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Resíduos Industriais (RI)

Capítulo III Análise reflexiva a quatro dimensões

3.4 Dimensão económica e financeira

3.4.2 Resíduos Industriais (RI)

Na sua versão inicial, o Plano Nacional de Gestão dos Resíduos Industriais (PESGRI 99) foi aprovado no ano de 199922. Tendo, porém, em conta uma nova inventariação dos RI produzidos, assim como os impactes sobre a saúde pública e o ambiente resultantes da queima dos RIP, foi decidido proceder a uma revisão daquele Plano sectorial, vindo a ser, aprovada três anos mais tarde uma nova versão do mesmo, que veio a ser designada por PESGRI 200123.

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Na Região Autónoma dos Açores funciona uma entidade homóloga: a Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos doa Açores (ERSARA), estabelecida pelo Decreto Legislativo Regional nº8/2010/A, de 5 de Março.

21 Lei nº2/2007, de 15 de Janeiro. 22 Decreto-Lei nº516/99, de 2 de Dezembro. 23 Decreto-Lei nº89/2002, de 9 de Abril.

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Na verdade, enquanto os quantitativos anualmente produzidos de RU são relativamente bem conhecidos, o mesmo não sucede com os RI, cujos montantes estimados variam consideravelmente, consoante as fontes consultadas, tanto no que se refere RIB, como a RIP. O conhecimento deficiente desta situação é, aliás, uma questão sobre a qual este CNADS teve a oportunidade de se pronunciar em diversas ocasiões24. Essa situação tem consequências graves sobretudo nos planos da eficácia da gestão e controlo dos fluxos, incluindo os que são exportados, e do dimensionamento adequado das infra-estruturas técnicas previstas e concretizadas efeito (aterros, unidades de valorização e tratamento, etc.). Estima-se, como ordem de grandeza, que a produção anual de RI, abrangendo os resíduos da indústria extractiva e da construção e demolição, seja várias vezes superior à dos RU, devendo atingir os trinta milhões de toneladas anuais25.

Em matéria de RI as prioridades da política de gestão vão para a redução e valorização; destinos finais, como a deposição em aterro, são encaradas como soluções supletivas. O PESGRI 2001, bem como o respectivo plano de prevenção da produção de resíduos (PNAPRI) estão neste momento em fase de revisão, esperando-se que uma nova versão possa entrar em vigor já em 2011.

3.4.2.1 Infra-estruturas e entidades gestoras

Com a excepção do caso das unidades de tratamento mecânico e biológico e das de fabricação de composto, que não existem no caso dos RI, as infra-estruturas que suportam a gestão deste tipo de resíduos, quer se trate de RIB ou de RIP, são fundamentalmente homólogas das dos RU, embora possuam as suas especificidades no plano tecnológico: existem, pois, a par dos aterros e das unidades de incineração, também instalações de recuperação e de valorização material e centros de transferência e de triagem de resíduos.

De acordo com dados facultados pela APA, em audição a este Conselho, e considerando apenas as infra-estruturas de maior porte, operam neste momento no nosso país:

sete aterros controlados para RIB, número este considerado insuficiente26; dois dos Centros Integrados de Recuperação, Valorização e Eliminação

(CIRVER)27 para RIP, ambos localizados no Concelho da Chamusca;

duas unidades de co-incineração nas cimenteiras da Secil, no Outão e da Cimpor, em Souselas, para RIB e RIP 28.

Contudo, no total, existem cerca de 900 operadores neste sector, a maior parte dos quais são pequenas e médias empresas.

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Cfr., a este propósito, o Parecer sobre o processo de co-incineração dos resíduos industriais (CNADS, 1998), o Parecer sobre o Plano Estratégico dos Resíduos Industriais (CNADS, 1999,), os Comentários do CNADS sobre o PESGRI 2001 (CNADS, 2001) e a Reflexão do CNADS sobre a política de gestão dos resíduos industriais e hospitalares (CNADS, 2001).

