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ATIVIDADE PROPOSTA

3. RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA FÍSICA E DA PESSOA JURÍDICA

3.2 SOLUÇÕES À CRIMINALIDADE ATRAVÉS DA PESSOA JURÍDICA E A REALIDADE BRASILEIRA

3.2.2 Responsabilidade penal da pessoa física

3.2.2.1 Responsabilização do dirigente. Concorrência de qualquer forma: autoria, co-autoria ou participação. A realidade brasileira

A co-delinqüência expressa-se, sabidamente, sob duas formas: a autoria e a participação. Na primeira existe adequação típica direta. O autor realiza (objetiva e

21 Mancuso, Rodolfo de Camargo, Interesses Difusos, Conceito e legitimação para agir, Editora RT,

subjetivamente) a totalidade da conduta típica, dominando-a finalisticamente, seja a realizando de per se, seja se valendo de outrem que não realiza conduta (não age), coagindo-o fisicamente. É o autor direto, imediato.

Também autor, mas indireto, será aquele que, mesmo não execute diretamente a conduta típica, a domina ou co-domina finalisticamente, embora realizada de forma direta por outro com vontade livre (autor ou co-autor pela teoria final-objetiva) ou, ainda, aquele que realiza a conduta se valendo de outro que realiza a conduta sem vontade livre, como ocorre, por exemplo, na coação moral irresistível (autor mediato).

O partícipe, por seu turno, apenas coopera (dolosamente) na conduta do autor. Como não é autor, inexiste adequação típica direta. Somente é possível punir-se a participação por força de adequação típica indireta.

Analisando a realidade das legislações em matéria criminal, verificamos, prontamente, que as normas das partes especiais dos Códigos Penais e as das leis especiais, que descrevem os tipos, não incidem diretamente sobre a conduta do partícipe. É indispensável a norma da parte geral, no caso brasileiro, do artigo 29, caput, do Código Penal do Brasil, por força da qual é que haverá incidência da norma tipificadora (parte especial ou lei especial) sobre a conduta daquele que apenas concorre, ou seja, do partícipe. Trata-se, assim, de norma de extensão da tipicidade. Quanto à infração praticada por intermédio da pessoa coletiva, o diretor, o administrador, o gerente, enfim, o seu dirigente, participando das decisões conjuntas no seio da pessoa jurídica, uma empresa, por exemplo, já está trazendo colaboração ao delito. De suas deliberações pode decorrer acentuada danosidade ao meio ambiente.

Já a própria participação na decisão conjunta que levou à realização da conduta incriminada constitui concorrência, o que poderá evidenciar participação. Por vezes, esta deliberação do dirigente poderá assumir tal relevância, de modo a não mais constituir mera participação, mas a revelar o domínio finalístico do fato, configurando autêntica autoria (ou co-autoria) pela teoria final-objetiva.

Deve-se, portanto, na responsabilização do sujeito ativo das infrações através da pessoa jurídica, dar especial atenção, à figura do dirigente, perquirindo, apuradamente, a par da causalidade no participar das decisões que levaram à conduta atentatória ao ambiente, decisões muitas vezes conjuntas, perquirindo, como dizia, do liame subjetivo a ligá-lo ao delito, liame que também pode decorrer da decisão pela atividade poluidora, exemplificativamente, ofensiva ao meio ambiente. De se destacar que, por sua condição, em geral de pessoa dotada de recursos culturais, o dirigente mais facilmente pode chegar à consciência de atentar ao meio ambiente.

A peculiaridade das infrações ambientais, em que o bem tutelado é, justamente, o meio ambiente ecologicamente equilibrado, mais permite conclusão pela responsabilização do dirigente da pessoa jurídica. Os bens individuais que podem ser atingidos por uma conduta atentatória ao meio ambiente, como a vida e a saúde das pessoas, embora também reflexamente tutelados, distinguem-se do bem- interesse protegido diretamente pela norma ambiental.

Assim, o dirigente da pessoa jurídica nem sempre poderá ter a consciência de atentar contra a incolumidade da pessoa, contra sua saúde, ou sua vida, como bens que possam ser atingidos reflexamente. Todavia, contra o bem principal tutelado, o meio ambiente, mais facilmente poderá ter a consciência de atentar, por suas (dele, dirigente) especiais condições e pelas conseqüências danosas ou perigosas ao ambiente decorrentes da atividade a que concorreu no seio da pessoa coletiva.

