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2. A gestão da indisciplina na sala de aula

2.1 Prevenção da indisciplina na sala de aula

2.1.3 Relação Pedagógica

Durante algum tempo a escola era vista como um espaço criado para a transmissão do conhecimento, no entanto, atualmente, “não basta que a escola assegure a transmissão do saber, mas ela deve incentivar a recriação e criação do saber” (Estrela, 2002, p.39). Alguns autores, (Estrela, 2002; Amado, 2001; Carita e Fernandes, 2002) concordam que todo o processo educativo decorre através de relações interpessoais, considerando o professor como um profissional de relação, um organizador do processo ensino- aprendizagem.

Para Estrela (2002) a relação pedagógica é o contato interpessoal que se gera entre os intervenientes de uma situação pedagógica e o resultado desses contatos.

Por sua vez, Amado (2001) entende por relação pedagógica problemática aquela em que os resultados desse contacto, o contacto entre os intervenientes não são, pelo menos, os esperados. Acrescenta que quando as expetativas que os alunos criam em relação ao professor falham, desencadeiam situações de indisciplina.

Vendo a escola e a sala de aula como um espaço relacional e democrático, o “papel do professor deixa de ser essencialmente o de transmissor para se tornar o organizador da aprendizagem e o estimulador do desenvolvimento cognitivo e socio-afetivo do aluno” (Estrela, 2002, p. 39).

37 Como realçam Carita e Fernandes (2002) a eficácia do professor no ensino- aprendizagem não passa apenas pelos seus conhecimentos científicos, mas também pelo seu sucesso no domínio da relação pedagógica, que se constrói na aula, servindo de suporte às atividades e situações aí criadas e desenvolvidas.

Neste sentido, o professor tem a necessidade de procurar estratégias que lhe proporcione um melhor relacionamento com os alunos e a criação de um ambiente propício ao ensino-aprendizagem.

Muitas dessas estratégias passam nomeadamente pela definição de normas de conduta e pela criação de um clima de confiança no sucesso do aluno e de respeito. A este propósito, Carita e Fernandes (2002) referem que os professores previnem a indisciplina e favorecem a aprendizagem, na medida em que, estabelecem com os alunos um clima de simpatia e respeito, que se traduz na transparência das regras, quer das mais relativas à organização e avaliação do trabalho quer daquelas mais direcionadas à regulação das relações entre as pessoas.

Uma relação pedagógica aberta e transparente, o estabelecimento do diálogo bem como a ausência de autoritarismo na definição das regras é fundamental para uma relação saudável ou pouco conflituoso.

Com efeito, Jesus (1996) salienta que se deve criar uma relação de agrado, em que o professor faz uma condução democrática do grupo turma e não a uma atmosfera de laissez-faire, estilo permissivo, na medida em que os alunos fazem o que querem e a indisciplina continua a fazer parte da realidade da sala de aula.

Na verdade, o professor que adota uma atitude democrática e de autonomia, “aquele que sugere tarefas e os educandos têm espaço de iniciativa na sua realização, ao contrário daqueles que mantém uma atitude autoritária, apresenta uma maior coesão e consequentemente, os benefícios são maiores” (jesus, 1996, p. 14).

É importante que a relação seja assente no diálogo e na negociação. Para isso, torna-se importante que o professor promova a criação de um ambiente de participação ativa dos alunos, envolvendo-os nas atividades e delegando-lhes responsabilidades. O aluno, deixa assim de ser um “recetor humilde e obediente” (Estrela, 2002, p. 38) e passa a estar diretamente envolvido no processo de ensino-aprendizagem.

Sendo assim, a relação pedagógica que se estabelece entre o professor e o aluno, torna- se importante para a prevenção da indisciplina na sala de aula.

38 Seguidamente, apresentamos de forma sucinta, um conjunto de questões que consideramos importantes nas relações interpessoais e favorecedoras de um clima saudável de ensino aprendizagem.

2.1.3.1 Autoconhecimento do professor e conhecimento do aluno

De acordo com Carita e Fernandes (2002), independentemente da sua vontade, os professores possuem o poder de modelagem, isto é, de influenciar os alunos mediante o seu próprio comportamento. Estas autoras afirmam que “por ter uma influência marcante no comportamento do aluno e no seu desenvolvimento pessoal e social, a modelagem deve tornar-se um processo consciente” (p.24). Acrescentam ainda que só assim permitirá que o professor preste atenção ao modo como atua na aula e é observado pelos alunos.

Por outro lado, para gerir melhor as relações interpessoais e o processo ensino- aprendizagem, conforme Carita e Fernandes (2002), é necessário que o professor se auto observe para fazer uma autoanálise no sentido de conhecer-se a si mesmo, que tenha em atenção a sua conduta e que consiga prever os reflexos dela nos alunos. Este conhecimento permite que o professor reflita sobre a maneira como é percecionado pelos alunos e, “manipular com cuidado uma das mais importantes variáveis da sala de aula – ele próprio” (Carita e Fernandes, 2002, p. 32).

