dos estados do Nordeste na tentativa de gerar planos de ação. O estado de Pernambuco, por exemplo, adotou a Política Estadual para o Controle da Desertificação, visando o desenvolvimento sustentável das áreas sujeitas à seca e à desertificação, com várias sugestões de contribuições (BRASIL, 2004). Entretanto, todos estes planos de ação requerem a conscientização e a participação de vários setores, sendo que a pesquisa científica tem muito a contribuir nesta área, com o desenvolvimento de novas tecnologias. Uma tecnologia relativamente barata é o uso de micro-organismos em conjunto com plantas para recuperação destas áreas. Requena et al. (1997) descobriram um consórcio bem vantajoso entre duas micorrizas arbusculares (Glomus coronatum, nativo e Glomus intraradices, exótico), duas espécies nativas de Rhizobium e duas espécies de bactérias capazes de promover o crescimento de plantas, sendo uma nativa e uma exótica, na rizosfera de Anthyllis cytisoides (Fabaceae) para a revegetação de ambientes semiáridos.

3.2 Micro-organismos