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Relação entre corpo docente e alunos

No documento TÍTULO (páginas 136-142)

7 RESULTADOS

7.1.4.3 Relação entre corpo docente e alunos

A atitude interdisciplinar ajuda o professor a se desenvolver. Ele se refaz enquanto pesquisador, transformando suas indagações em pesquisa, contribuindo, assim, para a explicação da realidade que nunca há de ser completa sem sua participação. Ao buscar as respostas de que necessita, ele consulta os livros, ampliando seu conhecimento, mas, principalmente, ele consulta a si mesmo e à sua própria história, aumentando sua confiança em si mesmo, sua autoestima.

A busca pela verdade é um desafio maior do que qualquer pessoa solitariamente pode enfrentar,o que indica que mais perto da verdade se chega quanto mais pessoas puderem se unir, a fim de que suas visões, sempre indispensáveis e insubstituíveis, possam formar um todo complexo e real. Quando o professor torna suas atitudes interdisciplinares, ele está, ao mesmo tempo, recuperando aspectos de sua autoestima, que foram provocados pelo sucateamento a que sua profissão o conduziu. O professor, quando dá início a essa nova forma de atitude, contagia toda a sala de aula, a escola e a comunidade (FAZENDA, 2005). É como exemplo, é como aquele que inspira e contagia a sala onde se põe. Os professores auxiliam seus alunos em sala de aula, dividindo com eles o conteúdo

que possuem, construindo com eles novos saberes, mas, sobretudo, os professores os ajudam com sua postura, com seu modo de ser.

Os adultos orientam, desafiam, proporcionam modelos de comportamento a serem modificados e organizam e estruturam a participação da criança (e do jovem) em atividades. Em resumo, os adultos são “incentivadores cognitivos”, estimulando e orientando as crianças (e jovens) para que sejam tudo o que podem ser (FLAVELL; MILLER; MILLER, 1999, p.20)

Esse trabalho não é simples. O professor encontra na escola alunos com todos os tipos de personalidade. Alguns são estudiosos e empenhados, portam-se com mais educação, enquanto outros manifestam desinteresse e atitudes questionáveis, em suma, é um ambiente representativo das escolas atuais. Respeitando os problemas existentes em todas as escolas com relação aos discentes e às idiossincrasias que apresentam, essa diferença tem, dentre muitos fatores, as condições econômicas e familiares que resultam muito na própria herança cultural que carregam.

Essas singularidades estão no consciente dos professores, principalmente, no dos efetivos que se encontram na escola há bastante tempo. Essa longevidade dentro da instituição permite que alguns professores acompanhem os alunos desde as séries primeiras, conhecendo sua postura dentro da escola e também suas ações fora dela, estando realmente lado a lado com eles em seu processo de amadurecimento intelectual e humano.

Tanto tempo juntos permite ao docente conhecer as dificuldades de aprendizado que essas crianças e jovens carregam, tanto quanto compreender os desafios que formam sua vida fora da escola. O manuseio dessa informação pode ser analisado de duas formas distintas.

A primeira apresenta um cunho pessimista. Há um distanciamento muito grande de alguns professores em relação a esses problemas exteriores ao ambiente escolar. Eles têm plena consciência da dificuldade que os alunos trazem de suas casas, mas querem apenas preocupar-se com o resultado deles em sala de aula, acreditando ser possível a separação entre vida familiar e vida escolar.

No que toca o dia a dia, geralmente, são esses professores mais distantes que apresentam relações mais problemáticas com suas salas. O domínio sobre os jovens é relatado por eles como difícil. Talvez porque lhes falte uma aproximação que não está em sua grande parte no interesse pela teoria, mas pela partilha de sua

história de vida, das dificuldades, dos desafios, da esperança. Quando o professor se fecha a esse aspecto, fecha-se para qualquer outro.

