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Relação entre funcionamento familiar e os estados emocionais negativos na adolescência adolescência

Relação entre funcionamento familiar e os estados emocionais negativos na adolescência

Relationship between family functioning and negative emotional states in adolescence

Mário Pinto Gonçalves, Inês Carvalho Relva, & Otília Monteiro Fernandes

Resumo

O funcionamento familiar é perspetivado como um fator que caracteriza a dinâmica familiar. Investigamos a forma como os adolescentes olham para as suas famílias, analisando o efeito que essa dinâmica vivenciada na família tem nos seus estados emocionais negativos, designadamente na ansiedade, depressão e stresse. Recorremos a uma amostra de 320 adolescentes, tendo aplicado a Family Adaptability and Cohesion Evaluation Scale (FACES- IV), a Family Communication Scale (FCS) e a Family Satisfaction Scale (FSS), assim como as

Depression Anxiety Stress Scales (DASS-21-C). Efetuamos análises descritivas exploratórias,

correlação de Pearson, e regressão múltipla hierárquica. Os resultados demonstraram que: 1) os adolescentes perspetivam as suas famílias como pouco coesas e flexíveis; 2) a prevalência de sintomatologia ansiosa entre níveis moderados e extremamente severos é de 32.8%, na depressiva 30.0 %, e na sintomatologia relacionada ao stresse 19.1%; 3) as raparigas evidenciam médias superiores de sintomatologia depressiva comparativamente aos rapazes 4) existe uma predição da coesão emaranhada e do sexo feminino na variável depressão e negativa quanto à satisfação familiar, sendo que a coesão emaranhada prediz positivamente o stresse em contraponto com a flexibilidade rígida e a satisfação familiar. Os resultados são discutidos ao nível do funcionamento familiar e o respetivo impacto nos estados emocionais dos adolescentes. Sugere-se que é importante sensibilizar pais, professores e técnicos de saúde primários, de forma a prevenirmos os estados emocionais negativos, ao longo da adolescência, assim como a realização de investigações longitudinais sobre esta temática.

Abstract

The family functioning is seen as a factor that characterizes the family dynamics. We investigated how adolescents look to their families, analyzing the effect of that dynamics experienced in the family has in their negative emotional states, including anxiety, depression and stress. We use a sample of 320 adolescents, and have applied the Family Adaptability and Cohesion Evaluation Scale (FACES-IV), the Family Communication Scale (FCS), the Family Satisfaction Scale (FSS) and the Depression Anxiety Stress Scales (DASS-21-C). We performed exploratory descriptive analysis, Pearson correlation and hierarchical multiple regression. The results showed that: 1) adolescents see their families as little cohesive and flexible; 2) the prevalence of anxiety symptoms of modorate and very severe levels is 32.8%, 30.0% in the depression, and symptoms related to stress 19.1%; 3)girls show higher averages in depressive symptomatology compared to boys 4) there is a prediction of enmeshd cohesion and female gender in the variable depression and a negative family satisfaction, and the enmeshd cohesion positively predict stress as opposed to rigid flexibility and family satisfaction. The results are discussed at the level of family functioning and their impact on the emotional states of adolescents. It is suggested that it is important to raise awareness among parents, teachers and technical primary health in order to prevent negative emotional states, through adolescence, as well as conducting longitudinal research on this subject.

Introdução

A adolescência é definida como um período desenvolvimental entre a infância e a adultícia. Embora em finais do século XIX tivesse sido interpretada como crucial no desenvolvimento da pessoa na sua total plenitude e potencial, apenas emerge na ciência psicológica, do ponto de vista empírico, no século XX (Senna & Dessen, 2012), portanto recentemente.

Etimologicamente, a palavra adolescente deriva do latim adolescere, que significa crescer (Sampaio, 2006). Salienta-se, com efeito, que a pessoa é, em si própria, neste crescimento maturacional, um ser em devir, em construção e na busca da sua individualidade/identidade que advém da relação com o outro, sustentando e apreendendo desse modo a vida afetiva (Matos, 2012), sendo que inicialmente, e geralmente, as primeiras relações são as relações na família de origem.

