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Os macacos prego utilizaram cerca de quatro vezes mais sítios de quebra na Caatinga arbustiva aberta que na Caatinga arbustivo-arbórea: 2.212 sítios de quebra em Jucurutu (Caatinga arbustiva aberta) e 558 sítios de quebra em Luís Gomes (Caatinga arbustivo- arbórea).

Em Jucurutu, 100% dos sítios de quebra encontrados eram exclusivamente de sementes de maniçobas, enquanto que em Luís Gomes houve uma maior variação de sementes, sendo: 75% de coco catolé (Syagrus cearensis), 16% de maniçoba (Manihot dichotoma), 1% de olho de boi (Diclea grandiflora) e 8% para sítios de quebra mistos. Devido ao baixo registro da quebra de sementes de D. grandiflora, optou-se por não utilizar estes dados nos testes de hipóteses.

A quebra de sementes em diferentes estágios de maturação foi observada em ambas as áreas de estudo. O grupo de C. flavius (Jucurutu) foi o único a quebrar sementes de maniçoba verdes (6%), quase maduras (2%) e maduras (92%). Por outro lado, o grupo de C. libidinosus (Luís Gomes), habitante de uma região onde também eram encontradas sementes de maniçoba, quebrou apenas sementes de maniçoba maduras, mas abriu cocos catolé em diferentes estágios de maturação, sendo 8% do total para sementes verdes, 73% sementes maduras, 15% sementes podres e 4% sementes mistas.

Escolha dos martelos para a quebra de sementes

A predição 1 foi verificada: observou-se que, para ambas as áreas de estudo, os martelos encontrados sobre as bigornas diferiram significativamente dos potenciais martelos

encontrados entre os raios de 1 a 20 cm e 21 a 100 cm de distância da bigorna (ver estatística na Tabela 1 e Figuras 4A e B). Entretanto, o padrão diferiu entre as áreas.

Em Jucurutu, o padrão encontrado foi de pedras localizadas acima da bigorna com massa significativamente menor (mediana = 46 g) do que aquelas localizadas nos arredores da mesma (medianas para raios entre 1-20 cm = 131g e 21-100 = 230 g – Figura 4A). O oposto foi verificado em Luis Gomes: pedras acima da bigorna significativamente com maior massa (mediana = 429 g) do que as pedras encontradas aos arredores (medianas para 1-20 cm = 32g e 21-100 = 52,5 g – Figura 4B).

Figura 4– Análises estatísticas correspondentes à predição 1. (A) Caatinga arbustiva aberta: massa

das pedras encontradas sobre a bigorna (0 cm, N = 414); entre 1-20 cm da bigorna (N =162) e entre 21-100 cm da bigorna (N=363). (B) Caatinga arbóreo-arbustiva: massa das pedras encontradas sobre a bigorna (0 cm, N = 93); entre 1-20 cm da bigorna (N =115) e entre 21-100 cm da bigorna (N=346). Mediana, Distribuição não outlier dos dados, *** p < 0,001.

Em relação ao peso dos martelos, foi verificado que estes variaram de acordo com a espécie da semente (predições 2) a ser quebrada. Para sementes menores (Manihot dichotoma) as pedras utilizadas como martelos eram mais leves (médias entre Jucurutu e Luís Gomes = 89,01g) do que para sementes maiores (Syagrus cearensis, média = 612,65g). O peso dos martelos não diferiu entre os sítios de quebra mistos e os sítios de quebra de S. cearensis na Caatinga arbustivo-arbórea (médias: sítios de quebra mistos = 412,25 e sítios de quebra de S. cearensis = 612,65g). Ver Tabela 1 e Figura 5A e 6.

Ainda foi observado que, a depender da área de estudo, ocorreram diferenças significativa quanto ao peso dos martelos utilizados para quebrar uma mesma espécie de semente (M. dichotoma). Na Caatinga arbustiva aberta, onde existem exclusivamente sementes de M. dichotoma, os martelos encontrados sobre as bigornas foram duas vezes mais leves do que os martelos encontrados na Caatinga arbóreo-arbustiva para quebrar esta mesma espécie de semente (médias: Jucurutu = 59,25g e Luís Gomes = 118,77g). Ver Tabela 1 e Figura 5A e 6.

