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CAPÍTULO 2 – Papel da cor do quelípodo e carapaça na preferência de

4. CAPÍTULO 2

4.2. Resumo

Reconhecer membros de sua própria espécie é crucial para o sucesso reprodutivo de muitos animais, pois evita o desperdício de tempo e energia em interações nulas com indivíduos de outra espécie. Caranguejos chama-marés possuem uma alta diversidade de cores que são utilizadas no reconhecimento de coespecíficos e seleção de parceiros. Porém, em um grupo composto por mais de 100 espécies diferentes, apenas uma espécie australiana foi investigada quanto a função comunicativa de sua coloração corporal. Assim, esse estudo buscou compreender como as cores corporais do quelípodo e carapaça de um caranguejo chama-maré das Américas (Leptuca leptodactyla), afetam o a preferência das fêmeas. Foram dadas para fêmeas escolhas binomiais entre diferentes pares de machos com quelípodos e/ou carapaças refletindo diferentes cores, de forma a simularem coespecíficos ou heteroespecíficos. Verificamos que a coloração do quelípodo é importante para seleção de parceiros, conforme ocorre em espécies da Austrália. Contudo, a coloração das carapaças é fundamental no reconhecimento de machos coespecíficos por fêmeas. Esse é o primeiro estudo evidenciando que a coloração da carapaça de machos serve como parâmetro de reconhecimento interespecífico em caranguejos chama- marés.

Palavras-chave: reconhecimento de coespecíficos, escolha de parceiros, visão

4.3. Introdução

A comunicação animal ocorre quando um emissor influencia o comportamento do receptador através de uma sinalização que, no geral, traz um resultado benéfico para ambos (Ruxton and Schaefe 2011). Para que os animais consigam se comunicar com membros de sua própria espécie é necessário, primeiramente, que se reconheçam como tal. Os processos de reconhecimento de espécie e de parceiros reprodutivos são intrinsicamente relacionados e dependentes um do outro (Pfennig 1998). Uma vez que o reconhecimento de espécie acontece, é possível reconhecer potenciais parceiros sexuais, evitando desperdício de energia em cópulas improdutivas com heteroespecíficos (Ryan et al. 2001). Para isso acontecer, os indivíduos precisam captar e processar os sinais emitidos pelos emissores, sejam eles, sonoros, químicos ou visuais (Stevens 2013).

Sinais visuais medeiam interações intraespecíficas através da complexidade de movimento, do padrão de cor ou na combinação de ambos (Eliason, 2018). A coloração de um traço pode ser considerada um fator importante na comunicação intraespecífica com implicações no processo de especiação (Lind et al. 2017). Apesar das cores estarem presentes em diversos grupos animais, os estudos sobre reconhecimento interespecífico são direcionados, principalmente, às aves e borboletas (Shawkey et al. 2009; Lind et al. 2017). De uma década para cá, estudos têm abordado a coloração dos caranguejos chama-marés na seleção de parceiros (Detto, 2007; Detto and Backwell, 2009) e reconhecimento interespecífico (Detto et al, 2006), porém

ainda são escassos frente a diversidade e riqueza que esse grupo possui (Shih et al. 2016).

Caranguejos chama-marés são animais com forte influência da seleção sexual, cujos machos costumam ser muito diferentes das fêmeas, tanto quanto ao tamanho de seus quelípodos hipertrofiados, quanto pela sua coloração (Crane 1975). As fêmeas desses caranguejos são capazes de identificar, individualmente, os machos com base em suas exibições de aceno (Perez and Backwell 2017) e coloração dos seus quelípodos (Detto et al. 2006). Já os machos, são capazes de identificar diferentes fêmeas com base no padrão de cor de suas carapaças (Detto et al. 2006).

Recentemente, os chama-marés (antigo gênero Uca) foram separados em 13 diferentes gêneros, sendo Leptuca o gênero mais diverso (Shih et al. 2016). Apesar de Leptuca ser o gênero mais estudado (Nabout et al. 2010) dentre os chama-marés, intrigantemente, não existem estudos sobre sua coloração e os fatores que afetam a seleção intersexual e reconhecimento interespecífico de suas espécies.

