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Relatos de mercado

No documento – PósGraduação em Letras Neolatinas (páginas 49-132)

Com base nas considerações de Bourdieu sobre a relação entre mercado e bens simbólicos presentes em As regras da arte, Molina define uma categoria bastante pertinente para a leitura de autores relacionados à NNA, o relato de mercado:

Un relato de mercado es una narración sobre el mercado de los bienes simbólicos —ya sea sobre sus agentes, sobre sus productos y/o sobre sus consumidores— que permite leer las significaciones y las prácticas estéticas y económicas que sus autores realizan de/en él. (2010, p. 114)25

Assim, os próprios textos ficcionais que se adequam a essa descrição podem servir como fontes para a compreensão da configuração do campo literário. No caso da NNA, nota-se uma forte tendência nesse sentido, sendo possível observar a presença de autores, editores, críticos entre outros constituintes do campo como personagens nas narrativas, além da referência aos

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Um relato de mercado é uma narrativa sobre o mercado de bens simbólicos - seja sobre seus agentes, sobre os seus produtos e / ou consumidores - que permitem a leitura de significados e práticas estéticas e econômicas que os autores realizam nele/sobre ele. (Tradução nossa).

processos anteriormente descritos, como o surgimento de novos grupos editoriais, em vários dos textos presentes nas antologias que compõe o corpus principal do presente trabalho. Tais textos traduzem as tensões e disputas do campo literário e criam o que Molina (2007, p. 57) denomina pontos de interferência entre realidade e ficção.

“Diario de un joven escritor argentino”, conto publicado em La joven guardia, e escrito pelo responsável pela seleção de textos de outra antologia de narrativa argentina jovem, Juan Terranova, pode ser lido como um exemplo de relato de mercado, uma vez que como afirma Molina (2007, p. 57) “fagocita el motivo del mercado, lo absorbe, y lo transforma en su protagonista”26

. O conto problematiza algumas das questões mais caras sobre a NNA, como o próprio questionamento sobre o que é ser um jovem escritor e os estereótipos que rondam essa definição:

¿Qué significa ser un ‘joven escritor argentino’? ¿Se supone que hay que escribir sobre los problemas de la gente joven? ¿Sexo desaforado, noches de borrachera, drogas? Este año cumplo treinta y voy a tener un hijo (LJG, p. 136)27

O narrador de Terranova chama atenção para a necessidade de não se deixar cair em caracterizações fáceis ou de se enxergar o “joven escritor argentino” como um grupo homogêneo, como geração, na acepção mais conservadora do termo, ao mesmo tempo em que nega a superficialidade com que o senso comum costuma representar a juventude:

Las garantías que puede dar el cartel de ‘joven escritor argentino’ colgado en el pecho son muy pocas. ‘Escritor’ y ‘Argentino’ puede ser, pero lo de joven

sigue siendo un enigma. Conozco a varios escritores jóvenes. Algunos se parecen a mí, otros escriben cosas que me gustan, pero también están los que no podrían ser más diferentes.

― Yo escribo desde los doce años

― Lo más importante es la riqueza de la prosa

― La literatura es antes de todo, lenguaje (2005, p. 153) 28

26 Fagocita o motivo do mercado, o absorve e o transforma em seu protagonista (Tradução nossa).

27 O que significa ser um "jovem escritor argentino? Se supõe é necessário escrever sobre os problemas dos

jovens? Sexo explícito, noites de bebedeira, droga? Este ano eu vou fazer trinta e ter um bebê (Tradução Nossa).

28 As garantias dadas pelo cartaz de 'jovem escritor argentino' pendurado no peito são muito poucos. 'Escritor' e

'argentino' pode ser, mas jovem permanece um enigma. Conheço vários jovens escritores. Alguns se parecem comigo, outros escrevem as coisas de que eu gosto, mas existem aqueles que não podiam ser mais diferentes.

Terranova não nega a existência do “jovem escritor argentino”, mas sim questiona a supervalorização da juventude como categoria para o estabelecimento de classificações relativas à produção de bens simbólicos. O texto, no entanto, parece apontar outra saída nesse sentido, que pode ser identifica, com intensa afinidade com o discurso existente nos elementos para-textuais das antologias, como a busca por espaço no campo literário. As tentativas de legitimação, de criação de instâncias de consagração parecem mais eficazes para pensar a situação do escritor jovem do que sua idade em si.