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Dados fornecidos em audição da Agência Portuguesa do Ambiente (APA) referem para o conjunto dos resíduos não urbanos 31,1 milhões de toneladas (2005) e 30,3 milhões de toneladas (2006), tendo como fonte o Instituto Nacional de Estatística (INE, 2008).

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Daí que, até 2009, vigorasse uma autorização excepcional para depositar RI em 21 aterros de RU, uma situação que suscitou fortes críticas, uma vez que reduzia substancialmente o período de vida útil deste tipo de infra-estrutura. 27

Criados pelo Decreto-Lei nº3/2004, de 3 de Janeiro. 28

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Contrariamente ao que é regra no que se refere aos RU, os sistemas de gestão de RI assumem a natureza jurídica de empresas privadas, se bem que, em alguns casos, possa haver uma participação minoritária de entidades públicas no seu capital social. Entende- se que, neste domínio, as operações de gestão não constituem uma ―reserva de actuação do sector público‖, por não estar em causa a satisfação de necessidades fundamentais das populações, pelo que esta actividade, sujeita a licenciamento, está aberta à iniciativa privada, à qual cabe a escolha das localizações para as infra-estruturas projectadas, assim como a promoção dos projectos e obras e a exploração das unidades.

3.4.2.2 Investimento

Se, como já tivemos a ocasião de observar, é deficiente o conhecimento sobre os fluxos físicos de RI, a situação não é melhor no que se refere aos montantes globais investidos na construção das infra-estruturas, ao longo da vigência do PESGRI e sua distribuição por projectos específicos. Os dados disponíveis são parcelares e não permitem ter uma visão de conjunto desta realidade.

O facto de, ao contrário do que sucede no caso dos RU, se tratar aqui fundamentalmente de investimento privado e se aplicar o princípio do poluidor-pagador, no sentido de que não cabe aos poderes públicos, mas sim à própria iniciativa privada financiar as medidas de gestão dos resíduos produzidos, não é uma razão suficiente para que não esteja acessível informação compilada sobre esta matéria, pelo menos no que respeita aos grandes empreendimentos.

Foi possível obter, apenas, alguma informação, designadamente sobre um dos sete aterros de RIB existentes, construído em Lousada, com um custo de 13 milhões de euros, para uma capacidade instalada de cerca de 700 mil toneladas. O investimento num aterro do mesmo tipo, localizado na Chamusca, foi um pouco superior a 4 milhões de euros, para uma capacidade de 250 mil toneladas (Fonte APA).

Sabemos, também, que o investimento total realizado nos dois CIRVER ascendeu a 45 milhões de euros. Pelo contrário, não se conhece com exactidão o custo das medidas tomadas pelas duas cimenteiras para poderem queimar RIP em condições satisfatórias nos planos ambiental e da saúde pública.

Relativamente aos CIRVER podemos, com alguma segurança, dizer o seguinte:

(a) trata-se de infra-estruturas que estão claramente sobredimensionadas: elas foram concebidas para tratarem anualmente 250 mil toneladas de RIP, mas apenas têm estado a receber à volta de 160 mil toneladas;

(b) estão licenciadas para operarem por um período de dez anos, o que faz com que a amortização do capital investido esteja a pesar fortemente sobre os custos de exploração;

(c) a situação económica e financeira dos CIRVER tem vindo, pois, a deteriorar-se, pondo em risco a prossecução dos objectivos da política de valorização dos RIP. O excesso de capacidade de tratamento instalada nos CIRVER não resulta somente do empolamento dos montantes inicialmente estimados de produção anual de RP não

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incineráveis29. Ele deve-se, também, à desvantagem competitiva dos Centros relativamente a muitos pequenos operadores, licenciados com menos exigências e aos que optam por exportar os RI, nomeadamente para Espanha, incorrendo apenas nos respectivos custos administrativos, isto em flagrante contradição com o princípio da auto- suficiência proclamado nesta matéria.

