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Os contribuintes paulistas podem pleitear o ressarcimento do ICMS-ST pago a maior em períodos anteriores a 19/10/2016

MARCELO MARQUES RONCAGLIA

PEDRO COLAROSSI JACOB

Crédito: Pixabay

Em 7 de agosto de 2019, o Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo declarou a inconstitucionalidade do inciso II do parágrafo 3º do artigo 66-B, da Lei 6.374/1989 (Lei do ICMS estadual), que restringia o direito à restituição do ICMS-ST pago a maior apenas para casos de preço final fixado por autoridade competente, os chamados casos de pauta fiscal.

Tal declaração da inconstitucionalidade não é uma novidade para contribuintes paulistas, uma vez que, desde 13 de dezembro de 2018, a Secretaria da

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Fazenda do Estado de São Paulo – SEFAZ/SP, por meio do Comunicado CAT 14/2018, passou a autorizar a admissão de pedido de ressarcimento do ICMS-ST pago a maior. Contudo, um trecho específico da decisão do Órgão Especial reforça o entendimento de que os contribuintes paulistas podem buscar a restituição do ICMS-ST em período maior do que aquele autorizado pela legislação paulista.

Contextualizando a questão, em 15 de março de 2018, transitou em julgado a decisão do STF proferida no RE 593.849/MG, que reconheceu o direito de todos os contribuintes brasileiros à restituição do ICMS-ST pago a maior nos casos em que a base de cálculo efetiva for inferior à presumida. Concomitantemente, o STF também julgou a ADIn 2.777/SP, na qual foi declarada a constitucionalidade da antiga redação do artigo 66-B, que autorizava os contribuintes paulistas a restituir o ICMS-ST pago a maior.

Desse momento em diante, a

Administração Tributária paulista

editou atos legais contraditórios na

tentativa de se adequar ao

entendimento do STF. Inicialmente, considerando que a atual redação do artigo 66-B da Lei 6.374/1989 restringe o direito à restituição, foi editado, em 22.5.2018, o Comunicado CAT 6/2018 da SEFAZ/SP que, mesmo considerando a decisão do STF no RE 593.849/MG e na ADIn 2.777/SP, manteve a restrição ao direito de restituição apenas para os casos de preço final fixado por autoridade competente (deixando de permitir a restituição nos casos em que se aplica a Margem de Valor Agregado – MVA).

Naquele momento, o entendimento do

Fisco Paulista, embasado no

Parecer PAT 3/2018 da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo, era o de que o STF teria analisado apenas a antiga redação do artigo 66-B e não teria apreciado a redação vigente de tal dispositivo na qual fora prevista a restrição.

Posteriormente, ante a clara

contrariedade de tal entendimento àquilo que foi decidido pelo STF, em 13.12.2018, foi editado novo ato pela

SEFAZ/SP, o Comunicado CAT

14/2018, que reconheceu o direito dos contribuintes paulistas à restituição do ICMS-ST pago a maior sem estabelecer qualquer restrição naquilo que diz respeito à modalidade de fixação do preço final a partir de 19.10.2016. Muito embora o direito à restituição

tenha sido reconhecido pelo

Administração Tributária do Estado de São Paulo, os atos normativos paulistas – assim como os de diversos outros Estados –, estabeleceram uma série de

outras restrições cuja

constitucionalidade e legalidade são

passíveis de contestação pelos

contribuintes (a imposição de

recolhimento de ICMS-ST

complementar, a demonstração de não repasse do ônus financeiro a terceiro nos termos do 166 do CTN, a ausência de prazo para análise do pedido de restituição, entre outras).

Para o que interessa à presente, como

visto acima, no Comunicado CAT

14/2018, o Estado de São Paulo estabeleceu que seus contribuintes poderiam pleitear o ressarcimento do ICMS-ST pago a maior a partir de 19.10.2016, data em que ocorreu o

julgamento RE 593.849/MG,

considerando que no julgamento desse

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recurso os Ministros do STF

determinaram que os efeitos da decisão

fossem aplicados somente para

períodos futuros.

Porém, a decisão proferida pelo Órgão Especial do TJ/SP dá sustentação para o argumento de que os contribuintes

paulistas podem pleitear o

ressarcimento do ICMS-ST pago a maior em períodos anteriores a 19.10.2016.

Como visto acima, juntamente com o RE 539.849/MG, foi julgada a ADIn 2.777/SP, ação essa impetrada em 2003 pelo governo São Paulo para que fosse declarada a inconstitucionalidade da redação antiga do artigo 66-B, que previa o direito ao ressarcimento do ICMS-ST em caso de pagamento antecipado a maior sem qualquer restrição.