Portanto, para sabermos se a coloração medeia alguma preferência da fêmea em diversas espécies de chama-marés, precisamos de mais dados sobre os diferentes gêneros, uma vez que apenas duas espécies australianas foram estudadas com relação a significância social da coloração corporal. Por meio de experimentos de preferência de fêmeas por machos de duas espécies diferentes (Leptuca leptodactyla e Leptuca cumulanta), e através de observação comportamental de fêmeas de L. leptodactyla, buscamos responder a seguinte hipótese: fêmeas utilizam informações de cor na identificação de machos. Por

meio de experimentos comportamentais de discriminação simples, esperamos mostrar que fêmeas escolhem machos (coespecíficos ou heteroespecíficos) com coloração similar a encontrada em machos coespecíficos, acima do esperado ao acaso.

4.4. Materiais e métodos

O estudo foi realizado no manguezal pertencente ao Rio Ceará-Mirim localizado dentro do Centro Tecnológico de Aquicultura da UFRN (CTA), Extremoz, Rio Grande do Norte, Brasil (Coordenadas: -5.674916, -35.238792). Todos os experimentos ocorreram durante a maré baixa dos meses de agosto (2018) até fevereiro (2019), entre os horários das 9h e 15h, momento em que os animais estão mais ativos (Santos et al. 2015).

Nesse local existem registros da ocorrência de cinco espécies de caranguejos chama-marés: Uca maracoani, Minuca rapax, Minuca burgersi,

Leptuca thayeri, Leptuca leptodactyla, cada uma ocupando uma parte diferente

do ambiente, que possui diferença na granulometria do substrato e grau de inundação da maré (Santos et al, 2015).

Recentemente, encontramos uma nova ocorrência para a área de estudo, uma população de Leptuca cumulanta que, apesar de estar dentro da faixa de ocorrência da região nacional brasileira, nunca tinha sido encontrada dentro do mangue do CTA até então (observação pessoal). Ao longo do sedimento, as distribuições das espécies Leptuca leptodactyla e Leptuca cumulanta são distintas. O L. cumulanta habita a parte lamosa e o L. leptodactyla habita a parte arenosa, porém existem locais de transição (entre a área lamosa e arenosa)

onde ambas ocorrem simpatricamente. São duas espécies morfologicamente semelhantes em termos de tamanho, porém possuem colorações corporais bem distintas (Figura 1).

Figura 1. Indivíduos de chama-marés simpátricos do gênero Leptuca. (A) Imagem evidenciando o quelípodo hipertrofiado amarelo natural de L. leptodactyla; (B) quelípodo cinza natural L. cumulanta; (C) a carapaça branca natural de L. leptodactyla e; (D) carapaça verde escuro natural de L. cumulanta.

4.4.1. Aparato experimental

Todo o aparato experimental constituído pela arena e pelo sistema de alavanca foram montados no mesmo habitat dos animais, porém sem tocas e caranguejos próximos. Para a arena, duas paredes de folha de acetato transparente de 30 cm foram enterradas paralelamente, de forma a ter 2 cm de altura, e estarem espaçadas entre si em 12 cm, formando um corredor (arena) de substrato natural. Nos extremos da arena foram posicionados pares de machos (um animal em cada ponta), enquanto no centro da arena fêmeas (uma por vez) foram mantidas sob um copo transparente de vidro (Figura 2-B). Esse

copo estava conectado ao sistema de alavanca, que possibilitava a liberação da fêmea a uma distância de 4 metros (Figura 2-A).

4.4.2. Procedimento experimental

Os nossos experimentos de preferência de fêmeas por machos foram baseados e adaptados de Detto et al (2006), Detto (2007) e Detto and Backwell, (2009).

Todos os experimentos foram realizados sob a mesma metodologia e aparato experimental, utilizando os machos da espécie de chama-marés L.

leptodactyla e L. cumulanta, e sempre utilizando fêmeas de L. leptodactyla. O

resumo dos experimentos mostrando quais espécies e quais tratamentos foram utilizados encontra-se na Tabela 1.

Figura 2. (A) Sistema de alavanca utilizado no procedimento experimental. (B) vista superior da arena do sistema e posição do par de machos e fêmea.