Nesse sentido, “Diario de un joven escritor argentino” explora uma questão fundamental para esse escritor em busca de consagração no campo. Em vários trechos do conto é referida a dificuldade de fazer da escrita, ainda hoje, um meio de vida. Em um diálogo entre o narrador e um encanador em visita a sua casa esse elemento fica bastante claro:

―¿Y usted, a qué se dedica? ― Soy escritor.

Usualmente miento. Hoy no tenía ganas. Pensé en agregar alguna explicación. No hizo falta.

―¿Y qué tipo de libros escribe? ― Novelas, sobretodo.

―¿Y se puede vivir de eso? ― No. (2005, p 137)29

O encanador pergunta então do que vive o narrador, evidenciando o fato de que essa é, até hoje, uma “profissão que não é uma profissão”, como afirma Bourdieu (1992, p. 256):

Escribo libros de Yoga, corrijo originales. Eso me da un poco más de aire. Dinero es lo que me da, el aire suele ser gratis.” (2005, p. 138)30

Terranova, portanto, em uma narrativa que se posiciona no limite entre ficção e testemunho autobiográfico, parece construir uma versão literária para a descrição da escrita como profissão presente em As regras da arte:

- Eu escrevo desde os de doze anos

- O mais importante é a riqueza de prosa

- A literatura é, acima de tudo, a linguagem (Tradução nossa).

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- E você, o que faz?/- Sou escritor./Normalmente minto. Hoje eu não sentia vontade. Eu pensei sobre adicionar alguma explicação. Não fez falta./- E que tipo de livros que você escreve?/- Romances, sobretudo. - E você pode viver disso?/- Não. (Tradução nossa).

30 Escrevo livros de Yoga, corrijo originais. Isso me dá um pouco más de ar. Dinheiro é o que dá, o ar costuma

A profissão de escritor ou de artista é, com efeito, uma das menos codificadas que existem; uma das menos capazes também de definir (e de alimentar) completamente aqueles que dela se valem e que, com muita frequência, só podem assumir a função que consideram como principal com a condição de ter uma profissão secundária da qual tiram seu rendimento principal (BOURDIEU, 1992, p. 257. Grifo nosso).

A “profissão secundária” é muitas vezes relacionada ao próprio campo, como no caso do narrador de “Diario de un joven escritor argentino”. Essa dupla atuação, no entanto, pode render vantagens, funcionando como estratégia para a conquista de capital social que pode ser útil ao longo da trajetória do escritor (BOURDIEU, 1992, 257).

“El amor es más que una novela de quinientas páginas”, conto de Washington Cucurto, publicado na antologia Uno a uno, também retrata, mediado pelo que o próprio autor denomina realismo atolondrado, a relação entre literatura e geração de dinheiro. No relato, Cucurto é contratado por um agente literário internacional, “Luciano Perezlindo, agente literario de las estrellas de la literatura latinoamericana”31, para, ao lado de nomes da literatura latino-americana como Mario Vargas Llosa e César Aira, tornar-se ele mesmo um “producto”, “el escritor latinoamericano que regresa de la miseria”32

(UAU, 2008, p. 262).

O campo literário no relato é representado alegoricamente como empresa, um prédio localizado em Berlin, com inúmeros escritórios nos quais trabalham escritores de todo o mundo. O regime a que estão submetidos é de quase escravidão e o agente literário o responsável pela construção de posições e de legitimação dos atores que figuram nesse campo. O objetivo principal da organização é o lucro, e no conto em questão, como em outros relatos de Cucurto, fica clara a relação entre literatura e dinheiro. Os escritores, assim como suas obras são produtos construídos pelo personagem do agente:

(...) productos comerciales que yo vendo las editoriales o a los diarios. Si quieren un escritor estrella, un periodista político de lujo, Bueno, yo se los fabrico (UAU, 2008, p. 263)33.