Ocorre que há uma sutileza quanto à análise de tais ações e das decisões

nelas proferidas que impacta

diretamente o contribuinte de São Paulo. No RE 539.849/MG, foi reconhecido o direito à restituição e declarada a inconstitucionalidade dos dispositivos da legislação mineira que vedavam a restituição. Por outro lado, a ADIn de São Paulo foi julgada

improcedente e reconhecida a

constitucionalidade da redação antiga do inciso II, do artigo 66-B da Lei 6.374/1989.

O primeiro parágrafo da ementa do julgado da ADIn é claro: “com base no §

7° do art. 150 da Constituição Federal, é constitucional exigir-se a restituição de quantia cobrada a maior, nas hipóteses de substituição tributária para frente em que a operação final resultou em valores inferiores àqueles

utilizados para efeito de incidência do ICMS”

Assim, no caso de São Paulo, como a redação antiga do 66-B, que já reconhecia o direito à restituição, foi julgada constitucional pelo STF, é possível afirmar que tal dispositivo permaneceu válido, ainda mais se

considerarmos a declaração da

inconstitucionalidade da atual redação do artigo pelo Órgão Especial do TJ/SP, motivo pelo qual não haveria razão de se falar em modulação de seus efeitos apenas para o futuro.

A análise de tal questão foi feita de forma precisa pelo Ministro Luís Roberto Barroso durante o julgamento do RE 593.849/MG e da ADIn 2.777/SP. O Ministro reconheceu que

no caso de Pernambuco1 e São Paulo

não há efeitos a serem modulados uma

vez que foi reconhecida a

constitucionalidade da legislação local. Nas palavras do próprio Ministro no julgamento do RE 593.849/MG, “as

leis, nos casos de Pernambuco e de São Paulo, já dão (a restituição no caso de

pagamento a maior), e eu não posso

declarar a constitucionalidade da lei e modular os efeitos, ali não haveria sentido.” Da mesma forma, no

julgamento da própria ADIn 2.777/SP, o Ministro ressalta “até admito, em

doutrina, a excepcional possibilidade de se modularem efeitos em uma ação declaratória de constitucionalidade; mas certamente este não é o caso.”

O entendimento manifestado pelo Ministro Barroso a respeito da ausência de prejudicialidade na declaração de

constitucionalidade acompanha

entendimento já consolidado no STF. Em julgado de 2008, ao tratar da modulação da eficácia de determinada

56 decisão, o ex-Ministro Eros Grau consignou que tal instituto “visa a

minimizar eventuais efeitos perniciosos decorrentes da retroatividade dos efeitos de declaração de inconstitucionalidade” e que “declarações de constitucionalidade

não geram efeitos perniciosos ao operarem retroativamente”. Por esse

motivo, o eminente Ministro concluiu de forma muito característica que “Não

se modulam declarações de

constitucionalidade de leis ou atos

normativos – toda a gente sabe disso”2.

E é justamente nesse ponto que a decisão proferida no último dia 7.8.2019 peloTJ/SP dá sustentação a essa interpretação. O Órgão Especial, no acórdão do julgado, além de atestar a inconstitucionalidade do artigo vigente, afirma expressamente que a

ADIn 2.777/SP declarou a

constitucionalidade da redação antiga do inciso II, do artigo 66-B da Lei Paulista do ICMS e que a restituição dos valores recolhidos a maior não configura despesa, mas cancelamento de receita por ausência de legitimidade constitucional para sua manutenção, fato esse que demonstra a ausência de impacto prejudicial a justificar qualquer tipo de modulação.

Assim, tem-se como demonstrado que existem argumentos, reforçados pelo entendimento do TJ/SP, para que os contribuintes paulistas busquem a restituição dos valores pagos a maior do ICMS-ST em período anterior ao definido pela SEFAZ/SP (19.10.2016), desde que (i) respeitado o prazo prescricional e (ii) seja possível

comprovar documentalmente o

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1 Pernambuco também previa a

restituição e ajuizou a ADIn 2.675/PE contra sua própria legislação, da mesma forma que São Paulo, ação essa que também foi julgada improcedente pelo STF.

2 BRASIL. Supremo Tribunal Federal.

RE 353.657. Tribunal Pleno. Relator: Ministro Marco Aurélio. Diário de Justiça, Brasília, DF, 7.3.2008.

MARCELO MARQUES

RONCAGLIA – sócio do escritório Pinheiro Neto Advogados

PEDRO COLAROSSI JACOB –

Advogado no Pinheiro Neto Advogados. Aluno do Mestrado Profissional em Direito Tributário da Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas.

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