Portanto, pela peculiar característica da infração ambiental, podemos encontrar, já no decidir pela atividade, consciente de sua conseqüência atentatória, o elemento subjetivo, que é, justamente, a consciência de contribuir ao delito, no dirigente da pessoa coletiva.

Dita responsabilidade do dirigente encontra amparo na sistemática tradicional da criminalização da pessoa física e na regra geral do artigo 29, caput, do Código Penal do Brasil, repetida na primeira parte do artigo 2º da Lei nº 9605, de 12 de fevereiro de 1998, conhecida como a Lei dos Crimes contra o Meio Ambiente.

Como concorrente de qualquer forma, seja pela autoria, co-autoria ou participação, o dirigente da pessoa coletiva poderá ter reconhecido seu concurso à infração penal. Tal contribuição pode ser admitida, como já destacado, segundo os consagrados princípios do Direito Penal dito tradicional, aplicando-se as conhecidas regras sobre o concurso de pessoas ao crime e dando-se a devida importância à concorrência do dirigente, inclusive e principalmente, em razão de sua peculiar posição na pessoa jurídica como agente de deliberações e determinações que podem levar à ocorrência de crimes contra o meio ambiente.

3.2.1.2 A realidade brasileira: co-responsabilização do dirigente por omissão no crime de outrem.

No Brasil, a Lei dos Crimes contra o Meio Ambiente, em seu artigo 2º, referiu- se, expressamente, ao dirigente da pessoa jurídica como concorrente em tais infrações. Foi além da tradicional regra sobre a concorrência de qualquer forma e criou mais uma hipótese de relevância da omissão, na esteira daquelas situações elencadas no Código Penal, artigo 13, parágrafo 2º.

Como sabemos, de regra, quem não age para impedir um delito executado por outra pessoa, não se torna partícipe, não é cúmplice em matéria criminal. Não é considerado concorrente para efeito penal, a não ser que tenha o dever jurídico de agir. Por exemplo, aquele que, presenciando a combinação entre os futuros executores de um assalto, até mesmo sem que os assaltantes o percebam, podendo fazê-lo, não avisa a vítima visada ou a autoridade, para evitar a execução do assalto, embora tenha o dever moral, não tem o dever jurídico de agir. No entanto, se for um

policial, um agente de segurança, já terá o dever de evitar a realização do crime. Podendo fazê-lo, não agindo, tornar-se-á partícipe do delito.

As situações de dever agir para evitar o crime devem ser explicitadas na lei, sob pena de não ser possível a punição do concorrente. Foi o que fez o artigo 13, parágrafo 2º do Código Penal, elencando as situações de dever agir que são restritas e expressas, sob a rubrica de “relevância da omissão”. Fora delas, não há concurso de agentes por omissão na ação de outrem. É o que se denomina de mera conivência não punível.

Agora, com a lei ambiental brasileira, nova situação de garantidor pelo dever legal (a enquadrar-se na hipótese do artigo 13, parágrafo 2º, “a”, do Código Penal) surgiu em nosso ordenamento. Estabelece a segunda parte do artigo 2º da nova lei brasileira de proteção ao ambiente a responsabilidade penal do diretor, administrador, membro de conselho e de órgão técnico, auditor, gerente, preposto ou mandatário de pessoa jurídica “que, sabendo da conduta criminosa de outrem, deixar de impedir a sua prática, quando podia agir para evitá-la”. Efetivamente, o dirigente da pessoa jurídica e aquelas outras pessoas referidas no artigo 2º da Lei nº 9605/98, por suas peculiares posições no seio da pessoa jurídica, tem o dever de agir para evitar danos ao meio ambiente decorrentes, inclusive, das condutas criminosas de outrem. Assim, omitindo-se quando poderiam atuar, tornam-se verdadeiros concorrentes por omissão. Destaque-se aqui não se tratar de autoria por ação, mas de concurso por omissão nos crimes da autoria de outras pessoas. De regra, entendo, tratar-se-á de participação por omissão no crime doutrem, admitindo-se, no entanto, o reconhecimento da co-autoria por omissão se a omissão assumir tamanha relevância a configurar co-domínio finalístico do fato segundo a teoria conhecida como final-objetiva já destacada no presente trabalho.