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CAPÍTULO I: Ao encontro do universo cigano

5. Relatos de coabitação

Esse item apresenta a partir da análise das anotações realizadas nos Diários de

Campo, as diversas pesquisas de campos realizadas nesse estudo. Para Rodrigues (2010a, p.3-

4),

O intérprete nas Pesquisas de Campo estará realizando os diários de campo e nos Laboratórios os diários pessoais. Os registros do Diretor dizem respeito as suas observações e análises dos diários do Intérprete, assim como dos laboratórios que ele planeja e do que realmente foi realizado. Registros audiovisuais são feitos quando oportunos, porém eles não são feitos em muitas das experiências em Pesquisa de Campo a fim de priorizar a relação do pesquisador com o pesquisado. Nos laboratórios iniciais também não é realizado este tipo de registro para oportunizar um fluxo mais espontâneo do corpo em processo. Os registros irão possibilitar uma reflexão essencial para o Intérprete, auxiliando-o a montar o mapa de consciência de seu processo.

As Pesquisas de Campo relatadas a seguir foram realizadas no período de agosto de 2014 a dezembro de 2017. Foram aproximadamente 60 idas a campo por dez cidades do

Estado de São Paulo: Atibaia, Caieiras, Campinas, Itanhaém, Itatiba, Itaquaquecetuba, Piracicaba, São Paulo, Sumaré e Valinhos.

O campo escolhido para essa pesquisa, como já explicitado no item anterior, são as diferentes representatividades ciganas no Estado de São Paulo (capital e interior) alocados em festividades temáticas, incorporações espirituais, modos de vida em acampamentos marginalizados, comunidades nômades ocupando espaços públicos, residências fixas, circo itinerante, encontros científicos temáticos, entre outros. Esses campos serão divididos aqui em três distintas, porém complementares etapas. Cada etapa, por sua vez, concentra um nicho temático específico, com confluências de valores, modos operantes e temas latentes.

A primeira etapa que será apresentada a seguir, corresponde às festas temáticas, encontros de resistência cultural e convivência com mulheres que se identificam com a imagem onírica da cigana, num contexto exotérico e/ou associado às artes, em especial das linguagens de dança e música. Diz respeito àquilo que genericamente se diz “parecer cigano”. A vivência dessa etapa tocou, em mim, em temas como a exposição e idealização e, por esse motivo, dei o nome de “Vitrine”.

A segunda etapa compreende as idas a acampamentos ciganos e encontro com ciganos nômades instalados em espaço público. Diz respeito ao encontro com aqueles que margeiam as fronteiras do pertencimento social. Traz, portanto, o nicho temático dos modos de vida cigano na contemporaneidade brasileira. Nomeei essa segunda etapa de “Fronteiras”.

A terceira e última etapa abrange o fenômeno da incorporação e aconselhamento espiritual, seja em terreiros de umbanda ou em outros espaços não convencionais. Contempla as várias possibilidades de dar passagem a essa energia e força cigana, numa perspectiva mais arquetípica e divinatória. Esse nicho temático diz respeito ao devir cigano, numa perspectiva predominantemente espiritualista. Nomeio essa etapa como “Passagem”.

A escolha por apresentar nesse item da tese, resumidamente, cada um dos campos coabitados se dá, principalmente, pela complexidade do campo emocional de cada um deles e a riqueza sociocultural que carregam em si, nas mais diversas concepções de ciganicidade que cabem em nossa brasilidade, nesse presente momento sociocultural.

Além de apresentar a diversidade desse segmento social, esses relatos propõem estabelecer paralelos entre essas vivências de campo e o ato de me inventariar, confluências essas, diretamente relacionadas a minha identidade, reforçando assim, os aspectos integrativo e sistêmico do método.

5.1 Etapa I: Vitrine

Essa etapa inicial das pesquisas de campo compreende o período de agosto de 2014 a dezembro de 2015 e diz respeito a quinze idas a campo em diferentes espaços e acontecimentos: festas temáticas como o Luau Cigano (Itanhaém/SP) em homenagem a Santa Sara Kali e a Festa Cigana na Fazenda das Oliveiras (Itatiba/SP); eventos científicos como o ciclo Retrato Cigano e palestra “Os Ciganos espanhóis e a inovação religiosa” promovidos pelo Centro de Pesquisa e Formação do Sesc São Paulo (São Paulo/SP); evento de resistência cultural (São Paulo/SP, Atibaia/SP e Valinhos/SP); visita ao Circo Moscou (São Paulo/SP) e, encontros com professora de dança cigana (São Paulo/SP), cigana nômade hoje assentada (Caieiras/SP) e casal de simpatizantes que participa ativamente de eventos ciganos (São Paulo/SP).

