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CAPÍTULO VI – A CONSTRUÇÃO DE SIGNIFICADOS NAS INTERAÇÕES ENTRE AS CRIANÇAS E A PROFESSORA DA TURMA

6.1. Relação entre o brincar e o aprender na educação infantil

6.1.1. A dissociação entre o brincar e o aprender. O brincar de faz-de-conta como forma de recreação – O professor ausente das brincadeiras

Os professores que adotam essa posição, geralmente, compreendem a brincadeira de faz-de-conta como uma atividade livre, espontânea e aprender como algo que faz parte de um currículo fechado, planejado, com conteúdos a serem ensinados. Por isso, os mesmos desenvolvem uma prática pedagógica caracterizada pela não intervenção nas brincadeiras, a não ser para garantir a segurança das crianças ou apaziguar algum conflito.

Nas práticas mais tradicionais, a brincadeira de faz-de-conta, geralmente, é entendida como uma forma de recreação ou alívio de tensões para as crianças, um momento das mesmas extravasarem as energias para o posterior retorno ao “trabalho sério”. Por outro lado, em algumas propostas pedagógicas mais centradas na criança, ela é entendida como atividade livre por excelência, na qual a criança desempenha melhor o seu potencial, sem necessitar da mediação dos adultos (Paniagua & Palacios, 2007).

Rocha (1997, 2000) e Wajskop, (1996) apontaram em seus estudos que tais professores, geralmente, reservam a hora do recreio para as brincadeiras e, quando não se ausentam totalmente delas executando alguma outra atividade, atuam tão somente para manter a ordem, solucionar eventuais conflitos ou evitar que as crianças brinquem para não se sujarem ou ficarem cansados, de modo a não prejudicar o bom desenvolvimento das atividades acadêmicas.

Rocha (2000) verificou que há um desprestígio da brincadeira de faz-de- conta no cotidiano das turmas de educação infantil. Segundo a autora, embora algumas vezes, as professora autorize as brincadeiras e até forneça brinquedos ou outros materiais, ela atua, basicamente, no sentido de colocar regras para o uso dos objetos e dos espaços da sala de aula e não visando a atividade lúdica em si.

6.1.2. A dissociação entre o brincar e o aprender. O brincar de faz-de-conta como recurso pedagógico – O professor como um delimitador das brincadeiras

Essa posição embora não seja majoritária, também pode ser percebida nas práticas pedagógicas dos professores da educação infantil. Os professores que a adotam, geralmente não respeitam a brincadeira de faz-de-conta como uma atividade livre, iniciada e mantida pela criança e da mesma forma que os adeptos da posição anterior, concebem o conhecimento como algo pronto a ser ensinado por alguém que sabe a quem não sabe. Assim, ao invés de investirem no desenvolvimento da capacidade simbólica das crianças, compreendendo que por meios dos significados construídos elas se constituem como sujeitos, os professores aproveitam os momentos de brincadeiras que ocorrem no espaço da educação infantil para “ensinar” conteúdos escolares. Estes são compreendidos como formas culturalmente prestigiadas de representação do real e suas possíveis categorizações segundo propriedades relacionais, como por exemplo, grande e pequeno, alto e baixo, quente e frio, entre outros ou segundo determinados tópicos instrucionais, como por exemplo, o alfabeto, os numerais, a classificação dos animais, entre outros (Rocha, 1997).

Da mesma forma que os que vêem o faz-de-conta como recreação ou entretenimento, os professores que assumem essa postura não valorizam essa atividade como uma forma das crianças aprenderem, de construírem significados acerca da realidade que os cerca. Eles acreditam que as crianças, ao brincarem,

estão perdendo tempo e deixando de realizar aprendizagens importantes que só podem ocorrer se o professor “ensinar” por meio de suas intervenções.

Considero que ambas as formas de atuação das professoras, apontadas pela literatura, tanto a que deixa criança brincar sozinha quanto a que “aproveita” a brincadeira para “ensinar” conteúdos disciplinares são reveladores de que o desenvolvimento do imaginar, do fazer-de-conta, não é prioritário no contexto pedagógico da educação infantil.

Desse modo, considerei importante investigar de que modo a professora da turma de educação infantil investigada atuava frente às brincadeiras das crianças, se ela assumia uma dessas posições apontadas pela literatura ou se agia de outra forma. Considerando o objetivo deste estudo, me interessei, principalmente, em saber se a professora contribuía para o processo de construção de significados pelas crianças e, se contribuía, que significados ajudava a construir.

Face ao exposto, objetivo no presente estudo objetivo compreender como ocorre o processo de construção de significados nas brincadeiras de faz-de-conta nas interações entre as crianças e a professora da classe de educação infantil investigada, destacando os modos de participação da professora nesse processo.

6.2. Método

6.2.1. Participantes

Participaram deste estudo 16 crianças, sendo dez meninos e seis meninas, com idades variando de três anos e oito meses a cinco anos e sete meses, que

freqüentavam, no ano de 2005, a turma de educação infantil, da Unidade Pedagógica da Ilha do Combu e a professora da referida turma.

6.2.2. Procedimento de coleta de informações

A coleta de informações deste estudo foi a mesma do estudo sobre a relação criança-criança, relatado no capítulo anterior. Para este estudo, entretanto, foram selecionados apenas os episódios em que a professora participou ativamente das brincadeiras.

6.2.3. Procedimento de análise

O procedimento de análise do material videogravado seguiu as diretrizes da opção metodológica já descrita neste trabalho e desdobrou-se em procedimentos específicos orientados para responder o objetivo do presente estudo.

Para isso, do mesmo modo que no estudo das interações criança-criança, tomei como objeto de análise a turma de 2005, por ela apresentar um maior número de registros com a participação da professora.

No processo de construção da análise, li as transcrições das falas durante as brincadeiras, a fim de identificar as sessões em que a professora participava. Posteriormente, selecionei os episódios a serem analisados. Defino como episódio uma seqüencia de interações com o mesmo enredo ou tema. Assim, a mudança de tema configura um novo episódio. Após o exame de cada episódio, identifiquei as

seqüências interativas em que a professora participava. Defino seqüência interativa como um conjunto de turnos em que há interação dialógica entre as crianças e a professora. Denomino de turno cada segmento do episódio, constituindo uma unidade de análise a partir do qual é possível reconstituir toda a seqüência interativa, num movimento de síntese (Amaral & Mortimer, 2006).

Com o objetivo de melhor compreender as interações e o conteúdo das mesmas, inicialmente, efetuei um mapeamento com descrições abreviadas de cada episódio como um todo. Em seguida, após tê-los estudado exaustivamente a fim de verificar os diferentes modos como a professora atuava durante as brincadeiras, identifiquei três principais tipos de participação. Um grupo constituído pelos episódios em que a professora apenas criava as condições para a brincadeira, outro por aqueles em que ela intervinha diretamente na brincadeira e um terceiro grupo formado pelos episódios que ela utilizava a brincadeira para ensinar um determinado conteúdo disciplinar. Neste sentido, os modos de participação da professora serão analisados de acordo com as seguintes categorias:

1) Cria condições para a brincadeira – Formas da professora participar criando condições para que as brincadeiras surgissem.

- Organiza o espaço - Organiza o tempo - Organiza os grupos