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3. AS MANIFESTAÇÕES DE 2013

3.4. RESULTADOS E EXPECTATIVAS

A reação diante da pressão de multidões nas ruas foi o atendimento a suas reivindicações, como a anulação do aumento da tarifa do transporte e redução em alguns casos, São Paulo, Rio de Janeiro e mais de 15 cidades reduziram a tarifa do transporte público. A presidenta da República, Dilma Rousseff, declarou em rede

nacional de televisão que estava escutando o clamor das ruas, que tinha intendido o recado e considerava as reivindicações pertinentes.

Outra reação imediata foi o arquivamento da PEC-37 no dia 25 de junho de 2013. O projeto Cura-Gay foi arquivado e o presidente da Câmara, Renan Calheiros, apresentou uma série de pautas para serem discutidas no mês de Julho e as férias dos deputados foram suspensas. O Senado, por sua vez, aprovou projeto que torna corrupção crime hediondo.

As respostas do poder público não tardaram: a promessa de convocar a Reforma Política, feita pela Presidenta da República (o que foi reprovado pelas forças partidárias de oposição ao governo federal e pelo Supremo Tribunal Federal – STF), investimentos em segurança pública, educação, saúde e mobilidade urbana. No âmbito Estadual (RS) houve a aprovação do Passo Livre Estudantil15 intermunicipal e a aplicação pela primeira vez dos 12% na Saúde.

A área da saúde foi contemplada com o programa do Governo Federal Mais Médicos (consiste na contratação de médicos brasileiros e estrangeiros para prestar serviços de atendimento nas regiões mais pobres e/ou menos cobertas pelos serviços públicos neste setor). Além da aprovação de 25% dos royalties16 do pré- sal17 para a saúde, os outros 75% serão destinados para a educação, área que também foi inclusa nas reivindicações.

Ainda na área da educação, foi aprovado o Plano Nacional de Educação - PNE18, que prevê a aplicação de 10% do Produto Interno Bruto- PIB para esta área, as diretrizes do documento abrangem todos os níveis de formação, desde a

15 Passe Livre Estudantil já está em funcionamento no Rio Grande do Sul. Resultado do diálogo com os movimentos estudantis

e sociais, o Governo do Estado vai garantir de forma pioneira o subsídio ao transporte de milhares de estudantes de todas as regiões do Estado. Além dos 67 municípios da Região Metropolitana e Aglomerações Urbanas, outros 380 municípios aderiram ao programa, num total de 447 cidades beneficiadas. Mais em: http://www.rs.gov.br/conteudo/190259/passe-livre-estudantil

16 Os royalties são os valores referentes ao que é cobrado pelo proprietário de uma patente de produto, processo de produção,

marca ou autor de uma obra, ao permitir sua reprodução ou comercialização. Os royalties do pré-sal são cobrados das concessionárias que exploram o petróleo das camadas mais profundas e é pago de acordo com a quantidade explorada. O valor é pago ao governo federal e repassado para os estados e municípios.

17 O “pré-sal” é uma área de reservas petrolíferas encontrada sob uma profunda camada de rocha salina, que forma uma das

várias camadas rochosas do subsolo marinho. As reservas do pré-sal encontradas no litoral do Brasil são as mais profundas em que já foi encontrado petróleo em todo o mundo.

18 LEI Nº 13.005, de 25 junho, 2014. Diretrizes I - erradicação do analfabetismo; II - universalização do atendimento escolar; III -

superação das desigualdades educacionais, com ênfase na promoção da cidadania e na erradicação de todas as formas de discriminação; IV - melhoria da qualidade da educação; V - formação para o trabalho e para a cidadania, com ênfase nos valores morais e éticos em que se fundamenta a sociedade; VI - promoção do princípio da gestão democrática da educação pública; VII - promoção humanística, científica, cultural e tecnológica do País; VIII - estabelecimento de meta de aplicação de recursos públicos em educação como proporção do Produto Interno Bruto - PIB, que assegure atendimento às necessidades de expansão, com padrão de qualidade e equidade; IX - valorização dos (as) profissionais da educação; X - promoção dos princípios do respeito aos direitos humanos, à diversidade e à sustentabilidade socioambiental. http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/_Ato2011-2014/2014/Lei/L13005.htm

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Educação Infantil até o Ensino Superior e visam eliminação de desigualdades históricas no país.

A juventude que foi às ruas também viabilizou a aprovação do Estatuto da Juventude em Julho de 2013, após dez anos de tramitação e pressão popular. A lei estabelece direitos e políticas públicas voltadas aos jovens, como acesso à educação, à profissionalização, ao trabalho e à renda, à participação social, ao território, à livre orientação sexual e à sustentabilidade. Prevê também a criação dos conselhos estaduais e municipais de juventude: espaços para que os jovens possam dar opinião e participar de decisões políticas.