Essa primeira etapa tocou em conteúdos e temas como a idealização, generalização, afetividade, fantasia, pertencimento, apropriação cultural, competição, dissimulação, compensação, permissividade, ocultamentos, hierarquia, discriminação, consentimento, carências, ausência de limites, legitimidade, patriarcalismo, disciplina e dedicação, apego, autocensura, enquadramentos, julgamento, aceitação, controle, curiosidade, euforia, prazer, paralisação física, medo entre outros. Esses temas apresentados estão diretamente associados aos campos emocionais dessas coabitações e também, são identificados enquanto parte do meu inventário.

Como já afirmado por Rodrigues (2003, p.84), as pesquisas de campo propiciam que dados da cultura velada comecem a se revelar, que são “crenças omitidas pelos familiares e mesmo origens mais humildes que se quer ignorar”. Segue então, os relatos das minhas coabitações nessa primeira etapa das pesquisas de campo.

Cigana assentada

Caieiras, 26 de agosto de 2014

A minha primeira Pesquisa de Campo enquanto pesquisadora do Método BPI aconteceu no dia 26 de agosto de 2014, logo que ingressei no doutorado. Nesse dia, visitei D. Celestina, cigana da etnia calon17 que, segundo seus relatos, viveu por muito anos na condição

17 Os ciganos da etnia calon falam a língua caló. São conhecidos como os ciganos ibéricos, recebendo o nome de

gitanos. Viviam principalmente em Portugal e na Espanha, mas que no decorrer dos tempos se espalharam também por outros países da Europa e foram deportados ou migraram inclusive para a América do Sul.

nômade e atualmente reside sozinha em endereço fixo na cidade de Caieiras (SP). Foi uma abertura de campo especial porque me senti acolhida ao mesmo tempo em que pude lidar com alguns conflitos internos importantes para um estudo sobre identidade.

D. Celestina é uma senhora de 80 anos conhecida carinhosamente como bibi, que significa “tia” no dialeto cigano. Minha primeira quebra de idealização começou assim que cheguei em sua casa após muitas trocas de ônibus, quando me deparei com uma fachada discreta, de tons claros, totalmente diferente do que eu imaginaria ser uma residência cigana. Só por esse relato já fica claro o quanto, naquele momento inicial da pesquisa, eu ainda estava presa à imagem onírica da cigana.

Depois de um tempo batendo palmas em frente a um portão de ferro, com medo de estar na casa errada e lidando com meu estranhamento, surge na porta uma senhora de estatura baixa, vestindo saias longas, com cabelo preso em um coque baixo, com parte do seu corpo coberto por acessórios, com maquiagem e unhas coloridas, voz suave e rouca. Ela me recebeu com sorriso largo no rosto e um abraço apertado.

Quando entrei em sua casa fiquei surpresa pois a sala, primeiro ambiente interno, cheirava a incenso doce e velas aromáticas.

Nos móveis haviam porta-retratos com fotos da família, objetos decorativos como uma serpente de cerâmica, esculturas e quadros de ciganos (o maior deles, ao centro da parede, era da cigana Esmeralda, entidade cigana que, segundo ela, é sua mentora espiritual), imagens de santas (entre elas a Santa Sara Kali, padroeira dos ciganos e da qual ela é muito devota), vasos com flores coloridas, potes com moedas douradas, arroz e cravo etc.

A música ambiente, em seu aparelho de som antigo, era dedicada às rumbas flamencas do grupo musical francês Gipsy Kings.

Seguimos pelo restante da casa. Me deparo com três quartos alinhados num corredor que dava acesso à cozinha e à varanda. O primeiro deles me chamou atenção, pois era todo forrado com tecido vermelho: uma tenda cigana confinada entre quatro paredes.