Neste sentido, compreendemos a família numa perspetiva alargada como exercendo uma indelével influência, considerando-se absolutamente significativa na estruturação dos indivíduos. Desempenha também um papel fulcral tanto na organização da personalidade como no comportamento individual de crianças e adolescentes, consubstanciado através dos afetos, de regras, limites, na interação direta com os pais, assim como através das práticas educativas parentais ou de outros significativos, na forma de conduzir os relacionamentos estabelecidos (e.g., família, escola, pares) (Pratta & Santos, 2007).

Adolescência e os desafios do crescimento

O período vivencial da adolescência encerra em si mesmo diversos tipos de desafios, não só para o indivíduo, mas também para o seu sistema familiar na sua globalidade, implicando reajustes permanentes entre este e aquele, devendo por isso serem relações pautadas pela flexibilidade. Com efeito, na adolescência, no início da aquisição de um pensamento complexo, envolto numa maturação física, biológica e psicológica iniciada com a puberdade, emerge a capacidade de formular abstrações perante os demais significativos e sobre o quotidiano (Alarcão, 2006; Gilbert, 2012). Dito de outro modo, neste período floresce aquilo que poderíamos denominar de segundo nascimento (Feixa, 2011). Subsiste, porém, a tendência de dividir a realidade entre o preto e branco, na maioria das vezes, sem perspetivar nuances, para lidar com os contextos relacionais e emocionais em que está envolvido (Alarcão, 2006).

Esta ideia, aliás, perpassa nos escritos de Fleming (2010), sugerindo-se que os adolescentes não adquiriram a capacidade, ainda, de relativizar a realidade, entregando as dimensões relacionais do amor ou afetos, à lei do tudo ou nada. Para esta autora, há duas tarefas

que subjazem ao longo do ciclo vital: o processo de separação-individuação e o processo de vinculação, sendo que o adolescente necessita de uma vinculação segura aos pais para assim poder conduzir os ditos processos de forma ajustada e solucionar adequadamente, o medo e o

desejo de crescer. Noller, Seth-Smith, Bouma, e Scweitzer (1992) argumentam que é comum

os adolescentes reportarem níveis de conflito elevados com os pais sentindo em simultâneo menor proximidade.

Nesta etapa da família (com adolescentes) existe uma separação psicológica entre pais e filhos, com o grupo de pares e/ou namorados, naturalmente, a desempenhar um papel de enorme preponderância na descoberta do “mundo exterior” (Fleming, 2015; Prinstein, Boergers, & Spirito, 2001). Perspetiva-se a influência dos pares, por exemplo, na tomada de decisões cruciais para os adolescentes (Albert, Chein, & Steinberg, 2013), ou na elaboração dos comportamentos de cariz sexual (Sneed, Tan, & Meyer, 2015). Contudo, esta necessidade salutar de autonomia por parte do adolescente deverá ser não só conquistada paulatinamente através da responsabilização, mas também num caminhar em simultâneo com a negociação exercida pelas figuras parentais na solução dos conflitos. Potenciando a maturação e selfs individualizados, assim como um desenvolvimento harmonioso, tendo por base um delineamento claro de limites e fronteiras (Fleming, 2015).

Por todas estas razões enumeradas anteriormente, compreende-se que o funcionamento familiar vivenciado de forma desestruturante se encontre associado a uma diminuição do bem- estar psicológico na adolescência, mais concretamente, no que respeita à exibição de depressão (Agerup, Lydersen, Wallander, & Sund, 2015), ansiedade (Gryczkowski, Jordan, & Mercer, 2010; White, Shelton, & Elgar, 2014), ou stresse (Kristensen, Schaefer & Busnello, 2010). De um modo positivo, as famílias que pautam as suas interações por um funcionamento equilibrado associam-se a uma redução de comportamentos aditivos (Woods-Jaeger, Nobles, May, & Larimer, 2016), relacionam-se, também, com um incremento na perceção de suporte e monitorização parental (Henry, Robinson, Neal, & Huey, 2006) e a um maior autocontrolo dos adolescentes, que conduz a um desenvolvimento individual saudável (Gomes & Pereira, 2014).

