• Nenhum resultado encontrado

SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO

3. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

3.5. REPRESENTAÇÕES SOCIAIS, PRÁTICAS SOCIAIS E ATITUDES.

Como teorias sociais práticas sobre os objetos sociais, as RS referem-se a um saber vinculado à experiência que o produziu, servindo ao indivíduo para agir sobre o mundo e sobre o outro (Jodelet, 1989). Para Wagner (1998), o processo de elaboração do conhecimento do senso comum raramente surge sem necessidades práticas. Portanto o principal objetivo desta tese é relacionar RS com práticas, a partir dos objetos envelhecimento e rejuvenescimento, ou seja, como essas RS são utilizadas para alicerçar práticas corporais em relação e este último objeto. Entende-se que o estudo das práticas pode revelar representações que as organizam, portanto, explorar a relação entre esses dois constructos pode contribuir para a compreensão da forma com que o envelhecimento é vivenciado pelas mulheres.

As definições propostas na literatura a respeito de práticas sociais, em geral, as referem como um conjunto complexo de ações ou comportamentos que são legitimados socialmente, ou seja, são

conectados ao contexto social que os produziu (Lheureux, Lo Monaco & Guimelli, 2011; Flament, 2001; Abric, 1994;). Sá (1994) as definem como um conjunto de comportamentos e ações que são determinados por RS, diferindo-as da noção de comportamento, ligado mais à concepção behaviorista que maximiza fatores situacionais na determinação da ação, em detrimento de elementos simbólicos. Dessa forma, como sistemas de comportamentos envoltos em uma dimensão simbólica, o estudo das práticas e das suas relações com as representações requer que se reporte aos grupos e às relações sociais nos quais elas ganham sentido.

Apesar de pesquisadores admitirem a relação de dependência entre RS e práticas, essa relação ainda não se mostra muito clara. Enquanto alguns autores enfatizam a influência das representações sobre as práticas, abordando seu efeito prescritivo (Moscovici, 1961, 1978), outros exploraram o efeito das práticas sobre as representações, abordando sua função justificadora (Morot & Sales-Wuillemin, 2008; Mamontoff, 2008; Guimelli, 1998). No entanto, a complexidade das situações sociais contribui para que a natureza da relação de determinação entre estes dois conceitos se mostre indefinida, o que abre espaço para questionamentos sobre até que ponto esta influência se dá em uma ou outra direção ou se isso pode ser aplicado a todos os objetos ou contextos sociais. Segundo Almeida, Santos e Trindade (2000), atualmente há uma predominância da ideia de interdependência entre representações e práticas sociais, com as primeiras regulando as segundas ao mesmo tempo em que aquelas também emergem das diferentes práticas sociais empregadas no cotidiano, pressupondo uma relação circular, ou seja, de interação mútua (Campos, 2003). Wagner (2015, 2003), por sua vez, questiona a distinção entre RS e comportamento, ao considerar que as ações fazem parte do conteúdo representacional frente aos objetos, portanto não haveria uma separação entre RS e práticas.

Ao mesmo tempo em que modulam simbolicamente o contexto no qual um comportamento ocorre (Moscovici, 1961, 1978), as RS também envolvem uma dimensão de explicação e argumentação, ou seja, quando os indivíduos agem com base em suas teorias leigas, eles simultaneamente elaboram uma explicação que justifique o seu comportamento, como forma de interpretar a realidade e tornar o mundo compreensível (Vala, 2006). Remetendo-se ao caráter prescritivo das RS este autor refere que apenas uma parte das ações poderia ser explicada por RS aderidas pelos indivíduos, diferenciando comportamentos representacionais (cujo fatores pré-situacionais seriam mais salientes) e

comportamentos situacionais (em que características do contexto seriam mais salientes que as RS).

A relação entre RS e práticas implica em considerar a articulação entre um constructo de natureza social e compartilhada com ações, caracterizadas por uma expressão individual. Como as RS consistem em um fenômeno complexo, cuja gênese envolve construtos tanto de natureza macrossocial quanto de esfera individual, compartilha-se da compreensão de alguns autores de que a predição de práticas a partir de RS não envolveria uma causalidade direta; estas corresponderiam a uma das diversas variáveis envolvidas na determinação das ações humanas (Wachelke & Camargo, 2007; Campos, 2003; Rouquette, 1998). Desta forma, embora se admita que as RS possuem uma função pragmática, servindo de guia para ação (Jodelet, 2001; Abric, 1998), ainda faltam esclarecimentos sobre seu poder preditivo sobre os comportamentos.