Esse quarto era uma eloquente alegoria para essa primeira etapa dos relatos de campo: uma tenda cigana alocada num espaço fechado de residência convencional retratava uma possível desconstrução da imagem cigana enquanto comunidade nômade e miserável e da temida mulher das ruas para a acolhedora senhora das boas histórias em endereço fixo, o que me fazia questionar a diversidade de representações ciganas no Brasil.

Nesse quarto vermelho, tudo parecia ter uma história, um sentido, uma memória. É nesse quarto que ela atende as pessoas para leitura de cartas. Era um ambiente que acolhia, por sua vez, todo meu imaginário.

Figura 1: As mãos de D. Celestina. Acervo pessoal de D. Celestina.

Em pé, na porta desse quarto, na fronteira entre os mistérios daquele ambiente místico e o corredor de acesso a casa convencional, fui convidada a escolher, aleatoriamente, três cartas de seu baralho antigo e ela me explicou o significado delas. Foi minha primeira experiência de consulente e foi muito importante ter sido justamente essa a vivência que marcaria meu primeiro campo, já que era justamente o conteúdo que havia me levado até ela.

Depois seguimos para a cozinha e lá ficamos conversando por horas sobre nomadismo cigano, casamentos arranjados, a origens dos nomes ciganos (e quem escolhe e determina qual será o nome de nascimento, batismo ou certidão oficial de cada criança, porque segundo a D. Celestina, cada cigano recebe ao longo da vida, essas três distintas identidades) e também, vendo fotos de sua família.

Na cozinha, com cheirinho de café passado na hora, me lembrei da D. Odete do Batuque de Umbigada de Piracicaba, que foi a primeira pessoa que convivi em situação de campo, ainda na Graduação em Dança. Ela se reunia comigo em sua cozinha para tomarmos um café quentinho e sempre tinha uma longa história repleta de afetos e aventuras para contar sobre os tantos anos vividos em fazendas de café no interior de São Paulo. O cheiro do café ao

lado de pessoas acolhedoras e queridas, durante horas de boas conversas, seria um dado afetivo importantíssimo daqui para frente, pois em vários campos o café esteve presente, diretamente ligado a sensação de intimidade, o que abraçava também minhas memórias familiares, como por exemplo, de acordar com cheiro de café passado na hora pelo meu pai e dos tantos cafés da tarde junto de meus avós.

Ao longo da conversa, a D. Celestina me disse que na cultura cigana os conhecimentos são passados de pais para filhos numa tradição predominantemente oral, sendo a maioria dos ciganos analfabetos. Vivenciamos juntas um instante de silêncio, após sucessivos relatos de discriminação, negação da própria cultura e perseguição étnica.

Foi então, que ela me levou até seu quarto, pegou uma caixinha e começou a tirar dela alguns papéis. Me mostrou jornais antigos, guardados com carinho, que traziam matérias sobre conquistas sociais ciganas e me pediu para ler para ela determinados trechos. Ela me apontava o trecho a ser lido. Descubro nesse momento que ela é analfabeta (ela tinha a memória espacial dos trechos anteriormente lidos por outras pessoas).

Cessado esse assunto, perguntei sobre a dança cigana e ela relatou que têm muitos giros e forte presença das mãos e do olhar. Esse momento foi bonito porque, ao me dizer isso, ela se levantou da cadeira e começou a dançar no corredor de sua casa.

Me mostrou em seguida algumas fotos dançando em diferentes etapas de sua vida e, nesses registros, pude ver quanto o elemento fogo, por exemplo, fazia parte de seu universo simbólico, pois eram muitas as fotos com tochas de fogo nas mãos, pés dançando em fagulhas de fogo etc.

Outro assunto foi a questão do corpo feminino. Seus relatos me remeteram imediatamente ao Mito de Eva e a noção de pecado herdado, especialmente nas figuras da serpente e da maçã que são, por sua vez, imagens presentes em vários objetos e relatos da D. Celestina.

Dentre o que foi dito sobre o simbolismo do corpo feminino, o peito significava vida e por isso, segundo ela, as ciganas podem até mostrar os

Figura 2: Cigana dançando em fagulhas de fogo. Acervo de D. Celestina.

seios em público, porque para a cultura cigana, essa região do corpo está diretamente associada a amamentação, que por sua vez está associada à maternidade, que por sua vez, por fim, associa-se sacralidade de se gerar uma vida.

