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SUMÁRIO

O MATERIAL ARQUEOLÓGICO DO SÍTIO JERICOACOARA I E A SUA INSERÇÃO NO CONTEXTO REGIONAL

2.7 REGIME DE VENTOS E PLUVIOMETRIA

O entendimento do regime de ventos dominante no litoral, onde os campos de dunas em constante processo de migração descobrem e recobrem os sítios arqueológicos ali existentes, é de fundamental importância para a percepção das problemáticas discutidas nesta tese, principalmente no que diz respeito à constituição e à desintegração do contexto arqueológico nas concentrações vestigiais que compõem o sítio Jericoacoara I.

95 O vento exerce um papel fundamental no litoral nordestino e apresenta-se como um importante componente da paisagem, ao atuar na mobilidade dos campos de dunas e no aporte de areia para a planície de aspersão eólica (MEIRELES, 2011a, p.176-177). A sua intensa influência se faz sentir, sobretudo, nos contornos morfológicos de toda a costa cearense, assim como no litoral potiguara, a leste, e até Lençóis Maranhenses, a oeste (MORAIS et al., 2006, p.140).

Ao abordar a primazia do vento na configuração da paisagem, Tsoar (2009 et al., p.225-226) aponta que a atividade das dunas no Ceará durante os anos secos resulta de maior energia eólica e não de baixas precipitações. Assim, a falta de vegetação nas dunas durante um período seco (como é hoje) é devido à alta energia eólica e não ao baixo nível de chuva. Nos períodos em que a energia eólica era muito menor, e as chuvas mais altas, a vegetação poderia se desenvolver; no entanto, foi a baixa energia eólica que iniciou a cobertura e a estabilização da vegetação, e não o aumento da precipitação, pois as águas de chuva, segundo o mesmo autor, não adicionam umidade suplementar à areia da duna, mas sim, às águas subterrâneas.

Produto das condições climáticas severas, nas regiões tropicais semiáridas (a exemplo da costa semiárida norte, na qual se insere a nossa área de estudo), a velocidade dos ventos é mais intensa, assim como o transporte e a disponibilidade de sedimentos. Segundo Morais et al. (2006, p.137), o domínio das formações arenosas contribui para a obstrução das reentrâncias costeiras e, em consequência, as drenagens de pequeno porte apresentam condições de hipersalinização nos períodos de estiagem, tornando os manguezais cada vez mais escassos, com importância mais local do que regional.

O regime de ventos no litoral semiárido do Nordeste está diretamente relacionado com o clima dominante, regido pela Zona de Convergência Intertropical (ZCIT), uma região de convergência para os ventos alísios do Atlântico do Nordeste e do Sudoeste, caracterizando-se por um agrupamento de nuvens e permanente baixa da pressão atmosférica (SAUERMANN et al., 2003; MAIA, FREIRE & LACERDA, 2005). O posicionamento da ZCIT determina a ocorrência dos ventos dominantes e do regime de precipitação e, desse modo, quando a ZCIT está localizada em sua posição mais ao norte, como é geralmente o caso de agosto a setembro, dominam intensos ventos do Sudeste e baixas chuvas na área. Por outro lado, quando a ZCIT está em sua posição mais a sul, ou seja, de março a abril, predominam ventos fracos do Sudeste e alta precipitação (SAUERMANN et al., 2003, p.247).

96 No tocante ao regime de ventos na nossa área de estudo, a planície costeira de Jericoacoara, as direções predominantes são SE, ESE, E e NE (MEIRELES, 2011a, p.177) e as maiores médias de velocidade são registradas no segundo semestre, no período correspondente aos meses de estiagem, quando atuam os ventos alísios de SE. Na estação chuvosa, concentrada nos primeiros meses do ano, a velocidade do vento é mais baixa e, como consequência, a movimentação de areias por toda a planície é menor.

Figura 2.13: Relação entre velocidade, direção do vento e as precipitações na costa cearense (MAIA, FREIRE & LACERDA, 2005, p.1123).

O regime de ventos atuante na praia de Jericoacoara, de natureza fortemente sazonal, atua com velocidade média de 5,47 m.s-1 na estação úmida, enquanto, na seca, a velocidade média chega a 7,75 m.s-1 (SAUERMANN et al., 2003, p.248). Esses fatores foram decisivos para eleição do primeiro semestre como período para a realização da segunda jornada de escavação do sítio Jericoacoara I. Tal decisão teve como propósito evitar o constante soterramento do sítio que, por sua vez, dificultaria o processo de documentação e, consequentemente, a sua interpretação.

Integrando as informações acerca do regime de ventos aos dados pluviométricos e de insolação para a praia de Jericoacoara, Meireles (2011a, p.177) aponta que nos primeiros meses do ano os valores da intensidade dos ventos e da insolação são menos

97 elevados, apresentando índices altos de precipitação. No segundo semestre, ocorre uma diminuição dos índices pluviométricos e eleva-se a velocidade dos ventos e a insolação. Dessa forma, a migração das dunas é mais efetiva no segundo semestre (menores índices pluviométricos, ventos mais elevados e maior insolação), juntamente com uma diminuição do nível hidrostático do lençol freático e, assim, a incidência das lagoas sobre a planície costeira.

Figura 2.14: Quadro comparativo das precipitações na costa cearense, registradas entre o período de estiagem e o chuvoso, respectivamente (MEIRELES, 2011a, p.177).

O regime pluviométrico da área de estudo, também fortemente sazonal, enquadra-se no tipo Tropical com a estação chuvosa concentrada em cinco meses consecutivos, mas apenas nos chamados “anos bons”. A estação chuvosa, conforme Meireles (2011a, p.173), começa geralmente no mês de fevereiro, com os valores máximos frequentemente associados aos meses de março e abril. O primeiro semestre do ano responde, em média, por mais de 90% das precipitações anuais, pois partir de julho as precipitações diminuem até o mês de novembro. A precipitação média anual alcança valores em torno de 823,8 mm para a região na qual se insere a praia de Jericoacoara.

Em complementação às características sinóticas que influenciam o regime de ventos no Nordeste do Brasil interanualmente, Lira, Silva & Alves (2011, p.350) apontam que as brisas terrestres e marítimas ocasionadas pelo contraste térmico continente/oceano são responsáveis pelas trocas na direção dos ventos durante o dia e noite nas áreas costeiras. Deste modo, durante o dia, principalmente à tarde, quando o continente é mais

98 quente que o mar, gera-se um centro de pressões mais baixas e o vento tende a soprar para o interior do continente, caracterizando a brisa marítima. Durante a noite, as características são contrárias, o mar perde calor mais lentamente que o continente, gerando pressões mais baixas e ocasionando um fluxo de ventos que sopram do continente na direção dos oceanos, definindo a brisa terrestre.

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CAPÍTULO 3

ENSEADA DE JERICOACOARA: DE LUGAR ARQUEOLÓGICO A LUGAR