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1 FUNDAMENTOS TEÓRICOS E PRÁTICOS

1.2 Análise Crítica de Conteúdo do Art 133 do CTN

1.2.2 Análise Propriamente Dita do Art 133 do CTN

1.2.2.7 Requisitos para a Caracterização da Aquisição de Estabelecimento e/ou

Viu-se que o verbo adquirir seguido da expressão por qualquer título, não deve ser interpretado como toda e qualquer forma de aquisição. Apenas os atos de transmissão inter vivos e de aquisição derivada é que devem ser tratados como hipóteses de aquisição a “qualquer título”. Além disso, foram excluídas da sucessão tributária outras hipóteses de aquisição, como os atos causa mortis e de aquisição originária. Entretanto, o exame do verbo adquirir ainda comporta outra reflexão. Ainda é necessário avaliar se tal verbo deve ser interpretado de forma restritiva – ou seja, num sentido formal, equivalente a “obter” ou a “comprar”, – ou de forma mais abrangente. Essa discussão é importante, pois não é incomum encontrar situações em que a aquisição de estabelecimento é simulada, exatamente para evitar a sucessão tributária do art. 133 do CTN.

A jurisprudência, especialmente a do STJ34, costuma interpretar o verbo adquirir de maneira formal, observando seu conceito tradicional. Por essa visão, a aquisição que importa seria somente aquela em que há uma transferência definitiva da propriedade de bens e direitos de uma pessoa para outra. A transferência apenas da posse não configuraria hipótese de aquisição. Assim, a prevalecer esse raciocínio, a responsabilidade tributária do art. 133 do CTN somente se efetivaria quando houvesse uma aquisição de estabelecimento e/ou fundo de comércio nos modelo tradicional, como se verifica, por exemplo, em um contrato de compra e venda. De outro lado, não se verificaria a sucessão tributária quando ocorresse, por exemplo, um arrendamento de estabelecimento, mesmo quando fossem identificados indícios de aquisição. Contudo, uma análise mais criteriosa da norma revela que o verbo adquirir deve ser interpretado de forma mais ampla, justamente para levar em conta as circunstâncias em que a operação foi realizada, pois só assim será possível fazer uma interpretação do art. 133 do CTN de forma coerente com a própria finalidade da norma, que é a satisfação do crédito tributário. Afinal, por trás da discussão da melhor forma de interpretar o verbo adquirir, está em jogo o desejo do legislador de coibir a prática de negócios jurídicos que buscam fraudar o Fisco.

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No capítulo dedicado ao estudo da jurisprudência do STJ apresentam-se exemplos em que essa Corte afastou a sucessão tributária do art. 133 do CTN porque foi feita uma interpretação literal do verbo adquirir, quando, na realidade, deveria ter sido feita uma análise mais detida dos fatos que mostram a ocorrência de alienação de estabelecimento empresarial.

Torna-se fundamental, portanto, a análise dos fatos. É importante que as circunstâncias fáticas sejam examinadas com a devida atenção, pois só assim será possível entender o verdadeiro propósito da operação e, a partir daí, averiguar se ocorreu ou não a aquisição de estabelecimento. Até porque não é incomum encontrar situações em que os envolvidos preferem ocultar a alienação do estabelecimento. Os meios utilizados são vários, passando desde a não formalização da operação até a sua venda fragmentada. Em outras situações, os envolvidos preferem declarar formalmente o negócio, mas não da forma que reflita a vontade real das partes. O fato é que, independente do meio utilizado, os envolvidos recorrem a esses “artifícios”, exatamente para se eximirem da responsabilidade tributária por sucessão.

Como regra, as operações de alienação de estabelecimento são formalizadas por meio de contratos de compra e venda, as quais têm a sua publicidade garantida com o registro na Junta Comercial. Quando há publicidade, nos termos do art. 1.144 do Código Civil35, não há qualquer dificuldade para o Fisco comprovar a alienação do estabelecimento. Entretanto, quando o negócio não é formalizado, é necessário que as autoridades fiscais busquem outros meios de provas capazes de comprovar a alienação do estabelecimento.

