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Resultado da avaliação pelo mini-exame do Estado Mental de Folstein

(Folstein et al., 1975), modificado segundo critérios de Brucki (2003)

O resultado do Mini-Exame do Estado Mental demonstra um alto índice de comprometimento cognitivo entre os sujeitos estudados. Nenhum dos sujeitos obteve moderado comprometimento cognitivo e baixo índice entre os sujeitos, com comprometimento cognitivo leve. Na seguinte proporção: 76,92% dos sujeitos com comprometimento cognitivo grave e 23,08% dos sujeitos com comprometimento cognitivo leve.

0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 0 a 10 grave 17 a 21 leve 0 a 10 grave 11 a 16 moderado 17 a 21 leve

7. Resultado da avaliação da capacidade funcional dos idosos por

intermédio da Escala de Capacidade Funcional de Katz

Todos os idosos foram submetidos a uma avaliação com a escala de Katz, cujos resultados variam de zero (maior dependência funcional) a 6 pontos (maior independência funcional).

Os achados mostraram que uma proporção de 61,54% dos sujeitos é independentes no autocuidado; 15,30% apresentam grau de dependência parcial para o autocuidado e 23,08% apresentam importante dependência para o autocuidado. 23,08% 15,38% 61,54% Dependência importante Dependência parcial Independente

8. Relação tempo de institucionalização e o recebimento

ou não de visitas

Observamos que o tempo em relação aos anos de institucionalização não interfere no fato de receber ou não visitas. A tabela 2 mostra que sujeitos institucionalizados por um período menor que 10 anos apresentaram neste estudo o mesmo percentual para os que recebem visitas em relação aos que não recebem visitas, 7,7%; para o período de institucionalização entre 11 a 20 anos, 23,1% dos sujeitos recebem visitas e 30,1% não recebem; para o período entre 21 a 30 anos o resultado foi a mesma proporção - 15,4% recebem visitas e 15,4% não recebem visitas.

Tabela 2. Distribuição dos anos de institucionalização em relação às visitas anos de Institucionalização recebe visita (nº) não recebe visita (nº)

<10 anos 1 1

11 a 20 3 4

21 a 30 2 2

9. Análise dos depoimentos dos entrevistados

9.1. Definir velho, velhice e envelhecimento

“... A única diferença entre um louco e eu, é que eu não sou louco.”

Salvador Dali

A visão de velho, velhice e envelhecimento aparece muito associada ao tempo cronológico e pouco referida no aspecto psicológico.

“(...) Ela é velha”, disse um dos sujeitos apontando para outra cliente, idosa.

“(...) Depois dos 47 anos a idade é crítica, já é velho”. “(...) Velhice é ficar desanimado”.

“(...) 70 anos já é velho, já sou velho”.

“(...) Velho tem 5 anos, quem tem 50 anos é Deus”.

“(...) Velhos a partir de 48 anos até 60 anos, depois dos 60 anos é mais velho ainda”.

“(...) Tem bastante velho”.

“(...) A pessoa tem que esperar a velhice, a idade que Deus quiser, eu acho que não vou ficar velha, vou encontrar com o pai que tá no céu. Eu quero uma bíblia, você me dá uma bíblia?” “(...) Nossos velhos, Deus, Nossa Senhora Aparecida, a mãe de Deus. Tô véia, tenho 800 anos”.

Os idosos doentes mentais têm percepção do envelhecimento relacionada ao lado espiritual. Falam muito de Deus e relacionam o envelhecimento a Deus.

”... o eterno é sem tempo. Deus é sem tempo. O tempo é coisa só dos homens, porque eles começam e terminam. São finitos. A condição humana da morte instaura a contagem da nossa duração neste mundo e inaugura o tempo. Temos tempo porque morremos” (CRITELLI, 2007:11).

“(...) Velho é o homem bom, os velhinhos são bons”.

A percepção de que os velhos são bons está atrelada à imagem do velhinho de cabelos brancos, pessoas incapazes de praticar o mal. Parafraseando Nietzsche, a velhice confere ao velho certa brandura e indulgência (NIETZSCHE, 1844).

“(...) Pessoa que depois de certa idade vai deixando de se alimentar, cria ruga na cara, vai para o asilo ou fica com os pais. Se os seres humanos se alimentarem não vão ficar velhos, podem viver a vida tranqüilamente”.

Analisando a frase acima, entende-se que o sujeito percebe a importância da alimentação adequada para uma melhor qualidade de vida. É enfatizado também a velhice como dependência física. A velhice traz a necessidade de ser auxiliado por outrem, de uma forma ou de outra o indivíduo precisa de outras pessoas.