Para esses, a sala dos professores, na hora do intervalo, transforma-se num refúgio a protegê-los dos alunos, também em um espaço de acusações, de extravasar os sentimentos que pela postura de sala de aula não seriam permitidos. Há dias em que o que se ouve sobre os alunos é que são da pior espécie possível e que não há soluções para muitos deles; que para estes, o estar na escola significa fugir de casa, pois qualquer coisa relacionada ao estudo não lhes interessa.

A representação destes taxados “alunos-problemas” acaba tomando todo o espaço da discussão, generalizando a ponto de criar a impressão de que todos os que ali estudam têm este perfil e que não há nada o que se possa fazer por eles, que não merecem qualquer esforço, pois o que foi feito para eles, eles não aproveitaram. Assim, são tidos como descartáveis e que, enquanto não lhes forem impostos outros ambientes, continuarão a colocar a perder os “poucos” que se interessam por algo.

Dessa atitude podemos pensar que

Muitos homens ensinam – uma disciplina intelectual ou manual, uma técnica, um ofício –, poucos desfrutam esse acréscimo de autoridade que lhes advém, não de seu saber ou capacidade, mas de seu valor como homem. Nesse sentido, um artista, um artífice, um homem de estado, um chefe militar, um sacerdote podem ser tão bons ou melhores mestres para aqueles que os cercam do que certos professores. A vida de tais homens impõe-se, a todos ou a alguns, como uma lição de humanidade (GUSDORF, 1987, p.3).

O modo de pensar impede qualquer relação frutuosa com o aluno. Mais do que isso, impede que se formulem opções para auxiliá-lo. Há o distanciamento entre professor e aluno, sendo que o único vínculo existente entre eles está numa degradada relação ensino-aprendizagem baseada na imposição de conteúdo.

Relações problemáticas ajudam a identificar no professor uma indisposição muito grande em relação ao seu ofício. Consequência disso está na repetição constante de ideias como “necessidade de buscar um novo emprego” ou “não vale a pena estudar, o que sei é mais que suficiente para o público que temos” ou ainda “eles são incapazes de cobrar algo a mais de mim”. Há nessas palavras um desânimo muito grande, que se reflete no próprio desinteresse em continuar se atualizando. O sentido da ação docente e a necessidade que ela carrega de

continuar a aprender encontram, na relação desfigurada entre professor e aluno, um fator desmotivante.

Essa indisposição também aparece no lado do aluno. As brincadeiras de mau gosto, ou mesmo o puro desgosto por determinada matéria, têm como objeto do escárnio os professores com quem têm pior relacionamento.

O contrário também existe, e os professores que despendem parte do seu tempo a estar com os alunos, a conversar assuntos outros, diferentes dos conteúdos programados, ganham um reconhecimento muito grande. Ao ponto de, mesmo os que apresentam dificuldade de aprendizado, enxergar no professor alguém digno de respeito. Isso faz pensar na oportunidade de realizar um ensino que valorize o conhecimento, mas, principalmente, que valorize a vida e a pessoa.

O estabelecimento desses laços recíprocos mobiliza o jovem para o desenvolvimento de atividades no seu meio físico, social e simbólico, condutores da sua atividade exploratória, manipuladora, criativa e imaginativa (DINIZ; KOLLER, 2010). Um dos professores pode servir como exemplo a essa constatação.

Em determinado momento do ano letivo, esse professor apresentou problemas na coluna. Tirar licença seria um transtorno maior a ele dado alguns fatores de seu mesossistema. Frente a essa situação, os alunos apresentaram-se como verdadeiros companheiros desse professor. Auxiliaram no manuseio dos materiais, cada um “tomava conta” do outro de modo a controlar seu comportamento. Esses alunos tornaram-se mais responsáveis, amadureceram diante da situação enfrentada.

Isso só pôde acontecer, porque, ao longo do ano, o professor e os alunos formaram um relacionamento forte, com muito afeto por parte de alguns. Prova disso é que vários foram os momentos em que seus alunos estavam próximos dele e, ao invés de discutirem teorias, falavam dos problemas em casa, das possibilidades de futuro, da questão de trabalhar ou simplesmente estudar, dos riscos de gravidez para uns, do como ser mãe na adolescência para outras. Toda essa cumplicidade permitiu as ações citadas. No final do ano letivo, no conselho final, esse professor apresentou poucos problemas com reprovações.