Os resultados dos testes da predição 3 indicam que na Caatinga arbustiva aberta houve variação no peso dos martelos utilizados para quebrar diferentes estágios de maturação de sementes de Manihot dichotoma (Tabela 1 e Figura 4B). Entretanto, esta diferença não foi verificada na Caatinga arbustivo-arbórea ao analisar o peso das pedras utilizadas para quebrar diferentes estágios de maturação de Syagrus cearensis (Tabela 1 e Figuras 5C e 6).

Figura 5 –Análises estatísticas correspondentes às predições 2 e 3. (A) Massa dos martelos utilizados para quebrar sementes por macacos prego em ambos os tipos de Caatinga. M. dichotoma1 (N= 414);

M. dichotoma2 (N= 13); Mix2 (Sítios de quebra mistos, N = 4) e Syagrus cearensis2 (N =88). (B) Martelos utilizados pelo grupo de Cebus flavius na quebra da semente de M. dichotoma em diferentes estágios de maturação. Sementes verdes (N= 9); sementes quase maduras (N = 9) e sementes maduras (N=393). (C) Martelos utilizados pelo grupo de C. libidinosus na quebra da semente de Syagrus

cearensisem diferentes estágios de maturação. Sementes verdes (N= 12); sementes maduras (N = 50); sementes podres (N = 11) e sítios de quebra mistos (N = 15). média e intervalos de confiança da média a ±95%; ** p < 0,01; *** p < 0,001; Manihot dichotoma1 = Caatinga arbustiva aberta;

Figura 6 – Sementes consumidas pelos macacos prego e indicadores de estágios de maturação. (A-D) Coco catolé (Syagrus cearensis), (E-F) Maniçoba (Manihot

Tabela 1 – Compilação dos resultados estatísticos.

Hipotesis a Type of test a2 N a3 Z a4 P

P1 - Open scrub Caatinga Kruskal-Wallis test 939 201,33 <0,001

P1- Scrub-arboreal Caatinga Kruskal-Wallis test 554 141,96 <0,001

P2 One-way ANOVA 516 267,517 <0,001

P3 - Open scrub Caatinga Repeated measured ANOVA 411 6,88 <0,01

P3 - Scrub-arboreal Caatinga Repeated measured ANOVA 88 0,534 0,66

P4 Kruskal-Wallis test 1685 117,48 <0,001

P5 Kruskal-Wallis test 1912 -15,98 <0,001

Tabela 2 – Resultados das correlações correspondentes a predição 4. Códigos: Espécie1 = Caatinga arbustiva aberta; Espécie 2 = Caatinga arbustivo-arbórea.

Type of test Matrix Correlations N Spearman's r Z P

Spearman's correlation of M. dichotoma1 Distances between seed-producing species

Distances between nut-crack sites and seed-producing species 1306 0,02 0,87 0,38

Distances between nut-crack 1306 -0,14 -5,2 < 0,001

Spearman's correlation of M. dichotoma2 Distances between seed-producing species

Distances between nut-crack sites and seed-producing species 65 -0,25 -2,1 <0,05

Distances between nut-crack 88 -0,08 -0,7 0,46

Spearman's correlation of S. cearensis2 Distances between seed-producing species

Distances between nut-crack sites and seed-producing species 233 0,03 0,5 0,62

Escolha espacial do sítio de quebra

A distância entre as plantas produtoras de cocos catolé (Syagrus cearensis) foram significativamente menores (mediana = 0 m; média = 2,72 m) do que as distâncias entre plantas de Manihot dichotoma (medianas/médias Jucurutu e Luís Gomes = 1,86/2,29 e 2,37/3,42 m; respectivamente) para ambas as áreas de estudo. As distâncias entre as plantas da espécie M. dichotoma foram semelhantes em ambas as áreas de estudo.Ver Tabela 1 e Figura 7A.

Em suporte à predição 4, foi observado que os sítios de quebra se distribuem de forma independente da distância entre as plantas produtoras de sementes. Não ocorreram correlações significativas positivas com alto poder explicativo entre as distâncias de plantas produtoras de sementes e as distâncias entre sítios de quebra às plantas. Este mesmo padrão ocorreu ao correlacionar as distâncias de plantas produtoras de sementes às distâncias entre os sítios de quebra. Ver Tabela 2 e Figura 8.