Já as pernas, região genital e tornozelos devem ser escondidos, debaixo de três camadas de saia se possível, pois é a parte do corpo que recebe o homem, entrega o filho ao mundo, está associada ao prazer feminino sendo, portanto, a fronteira de entrada e saída do corpo, o que os tornam suscetível e vulnerável, devendo assim, ser cuidada e protegida e, de certa maneira, censurada e reprimida.

Quando falamos sobre a entidade Esmeralda, cigana que é sua mentora espiritual e que a instrui por meio da intuição e incorporação, ela me disse que é uma jovem de dezoito anos, belíssima, que dança graciosamente, que é sensual e passional e que tem o dom da cura.

Para D. Celestina um dos sinais de que a entidade Esmeralda está sendo incorporada nela, é que seus olhos mudam de cor. Me relatou também, que algumas pessoas que olham para ela, especialmente homens jovens, veem a jovem cigana em seu lugar e se apaixonam por essa imagem tamanha a força dessa incorporação.

Esse relato não deixa de ser uma metáfora para a discussão sobre imagem ideal de corpo e a construção de uma identidade pautada naquilo que é supervalorizado e mais facilmente aceitável estética, social e culturalmente. A minha identificação com essa imagem idealizada de mulher é um forte dado desse primeiro campo.

As histórias sobre a jovem Esmeralda e sua força espiritual, me fizeram lembrar de outro mito, o da Velha Bruxa, popularmente conhecido como a bruxa da Branca de Neve, graças ao desenho infantil da Disney, que originariamente é um conto dos Irmãos Grimm. Essa bruxa, por meio da transfiguração etária, nesse conto, seduz uma jovem, por meio de uma maçã envenenada e a aprisiona paralisando seu corpo. Essa capacidade simbólica de transformação etária assemelhava-se aos inúmeros relatos compartilhados por D. Celestina, em diferentes roupagens e contextos.

Outro relato recorrente é sua devoção a Santa Sara Kali18, enfatizando a importância do mês de maio para o povo cigano. Sara é a padroeira dos ciganos e D. Celestina tem inúmeras histórias de fé relacionados a essa Santa.

18 Segundo vários relatos em campo, Sara é um nome hebraico associado a mulher de alta sociedade e o

epíteto Kali significa "negra", na língua indiana sânscrita, estando ela, diretamente ligada as lendas das Virgens Negras. Seu centro de culto é a cidade de Saintes-Maries-de-la-Mer, na França, cidade onde se encontra também sua cripta, na Igreja de Saint Michel. Sua festa é celebrada nos dias 24 e 25 de maio, reunindo ciganos de todo o mundo. Sua imagem é coberta de lenços, sendo ela uma protetora da maternidade: mulheres que não conseguem

Já era tarde e eu precisava retornar a Campinas. Nesse momento, quando nos despedíamos, ela me presenteou com roupas ciganas e acessórios pessoais como pulseiras e brincos dourados.

Ela acreditava que esses presentes poderiam me ajudar a dançar com mais propriedade a sua cultura. De fato, me ajudou, pois os levei para meus trabalhos laboratoriais. Um desses objetos, a pulseira dourada de guizos, que para a personagem Zafira está diretamente relacionada a imagem de uma serpente que ao se desenhar em seu corpo gera um serpentear da coluna e abre espaço para paisagens bem específicas dela como grandes desertos e feiras, foi bastante especial e permaneceu durante todo o processo de criação.

Hoje, ao reler o diário de campo desse encontro, me pergunto quem são esses “eles” que ela cita: eles comemoram, eles casam, eles festejam, eles acreditam. Esses “eles” seriam os ciganos de acampamentos, qualquer pessoa que se autodenomine cigano, os ciganos que estão no Brasil ou os ciganos do mundo? Quem seriam essas pessoas, quais pessoas caberia no “todas as ciganas” que ela afirma ter determinadas características? Segundo meus julgamentos, a generalização era evidente e a pouca ordem cronológica também, mas a força de seus relatos carregava uma veracidade incontestável, pelo menos para ela e essa convicção apaixonada me tocava.

Caieiras, 23 de dezembro de 2014

No dia 23 de dezembro, quatro meses após o nosso primeiro encontro, retorno à casa da D. Celestina. Entre essas duas visitas, nos encontramos no evento do Relevando São Paulo, na capital, que será relatado no próximo item, ainda desse capítulo.