“(...) Velhice é o cabelo, meu cabelo é velho, quando morre alguém é velhice”.

“(...) Não sei se foi o remédio, eu sou médium, eu fiquei com ruga. Velhice é uma coisa boa, conforme o relacionamento do marido com a esposa é como se fosse novo”.

A percepção da imagem corporal do velho, refletida no doente mental, manifestada pelas rugas, cabelos brancos e inapetência.

A comunicação dos sujeitos apresenta tendência ao monólogo e interrupções súbitas, havendo também autenticidade e sensibilidade nas falas, às vezes absoluto silêncio (mutismo). E em outros momentos a fala é desordenada e frenética, havendo também repetição de palavras e frases sem sentido.

“(...) Envelhecimento é a pessoa velha, é o passar do tempo, passar da vida, isso é velhice”.

Nessa fala o individuo faz uma referência ao tempo vivido, a temporalidade e a finitude. Tudo no mundo humano é submisso e marcado por esse tempo finito da existência, prazos de validade, períodos históricos, aniversários, estações do ano, relógios, tudo é demarcado pelo nosso tempo de ser (CRITELLI, 2007).

Os idosos doentes mentais têm percepção do envelhecimento vinculado ao lado espiritual. Falam muito de Deus, e relacionam o envelhecimento a Deus.

Pesquisas demonstram que as pessoas, na velhice, apresentam maior busca pela espiritualidade.

“... O ponteiro de horas da vida – A vida consiste em raros momentos da mais alta significação e de incontáveis intervalos, em que, quando muito, as sombras de tais momentos nos rondam. O amor, a primavera, toda melodia, a Lua, as montanhas, o mar – apenas uma vez tudo fala plenamente ao coração: se é que atinge a plena expressão. Pois muitos homens não têm de modo algum esses momentos, e são eles próprios intervalos e pausas na sinfonia da vida real” (NIETZSCHE, 1844:48).

9.2. A percepção que o doente mental tem sobre seu processo de

envelhecimento

As falas dos entrevistados mostram que sempre enxergamos o velho como o outro. O ser humano tem dificuldade de ver o seu próprio envelhecimento e se perceber idoso. Vê o outro como velho e não se considera velho.

Um sujeito de 60 anos deu o seguinte depoimento:

“(...) Sabendo que a gente é velho tratam a gente bem, não sou velha. Eu ainda estou quarentona, a partir de 100 anos é velho”.

Uma das idosas ao responder qual a sua percepção sobre o envelhecimento, abraçou a psicóloga e começou a cantar:

“(...) Índia, seus cabelos negros...

E chorou, após cantar.

O depoimento leva à reflexão sobre os sentimentos expressos ao cantar uma música. Muito provavelmente é lembrança de tempo vivido, sem as marcas

profundas da doença e o anonimato da institucionalização. Conforme Goffman (2007), os indivíduos vivem o ócio forçado, a identidade e a subjetividade são massificadas, há perda de contato com o mundo exterior.

“(...) Vou ficar velhinho, cabelo branquinho, barba branquinha, tenho 44 anos e sou velho”.

“(...) Vou envelhecer, todos nós envelhecemos, vai de cuidar da pele, pintar cabelo, pintava as unhas. Se não se cuidar fica feia, ninguém quer ser velho. A Toscana, a Letícia são velhas, a Virgínia não tem ruga. A pessoa quando passa dos 80 anos a cabeça não ajuda, antes disso fica em forma, vai da alimentação da pessoa, carne, vitamina, queijo, leite”.

A pessoa não se torna idosa repentinamente, mas passa por um processo de envelhecimento. As estruturas psíquicas se constituem no início da vida e acompanham o individuo durante toda existência. Os princípios são os mesmos para todos, mas a forma de percorrê-los é singular.

Ao envelhecer, o indivíduo é forçado a se deparar com alterações físicas e psicológicas, em si próprio, e também com mudanças nas possibilidades de atuação no mundo, especialmente no que se refere ao seu lugar na estrutura familiar e social. Quando esse indivíduo não tem núcleo familiar, e vive institucionalizado, o processo se torna muito mais doloroso (GOLDFARB e LOPES, 2006 ).

“(...) Eu posso viver vida normal, não vou chegar tomar o último suspiro de vida, evidentemente vou permanecer na terra, serei cuidado por Jeová Deus”.

“(...) Eu acho que não vou envelhecer porque eu não tenho estudo, não sei uma rua, esqueço fácil as coisas”.

Há a associação velhice/sabedoria. O tempo vivido, talvez pelas ausências de vivências significativas e o tempo prolongado de institucionalização.

