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Relação Estado e Sociedade Civil

No documento victormartinslopesdearaujo (páginas 113-117)

3.2. Concepção de Gestão

3.2.1. Relação Estado e Sociedade Civil

Nesse ponto nos dedicaremos sobre a proposta contida na política no que diz respeito à relação do Estado com a Sociedade Civil.

A forma de gestão no sistema descentralizado e participativo proposto pela LOAS, em seu capítulo III, artigo 6º, implica na participação popular, na autonomia da gestão municipal, potencializando a divisão de responsabilidade e no co-financiamento entre as esferas de governo e a sociedade civil. (PNAS, 2004, p.14)

A gravidade dos problemas sociais brasileiros exige que o Estado assuma a primazia da responsabilidade em cada esfera de governo na condução da política. Por outro lado, a sociedade civil participa como parceira, de forma complementar na oferta de serviços, programas, projetos e benefícios de Assistência Social. Possui, ainda, o papel de exercer o controle social sobre a mesma. (PNAS, 2004, p. 47)

No entanto, somente o Estado dispõe de mecanismos fortemente estruturados para coordenar ações capazes de catalisar atores em torno de propostas abrangentes, que não percam de vista a universalização das políticas, combinada com a garantia de eqüidade. Esta prerrogativa está assegurada no art. 5º, inciso III, da LOAS.

Para tanto, a administração pública deverá desenvolver habilidades específicas, com destaque para a formação de redes. A noção de rede tem se incorporado ao discurso sobre política social. Nos anos recentes, novas formas de organização e de relacionamento interorganizacional, entre agências estatais e, sobretudo, entre o Estado e a sociedade civil, têm sido propostas pelos atores sociais. O imperativo de formar redes se faz presente por duas razões fundamentais. Primeiramente, conforme já mencionado, porque a história das políticas sociais no Brasil, sobretudo, a de assistência social, é marcada pela diversidade, superposição e, ou, paralelismo

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das ações, entidades e órgãos, além da dispersão de recursos humanos, materiais e financeiros. (PNAS, 2004, p. 47)

Ao invés de substituir a ação do Estado, a rede deve ser alavancada a partir de decisões políticas tomadas pelo poder público em consonância com a sociedade. (PNAS, 2004, p. 47)

A gravidade dos problemas sociais brasileiros exige que o Estado estimule a sinergia e gere espaços de colaboração, mobilizando recursos potencialmente existentes na sociedade, tornando imprescindível contar com a sua participação em ações integradas, de modo a multiplicar seus efeitos e chances de sucesso. Desconhecer a crescente importância da atuação das organizações da sociedade nas políticas sociais é reproduzir uma lógica irracional da fragmentação, descoordenação, superposição e isolamento das ações. (PNAS, 2004, p.48)

“Art. 3º Consideram-se entidades e organizações de assistência social aquelas sem fins lucrativos que, isolada ou cumulativamente, prestam atendimento e assessoramento aos beneficiários abrangidos por esta Lei, bem como as que atuam na defesa e garantia de direitos.

§ 1º São de atendimento aquelas entidades que, de forma continuada, permanente e planejada, prestam serviços, executam programas ou projetos e concedem benefícios de prestação social básica ou especial, dirigidos às famílias e indivíduos em situações de vulnerabilidade ou risco social e pessoal, nos termos desta Lei, e respeitadas as deliberações do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), de que tratam os incisos I e II do art. 18.

§ 2º São de assessoramento aquelas que, de forma continuada, permanente e planejada, prestam serviços e executam programas ou projetos voltados prioritariamente para o fortalecimento dos movimentos sociais e das organizações de usuários, formação e capacitação de lideranças, dirigidos ao público da política de assistência social, nos termos desta Lei, e respeitadas as deliberações do CNAS, de que tratam os incisos I e II do art. 18.

§ 3 São de defesa e garantia de direitos aquelas que, de forma continuada, permanente e planejada, prestam serviços e executam programas e projetos voltados prioritariamente para a defesa e efetivação dos direitos socioassistenciais, construção de novos direitos, promoção da cidadania, enfrentamento das desigualdades sociais, articulação com órgãos públicos de defesa de direitos, dirigidos ao público da política de assistência social, nos termos desta Lei, e respeitadas as deliberações do CNAS, de que tratam os incisos I e II do art. 18.” (NR) (Lei 12.435)

De acordo com os textos da Política Nacional de Assistência Social, o Estado é o responsável pela condução da política, para que a assistência social possa se constituir enquanto política pública. Transitando do acampo da ajuda, filantropia e benemerência para o da cidadania e dos direitos. Dessa forma, coloca que somente o Estado dispõe de mecanismos fortemente estruturados para coordenar ações capazes de catalisar atores

115 em torno de propostas abrangentes, que não percam de vista a universalização das políticas, combinada com a garantia de equidade. A primazia, contudo, não pode ser entendida como responsabilidade exclusiva do Estado, mas implica na participação ativa da sociedade civil nos processos de formulação e controle social de sua execução. Um discurso que não desresponsabiliza o Estado, mas não descarta a participação da sociedade civil tanto na formulação, quanto no controle das ações, e na prestação de serviços.