As mesmas autoras defendem que o autoconhecimento consciente de si permite um melhor conhecimento do aluno e uma relação interpessoal caraterizada pela abertura e transparência, pelo cuidado e atenção para com o outro e pela interdependência de um

em relação ao outro (p. 32).

Ainda segundo Carita e Fernandes (2002) o conhecimento das necessidades, sentimentos, opiniões ou caraterísticas pessoais do aluno é um importante instrumento de prevenção de indisciplina dado o clima de maior proximidade que potencia e o facto de permitir prever quer os problemas, quer respostas e soluções mais ajustadas.

2.1.3.2 Comunicação pedagógica

A relação pedagógica “assenta na comunicação e do modo como ela é estabelecida depende o sucesso do ato pedagógico” (Carita e Fernandes, 2002, p. 41).

39 Para Amado (2001) “a comunicação pedagógica orienta as perceções dos alunos sobre o que foi dito ou mostrado, estimula o desenvolvimento das competências linguísticas, desafia as capacidades de aprendizagem e define a relação entre os comunicantes” (p. 86).

Para Estrela (2002) “todo o ato pedagógico é essencialmente um ato de comunicação visando induzir a aprendizagem de um saber” (p. 60). A mesma autora enumerou algumas estratégias facilitadoras da comunicação e promotoras de um clima de disciplina: a distribuição equitativa da comunicação por todos os alunos da aula, obtida pela eficaz utilização do espaço da sala de aula, promove um clima de disciplina, na medida em que os alunos não envolvidos na comunicação com o professor, “manifestam comportamentos de desinteresse e fuga à tarefa ou o que acontece mais frequentemente, enveredam por comportamentos desviantes mais perturbadores da aula” (p. 64).

Estrela (2002) realça a importância da comunicação que o professor estabelece com os alunos na transmissão de expetativas. “Através da comunicação que estabelece com os alunos, o professor vai-lhes transmitindo, consciente ou inconscientemente, as expetativas que formula a seu respeito, expetativas que levam os alunos a agirem em sua conformidade” (p.71).

Desta forma, segundo Estrela (2002), se os professores manifestarem atitudes positivas, de confiança no aproveitamento e comportamento do aluno, este desenvolve uma imagem positiva de si, esforça-se mais nas tarefas escolares e obtém melhores resultados.

A criação de condições favoráveis à comunicação, onde haja um clima de abertura, de confiança e de transparência entre o professor e o aluno, permite o desenvolvimento de uma boa relação pedagógica, facilitando assim o processo de ensino-aprendizagem.

2.1.3.3 Espaço e tempo

De acordo com Estrela (2002), a relação pedagógica é também condicionada pelo espaço físico e tempo.

Esta autora defende que a escola, enquanto espaço físico é um lugar de hierarquias e a ocupação de espaços marca a diferença entre as pessoas. “Desde os muros que separam a escola do mundo, às áreas de circulação restrita, à localização do gabinete do

40 diretor aos espaços reservados aos professores, tudo concorre para fortalecer uma certa ordem estabelecida” (p.42), muitas vezes limitando a interação entre os membros da comunidade educativa.

Também Estrela (2002) defende que o espaço da sala de aula não é menos estruturado e hierarquizado que o espaço da escola. A sala de aula transforma-se em espaço pedagógico onde se processa a transmissão intencional do saber e se dá a criação de relação pedagógica. Esta mesma autora, ressalta que:

Pelas suas dimensões, configuração, densidade de ocupação, possibilidades de utilização e condições de apropriação, o espaço facilita ou inibe a relação do professor e dos alunos e destes entre si, marca-lhes limites, assinala papeis e consagra estatutos, veicula normas e valores (Estrela, 2002, p.42).

Para Amado (2001), a organização espacial dos mobiliários e a consequente disposição dos alunos e do professor, é um suporte imprescindível do processo de ensino- aprendizagem e da vida relacional na aula.

Estrela (2002) defende que a constante mudança do lugar dentro da sala gera perda de tempo e fomentam situações de indisciplina, ocasionam a despersonalização dos espaços e a consequente iresponsabilização pela sua conservação e embelezamento, desligando também a relação pedagógica.

A mesma autora refere que a relação pedagógica também é regulada pelo tempo institucionalmente definido e acrescenta que:

O tempo escolar raras vezes consegue atingir um equilíbrio, acabando quase sempre por subordinar o ritmo do aluno que se sente os ritmos da aula desajustados aos seus ou à natureza das tarefas, o que origina sentimentos de perda ou de ganho de tempo.

Neste sentido, cabe ao professor, valorizar o espaço e tempo, procurando o equilíbrio, assumindo o papel de organizador, dinamizador e gestor do processo de ensino e aprendizagem.

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