Ansiedade, depressão e stresse: Percursos adaptativos e desadaptativos na família

Para um melhor entendimento dos constructos que iremos investigar, socorremo-nos de Lovibond e Lovibond (1995a), que descrevem, em traços gerais, que a ansiedade pauta-se pelas ligações entre os estados persistentes de ansiedade excessiva (e.g., excitação do sistema nervoso autónomo, ansiedade situacional) e respostas intensas de medo de uma forma desproporcional; ansiedade é assim compreendida como a antecipação de ameaças futuras que poderá originar

pensamentos de perigo imediato e comportamentos de fuga (DSM-5, 2014). A depressão caracteriza-se por tristeza, pela perda da autoestima e motivação (e. g., disforia, inércia), nomeadamente com a perceção reduzida de alcançar objetivos de vida significativos para o indivíduo (Lovibond & Lovibond, 1995a); pode envolver alterações nítidas do afeto (humor triste e vazio), e também ao nível da cognição (DSM-5, 2014). Por último, o stresse compreende-se entre estados de excitação e tensão constantes (e.g., irritabilidade, agitação), acompanhados por uma diminuição da tolerância à frustração (Lovibond & Lovibond, 1995a). Em relação ao stresse e embora haja uma grande variabilidade de indivíduo para indivíduo, pode conduzir a insatisfação escolar/laboral, incrementar dificuldades de concentração e na tomada de decisões ou limitar e fazer sobrepor a atenção nos acontecimentos negativos (e. g., ruminação) (Vaz-Serra, 2007).

Sendo assim, Gouveia-Pereira, Abreu, e Martins (2014), encontraram que nas famílias situadas num nível desequilibrado de funcionamento (Coesão e Flexibilidade desadequadas) existe a preponderância de níveis de ideação suicida por parte dos jovens, quando comparadas com contextos familiares considerados equilibrados e medianamente nivelados. Neste estudo com 534 adolescentes, constata-se que a variável depressão se associa negativamente com a afetividade e positivamente com o conflito, ou seja, quando a família é pouco afetiva e as suas interações são pautadas pela conflitualidade, poderá originar um incremento na sintomatologia depressiva na adolescência. Efetivamente, pelo contrário, um relacionamento saudável com as figuras parentais é tido como um fator protetor em relação à prevenção da depressão em crianças e adolescentes (Teodoro, Cardoso, & Freitas, 2010). Com efeito, Freed, Rubenstein, Daryanani, Olino, e Alloy (2016), referem que o funcionamento familiar exerce um efeito mediador na clareza emocional ou na sua ausência (expressão dos sentimentos) e a sintomatologia depressiva nos adolescentes, acontecendo também num sentido bidirecional. Na mesma linha de análise, num estudo longitudinal com 513 adolescentes (amostra final de 101 participantes), verificou- se que as relações familiares positivas, caracterizadas por uma Coesão e Flexibilidade equilibradas, atuam de forma favorável nos indivíduos que se deparam com eventos de vida adversos, diminuindo as consequências potencialmente negativas e a probabilidade de ocorrência de comportamentos de cariz externalizante, promovendo em simultâneo o ajustamento dos jovens (Oliva, Jiménez, Parra, & Sáncez-Queija, 2008). Pegando no modelo tripartido que iremos trabalhar, Hjemdal, Vogel, Solem, Hagen, e Stiles (2011) indicaram a relação entre a resiliência pessoal e a elevada Coesão familiar como fatores que diminuem os comportamentos obsessivo-compulsivos, a ansiedade, depressão e stresse, na juventude.