Todos os experimentos foram compostos por dois machos, posicionados em sentidos opostos na arena, e fêmeas que escolhiam um dos dois machos. Primeiro capturamos manualmente um macho e medimos, com auxílio de um paquímetro digital, o tamanho do quelípodo (considerando a base do própode até a ponta do dactylo) e o tamanho da carapaça (considerando a largura horizontal). Com base no tamanho do quelípodo, capturamos outro macho de tamanho semelhante (diferença máxima de 1 mm) e formamos um par. Para ser possível fixar os machos no chão da arena, uma linha de nylon amarrada a um prego, foi colada à carapaça de cada macho. Nesse momento, alteramos a coloração dos machos, de acordo com o tratamento experimental, cobrindo o quelípodo com tinta amarela, cinza, protetor solar transparente; e/ou tratamos a carapaça com tinta branca ou verde escuro. Animais do tratamento controle não tiveram suas colorações manipuladas, mantendo a cor natural. Utilizamos tintas foscas para artesanato da marca Acrilex (não tóxica), nas cores: amarelo ocre ouro (n° 573); branco (n° 519), cinza [produzido com uma mistura de preto (n°520) e branco, na proporção de 1 preto para 10 branco], verde escuro

Tabela 1. Resumo dos experimentos mostrando para cada tipo de tratamento, quais espécies de machos foram utilizados, e quais tipo de tratamento cada um refletia para a fêmea.

Tratamentos

Experimento 1 Espécie 1 Quela Carapaça Espécie 2 Quela Carapaça

I L. leptodactyla Natural (Amarelo) Natural (Branco) L. cumulanta Natural (Cinza) Natural (Verde escuro) II L. leptodactyla Tinta cinza Natural (Branco) L. cumulanta Tinta amarela Natural (Verde escuro) III L. leptodactyla Tinta amarela Natural (Branco) L. leptodactyla Tinta cinza Natural (Branco) IV L. leptodactyla Tinta amarela Natural (Branco) L. cumulanta Tinta amarela Natural (Verde escuro)

V L. leptodactyla Natural (Amarelo) Natural (Branco) L. leptodactyla Natural (Amarelo Sem UV) Natural (Branco) Experimento 2

VI L. leptodactyla Tinta amarela Tinta verde escuro L. cumulanta Tinta amarela Tinta branca VII L. leptodactyla Tinta amarela Tinta branca L. cumulanta Tinta amarela Tinta verde escuro VIII L. leptodactyla (CTA) Natural (Amarelo) Natural (Branco) L. leptodactyla (BR) Natural (Amarelo) Natural (Cinza escuro)

[produzido com a mistura de verde musgo (n° 513) e preto (n°520), na proporção de 1 para 1], e protetor solar de FPS 50, da marca Sundown. Todas as tintas foram medidas com um espectrofotômetro e comparadas com a coloração natural dos animais através de uma modelagem visual (ver item 4.4.6. Modelagem visual).

Após a preparação e pintura do par de machos, ancoramos cada um dos machos nas extremidades da arena em posição oposta pelo fincamento do prego no chão, mantendo seus movimentos restritos, uma vez que possuíam apenas 1 cm de linha entre o prego e sua carapaça. Com os machos posicionados, colocamos as fêmeas, uma por vez, no centro da arena, sob um copo transparente, por 1 min, para se habituarem à situação. Ao término do tempo, levantamos o copo através do sistema de alavanca, liberando a fêmea. Com a liberação, a fêmea poderia apresentar os seguintes comportamentos: 1) se aproximar de um dos machos, confirmando uma escolha (proximidade de, pelo menos, 2 cm de um dos machos); 2) deixar a arena, caracterizando uma fuga; ou 3) permanecer na arena, porém sem se aproximar de nenhum dos machos (até 3 min após a liberação). Cada fêmea só foi utilizada uma única vez. Independentemente do comportamento apresentado, a fêmea foi recapturada, teve sua carapaça medida, foi marcada com supercola em sua carapaça para evitar recaptura, e foi liberada. Em seguida, capturamos outra fêmea, que foi posicionada sob o copo, e repetimos o processo. A cada escolha pelas fêmeas, trocamos os machos de posição e, após três escolhas, o par de machos foi liberado e trocado por um novo par. Os machos que foram liberados também foram marcados com supercola.