Conforme exposto acima, a PNAS reafirma como um dos seus eixos de estruturação a parceria entre Estado e sociedade civil. Relação essa que precisamos observar e analisar se não pode colocar em xeque a primazia do Estado quanto à condução da política. Dependendo do entendimento, a legislação pode reforçar a ideologia neoliberal do Estado Mínimo, retraindo o Estado do campo das políticas sociais e ampliando a transferência de responsabilidade para a sociedade civil no campo da prestação de serviços. Desta forma, pergunta-se: que tipo de relação (ESTADO/SOCIEDADE CIVIL) está prevista nos textos legais?

Segundo a política, a administração pública deve desenvolver habilidades, como a formação de redes. Esta questão está apoiada sob a justificativa de que durante anos as políticas sociais brasileiras, em especial, a de assistência social, são marcadas pelas sobreposições ou paralelismo de ações, o que consequentemente gera uma dispersão de recursos humanos, materiais e financeiros. Dessa forma, o que podemos entender até então, é que existe um avanço na tentativa de organizar e regulamentar a relação entre o público e o privado.

Mas adiante, a justificativa para a parceria E/SC é devido à gravidade dos problemas sociais brasileiros. Neste momento, é colocado que o Estado deve estimular a geração de espaços de “colaboração, mobilizando recursos potencialmente existentes na sociedade” (PNAS, 2004, p. 41). Façamos uma observação aqui: o diagnóstico está correto, devido à fragilidade e até mesmo à quase inexistência de ações governamentais no âmbito da assistência social. Ao longo dos anos, o que se teve foi o surgimento de muitas instituições nessa área, instituições fortes e que podem ser bem aproveitadas, sendo realmente complementares à ação do Estado. Todavia, a política toma um tom diferente ao pregar o discurso da colaboração, o que pode dar profundidade ao modelo neoliberal, pois coloca um novo padrão para dar resposta à questão social, desresponsabilizando o Estado e auto-responsabilizando a sociedade para a função de

116 dar respostas à questão social. Tal questão pode desvirtuar a lógica de afirmação da assistência social como direito.

Há uma perspectiva de tendência liberal pós-moderna, que considera a sociedade civil como um bloco que busca acima de tudo interesses comuns, havendo a necessidade de olhar o mundo não mais a partir do antagonismo de classes, o que descaracteriza a existência de desigualdade na relação entre os proprietários da força de trabalho e os do capital, pois tudo gira em torno do “bem comum”.

Por conseguinte, as formas de enfrentamento das expressões da questão social, como a política social, e as resistências, como os movimentos sociais, são afetadas. O entendimento equivocado do papel da sociedade civil pode levar à despolitização dos movimentos de organização social e à institucionalização das “rebeldias”. Ao prevalecer o discurso que homogeneíza os interesses de classe, transforma-se a sociedade civil em um “bloco idêntico”. Montaño (1999) faz a seguinte referência sobre a repercussão dessa concepção de solidariedade: “O que se oculta, portanto, neste fenômeno de auto- responsabilização dos usuários particulares é um verdadeiro processo de des- responsabilização estatal (e do capital) com as respostas às sequelas da questão social” (MONTAÑO, 1999, p. 71).

De maneira geral, a política postula que a intenção é que as redes (formadas por instituições parceiras) não venham a substituir a ação do Estado, e que ela deve sim, ser alavancada a partir de decisões políticas tomadas pelo poder público em consonância com a sociedade, e que o Estado é o “coordenador” desse processo de articulação, tratando essa estratégia como forma de garantir a integralidade de atendimento à população. A adoção desse procedimento, todavia, traz riscos para o entendimento da assistência social como política pública e direito social. Pois, como afirma Guimarães (2009, p.86) o Estado não esclarece como a concretização da transferência do campo da filantropia se dá para o campo dos direitos.

Portanto, pode-se concluir que existe uma tensão expressa no texto legal, nos que diz respeito à relação Estado e Sociedade Civil. Cabe ressaltar, que esta tensão não está somente na forma como uma instituição privada, prestando serviços com uma conotação de direito, mas também está no fato de admitir que o Estado deve contar com a “participação” da sociedade “colaboradora”. Como citado anteriormente, tal posicionamento pode remeter a política a uma perspectiva neoliberal, num entendimento oriundo de uma concepção de Sociedade Civil que em nosso entendimento é equivocada. Contudo, vejo que o sentido geral dado a esta questão na

117 legislação da assistência social é que a responsabilidade na condução e na prestação de serviços da assistência social é de responsabilidade público-estatal.

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