Existirá uma interligação significativa entre a ansiedade e a depressão, no entanto, como explanado previamente, existem distinções importantes que deveremos ter em mente. Ainda assim, do ponto de vista etiológico, de acordo com Ask, Waaktaar, Seglem, e Torgersen (2016), existem evidências na componente genética que sugerem uma vulnerabilidade acrescida no desenvolvimento de ansiedade e depressão na adolescência. Contudo, referem estes autores, mais de metade da variância dos fatores de risco respeitantes à ansiedade, depressão e queixas somáticas dos 1394 adolescentes gémeos entre os 12 e os 18 anos de idade que participaram no estudo, residem nos fatores ambientais, como por exemplo, o contexto familiar vivenciado com os pais ou irmãos. Este último ponto, relacionado com as figuras parentais e fraternas já havia sido enfatizado anteriormente por Compton, Snyder, Schrepferman, Bank, e Short (2003). Outros autores objetivaram que a atmosfera familiar pouco estruturada ou desequilibrada relacionada com estilos parentais de superproteção (Jongerden & Bogels, 2015) ou psicopatologia parental (Schleider & Weisz, 2016), poderá ter um efeito negativo e propiciar o desenvolvimento de sintomatologia internalizante ao longo da adolescência. Por outro lado, experiências de relacionamento familiar com os adolescentes com problemas comportamentais tendem a provocar desligamento familiar, assim como a potenciar interações familiares empobrecidas (Jozefiak & Wallander, 2016).

White Shelton, e Elgar (2014) têm uma perspetiva distinta, na medida em que refletem que alterações (positivas) reportadas na dimensão Coesão familiar, encontram-se associadas a uma diminuição na sintomatologia depressiva, aos 17 anos de idade, predizendo modificações significativas na saúde mental das jovens. Com efeito, verificamos, numa revisão de literatura, que o ambiente familiar e o tipo de relacionamentos estabelecidos perspetivam a associação no que respeita ao incremento de ansiedade na infância, designadamente nas dimensões Coesão e Flexibilidade (Drake & Ginsburg, 2012). Sendo assim, níveis demasiado baixos ou elevados de Coesão tendem a provocar, respetivamente, um desligamento ou emaranhamento familiar; por outro lado, a uma reduzida Flexibilidade corresponderá rigidez nas interações familiares e a uma Flexibilidade familiar vivenciada como demasiadamente elevada, haverá tendência para um ambiente familiar caótico (Baiocco, Cacioppo, Laghi, & Tafa, 2013; Gomes & Pereira, 2014). Neste prisma, associado ao emaranhamento familiar, perspetiva-se um incremento na sintomatologia ansiosa e depressiva (Manzi, Vignoles, Regalia, & Scabini, 2006).

A presença de stresse no meio familiar é relativamente bem conhecida, bastará para isso cogitarmos nas tarefas e ajustamentos que são solicitados aos diversos membros da família, nas diferentes etapas do seu desenvolvimento individual bem como nas do ciclo vital familiar. Neste

sentido, por exemplo, a exposição ao stresse associado a transições desenvolvimentais na adolescência predizem significativamente problemas de internalização, designadamente sintomatologia depressiva e ansiosa. Deste modo, enquanto uma coesão familiar e práticas parentais equilibradas sugerem uma associação no que respeita à resiliência, ao longo da adolescência, verifica-se o seu contrário (sem efeito moderador), quando o funcionamento familiar se encontra diminuído (Sheidow, Henry, Tolan, & Strachan, 2014). Embora haja uma distinção do ponto de vista empírico entre a sintomatologia stressante associada à instabilidade familiar e os eventos de vida stressantes (e.g., morte de um familiar, divórcio) (Ross & Hill, 2002).

As diferenças encontradas em diversos estudos no que respeita ao sexo e à associação existente com estes indicadores psicopatológicos referem, invariavelmente, uma prevalência mais elevada no sexo feminino no que concerne ao desenvolvimento de perturbações de cariz ansioso (Lewinsohn, Gotlib, Lewinsohn, Seeley, & Allen, 1998; McLean & Anderson, 2009). Efetivamente são de realçar diferenças significativas concernentes ao género feminino, isto é, comparativamente aos rapazes as raparigas experienciam níveis de ansiedade mais elevados, acompanhados de dificuldades em lidar com estados emocionais negativos. Percebendo-se deste modo uma predição entre a elaboração destes estados e a ansiedade vivida (Bender, Reinholdt-Dunne, Esbjorn, & Pons, 2012; Maciejewski, Van Lier, Branje, Meeus, & Koot, 2016). Por exemplo, Nelemans et al. (2014) verificaram que a sintomatologia ansiosa, particularmente a ansiedade generalizada, aumenta a partir da adolescência média. No entanto, em idades mais precoces, na pré-escola e ao longo da infância, tende a verificar-se uma inversão de papéis, pois os rapazes, além de fisicamente mais ativos evidenciam níveis de desregulação emocional superiores aos das raparigas (Zahn-Waxler, Shirtcliff, & Marceau, 2008). Também, Borges, Manso, Tomé, e Matos (2008) referem que o género é preditor, efetivamente, da ansiedade observada em crianças e adolescentes.