Nesse dia ela me ofereceu novamente um café e ficamos praticamente o tempo todo conversando na cozinha. Me fez vários relatos pessoais, retomou algumas conversas anteriores, mas agora os dados eram outros: a imprecisão nos tempos de duração, cronologia dos fatos e lógica nos relatos me deixava intrigada, porque não tem como saber a veracidade de muitas coisas que ela relatava.

Fui orientada pela Graziela a acolher tais dados, pois as histórias que ela conta com tanto entusiasmo são parte dela e que claramente não precisam ser verídicas para serem legítimas porque a fantasia é um lado importante de sua personalidade e era isso que deveria importar naquele momento. Me questiono a razão disso me incomodar tanto na época. As respostas vêm aos poucos.

engravidar e mulheres que pedem por um bom parto, ao terem seus pedidos atendidos, depositam aos seus pés um lenço (diklô). Santa Sara é a santa dos desesperados, dos ofendidos e dos desamparados.

Esse olhar não julgador é um dos aspectos e especificidades de abordagem da ferramenta pesquisa de campo para esse método, que eu apreendia e exercitava a cada novo campo vivenciado. Quando entendi isso via experiência, consegui acompanhar melhor as narrativas D. Celestina e buscar o que estava por trás de sua fala, me importando menos com a veracidade e cronologia dos fatos e mais, muito mais, com o que era expresso em seu corpo.

Esse encontro permitiu estreitar laços e foi aí, na abertura para começar a acolher o universo do outro de verdade, que entendi melhor meu papel nesse encontro e nessa pesquisa (não somente pela teoria do método, mas pela experiência de vive-lo em meu corpo). Eu ainda estava aprendendo a trabalhar maduramente com essa ferramenta e a constância das idas a campo e o contato com minha orientadora foram fundamentais nesse processo.

Caieiras, 09 de dezembro de 2015

No dia 09 de dezembro de 2015, quase um ano após a visita anterior e depois de muito exercício de coabitação - em outros espaços que serão relatados em seguida -, estive por mais uma vez com D. Celestina em sua casa. Esse foi um dia para reencontrá-la e agradecê-la pelo acolhimento no início do projeto e também, para retomarmos assuntos como a incorporação da entidade Esmeralda e a cultura cigana, assuntos esses que nós duas gostávamos de conversar.

O campo era o mesmo, mas eu não era a mesma nesse campo: Sentia-me mais aberta para receber seus relatos, consegui mergulhar em suas narrativas com mais facilidade, especialmente nas histórias sobre sua entidade, que dessa vez me deixaram envolvidíssima! Sentia-me mais porosa para receber os tantos estímulos daquele ambiente e suas histórias fabulosas.

Nesse dia, em especial, ela contou duas lendas sobre o amor da cigana Esmeralda e cigano Vladimir. Para ela, essas duas entidades espirituais, há séculos atrás, eram ciganos nômades encarnados e hoje, na condição de desencarnados (espíritos), prestam serviços de orientação espiritual a quem tem afinidade com essa linha espiritual.

A primeira versão apresentada por ela, conta que séculos atrás um cigano chamado Vladimir se apaixonou por uma cigana de seu clã, cigana essa que seu irmão também era apaixonado. Para decidir quem ficaria com a cigana Esmeralda, o irmão de Vladimir propôs a ele um duelo. Para não fugir à tradição, Vladimir aceitou a proposta e dirigiu-se para o embate, porém, na hora exata de aplicar um golpe percebeu que levaria vantagem e que isso significaria a morte de seu irmão, então recuou e para surpresa de todos

acabou sendo atacado por seu irmão, caindo morto em seguida. Nesse momento Esmeralda vendo-o caído no chão, morto com uma adaga cravada em seu peito, jogou-se sobre seu corpo e chorando a retirou de seu corpo e a cravou em si, ato este que culminou também em sua morte. “O amor deles seria, enfim, consumado em outros planos” - como D. Celestina me explicou.

A segunda lenda conta que o cigano Vladimir era de origem eslava (povo indo- europeu) e que se apaixonou perdidamente por Esmeralda (cigana da região de Sevilha), que era conhecida por trabalhar em magia branca, de cura, especialmente com pedras verdes. Ela,

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