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1. INTRODUÇÃO

2.5. FATORES QUE INFLUENCIAM O COMPORTAMENTO DO CONCRETO

2.5.3. Regime de ensaio

O regime de ensaio depende da combinação da condição de carregamento das amostras, do modo térmico utilizado, do regime de aquecimento e do momento em que cada ação é realizada, sendo influenciado ainda pelas condições de umidade do concreto (COSTA, 2008; FIB, 2007).

A escolha do regime de ensaio deve ser realizada conforme o propósito para o qual os dados serão coletados.

Para o projeto e a análise de estruturas em situação de incêndio, utilizam-se as propriedades mecânicas obtidas em ensaios realizados com carga durante o aquecimento; para a recuperação e o reforço de estruturas pós- incêndio, utilizam-se suas propriedades residuais, recomendam Caetano, Santos e Rodrigues (2014) e Xing et al (2011).

Hertz (2005) faz consideração semelhante, expondo que as curvas de redução das propriedades mecânicas do concreto obtidas à quente destinam-se a avaliação das estruturas durante o incêndio, enquanto as curvas das propriedades mecânicas residuais aplicam-se após o incêndio. O autor recomenda que os projetos avaliem ambas as condições quando se objetiva estudar a resistência de uma estrutura ao colapso frente aos efeitos das altas temperaturas.

Destaca-se, portanto, a importância da exposição do regime de ensaio utilizado nas normas e demais publicações técnicas.

O Bulletin 38 do FIB (2007) apresenta os seguintes modos térmicos que podem compor o regime de ensaio:

1. A frio, antes do aquecimento – geralmente aplicado em amostras de controle;

2. Transiente durante o aquecimento;

3. Constante, em temperatura elevada e estável; 4. Transiente durante o resfriamento;

5. Residual, em temperatura ambiente após o resfriamento;

6. Pós resfriamento, em um determinado período após o resfriamento e

7. Após o segundo aquecimento e assim por diante.

Costa (2008, p.160) e a recomendação RILEM TC 200-HTC (SCHNEIDER et al., 2007) dispõe que o regime de aquecimento pode ser constante (steady state test) ou transiente (transiente state test ou non-steady

test).

Para o regime de aquecimento constante, o período de aquecimento apresenta duas etapas: na primeira, é aplicada uma taxa de aquecimento fixa até que se alcance uma temperatura previamente determinada; na segunda etapa, as amostras são submetidas a um período de estabilização térmica, também denominado patamar, para uniformizar sua temperatura.

O regime de aquecimento constante é adequado para a determinação da resistência à compressão, da resistência à tração, do módulo de elasticidade, da retração, da fluência ou deformação lenta, da deformação lenta recuperável e da relaxação das amostras de concreto, conforme a recomendação. recomendação RILEM TC 200-HTC (SCHNEIDER et al., 2007),

O regime de aquecimento transiente, condição também presente em incêndios reais, é caracterizado pela variação térmica – normalmente ascendente – da temperatura ao longo do ensaio, como proposto pela curva padrão da norma ISO 834:1975, normalmente associada à aplicação de carga. A recomendação RILEM 200 HTC (SCHNEIDER et al., 2007) indica esse regime para a determinação da deformação térmica, de tensões decorrentes da restrição à retração do material durante o aquecimento e da fluência transiente do concreto;

De forma geral, os regimes de aquecimento constantes são aplicados aos modos térmicos com ensaios a frio, durante o patamar, residuais ou após o resfriamento. Para os demais modos, aplicam-se regimes de aquecimento transientes (FIB, 2007).