Wackelke e Camargo (2007) consideram que a articulação entre RS e atitudes permite considerações a respeito da relação entre RS e comportamentos. Ao contrário das RS, as atitudes tem amplo respaldo na literatura como variáveis que permitem integrar cognição e comportamento, na medida em que funcionariam como predisposições à ação (Ajzen, 1991, 2001, 2005; Ajzen & Madden, 1986; Fishbein & Ajzen, 1975). Essa característica permite considerá-las como um constructo pertinente ao estudo da relação entre RS e práticas, apresentando-se como um intermediário importante nesta relação (Moliner & Tafani, 1997).

Existem diversas definições formais de atitudes, no entanto, em geral, elas são consideradas um constructo psicológico de natureza avaliativa (Neiva & Mauro, 2011; Lima, 2006; Ajzen, 2005), consistindo em disposições para responder favorável ou não favoravelmente a um objeto, que pode ser uma pessoa, ferramenta, instituição ou mesmo uma ideia (Doise, 2001; Stroebe & Stroebe, 1995). A avaliação implica uma tomada de posição, que por sua vez está sempre inserida em um uma dinâmica social presente no contexto do sujeito, em que constantemente sua manifestação é demandada nos processos inerentes às relações sociais e pertenças grupais (Doise, 2001).

Moscovici (1961, 1978) destaca o caráter afetivo das atitudes, situando-as como um dos componentes que compoem as RS, juntamente com a informação sobre o objeto e o campo. Este autor considera que, em geral, a atitude tende a ser a dimensão mais presente, possivelmente sendo a primeira em uma hierarquia genética, uma vez que somente se busca informações e se elabora uma ideia organizada sobre o objeto após ter

tomado uma posição e em função deste posicionamento (Moscovici, 2012). Elas são elementos primários na formação das RS e fundamentais para a construção do conhecimento social, o que permite considera-las como organizadoras das cognições que compõe o campo representacional associado ao objeto; ou seja, os elementos carregados valorativamente se apresentam como importantes marcos de interpretação e categorização de novas informações, configurando-se em sistemas de significação que virão a orientar os comportamentos (Parales-Quenza & Vizicaíno- Gutiérrez, 2007).

Embora as RS sejam formadas a partir da tomada de posição em relação ao objeto, a formação de uma atitude também exige que se tenha alguma informação sobre o mesmo (Moscovici, 1961, 1978), indicando uma relação de reciprocidade entre os dois constructos. As atitudes são alicerçadas em crenças (Ajzen, 2006) e se formam a partir da internalização de valores (Fraser, 1994), o que pressupõe uma regulação dos processos cognitivos por fenômenos societários. Moliner e Tafani (1997), por sua vez, afirmam que os componentes avaliativos de uma representação formam a estrutura subjacente de uma atitude, ou seja, as primeiras permitem explicar as bases cognitivas das últimas. Em consonância com esta perpesctiva, Doise (1986, p.86) conceitua as RS como “princípios organizadores de tomadas de posição ligadas a inserções sociais específicas em um conjunto de relações sociais”, o que permite estudar as atitudes como sendo RS. Desta forma, considera-se que a articulação entre atitudes e RS envolve a dimensão individual das atitudes com a coletiva das RS, havendo uma interdependência entre atitudes e atividade representacional (Salesses, 2005).

Apesar da importância dos elementos avaliativos na relação entre RS e práticas, o campo representacional que predispõe os indivíduos à ação pode envolver diversas variáveis, de forma que a ocorrência da prática é também dependente de outros fatores do ambiente. Modelos teóricos como a Teoria da Ação Refletida (Ajzen & Fishbein 1975) e do Comportamento Planejado (Ajzen, 1991, 2001, 2005; Ajzen & Madden, 1986) sustentam que as atitudes não são as únicas variáveis envolvidas na predisposição dos indivíduos à ação, na medida em que também consideram a adesão a determinadas normas sociais, como as normas subjetivas, como fatores importantes na decisão dos indivíduos em realizar um comportamento. Doise (1985, 2014), apreendendo o conceito de metassistema de Moscovici (1961, 1978), defende a necessidade de estudar a relação entre as regulações sociais e o funcionamento cognitivo, que por sua vez, permite explicar os comportamentos. Assim, explicar as

ações humanas a partir da perspectiva das RS requer considerar os determinantes sociais e societais que as compõe e que permitem a contextualização de crenças, atitude e comportamentos frente aos objetos. Guignard, Apostolidis e Demarque (2014) consideram as dimensões normativas importantes para a análise da relação entre o funcionamento social e os comportamentos. Considerando que as práticas corporais de rejuvenescimento remetem a características valorizadas na sociedade brasileira, como jovialidade e beleza, entende-se que, além de aspectos afetivos referentes a estas práticas, elementos normativos também possam influenciar a predisposição das mulheres em adotar práticas de rejuvenescimento, portanto da mesma forma que as atitudes, podem se constituir como variáveis mediadoras na relação das RS do envelhecimento e rejuvenescimento e práticas corporais de rejuvenescimento.