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Neste trabalho, o objetivo foi identificar a composição e cinética de produção de compostos orgânicos voláteis e semi-voláteis do fungo do gênero

Myrothecium sp. (MYL), apontado por outros grupos do projeto SISBIOTA como

um potencial agente de controle biológico de doenças em diversos patossistemas em estudo (Tabela 2), bem como possível indução de resistência nas plantas com relação aos mesmos patógenos.

Inicialmente um ensaio foi realizado para comparar a inoculação feita utilizando um disco de micélio do fungo e outro utilizando uma solução de esporos. Além destes, foi realizado outro ensaio comparando o efeito dos diferentes meios de cultura, CMA e BDA, na produção de voláteis. Estes ensaios preliminares foram feitos com a espécie de fungo do gênero Curvularia sp. (CUI).

Antes do início dos testes preliminares, foi necessário otimizar as condições de operação do modulador criogênico de quatro jatos para que os ensaios fossem conduzidos no sistema GC×GC-QMS. A fim de obter picos estreitos e bem resolvidos, a modulação foi ajustada para um período de 6 s.

Na comparação entre a composição volátil e semi-volátil do metabolismo fúngico gerada nos diferentes meios de cultura, foi possível observar que a utilização do meio BDA (Figura 12C) levou a um aumento na produção dos metabólitos voláteis extraídos em detrimento da produção observada quando empregado o meio de cultura CMA (Figura 12D). Assim, o meio BDA foi escolhido para a condução dos demais experimentos, devido às maiores intensidades melhorando o processo de detecção e identificação dos compostos.

Figura 6: Cromatogramas dos brancos contendo somente os meios de cultura BDA (A) e CMA (B), bem como os cromatogramas dos metabólitos voláteis do fungo CUI nos meios de cultura BDA (C) e CMA (D). Condições de extração,

O ensaio para comparação da inoculação usando o disco do micélio e a suspensão de esporos foi executado segundo procedimento existente na literaturainoculando 1400 esporos por frasco de extração, contados devidamente em câmara de Neubauer com o auxílio de microscópio óptico.65

Diferenças foram observadas entre a composição do headspace de meios de cultura inoculados com diferentes procedimentos. Compostos antes não detectados em ensaios onde os meios de cultura eram inoculados com o disco de meio CMA contendo o micélio do fungo CUI, apareceram quando inoculados utilizando a suspensão de esporos deste mesmo fungo. Isso ocorre, pois, ao utilizar a suspensão de esporos, uma maior (e conhecida) quantidade de material biológico é inoculada e a variação dessa quantidade inoculada é menor em relação a que ocorre quando a inoculação é feita através de discos de micélio, onde o número de esporos transferidos é aleatório e dependente da região específica do disco selecionado para inoculação, tornando o controle difícil.65

A diferença acentuada na produção de voláteis (Figura 13) pode ser evidenciada apenas comparando visualmente os dois cromatogramas obtidos, onde o destaque em rosa (Figura 13B) mostra metabólitos produzidos em quantidades muito superiores àquelas observadas no experimento utilizando o disco do micélio (Figura 13A). Dessa forma, a inoculação utilizando a suspensão de esporos foi escolhida para condução dos demais experimentos.

Figura 7: Cromatogramas dos metabólitos voláteis do fungo CUI inoculado com

o disco do micélio (A) e com a suspensão de esporos (B). Condições de extração, separação e detecção conforme item 4.5.2.

Escolhida a forma de inoculação adequada bem como otimizadas as condições cromatográficas para o sistema bidimensional utilizando modulador de

loop a partir dos resultados dos ensaios anteriores, foram conduzidos os ensaios

para o fungo do gênero Myrothecium sp. (MYL), avaliando a produção de VOCs durante o período de cinco dias (do terceiro até o sétimo dia após a inoculação).

De posse dos cromatogramas foram iniciadas as análises quimiométricas do conjunto de dados a fim de eliminar a subjetividade da identificação do dia onde a produção de metabólitos secundários voláteis é a maior e mais diversa. Inicialmente foi realizado o alinhamento dos cromatogramos, uma vez que todas as injeções foram realizadas manualmente por SPME. Assim, foram otimizados os parâmetros do algoritmo COW para que o alinhamento dos dados fosse realizado e os deslocamentos de tempos de retenção (time shift) fossem eliminados sem que houvesse deformações nos picos que comprometessem sua identificação posterior.

Para o alinhamento e posterior modelagem apenas os cromatogramas obtidos no modo splitless (sem divisão) de injeção foram utilizados. Os cromatogramas obtidos com modo de injeção split (com divisão) foram utilizados somente para a identificação dos picos mais intensos, onde houve sobreposição da intensidade do sinal devido à saturação do fundo de escala do detector.