Apesar de plantas de maniçoba (Manihot dichotoma) apresentarem maiores distâncias inter-individuais do que a distância registrada entre os espécimes de cocos catolé (Syagrus cearensis), os sítios de quebra de sementes maniçoba estavam mais próximos das plantas produtoras do que os sítios de quebra de cocos catolé. Ver Tabela 1 e Figura 7B.

Também foi verificado que as distâncias entre os sítios de quebra diferiram de acordo com o tipo de semente: sítios de quebra de maniçobas estavam mais próximos entre si (medianas maniçobas de Jucurutu = 2,24 e Luís Gomes =3,72) do que os sítios de quebra de cocos catolés (mediana = 5,04). Ver Tabela 1 e Figura 7C.

Confirmando a predição 5, foram verificadas diferentes distâncias entre sítios de quebra a depender do tipo de Caatinga: na Caatinga arbustiva aberta os sítios de quebra

estavam significativamente mais próximos (mediana = 2,24) do que na Caatinga arbusitvo- arbórea (mediana = 4,91). Conferir Tabela 1 e Figura 7D.

Figura 7 – Análises

estatísticas correspondentes às predições 4 e 5. (A)

Distâncias entre as espécies vegetais produtoras de sementes nas áreas de estudo (Distance1). Manihot dichotoma1 (N =1306); M. dichotoma2 (N = 146); Syagrus cearensis2 (N = 233). (B) Distâncias entre os sítios de quebra e as respectivas espécies produtoras de sementes em ambas as áreas de estudo (Distance2). Manihot dichotoma1 (N =2192); M.

dichotoma2 (N = 50);

Syagrus cearensis2 (N = 412). (C) Distâncias entre os sítios de quebra (Distance3) para cada espécie de semente em áreas de estudo.

Manihot dichotoma1 (N

=1912); M. dichotoma2 (N = 88); Syagrus cearensis2 (N = 380). (D) Distâncias entre os sítios de quebra (Distance3) em ambas as áreas de estudo. Caatinga arbustiva aberta (N =2192), Caatinga arbustivo-arbórea (N = 462). medianas e distribuição não outlier dos dados; *** = p < 0,001; Manihot dichotoma1 = Caatinga arbustiva aberta; Manihot

Figura 8 – Análise estatística correspondente a predições 4. (A) Manihot dichotoma1 (Ns =1306 e 1306). (B) Manihot dichotoma2 (Ns =65 e 88). (C) Syagrus cearensis2 (Ns= 233 e 233). Correlações entre sítios de quebra e espécies produtoras de sementes e entre sítios de quebra para cada espécie de semente ; Manihot dichotoma1 = Caatinga arbustiva aberta; Manihot dichotoma2 e Syagrus

DISCUSSÃO

Estudos com diversas espécies de macacos prego habitantes de ambientes secos afirmam que a quebra de sementes representa uma estratégia de forrageio, tanto em Biomas de Caatinga (Cebus libidinosus: Moura & Lee 2004; Ferreira et al., 2009, 2010; C. xantosternos: Canale et al., 2009; C. flavius: Emidio & Ferreira 2009), de Cerrado (C. libidinosus: Waga et al., 2006; C. xantosternos: Canale et al., 2009) e no ecótono Caatinga- Cerrado (C. libidinosus: Fragaszy et al., 2004a; Visalberghi et al., 2007; C. xantosternos: Canale et al., 2009). Desta forma, nossos resultados corroboram os achados anteriores.