Assim, em “El amor es mucho más que una novela de quinientas páginas”, a literatura é retratada como fonte de riqueza, que acaba indo para outras mãos que não as do escritor.

31 Luciano perezlindo, agente literário das estrelas da literatura latinoamericana 32 O escritor latinoamericano que regressa da miséria (Tradução nossa).

33 (...) os produtos comerciais que eu vendo às editoras ou aos ou jornais. Se querem um escritor estrela, um

Essa explícita ironia em relação à mercantilização da literatura perpassa a obra ficcional de Cucurto e se encontra representada também em atitudes exteriores a esse âmbito, como a publicação de um encarte que oferece jogos aparentemente infantis mencionado em um de seus romances (Ver Figura 5) e a fundação da editora Eloísa Cartonera. O autor vai ainda mais longe nesse sentido e menciona essa iniciativa que pode ser vista como uma intervenção no mercado editorial em obras publicadas por editoras consagradas como a Emecé.

Molina (2007, p. 59) descreve esse procedimento como a criação de pontos de interferência na obra de Cucurto, cruzamentos entre o real e o literário. O narrador menciona, por exemplo, nesse mesmo conto, um de seus romances mais conhecidos, Cosa de negros. A Interferência nesse texto é tão finamente arquitetada que em seu texto de apresentação biográfica, cada um dos contos que compõem a antologia traz um, consta a seguinte frase: “En los 90, comenzó a hacerse conocido como escritor. Y entonces ló detecto Perezlindo” 34

(UAU, 2008, 264).

A postura performática de Cucurto pode ser lida também como uma provocação relacionada á glória literária e à rentabilização do literário. Bourdieu descreve a associação entre esses dois aspectos em A economia das trocas simbólicas:

O projeto de rentabilização da glória literária pode parecer em princípio auto-destrutivo e cômico porque supõe uma relação dessacralizada e dessacralizante com a autoridade literária, relação de todo inconcebível, a não ser para um artista marginal, capaz de reconhecer de tal modo os princípios da legitimidade cultural a ponto de colocar-se imaginariamente fora da lei cultural(BOURDIEU, 2011, p. 160).

Assim, Santiago Vega deliberadamente simula através da voz de Cucurto essa posição ambígua, de autor que está inserido no campo, mas que constantemente constrói discursos como se o estivesse observando à margem.

Sobre o texto de Cucurto ainda se pode observar a relação do escritor com outros atores do campo literário, que também surgem com alguma frequência em vários dos relatos de mercado da NNA. Nesse sentido, merecem destaque as figuras do editor/agente literário e da crítica especializada.

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Figura 5: primeira página do encarte veiculado juntamente com a edição de Las aventuras del Señor Maiz.

O primeiro desses atores é um elemento tradicionalmente ambíguo, dentro do campo literário. O editor tende a ser visto como elo entre o artista e o mercado, porém comumente considerado como um elemento mais atrelado ao segundo do que ao primeiro. Nos relatos de mercado da NNA, entretanto, essa figura não é representada de maneira negativa, necessariamente:

Los editores no son monstruos. Son gente que trabaja y quiere que los libros que aprueban se vendan para que no les echen a patadas (TOMAS, 2005, p. 139)35

No conto “Diario de Boedo”, publicado em Buenos Aires escala 1:1, o protagonista, também um jovem escritor argentino narra, entre outros fatos de seu cotidiano, um encontro com o editor seu primeiro romance em um bar. A relação é descrita de maneira cordial e ambos jogam sinuca antes que ele receba os valores pendentes pela publicação do livro.

Esses exemplos, assim como a presença constante da questão financeira nesse tipo de relato fornecem dados que funcionam como indícios do perfil desse autor. Para o jovem

35 Os editores não são monstros. São pessoas que trabalham e querem que os livros que aprovam sejam vendidos

escritor, muitas vezes empregado em uma das “instituições aparentadas”, o jornalismo, ou mesmo o mercado editorial, fazer da literatura sua atividade profissional principal é um sinal de reconhecimento e de estabelecimento no campo.