Todo esse procedimento foi aplicado a todos os experimentos, que diferiram apenas quanto aos tipos de tratamentos utilizados nos machos. No Experimento 1, agrupamos os tratamentos referentes ao efeito da coloração do quelípodo na preferência de fêmeas por machos. E no experimento 2, agrupamos os tratamentos referentes ao efeito da coloração da carapaça na preferência de fêmeas por machos.

4.4.3. Experimento 1: Papel da coloração do quelípodo na preferência de fêmeas

Primeiramente nos perguntamos se as fêmeas de Leptuca leptodactyla reconhecia seus coespecíficos com base em suas características naturais. Assim apresentamos os seguintes pares para as fêmeas: (I) L. leptodactyla sem tratamento, que naturalmente possui quelípodo amarelo e carapaça branca versus Leptuca cumulanta sem tratamento, que naturalmente possui quelípodo cinza e carapaça verde escuro. Segundo, alterarmos as cores dos machos de L.

leptodactyla de forma a representar o macho de L. cumulanta, e vice-versa.

Dessa forma, realizamos um tratamento no quelípodo dos animais as quais: (II) pintamos os quelípodos do macho de L. leptodactyla de cinza e o quelípodo do macho de L. cumulanta de amarelo. Terceiro, as espécies utilizadas, apesar de serem do mesmo gênero, possuem diferenças. O formato do quelípodo é levemente diferente, e a cor de suas carapaças são bem distintas, onde no macho de L. leptodactyla predomina uma carapaça de cor branca, e no L.

cumulanta, um verde pântano escuro. Para evitar essas diferenças

interespecíficas, realizamos um experimento utilizando apenas machos de L.

representando L. leptodactyla, e cinza, representando a cor do L. cumulanta. Também pintamos de amarelo ambos os quelípodos dos machos de L.

leptodactyla e L. cumulanta, dessa forma as fêmeas não tiveram como utilizar

pistas de cor do quelípodo dos machos, tendo que escolher entre: (IV) macho de

L. leptodactyla com quelípodo pintado de amarelo e carapaça natural branca e

macho de L. cumulanta com quelípodo pintado de amarelo e carapaça natural verde escuro. Por fim, para saber se a luz ultravioleta presente no quelípodo dos machos de L. leptodactyla influencia a escolha da fêmea, fizemos um tratamento entre: (V) machos com quelípodo externo (visível para as fêmeas) pintados de protetor solar versus machos com quelípodo interno (não visível para as fêmeas) pintados de protetor solar. Nosso tratamento na parte externa do quelípodo era transparente e impossível de distinguir, a olho nu, machos tratados e não tratados. Esse tratamento não interfere com o espectro visível (400 – 700 nm), porém retira a parte do espectro não visível representado pela luz ultravioleta (300 – 400 nm).

Para cada tratamento desse experimento, utilizamos 20 pares de machos e um total de 60 escolhas de fêmeas, com média de 84 fugas, com exceção do tratamento (IV) que utilizamos 11 pares de machos com um total de 33 escolhas, e 43 fugas.

4.4.4. Experimento 2: Papel da coloração da carapaça na preferência de fêmeas

Para analisar se a cor da carapaça dos machos afeta a preferência de fêmeas, pintamos a carapaça de machos com: tinta branca para representar um

macho de L. leptodactyla ou verde escuro para representar machos de L.

cumulanta.

No Experimento 1, tratamento (IV), as fêmeas tinham acesso apenas a diferença natural de cor da carapaça de ambas espécies, uma vez que pintamos os quelípodos hipertrofiado dos machos com a mesma cor amarela. Como outras pistas (i.g. formato do quelípodo, comunicação química) poderiam estar influenciando a escolha da fêmea, decidimos realizar um experimento de cores de carapaça trocando as cores da carapaça que representa cada espécie. Assim nesse tratamento temos: (VI) L. leptodactyla com quelípodo pintado de amarelo e carapaça pintada de verde escuro e L. cumulanta com quelípodo pintado de amarelo e carapaça pintada de branco. Como controle, realizamos um experimento utilizando machos de: (VII) L. leptodactyla com carapaça pintada de branco e L. cumulanta com carapaça pintada de verde escuro. Ambos com quelípodos pintados de amarelo.