A Figura 14 compara uma fração dos dados antes e depois do alinhamento COW, mostrando que o mesmo se fez eficiente para remoção dos deslocamentos do tempo de retenção com o mínimo de deformação.

Figura 8: Comparação entre um corte dos dados brutos (A) e desses mesmos dados depois de alinhados (B) pelo algoritmo COW.

Uma análise estatística não supervisionada de reconhecimento de padrões foi realizada utilizando MPCA, que é uma extensão da análise de componentes principais (PCA) para dados de ordem superior, para que agrupamentos naturais entre as amostras fossem evidenciados.

O formato dos dados para cada amostra é tridimensional, sendo esses tensores na forma de (sinal × ¹tR × ²tR), sendo o sinal a soma das intensidades de

todos os fragmentos detectados no espectro de massas coletado para aquele ponto. Logo, o conjunto de dados incluindo o modo das amostras (período de inoculação) passou a conter quatro dimensões, ou seja, tensores Sinal × (¹tR × ²tR

× período de inoculação), tornando o tratamento de dados muito complexo. Assim, os dados foram tratados na forma desdobrada, para que o tratamento de dados fosse simplificado e compatível com o algoritmo MPCA.

O primeiro passo consistiu em escolher o número de componentes principais (CP) utilizando a validação cruzada do tipo leave one out limitando o modelo a 4 CP, bem como utilizando o gráfico de número de CP em função da variância explicada (%), conforme a Figura 15. A validação cruzada foi limitada para 4 CPs pensando que uma CP poderia ser responsável por explicar a variância contida nas amostras controle, uma para explicar a variância das amostras inoculadas, uma para a variância proveniente da informação temporal (mudança da composição volátil e semi-volátil do metabolismo fúngico em função da cinética de produção de metabólitos) e por fim uma quarta CP para explicar alguma variância não evidenciada nas demais que fosse relevante para o estudo.

Figura 9: Gráfico de número de componentes principais versus variância explicada (%).

Visualmente e através da validação cruzada o resultado indicou um modelo com 2 CP explicando 88,40% da variância dos dados, e que as demais CPs não adicionariam informações relevantes se fossem adicionadas no modelo.

Antes de avaliar os gráficos de escores e pesos, foi verificada a presença de outliers no conjunto de dados através de um gráfico de Hotelling T² em função dos resíduos (Figura 16). Os resíduos indicam quanta informação de determinada amostra não foi explicada pelo modelo, enquanto que os valores de Hotelling T² indicam a distância de cada amostra do centro do conjunto de dados.

Uma amostra com resíduo alto (acima dos limites de confiança de 95% representados na figura pela linha tracejada azul) indica que o modelo não foi capaz de explicá-la satisfatoriamente. Já uma amostra com Hotelling T² alto (acima dos limites de confiança utilizados) indica que a amostra está muito longe do centro do conjunto de dados. Por fim, amostras com valores de Hotelling T² e valores de resíduo altos são consideradas outliers, indicando que é uma amostra atípica e não pode ser explicada pelo modelo contruído.

Como resultado, nenhuma amostra apresentou tais características, sendo todas satisfatoriamente descritas pelo modelo.62

Figura 10: Gráfico de Hotelling T² versus resíduos.

A avaliação da influência de cada componente principal no modelo e a verificação de possíveis agrupamentos entre as amostras foi realizada a partir da construção de gráficos de escores, uma vez que estes contêm as informações relevantes das amostras sendo que, cada amostra corresponde a um determinado período de inoculação.59,62

A avaliação do gráfico de escores (Figura 17) revelou que a primeira componente principal, responsável por explicar a maioria da variância do modelo (82,10%) foi responsável por separar, principalmente as amostras contendo

apenas o meio de cultura BDA das amostras inoculadas. Essa CP também foi capaz de explicar a diferença entre as amostras inoculadas em função do período após inoculação.

Figura 117: Gráfico de escores da CP1 versus CP2.

Observando o gráfico de escores em função do tempo após inoculação para a primeira CP (Figura 18) ficou mais evidente a relação das amostras entre si. Esse gráfico mostra que independentemente do período de inoculação, os escores dos brancos (meio BDA não inoculado) são próximos de zero, ao contrário do meio inoculado, que mostra uma evidência de queda dos escores ao longo do tempo de avaliação. Nesse caso, os maiores escores foram encontrados nas amostras do terceiro dia de cultivo, evidenciando que a maior diversidade e quantidade de metabólitos foi adquirida nesse período após inoculação do fungo.

Ainda sobre o gráfico de escores da CP1 em função da CP2 (Figura 17), foi possível associar a segunda componente (6,32% da variância do modelo) principal somente à variação da composição do headspace do meio de cultura

inoculado com o período de inoculação (i.e., com a cinética de produção e consumo/extinção de metabólitos voláteis).

Figura 12: Gráfico de escores da CP1 em função dos dias de cultivo.