As sementes encontradas quebradas em Jucurutu e Luís Gomes são menores e menos resistentes aos impactos do que as sementes de palmeiras (Acrocomia spp., Astrocarpum spp., Attalea spp., Orbignya spp e Cnidoscolus spp.) disponíveis nas áreas de estudos de Fragaszy et al., (2004a); Waga et al., (2006); Canele et al., (2009) e Visalberghi et al., (2007, 2009a,b). Ademais, destaca-se o uso de pedras para quebra de sementes de Manihot dichotoma, que, teoricamente, poderiam ser quebradas com os dentes. Um padrão semelhante foi verificado por Boesch & Boesch (1983) e muitas das suas sugestões adéquam-se aos macacos prego. Tais autores sugerem que a quebra de sementes pequenas (Coula edulis, 3-4 cm de diâmetro) com pedras evitaria desgaste da arcada dentária dos chimpanzés, visto que não há adaptações filogenéticas para a predação de sementes. Em macacos prego, a utilização de instrumentos para evitar o desgaste dos dentes é uma possível explicação, uma vez que estes animais consomem sementes frequentemente ao longo do ano, mesmo não possuindo arcada dentária especializada para abrir tais sementes (como a observada nos cuxiús - Chiropotes sp - Feagle 1998). Apesar de Boesch & Boesch (1983) sugerirem que o consumo de Coula edulis é um possível traço cultural para a quebra de sementes pequenas, o mesmo não pode ser dito para a quebra de sementes menos resistentes em macacos prego. Foi observado que diversas populações distantes e sem contato quebram esta espécie de semente (Mata do Desterro,

Paraíba: Langguth & Alonso, 1997; Serra do Estreito, Rio Grande do Norte: Emidio & Ferreira, 2009; Serra de Martins e Serra de Luís Gomes, RN: Ferreira et al., 2010; Fazenda Boa Vista, Piauí: Fragaszy et al., 2004a; Visalberghi et al., 2007; Silva, 2008; Serra da Capivara, PI: Mannu & Ottoni, 2008), o que é indicativo de convergência comportamental devido a semelhança ecológica.

De forma geral, nossos dados oferecem suporte à hipótese de que, apesar da abundância de material disponível, o uso de pedras por macacos prego não ocorre de forma aleatória, mas envolve escolhas, tanto do martelo quanto da bigorna. Estas escolhas diferem de acordo com as condições ecológicas encontradas nas áreas de estudo e são ajustadas de acordo com as espécies de sementes a serem quebradas.

Escolha do martelo – eficiência na quebra de sementes

Nossos dados indicam escolha das pedras para o uso como martelo na quebra de sementes. Primeiramente, foi visto que a massa das pedras encontradas sobre as bigornas diferiram significativamente das massas daquelas encontradas ao redor da bigorna (predição 1). Visalberghi et al., (2007) e Canale et al., (2009) também concluíram quanto a existência de um padrão na distribuição espacial de martelos eficientes para quebrar sementes de palmeiras. Estes martelos eram comumente encontrados sobre as bigornas e não localizados ao redor destas, sugerindo que diversas espécies de macacos prego (C. libidinosus e C. xantosternos) transportam martelos adequados para os sítios de quebra. Entretanto, a disponibilidade de potenciais martelos encontrados em nossas áreas de estudo difere do observado por Fragaszy et al., (2004a); Canele et al., (2009) e Visalberghi et al., (2007, 2009a, b), porque naqueles locais havia poucos martelos eficientes para quebrar itens encapsulados bastante resistentes, o principal tipo de semente consumida por estes animais. Nas nossas áreas de estudo, há grande

disponibilidade de potenciais martelos próximos às bigornas, portanto, sugerimos que macacos prego apenas escolhem as pedras mais adequadas sem a necessidade de transportá- las.

A seleção de martelos eficientes e disponíveis foi relatada por Schrauf et al., (2008) em condições de laboratório e por Vilsaberghi et al., (2009a) em um experimento com macacos prego selvagens. Estes autores descreveram diversas tarefas para quebrar sementes de palmeiras com martelos artificiais em condições nas quais martelos eficientes eram aqueles que apresentavam maior resistência ou peso. Os resultados mostraram que os C. libidinosus escolheram, transportaram e quebraram sementes de palmeiras com os martelos mais efetivos. Ferreira et al., (2010) comparando três áreas de ocorrência de macacos prego com alta disponibilidade de material de quebra, verificaram que estes quebraram sementes de Atallea oleifera com martelos significativamente duas vezes mais pesados do que aqueles utilizados na quebra de sementes de Syagrus cearensis (as sementes mais resistentes do presente estudo), e 18 vezes mais pesados do que os martelos utilizados para quebrar sementes de Manihot dichotoma (as sementes menos resistentes do nosso trabalho).