As taxas e formas de aquecimento utilizadas em diferentes pesquisas apresentam variações significativas, como exemplificado pelos seguintes estudos:

a) Carino e Phan (2001) – taxa de 5 ºC/min até o atingimento das temperaturas desejadas, com patamar até o núcleo da amostra atingir temperatura com diferença máxima de 10 ºC da temperatura do forno;

b) Gallé e Sercombe (2001) – taxa de 1 ºC/min até o atingimento das temperaturas desejadas, com patamar até a estabilização da perda de massa (<0,01 %/24 h);

c) Ali (2002) – curva BS 476;

d) Pimienta e Hager (2002) – taxa de 1 °C/min até o atingimento das temperaturas desejadas, mantendo-se o patamar até 120 min (120 °C) ou 60 min (250, 400 e 600 °C);

e) Souza (2005) – curva ISO 834 durante aproximadamente 180 min; f) Lima (2005) – taxa de 27,4 ºC/min até o atingimento das

temperaturas desejadas, com patamar de 30 min;

g) Wendt (2006) – taxa de 27,4 ºC/min até o atingimento das temperaturas desejadas, com patamar de 30 min;

h) Arioz (2007) – taxa de 20 ºC/min até o atingimento das temperaturas desejadas, mantendo-se o patamar até completar 120 min;

i) Silva (2009) – taxa média de 7,4 ºC/min até o atingimento das temperaturas desejadas, mantendo-se o patamar até completar 150 min;

j) Kirchhoff (2010) – taxa de 27,4 ºC/min até o atingimento das temperaturas desejadas, com patamar de 120 min;

k) Britez (2011) – curva ISO 834 durante 180 min;

l) Almeida (2017) – taxas médias de 9 ºC/min e 27,4ºC/min até o atingimento das temperaturas desejadas, com patamar de 30 min ou até a estabilização da temperatura interna.

Lima (2005) e Almeida (2017) (itens “f” e “l”) definiram as taxas aplicadas em função das taxas utilizadas por outros autores e das limitações dos equipamentos.

Os regimes de aquecimento apresentados são ilustrados pelo gráfico da Figura 15.

Figura 15 – Regimes de aquecimento utilizados em diferentes estudos, compilados pela autora 0 200 400 600 800 1000 1200 1400 0 60 120 180 240 300 360 420 480 540 600 T e m p e ra tu ra ( °C) Tempo (min)

5°C/min - Carino e Phan (2001) 1°C/min - Gallé e Sercombe (2001) Transiente (curva BS 476) - Ali (2002) 27,4°C/min - Wendt (2006)

Transiente (curva ISO 834) - Britez (2011) 1°C/min (patamar de 60 min) - Pimienta e Hager (2002) 1°C/min (patamar de 120 min) - Pimienta e Hager (2002) 27,4°C/min - Lima (2005)

Transiente (curva ISO 834) - Souza (2005) 20°C/min - Arioz (2007)

27,4°C/min - Kirchhoff (2010) 9°C/min (patamar de até 156 min) - Almeida (2017) 9°C/min (patamar de 30 min) Almeida (2017) 27,4°C/min (patamar de 30 min) - Almeida (2017)

0 200 400 600 800 1000 1200 1400 0 60 120 180 240 300 360 420 480 540 600 T e m p e ra tu ra ( °C) Tempo (min)

5°C/min - Carino e Phan (2001) 1°C/min - Gallé e Sercombe (2001) Transiente (curva BS 476) - Ali (2002) 27,4°C/min - Wendt (2006)

Transiente (curva ISO 834) - Britez (2011)

1°C/min (patamar de 60 min) - Pimienta e Hager (2002) 1°C/min (patamar de 120 min) - Pimienta e Hager (2002) 27,4°C/min - Lima (2005)

Transiente (curva ISO 834) - Souza (2005) 20°C/min - Arioz (2007)

27,4°C/min - Kirchhoff (2010)

9°C/min (patamar de até 156 min) - Almeida (2017) 9°C/min (patamar de 30 min) Almeida (2017) 27,4°C/min (patamar de 30 min) - Almeida (2017) 0 200 400 600 800 1000 1200 1400 0 60 120 180 240 300 360 420 480 540 600 T e m p e ra tu ra ( °C) Tempo (min)

5°C/min - Carino e Phan (2001) 1°C/min - Gallé e Sercombe (2001) Transiente (curva BS 476) - Ali (2002) 27,4°C/min - Wendt (2006)

Transiente (curva ISO 834) - Britez (2011)

1°C/min (patamar de 60 min) - Pimienta e Hager (2002) 1°C/min (patamar de 120 min) - Pimienta e Hager (2002) 27,4°C/min - Lima (2005)

Transiente (curva ISO 834) - Souza (2005) 20°C/min - Arioz (2007)

27,4°C/min - Kirchhoff (2010)

9°C/min (patamar de até 156 min) - Almeida (2017) 9°C/min (patamar de 30 min) Almeida (2017) 27,4°C/min (patamar de 30 min) - Almeida (2017)

Através da análise do gráfico da Figura 15 é possível perceber a grande variabilidade das taxas de aquecimento empregadas pelos autores, um dos fatores influentes na elevada dispersão da resistência à compressão residual do concreto, como exposto em 2.2.1.