Voltando à adolescência e no que se refere à dimensão depressão, sugere-se que as raparigas revelam duas a três vezes mais sintomatologia, quer em populações normativas quer em populações clínicas (Zahn-Waxler, Crick, Shirtcliff, & Woods, 2006). Mais recentemente, outros autores debruçaram-se sobre amostras de cariz epidemiológico notando diferenças significativas também em relação ao sexo, na medida em que o incremento da prevalência existente reporta-se nas jovens, em particular na depressão acompanhada de somatização (comparações com depressão atípica) (Silverstein et al., 2013). Com efeito, a preponderância de taxas mais elevadas no sexo feminino é assinalada noutros estudos (Hyde, Mezulis, &

Abramson, 2008; Mota, Matos, Pinheiro, Costa, & Oliveira, 2015; Thapar, Collishaw, Sine, & Thapar, 2012). Enquanto que decorrente de uma abordagem longitudinal com 995 indivíduos, McLeod, Horwood, e Fergusson (2016) compreenderam que as associações entre as variáveis sexo e depressão foram significativas, ainda que baixas, em relação ao funcionamento social na idade adulta (vitimização e gravidez não planeada) nas mulheres. Os autores referem que os riscos incidem não só nos indivíduos com diagnóstico de depressão major, mas também nos indivíduos com sintomatologia depressiva.

Fundamentos e conceptualização do modelo de funcionamento familiar de Olson e colegas

A fundamentação teórica do Modelo Circumplexo (MC) de Olson e colegas comunga da teoria familiar sistémica. Efetivamente é em finais da década de 70 que Olson, Sprenkle, e Russel (1979), lançam, por assim dizer, aqueles que serão os princípios basilares do referido modelo, isto é, a um bom funcionamento familiar subjaz um sistema equilibrado, em termos de Coesão e Adaptabilidade, sendo que os níveis centrais correspondem a famílias ajustadas, e altos e baixos resultados na Coesão e na Adaptabilidade correspondem a famílias extremas.

Neste seguimento, Olson, Russell, e Sprenkle (1989) propõem a primeira versão da escala de avaliação da Coesão e Adaptabilidade familiares (FACES), um instrumento de autorrelato que vai já na sua quarta edição, continuamente melhorado, sendo igualmente um modelo de investigação e aplicação clínica relativa ao funcionamento familiar que tem sido aperfeiçoado, portanto, ao longo de quase 30 anos. O MC hipotetiza as dimensões supracitadas com o relacionamento familiar de uma forma curvilínea. Dito de outro modo, a atual versão engloba seis escalas: duas equilibradas (coesão e flexibilidade) que medem os níveis moderados, e quatro desiquilibradas (desligada, emaranhada, rígida e caótica) que avaliam os extremos superiores e inferiores da Coesão e Flexibilidade (Olson, Gorall, & Tiesel, 2006)

A hipótese implícita ao MC, relativamente à Coesão, traduz-se pela seguinte premissa: níveis de Coesão balanceados estarão mais condizentes com um funcionamento familiar ajustado, envolto em proximidade e lealdade. Em contraponto, perante níveis de Coesão demasiado baixos ou elevados (não balanceados), o funcionamento familiar é considerado desajustado, pautado por um desligamento relacional e separação emocional (Olson et al., 2006). A Coesão define-se como sendo a ligação emocional entre os membros da família, avalia o grau de separação ou ligação de cada membro da família, e engloba conceitos como limite, tempo, coligação, espaço ou amizades. Compreendemos que quando a Coesão é equilibrada exerça um efeito protetor para as adversidades, passando-se o inverso quando a coesão é desligada (é desligada quando existe um envolvimento escasso entre os membros da família e

uma grande separação pessoal, predominam interesses separados e os indivíduos não se apoiam entre si) ou emaranhada (diz-se emaranhada quando ocorre uma proximidade emocional extrema e de dependência, os indivíduos tendem a ser demasiado reativos, uns com os outros) (Olson et al., 2006).