Tememos ficar velhos. Apesar de cada vez mais se apregoar a “boa velhice”, exemplificada com figuras públicas poderosas e sábias, o “velho doente e dependente” faz parte do nosso cotidiano e povoa assustadoramente o nosso imaginário.

9.3. O que considera família, e se sente falta de família

De modo geral, a instituição oferece apenas os serviços de moradia, alimentação, lavanderia, cuidados diários e administração de medicamentos, quando necessário. Há algumas atividades socioocupacionais. Não há, porém, um programa continuado de estímulo à reintegração social ou de desenvolvimento da autonomia para as atividades domésticas. Até mesmo a relação intra-instituição não é incentivada. Cada pessoa vive em seu mundo individual e privado. Os diálogos são escassos e predomina uma vida silenciosa e introspectiva.

“(...) Eu vivo sozinho”.

“(...) Quem cuida da gente e quem mais dá atenção é minha irmã. As pessoas internas são famílias, mas vou deixá-las, a família vem me ver, a internação finda”.

“(...) Sou solteiro velho, meu irmão não vem me ver, sinto falta dele”.

“(...) Acho que as pessoas daqui não são minha família, sinto falta da família, na minha família todos têm os olhos esverdeados, como os meus”.

“(...) As enfermeiras que cuida da gente é nossa família, quem dá roupa limpa pra gente é família, os internos não são família”.

Para alguns, a percepção de família está relacionada aos laços sangüíneos. Não vêem outros arranjos como forma de família. Outros enxergam a família como alguém que cuida e que tem laços afetivos, mesmo que não seja alguém com laços sangüíneos, mas que convive no dia-a-dia.

“(...) Eu sei, moça, meu pai, minha mãe, eu quero ir embora, meu pai me mandou embora com 17 anos, eu era sem educação com meu pai, agora sou bom”.

“(...) Eu gosto da minha mãe”.

“(...) Família é a mulher da gente, o tio, a tia, o primo Valter”. “(...) Meu pai, meu sobrinho é minha família”.

“(...) Minha família só tenho Julinha, minha filhinha adorável, tive infância trágica, minha mãe não me dava comida”.

“(...) Eu não tenho família, eu fui abandonado pela família a partir do momento que eu comecei a existir”.

A narrativa é emblemática: “Fui abandonado pela família a partir do momento que eu comecei a existir”. A história desse indivíduo foi radicalmente influenciada pela doença. Os acontecimentos que envolveram sua família constituem exemplo das vivências familiares em torno das doenças mentais. Conforme Melman (2003), o surto psicótico de um membro da família rompe e desorganiza o convívio domiciliar. O evento representa, de certa forma, o colapso dos esforços, o atestado da incapacidade de cuidar adequadamente do outro, o fracasso de um projeto de vida, o desperdício de muitos anos de investimento e dedicação. No imaginário social, predomina visão de medo e rechaço frente a qualquer experiência humana que se afaste dos padrões de racionalidade e normalidade hegemônicos. Talvez para essa família, a institucionalização tenha sido a alternativa para lidar com o fracasso.

“(...) Família é o pai, a mãe, vô, vó, tio, tia, filho, sobrinho, primo, prima, minha família mora em Santos, sinto falta, mas eles vêm me ver”.

Fato interessante é que a maior parte dos sujeitos se reporta à família como alguém que conviveu no passado. Sempre citam algum grau de parentesco:

mãe, tia, irmão. Poucos se referem à família como alguém que cuida. Não vinculam o cuidado à noção de família.

9.4. Percebe os demais internos como alguém da família?

“(...) São meus amigos”, aponta para outro paciente e diz que é seu filho.

“(...) Os internos não são minha família, são companheiros, são tudo bom, mas não é família”.

“(...) Considero as pessoas daqui como família”.

“(...) Os pacientes não são família, são velhinhas, eu acho que elas não são família”.

“(...) Os outros pacientes não são minha família, porque não conversam comigo para saber, todo mundo prejudica eu, eu quero ir embora, meu pai não vem me buscar e tão vendo que eu estou sofrendo”.

Conforme Osinaga (2004), acredita-se que o transtorno mental é a patologia da liberdade, a perda da realidade interior. O que infelizmente se pode constatar pela experiência é que o distúrbio mental vem acompanhado da perda da realidade exterior, como do direito de ir e vir, assim como de ter opinião, ser ouvido, ter trabalho, como também ser tratado com respeito e dignidade.