Os meios de comunicação tiveram um papel decisivo nos protestos, enquanto a mídia tradicional buscou, no início, criminalizar os manifestantes, taxando-os como vândalos e baderneiros; cobertura que foi pressionada a modificar no decorrer dos acontecimentos. A imprensa alternativa acompanhou os atos das ruas, ao vivo, transmitindo através das mídias digitais, contribuindo para que a discussão sobre a democratização da comunicação ganhasse espaço. Além desse, outro debate foi retomado no processo de manifestação: reforma política, pois somente ela seria capaz de proporcionar mudanças mais profundas no processo político e de representação.

Após a negativa do Congresso Nacional em realizar um Plebiscito para saber a opinião da população em relação à Reforma Política, proposto pela Presidenta Dilma Roussef, os movimentos sociais e entidades de todo país, reuniram-se em plenária nacional e decidiram que convocariam um Plebiscito Popular. Iniciativa que apesar de não possuir caráter legal, tinha como objetivo demonstrar o desejo popular por mudanças no sistema político e pressionar o poder público a convocar um plebiscito oficial sobre a reforma política.

O Plebiscito Popular que aconteceu de 1 e 7 de setembro de 2014, e recolheu 7,4 milhões de votos favoráveis a criação de uma Constituinte Exclusiva e Soberana sobre o Sistema Político. Em outubro o resultado foi apresentado aos três poderes e protocolado na Câmara de Deputados o Projeto de Decreto Legislativo - PDL 1508/2014 que propõe um Plebiscito oficial sobre a convocação de uma Constituinte, Exclusiva e Soberana do Sistema Político.

Muitas das demandas dos protestos de junho não foram atendidas porque a estrutura do poder político no Brasil e suas “regras de funcionamento” não permite que se avance para mudanças profundas. A Reforma Política abrangeria o coletivo de reivindicações daqueles que foram às ruas. Marilena Chauí reforça essa perspectiva, diante do pedido de mais ética política que ecoou nas manifestações:

(...) Ética que não depende das virtudes morais das pessoas privadas dos políticos e sim da qualidade das instituições públicas enquanto instituições republicanas. A ética da política, no nosso caso, depende de uma profunda reforma política que crie instituições democráticas republicanas e destrua de uma vez por todas a estrutura deixada pela ditadura, que força os partidos políticos a coalizões absurdas se quiserem governar, coalizões que comprometem o sentido e a finalidade de seus programas e abrem as comportas para a corrupção (CHAUÍ, 2013, n.p.).

O temor de Chauí em relação a apropriação e manobra da direita em ralação ao processo das mobilizações (conforme item 3.3, tratado anteriormente) foi confirmado a partir da ascensão da direita ultraconservadora no Brasil, evidenciada no resultado da eleição de 2014, onde foi eleito o congresso mais conservador desde 1964, segundo o Diap (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar).

O site Pragmatismo Político noticiou: “apesar das manifestações de junho de 2013 — carregadas com o simbolismo de um movimento popular por renovação política e avanço nos direitos sociais —, o resultado das urnas revelou uma guinada em outra direção”. Referindo-se a eleição de figuras como Pastor Feliciano19, o Celso Russomanno20 em São Paulo, Jair Bolsonaro, Rio de Janeiro e Luis Carlos Heinze21 no Rio Grande do Sul. Parlamentares que incitaram o racismo, a violência

19MARCO ANTÔNIO FELICIANO; conferencista, empresário, pastor evangélico. Deputado Federal pelo Partido

Social Cristão. Autor do projeto “Cura Gay”, que permite a Psicólogos “curar” a homossexualidade.

20 CELSO RUSSOMANO; ficou conhecido pelo popular programa de televisão Aqui e Agora, no qual fazia um

quadro em que lidava com consumidores insatisfeitos. Eleito Deputado Federal mais votado do Brasil, no Estado de SP, pelo PRB.

21 LUIZ CARLOS HEINZE, autor da famosa frase: “É ali que estão aninhados quilombolas, índios, gays, lésbicas,

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e assumem as ideias mais ultraconservadoras da extrema-direita publicamente, além de estimular o fundamentalismo religioso.

Outro reflexo da jornada de junho nas eleições foi o aumento do índice de abstenção dos eleitores, de acordo com dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) o número deste ano foi o mais alto desde 1998, em 2014 19,4% do eleitorado brasileiro não compareceu às urnas (27,7 milhões dos 142,8 milhões de eleitores no país). De acordo com Maria Francisca Motta, assessora de comunicação do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo, um dos motivos pode ser a não transferência do domicílio eleitoral. Entretanto, o descontentamento com a representação e o sistema político expressado na jornada de junho contribuiu para esse aumento.

É possível assim verificar que as manifestações de 2013 tiveram inúmeros resultados em diversas instâncias, nem todos positivos. Muitas reivindicações foram atendidas por parte dos Governos Estaduais e Federal, contudo, outros avanços foram barrados pelo Congresso Nacional, como o Plebiscito da Reforma Política e a regulamentação dos Conselhos Populares. Outras consequências puderam ser vistas a partir do resultado das eleições de 2014, com o aumento dos votos da direita e da porcentagem de abstenção dos eleitores, denotando com isso insatisfação dos mesmos, frente ao sistema político vigente.

4. NARRATIVAS DO PROTAGONISMO JUVENIL: ANÁLISE DAS

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