Outro exemplo de atitude que conduziu a bons resultados estava na atuação de um dos professores readaptados (não pode exercer sua atividade em sala de aula). Uma das funções desse professor está na ornamentação de todo e qualquer evento dentro da escola. Interessante notar que muitos alunos, por prazer, o ajudam.

Por não haver nenhuma cobrança sobre esses alunos, por não haver avaliações, nem tão pouco notas, os jovens oferecem o que tem de melhor. Sentem- se a vontade para ousar. Isso representa, por exemplo, que alguns deles realizam desenhos, cartazes, painéis muito melhores do que aqueles que apresentam na aula de artes. A organização que demonstram, a desenvoltura em lidar com conhecimentos diferentes é melhor do que as vistas nas disciplinas. É impossível, diante desses exemplos, desconsiderar que “cada membro de um microssistema influencia o outro” (BONFENBRENNER, 2011, p.187), principalmente, quando a relação entre eles é de respeito, de reconhecimento. É assim que os processos proximais podem produzir como efeito:

competência, que se refere à aquisição e desenvolvimento de conhecimentos, habilidades e capacidade para conduzir e direcionar seu próprio comportamento através de situações e domínios evolutivos, tanto isoladamente como através de uma combinação entre eles (intelectual, físico, sócio-emocional, motivacional e artístico) (CECCONELLO; KOLLER, 2003, p.516)

Outra questão que serve como exemplo aos alunos está na leitura. Alguns dos professores passeiam constantemente com livros pela escola, mostram o que estão lendo, conversam sobre os títulos, servindo assim de espelho tanto para seus alunos quanto para seus colegas. A prática ainda é limitada, mas, como na atitude interdisciplinar, é preciso sempre que alguém aceite dar o primeiro passo nessa direção, que alguém aceite ser o elemento a suscitar a ideia e isso a escola apresenta.

A relação entre professor e aluno é recheada de conflitos e de parcerias. O importante é o professor saber como lidar com elas. Em tudo o que foi observado, nada parece registrar mais efeito do que o exemplo. O professor que estuda (tal como os mestrandos), o professor que lê, aquele que não falta tem um respeito conquistado junto aos discentes.

Os professores que mantêm esse bom relacionamento apresentam perspectivas interessantes, talvez por conseguirem vislumbrar uma realidade para além de sua única visão. Eles se comprometem com seus alunos, ele sente com eles e por eles, ele planeja e sonha em comunhão com eles. Com isso, ambos se desenvolvem. Cada um encontra no outro o apoio para evoluir,

sobretudo onde encontra uma outra personalidade, e não onde se fecha sobre si própria numa espécie de apatia. A presença do outro, quer seja mensageira de semelhança ou de diferença, é ocasião privilegiada de

despertar e de enriquecimento. Rigorosamente, o homem não pode existir no estado de isolamento. O ser humano revela-se no encontro, nesse encontro que é, segundo a expressão de Buytendijk, “um ser o que não se é, e um tornar-se o que já se é” (GUSDORF, 1987, p.139).

As observações terminaram no mesmo dia em que se encerrou o ano letivo. Com as férias dos alunos e o descanso dos professores, a escola se esvazia e o ambiente se torna infértil para as manifestações que interessavam a essa pesquisa. Ao cabo do ano de observação, muitas manifestações ocorreram, muitas atitudes foram realizadas. Todas essas ações exigem uma conclusão, porém, todo trabalho que lide com pessoa tem fim. As pessoas mudam, elas surpreendem. Adotam posturas e as alteram, elas inovam. Mesmo assim, é preciso parar para partilhar os dados obtidos. Parte-se, agora, para as considerações finais.

No documento TÍTULO (páginas 136-142)