Informa-se que o gráfico da Figura 15 não abrange o resfriamento das amostras ensaiadas a frio porque seu monitoramento foi relatado apenas por Souza (2005), que utilizou a taxa de 1 ºC/min nas amostras resfriadas lentamente, e por Arioz (2007), cuja taxa equivale a 2 ºC/min.

As taxas de aquecimento que podem compor os regimes de

aquecimento exercem forte influência no comportamento do concreto exposto às

altas temperaturas. As taxas baixas – de até 2 ºC/min – permitem separar tanto quanto possível os efeitos sofridos pelo material dos efeitos sofridos pela estrutura, enquanto taxas mais altas podem levar ao aparecimento de tensões em função dos gradientes térmicos e de umidade (FIB, 2007; HERTZ, 2007).

A seleção da taxa de aquecimento é fortemente ligada à geometria da amostra, o que abrange sua seção transversal e seu tamanho.

Hertz (2007) afirma que um aquecimento acelerado dificulta a avaliação da resistência do concreto, pois as amostras devem possuir uma seção transversal com dimensões mínimas suficientes para que a distribuição da pasta de cimento e dos agregados seja representativa do material, em relação a um elemento estrutural.

Em amostras com dimensões suficientes, como corpos de prova de 150 mm de diâmetro, uma taxa de 10 a 20 ºC/min pode proporcionar gradientes térmicos de até 400 ºC entre a superfície externo e o interior da amostra, induzindo tensões térmicas que reduzem a resistência do concreto antes do ensaio.

Hertz (2007) afirma ainda que a resistência à compressão residual do concreto exposto a temperaturas de até 500 ºC com baixas taxas de aquecimento baixas é maior do que quando são utilizadas taxas altas. Essa variação de resistência se deve às diferenças na fissuração da matriz quando o agregado se expande e ela se retrai ao longo de um tempo mais extenso.

Nas temperaturas superiores a 500 ºC, Hertz atribui a inversão do efeito – maior resistência à compressão residual para as amostras aquecidas rapidamente – ao fato que a decomposição de todo o hidróxido de cálcio

consome determinado tempo, não disponível nessas condições. A Figura 16 ilustra o comportamento relatado por Hertz:

Figura 16 - Resistência à compressão residual de corpos de prova aquecidos rápida e lentamente, adaptado de Hertz (2007)

Khoury, Sullivan e Grainger (1984) avaliaram a diferença de temperatura radial em corpos de prova cilíndricos de 6 cm de diâmetro e 19,1 cm de altura, expostos às altas temperaturas, com taxa de aquecimento de 1 ºC e 2 ºC. Os agregados graúdos utilizados foram pedregulho do Tâmisa e um agregado leve de baixa difusividade. Parte das amostras encontrava-se secas ao ar (20 ºC, 65% U.R.), parte foram tratadas por pré-aquecimento a 105 ºC e um corpo de prova foi pré-aquecido a 600 ºC.

Com taxa de aquecimento de 1 ºC/min e 7:40h de ensaio, os autores verificaram diferenças entre a temperatura no centro dos corpos de prova e em sua superfície de no máximo 18ºC. Dado que o pré-aquecimento reduziu a umidade das amostras, foi observado um pico de aproximadamente 15 ºC na diferença de temperatura radial a cerca de 160 °C, entre os corpos de prova que foram secos ao ar e os que previamente aquecidos a 105ºC. Tal pico reflete um ponto de maior perda de umidade, condição que já havia sido alcançada pelas amostras pré-aquecidas.