As duas empresas cimenteiras licenciadas para incinerarem RP, ao abrigo do Memorando que assinaram com o Estado30, também se queixam de que os montantes de RP por elas utilizados como combustível alternativo (cerca de 8.500 toneladas por ano) estão longe de pagar o investimento feito. De facto, a maior parte dos RI actualmente incinerados nos fornos das cimenteiras são resíduos banais (RB): 125 mil toneladas por ano, no caso da Secil e 60.000 toneladas por ano, no caso da Cimpor.

3.4.2.3 Taxas e tarifas

A TGR também se aplica a operadores de RI 31, com os valores seguintes:

(a) €1 por cada tonelada de resíduo gerido pelos CIRVER e pelas instalações de incineração e co-incineração32;

(b) €5 por cada tonelada de resíduo inerte ou de resíduo industrial perigoso depositado em aterro.

Existe, ainda, uma segunda taxa, de carácter específico, a que estão apenas sujeitos os CIRVER, prevista na lei que os criou33. Esta taxa tem o valor mínimo de entre um dos dois seguintes:

(a) 0,5% da respectiva facturação;

(b) €0,5 por cada tonelada de resíduo recebido.

Nas transacções de resíduos entre operadores, de momento ainda em fase muito incipiente, funcionam preços livres de mercado. Precisamente para incentivar a expansão deste tipo de mercados, foi recentemente publicada legislação34, que veio criar o MOR. Trata-se de uma bolsa de resíduos em geral, constituída por plataformas de negociação onde são lançadas as ordens de compra e venda. Ela terá, em princípio, o seu principal campo de aplicação nos RI, para além dos fluxos específicos. Procura-se, assim, potenciar a valorização e reintrodução dos resíduos no circuito económico. Desses resíduos estão obviamente excluídos os RP.

Para estimular a adesão dos produtores e operadores ao MOR, o legislador previu alguns incentivos financeiros e administrativos.

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O montante anual de 254 mil toneladas, retido no Decreto-Lei nº3/2004, resulta de um estudo encomendado às Universidades pelo Ministério do Ambiente.

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Memorando de Entendimento entre o Ministério do Ambiente e o Sector Cimenteiro Nacional sobre a Eliminação de Resíduos pela Indústria Cimenteira, de 9 de Maio de 1997.

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Dela estão, porém, isentas as pedreiras, uma forma de incentivar a sua recuperação paisagística. O que não obsta a que muitas vezes se acumulem os escombros na própria exploração, a ponto de dificultarem o acesso à matéria- prima. Um dos motivos desta situação prende-se com o elevado custo de transporte dos inertes.

32

Saliente-se que, na sequência do Memorando de Entendimento entre o Ministério do Ambiente e o Sector Cimenteiro, este sector recebe para incinerar resíduos perigosos, mas paga a taxa de gestão, quando se trata de resíduos industriais banais.

33

Art. 92º do Decreto-Lei nº3/2004, de 3 de Janeiro. 34

Decreto-Lei nº210/2009, de 3 de Setembro, que estabelece o regime de constituição, gestão e funcionamento do mercado organizado de resíduos.

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3.4.2.4 Regulação e supervisão

A ERSAR não exerce qualquer competência sobre os operadores de RI, embora se possa dizer que o Estado também não deve alhear-se neste caso de prosseguir a defesa do interesse público, prevenindo nomeadamente a formação de estruturas de mercado concentradas e de situações de monopólio. A função reguladora compete, pois, por inteiro à Autoridade da Concorrência (AdC), não existindo nenhuma entidade específica para o efeito, a não ser no caso dos CIRVER, cujo funcionamento está sujeito à supervisão de um Observatório próprio (o Observatório dos CIRVER), nos termos da legislação que os instituiu.

No Observatório dos CIRVER estão representadas diversas entidades públicas e privadas e entre elas figura um representante da Autoridade da Concorrência, o que evidencia uma preocupação por parte dos poderes públicos em assegurar condições de concorrência, a qual não é por enquanto extensiva a todo o sector dos RI.

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