Já a outra posição, representada pelo crítico ou jornalista cultural parece ser enxergada com maior desconfiança. Outro relato de mercado, “El temible crítico literário”, de Pablo Manzano, publicado na antologia La erótica del relato (2009), dedica-se exclusivamente a colocar em cena essa figura do crítico tradicional, detentor de certo peso no processo de legitimação de escritores e resistente em relação a nomes que ainda não gozam de prestígio.

se dice, se rumorea, que un día el temible crítico literario terminó de leer un libro de un joven autor y ... solo se dice, se rumorea, porque la verdad es que

nadie llegó a encontrar el artículo que escribió a continuación … pero se dice

que un día, sólo aquel día y nunca más, el temible crítico literario terminó de

leer un libro de un joven autor y … le gustó (2009, p. 96)36

O crítico acidamente retratado no conto chega a tentar suicídio “por envenenamento”, engolindo uma bola feita com os textos por ele produzidos. Após uma lavagem estomacal, são encontrados em seu estômago restos dos cadáveres dos “jóvenes escritores, a quienes, salvo ilustres excepciones había brindado un trato piadoso” 37

(2009, p. 96). Entra em cena também a figura do “Super Superior”, alguém acima do ilustre crítico argentino, que menospreza as editoras vocacionais:

se trataba de un libro escrito por un Don nadie (...) publicado por una editorial menos que pequeña que, seguramente, dirigía una de esas marujas que de un día para el otro decidían hacerse editoras (LEDR, 2009, p. 97)38

São ironizadas também no conto algumas das características mais frequentemente apontadas entre os pertencentes às novas gerações:

Le sugerí que no perdiera tiempo leyendo a bagatelas de subgénero (…) sólo

aquellos que amamos profundamente la buena literatura, sabemos el padecimiento que implica enfrentarse a esas literaturilla plagada de

36 se diz por aí, há boatos, de que um dia o temível crítico literário terminou de ler o livro de um autor jovem e

... só se diz, há boatos, porque a verdade é que ninguém chegou a encontrar o artigo que escreveu em seguida ... mas se diz que um dia, aquele dia só e nunca mais, o temível crítico literário terminou de ler um livro de um jovem autor e gostou ... (Tradução Nossa).

37

Jovens escritores a quem, salvo ilustres exceções havia oferecido um tratamento piedoso (Tradução nossa).

38 era um livro escrito por Don ninguém (...) publicado por uma editora menos do que pequena que, certamente

referencias culturales actuales y marcada por el lenguaje del cómic (LEDR, 2009, p. 98)39

Outro ator a ganhar destaque no conto é o público leitor dos suplementos culturais, que utiliza esse tipo de veículo para formular suas opiniões sobre literatura:

esos incontables seres que dedicaban sus vidas a leer con lupa el suplemento cultural para diferenciar la buena de la mala literatura (LEDR, 2009, p. 98)40

Assim, o conto de Pablo Manzano evidencia toda a tensão da luta pela defesa das fronteiras do campo, apresentando a versão do autor para a postura de negação do novo operada pelos que detêm posições de domínio nesse espaço simbólico. O texto representa, ao reconhecer e ironizar abertamente esse processo uma exceção, uma vez que, como aponta Vanoli (2010, p. 261), os autores identificados com a NNA tendem a manter uma relação ambígua com a noção de geração que o título supõe. Tiram proveito de suas vantagens, mas tendem a se mostrar reticentes em afirmar-se como novos e ainda mais cautelosos quando essa posição implica oposição a uma geração anterior.

A própria formação do escritor, tema com larga tradição na história da literatura, parece também ser um dos eixos centrais para compreensão da auto-imagem que fazem do campo os autores identificados com a NNA. O que se observa de novo, entretanto, é a incorporação dos recursos próprios da atualidade nesses textos. Assim, oficinas literárias, os meios massivos e a internet desempenham um papel fundamental para a compreensão do processo de formação desses escritores.

“El hipnotizador personal”, escrito por Pedro Mairal para integrar La joven guardia, e “Ideal II”, de Joaquín Linne, publicado na Buenos Aires escala 1:1, fazem referencia a um dos principais recursos de formação declarados pelos autores da NNA: a oficina literária. Vários dos nomes presentes nas antologias frequentaram espaços desse tipo e muitas vezes ministram eles próprios oficinas com esse perfil na atualidade.