Analisamos a preferência intraespecífica das fêmeas utilizando machos de duas populações diferentes da espécie L. leptodactyla onde ambas possuem quelípodos semelhantes, porém as colorações das carapaças de cada população são diferentes. Os machos da população do mangue do CTA possuem em sua maioria machos de carapaça branca e os machos da população de uma praia próxima ao CTA, Praia de Barra do Rio (BDR) – Extremoz, RN, possuem em sua maioria machos de carapaça cinza escura. Assim, capturamos manualmente os machos de BDR, colocamos em uma caixa de isopor com substrato e água do local, e transferimos para o CTA, local em que realizamos os experimentos. No final dos experimentos devolvemos os

animais para suas respectivas populações. Em suma, nesse tratamento utilizamos machos: (VIII) da população CTA de quelípodos naturais (sem tratamento) de carapaças brancas naturais (sem tratamento) e machos da população da praia com quelípodos naturais (sem tratamento) de carapaças cinzas naturais (sem tratamento).

4.4.5. Modelagem visual

Os espectros de refletâncias da coloração dos animais e das tintas foram obtidos através de um espectrofotômetro USB4000-UV-VIS conectado a uma lâmpada DH-2000-BAL, e uma fibra bifurcada QR450-7-XSR. O equipamento foi calibrado utilizando o branco padrão Spectralon WS-1-SL (Ocean optics.) e os objetos foram medidos a um angulo de 90°, utilizando uma ponteira produzida com uma impressora 3D com abertura de 1 mm. Como mostrado por Erickson, Silva e Pessoa (em preparação), a ponteira não distorce o espectro dos objetos mensurados.

Utilizamos o modelo Receptor Noise Limited (RNL) para calcular o contraste cromático entre as tintas e a coloração dos caranguejos (Osorio & Vorobyev 1996). O modelo calcula a diferença entre dois estímulos em unidades de JND (just noticeable difference) que é o contraste cromático. Nesse trabalho, calculamos a cor do animal versus a cor da tinta correspondente, e vimos através do valor resultante de JND se ambas diferem entre si na visão do caranguejo chama-maré em condições ideais. Resultados de JND menores do que 1, significam que a diferença da cor do animal e da tinta correspondente não são perceptíveis, na visão do modelo. Sendo assim, consideradas semelhantes,

enquanto estímulos com JND igual ou maior do que 1, a diferença é perceptível em condições ideais.

Para calcular o contraste cromático, utilizamos os espectros dos animais medidos antes e depois de serem pintados e comparamos um com o outro. A modelagem visual foi realizada utilizando o software R e o pacote “pavo2” (Maia, Bitton, Doucet & Shawkey 2018). Nesse processo levamos em consideração os picos de sensibilidade visual (420 e 530nm) do caranguejo chama-maré Leptuca

thayeri, (mesmo gênero das espécies utilizadas nesse estudo); por falta de

informação, uma proporção de 1 para 1 para os tipos de fotorreceptores; e um iluminante já disponível no pacote “pavo2”, o bluesky.

Com a modelagem visual vimos que todas as cores naturais dos animais são semelhantes às suas respectivas tintas (JND < 1), com exceção da tinta amarela versus amarelo natural (JND > 1) (Figura 3).

Figura 3.Espectros de refletância representativo das cores naturais das carapaças e quelípodos junto com seus respectivos tratamentos simulados. Cada gráfico representa o espectro de um animal antes (cor natural) e depois do tratamento (espectro da tinta). (A) quelípodo L. leptodactyla (JND = 4,14); (B) quelípodo L. cumulanta (JND = 0.25); (C) carapaça L. leptodactyla (JND = 0,96); (D) carapaça L. cumulanta (JND = 0,8); (E) quelípodo L. leptodactyla (JND = 0,08) e; (F) carapaça L. leptodactyla (JND = 0,26). O JND representa a unidade do contraste cromático de cada comparação. Quando o JND é menor do que 1, significa que não há diferença entre ambas as cores com base na visão do chama-maré Leptuca thayeri (Horch, 2002).