A tendência de queda de escores na CP2, ilustrada de forma geral na Figura 17 e em função do tempo na Figura 19, confirma a tendência da Figura 18, explicando a variação dos escores da CP2 em função do período de inoculação. Desta forma, para o meio inoculado, os escores são maximizados no 3º dia do experimento, que então corresponde ao período após a inoculação onde a concentração de metabólitos voláteis no headspace do meio de cultura inoculado foi maximizada.Baseado nessas evidências , a inspeção do gráfico de escores do modelo gerado por MPCA foi determinante na aquisição do período de inoculação onde a concentração de metabólitos voláteis no headspace do meio de cultura inoculado pelo fungo MYL é máxima.

Figura 13: Gráfico de escores da CP2 em função dos dias de cultivo.

A partir dos cromatogramas bidimensionais do 3º dia de estudo, a identificação tentativa dos picos cromatográficos provenientes apenas da fração volátil do metabolismo do fungo foi então realizada. A discriminação dos picos presentes no meio de cultura (Figura 20B) e provenientes dos metabólitos voláteis do fungo (Figura 20A) foi assistida pelo uso do gráfico de pesos positivos (Figura 21) que se assemelhou a um cromatograma bidimensional, pois é função dos tempos de retenção na primeira e na segunda dimensão.59,62

Figura 14: Cromatograma da fração volátil do metabolismo do fungo MYL inoculado em meio de cultura BDA (A) e amostra controle (branco) contendo apenas o meio de cultura BDA (B) após três dias de transferência para o dispositivo de extração. Condições de extração, separação e detecção conforme item 4.5.2.

Figura 15: Gráfico de pesos positivos da segunda componente principal (CP2) do modelo de MPCA.

A matriz de pesos gerada pelo modelo de MPCA para a CP2 foi escolhida para o processo de identificação tentativa dos metabólitos, uma vez que esta é responsável somente por evidenciar a cinética de produção de voláteis, diferentemente da CP1, na qual a maior parte da variância explicou a diferença entre amostras controle e amostras inoculadas.

Desta forma, a matriz de pesos da CP2 foi dividida a fim de separar os valores de pesos positivos e negativos. Os valores positivos correspondem a partes do cromatograma onde o sinal da amostra inoculada é mais intenso do que na amostra controle (contendo apenas o meio BDA). Analogamente, os pesos negativos da CP2 correspondem, a princípio, a picos do background do meio de cultura suprimidos pelo crescimento do fungo ou metabolizados tardiamente.

Os tempos de retenção na primeira (¹tR) e segunda (²tR) dimensão para

cada composto foi obtido utilizando o software GCImage, através da comparação dos cromatogramas do terceiro dia e do gráfico de pesos positivos da CP2. Como resultado, foram detectados 102 metabólitos voláteis produzidos pelo fungo e 54 destes compostos foram tentativamente identificados (cerca de 53%), os quais estão listados na tabela 4.

Tabela 4: Identificação tentativa dos metabólitos voláteis produzidos pelo fungo MYL nas extrações realizadas no 3º dia de cultivo do fungo. # ¹tr (min) ²tr (min) Match

(%) LTPRILit LTPRIExp Composto Químico CAS

1 6,533 0,007 92 926 943 3,7-dimetil-1,6-octadieno (R-citroneleno) - 2 7,950 0,025 84 993 994 4-ciclohepten-1-ona - 3 8,367 0,016 91 1008 1007 Acetado de 3-Hexenila 3681-71-8 4 8,867 0,009 94 1018 1020 4-metil-1-(1-metiletil)-1,3-ciclohexadieno (α-terpineno) 99-86-5 5 9,117 0,008 88 1023 1027 1-metil-4-(1-metiletil)-ciclohexeno (para-ment-1-eno) 5502-88-5 6 9,117 0,012 94 1025 1027 1-metil-4-(1-metiletil)-benzeno (para-cimeno) 99-87-6 7 9,200 0,033 97 1030 1040 2-etil-1-hexanol 104-76-7 8 9,283 0,010 85 1046 1042 3,4-dimetil-1,5-ciclooctadieno 21284-05-9 9 11,367 0,011 83 1117 1109 (3E)-4-etil-3-nonen-5-ino 74685-67-9 10 11,867 0,031 81 1125 1122 3,7-dimetil-6-octenal (β-citronelal) 106-23-0 11 12,617 0,068 97 1136 1142 feniletil álcool 60-12-8 12 13,200 0,033 89 1158 1155 (2Z)-6-metil-2-undeceno - 13 14,033 0,040 81 1181 1176 4-etil-benzaldeído 4748-78-1 14 17,450 0,033 92 1258 1249 1-decanol 112-30-1 15 18,783 0,015 86 1280 1276 1-(eteniloxi)-decano 765-05-9 16 19,450 0,015 84 1299 1289 5-butil-4-noneno 7367-38-6