Nossos dados revelam informações que vão além de escolhas de pedras raras para quebrar sementes resistentes. As pedras utilizadas pelas duas populações de macacos prego monitoradas (Cebus flavius e C. libidinosus) indicam que estes animais estão selecionando aquelas mais eficientes de acordo com a espécie de semente a ser quebrada, apesar da alta disponibilidade de pedras alternativas potencialmente adequadas para a quebra das sementes.

Os dados também indicam que o grupo de C. flavius, animais habitantes da Caatinga arbustiva aberta, selecionam as pedras de acordo com o estado de maturação da mesma espécie de semente (Manihot dichotoma), de modo que quanto mais maduras as sementes estavam, martelos mais leves eram escolhidos. Por outro lado, uma seleção desta natureza não

foi observada pelo grupo de C. libidinosus habitante da Caatinga arbóreo-arbustiva. Estes consumiram cocos catolé (Syagrus cearensis) em diferentes estágios de maturação, porém, utilizaram martelos com massas semelhantes para quebrar sementes em diversos estados de maturação. Da mesma forma, sementes de M. dichotoma são quebradas em ambas as áreas, entretanto, foi identificado que o grupo de C. flavius selecionou martelos duas vezes mais leves do que o grupo de C. libidinosus.

Sugerimos que esta diferença encontrada entre as escolhas de martelos não representam diferenças entre espécies, mas sim, da riqueza florística das áreas em que os animais vivem. Na Caatinga arbustiva aberta, 100% dos sítios de quebra encontrados de sementes de maniçobas (M. dichotoma), enquanto que na Catinga arbustivo-arbórea houve uma maior variação no consumo de espécies de sementes quebradas. Deste modo, na Caatinga arbustiva aberta parece ocorrer uma maior especialização (cultural ou através de tentativa e erro, tipos de aprendizados preditos por van Schaink et al., 1999) em quebrar sementes de maniçoba com pedras menores. Por outro lado, os macacos prego da Caatinga arbóreo- arbustiva parecem adotar estratégias mais generalistas nas atividades de quebrar sementes.

Escolha das bigornas – estratégias para reduzir riscos de predação e custos de competição direta.

Os nossos resultados mostram que os locais de sítios de quebra não se distribuem aleatoriamente nem seguem o espaçamento natural das plantas produtoras de sementes (predição 4). Foi verificado que os sítios de quebra de sementes menores (Manihot dichotoma) localizaram-se mais próximos às plantas produtoras do que os sítios de quebra de sementes maiores (Syagrus cearensis). Entretanto, de forma geral as distâncias em mediana foram baixas (menos de 8 m), comparado com chipanzés que transportavam sementes

frequentemente a mais de 30m (Boesch & Boesch, 1983). Nossos achados dão suporte a abordagem construída por Vilsaberghi et al., (2009b) através de comparativos entre as relações dos deslocamentos no chão e riscos de predação em macacos prego e chimpanzés. Estes autores observaram que os macacos prego transportam martelos para os sítios de quebra a distâncias significativamente menores do que os chimpanzés. Tais autores sugerem que os custos no transporte de martelos são maiores em macacos prego do que nos chimpanzés, devido a maior vulnerabilidade de predação. Portanto, estes animais possuem maior aversão a grandes deslocamentos terrestres em condições que comprometem o equilíbrio e a velocidade. Nossos achados também revelaram que os sítios de quebra distavam mais entre si na área com maior número de árvores para rota de fuga. Visalberghi et al., (2007) observaram que os macacos prego habitantes do Bioma Caatinga-Cerrado escolhem bigornas não pela proximidade das plantas produtoras de sementes, mas pela disponibilidade de rotas de fuga, como árvores que suportem o deslocamento destes macacos.Tal como discutido por Visalberghi et al., (2007), a proteção contra predadores parece ser um importante fator na escolha dos sítios de quebra nas áreas do presente estudo. No nosso estudo, a população de C. libidinosus sofreram menor risco de predação do que a população de C. flavius devido à característica florística do habitat ocupado. Na Caatinga arbustivo-arbórea, as árvores são mais altas (média = 6m, máximo = 30m), possibilitando maiores chances de fuga por indivíduo, principalmente sobre as árvores. Por outro lado, a população de C. flavius habita uma região com árvores menores (média = 3 m, máximo = 5 m) e com grande quantidade de vegetação herbácea e trepadeira. Estas características possibilitam menor disponibilidade de fuga e maiores deslocamentos no chão. Há ainda, o maior efeito de camuflagem para potenciais predadores, como jibóas (Boa constrictor) e gatos mouriscos (Puma yagouaroundi) avistados nas parcelas monitoradas, além da maior suscetibilidade de sofrer ataques aéreos por aves de rapina como carcarás (Caracara plancus) e águias chilenas (Buteo melanoleucus)

observadas em áreas circunvizinhas (lista completa de potenciais predadores em ambas as áreas de estudo em Ferreira et al., 2009).