Observou-se também o leve aumento do gradiente térmico entre 500 ºC e 600 ºC, com pico em aproximadamente 550 °C, refletindo a dissociação do hidróxido de cálcio (Ca(OH)2).

A Figura 17 expõe a diferença de temperatura radial para amostras de concreto com pedregulho do Tâmisa com e sem pré-aquecimento.

Figura 17 – Efeito do pré-aquecimento na diferença de temperatura radial ΔT (°C) em função da temperatura superficial, em °C – concreto com pedregulho do Tâmisa

aquecido a 1ºC/min, adaptado de Khoury, Sullivan e Grainger (1984)

A Figura 18 expõe a diferença de temperatura radial para amostras de concreto com agregado graúdo leve com e sem pré-aquecimento.

Figura 18 – Efeito do pré-aquecimento na diferença de temperatura radial ΔT (°C) em função da temperatura superficial, em °C – concreto com agregado leve aquecido a

1ºC/min, adaptado de Khoury, Sullivan e Grainger (1984)

Khoury, Sullivan e Grainger (1984) verificaram que a diferença na temperatura radial de amostras de concreto expostas às altas temperaturas pode ser estimada através da aplicação da 2ª Lei de Fourier, obtendo resultados coerentes através de análise analítica, numérica e experimental. A mesma equação (2) é reproduzida na parte 4 da recomendação RILEM TC 129 MHT (2000):

Entende-se que ΔT é a máxima diferença de temperatura radial, R é a taxa de aquecimento, a é o raio da amostra e D é a difusividade do concreto.

O regime de resfriamento das amostras é normalmente classificado como natural ou forçado, podendo seguir ou não uma taxa de resfriamento constante (FIB, 2007).

A aplicação de carga durante o aquecimento ou com as amostras aquecidas é outra particularidade do regime de ensaio que influencia a alteração das propriedades mecânicas do concreto.

Em concretos aquecidos sem carga, o módulo de elasticidade e a resistência mecânica são menores, enquanto a deformação obtida sob a máxima tensão é maior, quando comparados aos concretos aquecidos sob carregamento. A tensão de compressão aumenta a polimerização dos silicatos, mitiga o desenvolvimento de microfissuras ao “compactar” o concreto e ocasiona a ocorrência de LITS (FIB, 2007).

A LITS (Load Induced Thermal Strain), deformação térmica induzida pelo carregamento, é verificada unicamente no concreto submetido à compressão e mitiga os efeitos das deformações diferenciais da pasta de cimento e dos agregados (KLEIN JÚNIOR, 2011). De forma geral, a deformação total do concreto exposto às altas temperaturas pode ser separada em 9 componentes, como exposto no Quadro 2.

Nº Tipo de deformação Dependência do

carregamento

Agrupamento experimental

1 εe Elástica inicial Sim Deformação

elasto-plástica

2 εp Plástica inicial Sim

3 εth Térmica Não Deformação

térmica

4 εsh Devido à retração Não

5 εcrack Devido à fissuração Sim

6 εttc Térmica transicional Sim LITS

7 εcr-d Devido à fluência por secagem Sim

8 εct-t-dep Devido à fluência dependente do tempo Sim

9 εΔel Devido a alterações de deformação

elástica durante aquecimento com carga Sim

Quadro 2 - Componentes da deformação do concreto aquecido, com base em Khoury (2006) e Klein Júnior (2011)

Klein Júnior (2005) observa que, somadas as deformações térmicas transicional, devido à fluência por secagem, à fluência decorrente do tempo e às alterações de deformação elástica durante o carregamento com carga constituem a LITS. Por isso, ela LITS pode ser estimada calculando-se a diferença entre a deformação térmica de um corpo aquecido sem carregamento e a deformação térmica de um corpo de prova idêntico ao anterior, mantido com carga antes e durante o aquecimento – similar a uma estrutura em situação de incêndio –, descontando-se a deformação elasto-plástica inicial.

Segundo Gernay e Franssem (2010), o modelo da relação tensão- deformação do concreto adotado pela norma EN 1992-1-2: 2004 considera LITS de forma implícita.