“(...) Eu não moro aqui, estou fazendo tratamento, minha filha não vem há seis anos, eu acho que ela me abandonou. Os funcionários são minha família, me dão cigarro, eu devo cigarro”. “(...) Os pacientes são estranhos, só aceito conversa com aqueles que me aceitam também, eu posso ter comunicação com eles, por exemplo, assunto particular tem encontrar um amigo e não é fácil encontrar um amigo. A gente tenta descobrir quem tem o mesmo pensamento, idéias da gente, se você é amigo dele ele é seu amigo. Eu nunca tive um amigo para compartilhar minhas idéias”.

A fala refere-se a um sentimento de desconfiança ou de falta de afetividade para poder compartilhar idéias, sentimentos e pensamentos. Segundo Nietzsche, tememos a disposição hostil do próximo porque receamos que, graças a esta disposição, ele chegue aos nossos segredos.

De certo modo, nomear um relacionamento parental traz atribuição de estabilidade e força. Por outro lado, os vínculos não familiares apresentam caráter mais transitório e flexível, independentemente de quão persistentes demonstrem ser. Não há dúvida quanto à necessidade de as pessoas possuírem vínculos estáveis e confiáveis, que possam servir de apoio e sustentação (MELMAN, 2006).

“(...) Os pacientes são praticamente minha família, porque eles dão cigarro um para outro, acende o cigarro. Aqui não tem velhinho. Os funcionários são tia, conversa muito, os funcionários são da TV”.

A percepção de família é algo relacionado aos laços consangüíneos e não ao convívio do dia a dia (dia-a-dia), e nem ao convívio de meses e anos. Raramente citam como família alguém que cuida ou dá atenção.

10. Qual a razão para os indivíduos com transtorno mental crônico não

serem acolhidos por seus familiares?

Questionou-se a assistente social do Instituto para tentar-se compreender o porquê de os sujeitos permanecerem institucionalizados, mesmo após o movimento da reforma psiquiátrica.

Na coleta de dados constatou-se que 46,15% dos sujeitos recebem visitas, e desses, 66,66% das visitas são de pessoas com laços consangüíneos (mãe, filhos e irmãos); 33,34% recebem visitas de pessoas sem vínculo consangüíneo (curador e ex-marido).

Conforme resposta obtida da assistente social, muitos sujeitos, quando transferidos para a instituição, estavam em outros hospitais psiquiátricos. Em relação àqueles que possuem algum tipo de vinculo familiar, houve esforço para retornarem ao domicílio. Mas muitos apresentam dificuldade de adaptação ao ambiente externo à instituição.

Um dos sujeitos tem um irmão que esporadicamente o visita, e houve tentativa de alta, mas o irmão, também idoso, teve dificuldade em lidar com o comportamento delirante de seu familiar. Ele afirmou: “Ele recusa alimentação quando está em casa, diz que tem veneno na refeição, que quero matá-lo. E

também não aceita o remédio, diz que quero dar a ele um “sossega leão13”...”. Segundo a assistente social, é comportamento típico de quem tem delírio persecutório14.

Há outro sujeito deste estudo cuja mãe o visita todos os finais de semana. Mas não o leva para casa por causa do quadro de agitação psicomotora. Em casa fica “agressivo”, e torna-se muito difícil conter essa agressividade.

Houve relatos de famílias em cujo domicílio moram outros doentes, não existindo condições de cuidar de um doente mental.

Em algumas famílias há um ou mais doentes mentais, o que elimina a possibilidade da vinda de mais um doente, e doente mental, por esse motivo não tem condições econômicas e psíquicas para cuidar em casa de mais alguém, também doente e dependente.

13

Dito popular para um medicamento cujo efeito é sedativo, ou seja, um ansiolítico (medicação que age no sistema nervoso central, causa relaxamento muscular e induz ao sono).

14

VI – CONSIDERAÇÕES FINAIS

A gerontologia, ciência que estuda o envelhecimento, considera de modo global o processo, abarcando os aspectos biológicos, psicológicos, sociais e econômicos. Segundo Potter & Perry (2004), é o “estudo de todos os aspectos do envelhecimento e suas conseqüências”.

O envelhecimento é fenômeno inexorável. Não deve ser considerado, entretanto, causa primária de doença ou morte, mas declínio funcional do organismo humano. Envelhecer é fase da vida.

A rápida ascensão da longevidade da população brasileira não foi acompanhada pela melhoria na qualidade de vida. O acesso aos serviços de saúde ainda é grande problema para a maioria da população, que carece de educação e de saúde (a prevenção continua a ser o melhor remédio).

Segundo dados da OMS, mais de 30% da população, independentemente de classe social, credo ou raça, necessitam de algum atendimento psiquiátrico. Conforme o Fórum de Entidades Nacionais de Direitos Humanos (2006), o Ministério da Saúde, sem implementar política adequada ao atendimento do doente mental, promove uma reforma psiquiátrica, pois edita portarias sem levar em conta as reais necessidades de quem espera por esse atendimento.