Quanto à Flexibilidade (antes o autor falava em Adaptabilidade - quantidade de mudança na liderança, nas regras e nos papéis relacionais. A dimensão da Adaptabilidade foi redefinida e atualmente é designada por Flexibilidade, que mede a qualidade de expressão da liderança e da forma como os membros da família se organizam, como se dão os seus processos de negociação, as relações de papéis desempenhados e as regras nos relacionamentos (Olson et al., 2006). Olson (2011) refere que é a forma como os sistemas familiares se equilibram entre os extremos de estabilidade e mudança. À semelhança da dimensão Coesão consideramos que a Flexibilidade (quando equilibrada) é tida, igualmente, como fator protetor perante as contrariedades, salientando-se o inverso quando a Flexibilidade é rígida (é rígida, quando a família é pautada por níveis de flexibilidade baixos, observando-se a existência de um indivíduo altamente controlador, autoritário, único responsável pela tomada de decisões sem que sejam questionadas ou negociadas, e regras inalteradas) ou caótica (é caótica quando encontramos sistemas familiares onde existe a tendência de haver uma liderança errática e difusa, sendo a tomada de decisão irrefletida e exercida de forma impulsiva por qualquer membro da família; ocorre uma difusão de papéis sendo estes pouco nítidos, com tendência a mudarem entre os membros do sistema) (Olson et al., 2006). Como referido inicialmente, considera-se que os sistemas familiares disfuncionais, conduzem, potencialmente, a comportamentos sintomáticos (Olson, 2011).

Incluindo a vertente Comunicação na sua equação, Olson e Gorall (2003) postulam que a mesma designa habilidades comunicacionais positivas. A variável comunicação familiar desempenha assim um papel central ou facilitador, em relação as dimensões Coesão e Flexibilidade existentes no contexto familiar (Olson, 2000; Olson & Gorall, 2003). Dito de outra forma, circunscreve as competências comunicacionais positivas nas interações dos sistemas familiares e maritais (e.g., partilhar sentimentos sobre si e na relação com os outros, aspetos afetivos da comunicação). Em suma, o modelo teórico supracitado explicita o nível de funcionamento familiar (Carvalho, Leuschner, & Olson, 2014; Olson, 2011). Integrando três dimensões essenciais à compreensão, avaliação e intervenção dos sistemas conjugais e familiares; Coesão, Flexibilidade, e comunicação (Olson, 2000; Olson & Gorall, 2003).

Aludindo à hipótese central do MC teremos então que sistemas familiares com graus de Coesão e Flexibilidade familiar equilibrados tendem a apresentar boas capacidades comunicacionais. Por contraponto, sistemas familiares com graus de Coesão e Flexibilidade desequilibrados apresentam baixos níveis de comunicação familiar (Olson, 2011).

No entanto gostaríamos ainda de explicitar, em breves linhas, que os valores de percentil utilizados em contexto clínico permitem situar os indivíduos de acordo com o Mapa Conjugal e Familiar. Deste modo, através do cruzamento das dimensões Coesão (eixo sincrónico) e Flexibilidade (eixo diacrónico), descreve-se a compreensão do funcionamento dos sistemas familiares (Olson, 2011). De salientar que a distinção entre sistemas familiares equilibrados e desequilibrados é entendível, na perspetiva de que os primeiros não se fixam nos níveis extremos de Coesão e Flexibilidade, por extensos períodos de tempo (Olson & Gorall, 2003).

Sendo assim, nas várias análises realizadas recorrendo à utilização da FACES IV, ou a versões anteriores, salientamos olhares sobre diferentes problemáticas: funcionamento familiar e vítimas de terramoto (Cao, Jiang, Li, Lo, & Li, 2013), envolvimento parental e lazer familiar

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