Daí a importância do exame detalhado do contexto fático pela fiscalização, pois assim será possível identificar aspectos que comprovem a aquisição de estabelecimento e/ou fundo de comércio. Analisar de forma isolada o negócio jurídico sem antes investigar o contexto fático da operação é medida pouca cuidadosa quando está em discussão a sucessão tributária. Por isso, reafirma-se a necessidade de a análise probatória ser feita de forma cautelosa e criteriosa, pois não se devem ignorar aspectos que a princípio poderiam parecer irrelevantes, por exemplo, a relação de parentesco entre as partes. Isso porque, a depender da situação, a mudança do responsável pelo estabelecimento é apenas um subterfúgio para o não pagamento dos tributos (ARAÚJO, 2010).

Outros aspectos também precisam ser avaliados, por exemplo, o grau de semelhança entre as marcas utilizadas pelo antigo e pelo novo proprietário do estabelecimento. Em determinadas situações, pode ocorrer de as marcas serem tão semelhantes que “aos olhos” do cliente seja imperceptível qualquer alteração das mesmas.

Ferragut (2012, p. 96), por exemplo, apresenta exemplos de aspectos que devem ser avaliados pela fiscalização para comprovar a aquisição de estabelecimento e, por consequência, para caracterizar a responsabilidade sucessória.

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“Art. 1.144 – O contrato que tenha por objeto a alienação, o usufruto ou arrendamento do estabelecimento, só produzirá efeitos quanto a terceiros depois de averbado à margem da inscrição do empresário, ou da sociedade empresária, no Registro Público de Empresas Mercantis, e de publicado na imprensa oficial”. (BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002)

Confira-se:

- ocupação das mesmas instalações;

- utilização dos mesmos equipamentos e utensílios para o exercício da atividade econômica;

- mesmo controle acionário; - mesma força de trabalho;

- coincidência de um grande número de prestadores de serviços e fornecedores; - mesmo sistema de informática, sobretudo se for algo específico ao negócio e

contiver programação não encontrável em softwares “de prateleira”; - similaridade do nome comercial, fantasia, logotipo e marcas; - atendimento da mesma carteira de clientes;

- simultaneidade entre o início da exploração da atividade econômica pelo adquirente dos ativos e a sua interrupção pelo alienante;

- variação da receita, com aumento da sociedade sucessora e proporcional pela diminuição da sociedade sucedida;

- assunção de dívidas, pelo adquirente, junto aos fornecedores do alienante; - existência de compromisso de não concorrência ou de colaboração; e

- celebração de contratos de prestação de serviços de know-how entre as pessoas envolvidas.

Cabe ainda alertar que, conforme mencionado, a alienação isolada de determinados ativos (“ponto comercial”, clientela e know how, por exemplo) ou de outros elementos do estabelecimento (instalações, equipamentos, máquinas, etc.) não é capaz de atrair a incidência do art. 133 do CTN. Entretanto, se a fiscalização conseguir demonstrar que a transferência de alguns ativos é suficiente para que o adquirente dê continuidade à atividade antes exercida pelo devedor aplicar-se-á a responsabilidade por sucessão. Ou seja, se restar comprovada a transferência de parte relevante do estabelecimento, de modo a permitir que o adquirente dê prosseguimento à atividade econômica, incidirá a responsabilidade tributária do sucessor.

Como se verifica, mais do que a análise do objeto do contrato, é fundamental conhecer o verdadeiro propósito da operação. Ou seja, é necessário compreender a real intenção das partes ao celebrarem o negócio. Restando comprovada a aquisição de estabelecimento e/ou fundo de comércio, o negócio deve ser desconsiderado, fazendo incidir a responsabilidade tributária por sucessão do art. 133 do CTN.