A pesquisa revelou que, apesar do movimento de desinstitucionalização psiquiátrica ocorrido nos últimos anos em todo o mundo, ainda é grande a prevalência de moradores no Instituto de Reabilitação e Prevenção em Saúde Indaiá.

Na época deste estudo havia 33 sujeitos considerados “moradores” ou “crônicos” (20,6% dos internados), dos quais foram estudados apenas os idosos, 13 moradores (8,2% dos internados). Por razões diversas, não obtiveram alta hospitalar e não foram transferidos para outros serviços. Alguns em virtude de doenças crônicas, com deterioração progressiva da capacidade cognitiva, como apresentado pelo MEEM, levando a distúrbios mais graves de comportamento: 76,9% dos sujeitos obtiveram pontuação menor que 10, o que indica comprometimento cognitivo grave, e apenas 23,1% dos sujeitos obtiveram pontuação entre 17 a 21, com comprometimento cognitivo leve; outros apresentaram comprometimento acentuado da capacidade funcional, ocasionando alto grau de dependência, verificado por meio da escala de Katz, para avaliação funcional das atividades básicas de vida diária: conforme essa escala, 38,46% dos sujeitos apresentam dificuldade nas atividades funcionais, sendo 23,08% com comprometimento importante, 15,38% com comprometimento parcial, além do abandono e rejeição familiar.

A média de institucionalização foi de 17 anos. A pesquisa mostrou que, apesar do longo tempo de institucionalização, muitos sujeitos ainda recebem visitas, mesmo esporadicamente. A proporção dos que recebem visitas para os que não recebem visitas não é muito divergente: 46,2% dos sujeitos recebem visitas e 53,8% não recebem visitas.

Em relação ao sexo há predomínio do sexo feminino: 69,3% para 30,7% do sexo masculino, o que confirma a feminização da velhice.

Entre as doenças mentais, a psicose orgânica é a de maior proporção - 46,15%, seguida pela esquizofrenia - 38,46%, epilepsia - 15,4%, e psicose alcoólica - 7,7% dos sujeitos.

Nem sempre o meio familiar é o mais indicado para uma pessoa com transtornos mentais. Produzir e multiplicar projetos de moradia, de sociabilidade e de familiaridade para os pacientes com transtornos mentais ajuda a superar impasses, gerando nichos comunitários nos quais os sujeitos usufruam a sua subjetividade com mais autonomia e liberdade (MELMAN, 2006).

Sennett (2006) ressalta que o caráter parece formado pela história e suas voltas imprevisíveis. Uma vez estabelecida, uma rotina não permite muita coisa em termos de história. Para desenvolvermos o caráter temos de fugir da rotina. Os sujeitos deste estudo, institucionalizados, seguem a mesma rotina, e apresentam ruptura em sua biografia. O isolamento típico de uma instituição corrói o caráter, sobretudo as qualidades que ligam os seres humanos uns aos outros, e dão a cada um o senso de identidade.

Para reflexão evidencio a importância, para o cenário científico brasileiro atual, de estudos como este, que teve a finalidade de compreender o processo de envelhecimento de pessoas portadoras de transtornos mentais. O Brasil, apesar do movimento da reforma psiquiátrica iniciado na década de 1970, ainda tem considerável contingente de pessoas que vivem em instituições psiquiátricas. Envelhecer em instituição psiquiátrica é significativamente diferente, pois cada pessoa responde singularmente à situação que vivencia. A falta de estímulos sociais e de cuidados individualizados faz com que haja perda de identidade. Rompe-se a linearidade de cada uma das biografias.

A pesquisa também apresentou pontos considerados frágeis:

- As dificuldades enfrentadas por pesquisadores no Brasil (no que me incluo) em arcar com a própria sobrevivência, sendo obrigados ao trabalho

cotidiano. E concomitantemente ao trabalho haver a dedicação à pesquisa, tarefa árdua. Um pesquisador não avança sem determinação, coragem e persistência.

- Outra dificuldade encontrada foi conseguir autorização para entrar na instituição, na condição de pesquisadora. Há grande resistência por parte dos administradores em ver o pesquisador positivamente, e não alguém que interferirá, atrapalhará ou fiscalizará o cotidiano da instituição;

- Saliento, ainda, como ponto frágil para esta pesquisa, as dificuldades enfrentadas no manejo com os sujeitos, em decorrência dos comprometimentos cognitivos e limitações de comunicação, embotamento afetivo e isolamento social.

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