4.4.6. Estatística

Para saber se as fêmeas de Leptuca leptodactyla escolhem machos acima da aleatoriedade, quando lhe são dadas escolhas binomiais, utilizamos o Teste binomial do programa R para cada tratamento, considerando um alfa de 5%.

4.5. Resultados

4.5.1. Experimento 1: Papel da coloração do quelípodo na preferência de fêmeas

Os resultados mostram que as fêmeas preferem seus coespecíficos (L.

leptodactyla) em detrimento de heteroespecíficos (L. cumulanta), quando esses

animais não apresentam suas colorações modificadas experimentalmente (p < 0.001, n = 60) (Figura 4-A). Quando a coloração dos quelípodos dos machos é invertida, ou seja, os quelípodos de coespecíficos são modificadas para se assemelharem aos quelípodos de machos heteroespecíficos, e vice-versa, as fêmeas continuam escolhendo, acima da aleatoriedade, os machos coespecíficos (p < 0.05, n = 60) (Figura 4-B). Quando as fêmeas se deparam com coespecíficos e heteroespecíficos com quelípodos pintados na coloração de coespecíficos (amarelo), elas ainda preferem seus coespecíficos (p < 0.001, n = 33) (Figura 4-D). Porém, quando é dada a escolha entre machos coespecíficos com quelípodos pintados na coloração de coespecíficos (amarelo) e de heteroespecíficos (cinza), a fêmea perde a preferência, não escolhendo nenhum dos tratamentos significativamente (p > 0.05, n = 60) (Figura 4-C). Por fim, ao se deparar com machos coespecíficos que não refletem luz UV devido

ao tratamento com protetor solar em seus quelípodos, e machos de coloração natural que refletem luz UV, as fêmeas preferem os machos que apresentam reflexão natural com luz UV (p < 0.001, n = 60) (Figura 4-E).

Figura 4. Preferência de fêmeas em L. leptodactyla mostrando o número total de escolhas baseadas nos tratamentos de cor do quelípodo dos machos. (A) macho coespecíficos (L. leptodactyla) e macho heteroespecíficos (L. cumulanta); (B) coespecíficos pintado de cinza e heteroespecíficos pintado de amarelo; (C) coespecíficos pintado de amarelo e coespecíficos pintado de cinza; (D) coespecíficos pintado de amarelo e heteroespecíficos pintado de amarelo; e (E) coespecíficos com UV visível (sem protetor solar) e coespecíficos sem UV visível (com protetor solar).

4.5.2. Experimento 2: Papel da coloração da carapaça na preferência de fêmeas

Os resultados mostram que a cor da carapaça também influencia a preferência das fêmeas de L. leptodactyla. Entre um macho coespecífico com carapaça pintada nas cores de um heteroespecífico (verde escuro) e um macho heteroespecífico com carapaça pintada nas cores de um coespecífico (branco), ambos com quelípodos pintados nas cores de um coespecífico (amarelo), as fêmeas de L. leptodactyla preferem os machos heteroespecíficos (p < 0.001, n = 27) (Figura 5-A). No entanto, quando ambos possuem as quelípodos pintadas nas cores de um coespecífico (amarelo), as fêmeas preferem machos coespecíficos com carapaça pintadas na cor de coespecíficos (branco) em detrimento a machos heteroespecíficos com carapaças pintados na cor de heteroespecíficos (verde escuro) (p < 0.001, n = 27) (Figura 5-B).

Quando comparados machos coespecíficos de diferentes populações de

L. leptodactyla (CTA e BDR), sem nenhuma manipulação da coloração, as

fêmeas preferem machos de suas próprias populações (CTA), que apresentam quelípodos amarelos e carapaças brancas, em detrimento a machos de uma população vizinha (BDR), que apresentam quelípodos amarelos e carapaças cinzas (p < 0.001, n = 60) (Figura 5 - C).

Figura 5. Experimentos de reconhecimento de coespecíficos e seleção de parceiros em L. leptodactyla. O gráfico mostra o número total de escolhas baseados na cor da carapaça. Número total de escolhas das fêmeas baseados na cor da carapaça. (A) Coespecífico com quela pintada de

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