Destaca-se que, das duas espécies estudadas, apenas em C. flavius foram registradas ocorrências de uso de instrumentos na tentativa de afugentar potencias predadores, o que pode representar estratégias adicionais para reduzir riscos de predação. Nossos resultados corroboram com os achados por Mannu & Ottoni (2008) e Chevalier-Skolnikoff (1990) que observaram a emissão de comportamentos teatrais seguidos de lançamento de folhas, pedaços de troncos ou rochas a potenciais predadores em macacos prego (C. libidinosus e C. capucinus). No presente estudo, quando os C. flavius constatavam a presença do pesquisador, estes animais deslocavam-se para rochões mais altos, formavam grupos coesos, emitiam vocalizações e lançavam pedras em direção ao solo (Emidio & Ferreira, 2009). Nossos achados indicam que a falta de oportunidades para fugas individuais tornam os grupos mais coesos durante a permanência no chão para quebra de sementes.

As análises da distância entre os sítios de quebra possibilitam ainda inferir estratégias comportamentais adotadas para reduzir a competição por alimento. Foi possível identificar numa mesma área (Caatinga arbóreo-arbustiva) que os sítios de quebra de sementes menores e menos calóricas (i.e. M. dichotoma: volume da semente = 0,24cm3 – Ferreira et al., 2010; valor calórico de Manihot spp. = 1,13 cal/g – dados ajustados de Martins et al., 2007) localizaram-se a menores distâncias entre si do que os sítios de quebra de sementes maiores e mais calorias (i.e. S. cearensis – volume da semente = 16cm3– Ferreira et al., 2010; valor calórico de S. coronata = 5,27 cal/g – dados ajustados de Crepaldi et al., 2001).

Sugerimos que o efeito da competição é responsável por esta diferença. Em outras palavras, há maior vantagem em transportar sementes maiores e mais calóricas a distâncias maiores (resultando em maiores distâncias entre sítios) provavelmente devido ao menor risco

de usurpação de amêndoas prontas para o consumo por co-específicos que sejam capazes de quebrar sementes com eficiência. Ottoni & Mannu (2001) foram os primeiros a relatarem relações de roubo nas atividades de quebra de sementes e revelam que apenas os infantes e juvenis são tolerados, permanecendo mais próximos aos animais mais proficientes em quebrar sementes. Ottoni et al., (2005) discutem que há uma relação de benefício e custo na tolerância na usurpação de alimento. Assim, ao ficarem observando a quebra de sementes, os animais tolerados roubam as amêndoas e também aprendem as técnicas para abrir itens encapsulados. Resultados semelhantes foram observados por Silva (2008) que estudou uma população de C. libidinosus habitante do ecótono Caatinga-Cerrado, sugerindo que é característico do gênero.

Em nossa área frequentemente foram observados sítios de quebra de cocos catolé contendo cachos destes cocos, revelando que os animais tentam transportar o máximo de pacotes de energia por deslocamento para serem ingeridos. A competição por alimento em nossa área pode ser maior do que observado por outros estudos tendo em vista o grande número de animais avistados nos grupos (observação ad libitum: tamanho dos grupos e de C. flavius = 40 e C. libidinosus = 50; número de avistamentos C. flavius = 7 e C. libidinosus = 8) e a menor disponibilidade de alimentos característica de ambiente de Caatinga. Esta separação entre sítios de quebra assemelha-se às distâncias inter-individuais descritas por diversos estudiosos da organização social de macacos prego (ex.: Robison, 1981; Janson, 1985, 1990; Phillips, 1995a,b; Hall & Fedigan, 1997). Segundo estes autores, em macacos prego, grande parte das agressões ocorre em atividades de forrageio. Logo, os animais tendem a manter-se

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