17 21,617 0,031 91 1351 1341 1,1-dimetil-2-nonilciclopropano 41977-38-2 18 22,200 0,007 89 1357 1355 1-undecanol 112-42-5 19 22,450 0,008 82 1365 1361 undec-(8Z)-enal - 20 22,783 0,007 83 1376 1369 2-dodecanol 10203-28-8 21 23,450 0,007 89 1384 1386 4,8-dimetiltridecano 55030-62-1 22 23,617 0,009 84 1393 1390 2-butil-1-octanol 08/02/3913 23 23,783 0,011 90 1403 1394 diepi-α-cedreno 469-61-4 24 24,117 0,013 95 1398 1403 [1S-(1α,2β,4β)]-2,4-diisopropenil-1-metil-1-vinilciclohexano (β-elemeno) - 25 24,200 0,008 93 1409 1405 1,1,3-trimetil-2-(3-metilpentil)ciclohexano - 26 24,617 0,009 86 1411 1415 1-tetradecino 765-10-6 27 24,867 0,008 91 1421 1421 (E)-3-tetradeceno 41446-68-8 28 25,117 0,011 82 1418 1428 α-santaleno - 29 25,200 0,012 82 1424 1430 β-barbateno - 30 25,617 0,012 84 1433 1440 α-bulneseno 3691-11-0 31 26,033 0,012 83 1458 1451 (3Z,6E)-3,7,11-trimetil-1,3,6,10-dodecatetraeno (α- farneseno) 26560-14-5 32 26,117 0,009 84 1443 1453 propanoato de citronelil 141-14-0 33 26,533 0,009 85 1466 1463 9a-metildecahidro-2H-benzo[a]ciclohepten-2-ona - 34 26,700 0,012 81 1475 1467 4-metileno-1-metil-2-(2-metil-1-propen-1-il)-1-vinil- cicloheptano -

35 26,950 0,012 85 1472 1474 Biciclo[10.1.0]tridec-1-eno - 36 27,117 0,013 82 1485 1478 8,8-dimetil-9-metileno-1,5-cicloundecadieno - 37 27,283 0,016 86 1480 1482 1-(1,5-dimetil-4-hexenil)-4-methil-benzeno (α-curcumeno) 644-30-4 38 27,700 0,010 84 1483 1492 isobutirato de citronelil 97-89-2 39 27,867 0,012 84 1503 1496 1-metil-4-(4-metilpentil)-3-ciclohexeno-1-carboxaldeído - 40 27,950 0,013 86 1499 1499 2,6,10,10-tetrametilbiciclo[7.2.0]undeca-2,6-dieno (cariofileino-(I3)) - 41 28,117 0,011 84 1501 1503 butirato de citronelil 141-16-2 42 28,700 0,013 87 1518 1517 cis-α-bisaboleno 29837-07-8 43 30,033 0,012 81 1557 1551 (1E,5E)-1,5-dimetil-8-(propan-2-ilideno)ciclodeca-1,5-dieno 15423-57-1 44 30,367 0,013 83 1567 1559 6,10-dimetil-dodeca-1,6-dien-12-ol - 45 30,700 0,011 82 1574 1567 11-tridecin-1-ol 33925-75-6 46 32,950 0,027 80 1635 1632 (4,8,8-trimetildecahidro-1,4-metanoazulen-9-il)metanol (Isolongifolol) 1139-17-9 47 34,283 0,025 81 1683 1676 1,3-di(ciclohexil)but-1-eno - 48 35,117 0,028 87 1706 1704 4-isopropil-1,6-dimetilnaftaleno (cadaleno) 483-78-3

Estudos realizados com o fungo da espécie Trichoderma atroviride, extensivamente estudado pelo conhecido poder de biocontrole de vários patógenos em plantas, também revelou a produção de metabólitos como o feniletil álcool e terpenos α-curcumeno e α-terpineno.20

Da mesma forma, o fungo do gênero Memnoniella produz metabólitos encontrados para o fungo MYL, como o α-curcumeno e α-terpineno, bem como o terperno β-elemeno, que possui ação de biocontrole conhecida.45

Por fim, outros metabólitos como diepi-α-cedreno e β-elemeno, produzidos pelo o fungo Penicillium roqueforti; e o metabólito feniletil álcool, produzido pelo fungo endofítico Gliocladium roseum, ambos conhecidos por metabolizar substâncias antibióticas, foram encontrados na fração volátil do metaboloma do fungo do gênero Myrothecium, confirmando seu potencial como fungo de biocontrole e indicando que sejam essas as possíveis substâncias responsáveis, por exemplo, pelo controle do mofo branco em soja, doença causada pelo micro-organismo Sclerotinia sclerotiorum.21,66

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