Em ambas as narrativas as oficinas funcionam não só como espaço de aprimoramento do ato de escrever, mas também, e talvez principalmente, como espaço de sociabilidade.

39 Sugeri a ele que eu não perca tempo lendo bobagens de subgênero (...) só aqueles que amamos profundamente

a boa literatura, sabemos o padeciomento que envolve enfrentar esta literaturazinha infestada por referências culturais atuais e marcada pela linguagem dos quadrinhos (Tradução nossa).

40 esses incontáveis seres que dedicaram suas vidas a ler muito de perto o suplemento cultural para diferenciar o

Contos e poemas são enviados por e-mail e debatidos em conversas que ocorrem em festas em que o consumo de álcool e drogas é absolutamente naturalizado. A literatura é apresentada como estilo de vida nesses textos, e frequentar uma oficina mais do que algum envolvimento com a literatura para os dois autores pode estar mais relacionado ao pertencimento a um grupo.

Tanto Linne quanto Mairal produzem textos que também poderiam se situar em uma zona ambígua entre ficção e autobiografia, mas apresentam um olhar ácido e impiedosamente irônico aos seus iguais. Como afirma Drucaroff (2007, s/n), são incapazes de levar qualquer um, mesmo a si mesmos e a sua geração, a sério.

A questão da formação leva a outra problemática central para a compreensão do campo literário argentino que pode ser trabalhada também a partir de relatos que a colocam em cena: a relação e as influências que os autores em posição dominante representam para esses jovens narradores.

O conto de Patricio Pron, publicado no volume da revista Granta dedicado aos melhores jovens narradores em espanhol, Algumas palavras sobre o ciclo das rãs, pode ser lido como uma dessas narrativas que evidenciam algo sobre a relação entre as diferentes gerações de produtores no campo literário argentino atual. No texto, um aspirante a escritor vindo do interior do país, vai morar no mesmo edifício do que ele chama de “o escritor argentino vivo”:

Vivi sob o escritor argentino vivo. Essa afirmação não é metafórica, infelizmente. Não vivi sob o escritor argentino vivo da mesma forma como os escritores argentinos vivem uns sob a influência dos outros e todos sob a influencia de Jorge Luis Borges, e sim, vivi realmente sob o escritor argentino vivo e fui seu vizinho e o depositário de um mistério pueril que interessaria somente a mim mas viria a mudar tudo (GRANTA, 2011, p. 337).

No decorrer do conto, o narrador começa a ouvir recorrentes caminhadas no apartamento do andar de cima e imagina que o vizinho passa noites inteiras escrevendo, quando na verdade “o escritor argentino vivo” anda nervosamente pelo apartamento porque seu filho está doente. Como quando afirma que “Para escrever é preciso ter dormido pelo menos seis horas e ter o estômago cheio” (GRANTA, 2011, p. 338) ao apresentar o escritor como pai, Pron desconstrói a figura idealizada do criador inspirado, e, à semelhança de

Terranova, chama a atenção para os aspectos banais do cotidiano de um autor, consagrado ou não.

Dessa forma, os relatos de mercado da NNA parecem conformar sua própria definição de escritor, bastante distante do intelectual politicamente engajado dos anos 60 ou 70, do artista em busca de rupturas profundas da vanguarda ou da visão romântica do criador tocado pela inspiração. Mais próximos da concepção da primeira geração pós-ditatorial, imediatamente anterior a sua, para esses escritores o autor é apenas um individuo, alguém absolutamente trivial, com contas a pagar, família, e a expectativa de fazer da literatura um meio de vida.

Assim, a influência intergeracional se dá de forma relativamente pacífica. No conto de Pron, o narrador nutre uma admiração sincera pelo escritor consagrado e se o inveja é por motivos também bastante triviais: “seu estilo já estava completamente formado e ele podia se dedicar a sair com os amigos ou ver filmes franceses em que nada acontece ou a fazer pãezinhos” (p. 345). O ciclo das rãs que dá nome ao conto faz referência ao fluxo de jovens

No documento – PósGraduação em Letras Neolatinas (páginas 49-132)

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