• Nenhum resultado encontrado

Como realizado para os outros autores analisados, efetuaremos um breve resumo do texto para que o leitor possa obter uma visão geral do conteúdo e tom do texto. O capítulo seis é dividido em sete subcapítulos da seguinte forma:

6. Uma virada antropológica

Uma inversão sem prevalências Uma subversão sem precedente Fenomenologia dos neo-sujeitos Os impasses do mesmo

Nova economia, novo sujeito?

Os dois regimes da economia psíquica Pai e patriarcado

Entretanto, como já anunciado anteriormente, aqui será trazida a transcrição e análise apenas dos três primeiros subcapítulos, por razões de concisão e também porque eles foram suficientes para alcançarmos os objetivos do trabalho.

Comecemos, então, a realizar um voo panorâmico nos subcapítulos.

O capítulo seis tem como preocupação dominante as interações indivíduo- cultura/sociedade no que diz respeito às limitações e liberdades que cada um possui frente ao outro, explicando melhor, trata do quanto de limitação à liberdade individual é necessária para que a sociedade possa continuar existindo, pelo menos continuar existindo como existiu até então. O capítulo procura denunciar um suposto excesso de liberdade individual que impossibilitaria o viver em sociedade, apregoando que uma certa dose de sacrifício e restrição é necessária na vida em comum.

94 O autor, ao longo do texto, evita estabelecer qualquer ruptura entre o antes e o agora, sua argumentação segue sempre dizendo que existe, agora, mais ou menos de algo que sempre existiu, que a balança que mantinha, por exemplo, o equilíbrio entre o social e o particular antes pendia mais para o social e agora inclina-se mais para o particular. Somente em aspectos muito específicos o autor se pronunciará dizendo que houve, de fato, mudança radical.

Lebrun trata, em outros capítulos do livro, da suposta crise de legitimidade que estaríamos vivenciando atualmente; no capítulo que trazemos limita-se a expor quais seriam algumas das consequências desta crise.

Boa parte da discussão do capítulo centra-se na ponderação acerca do “lugar de exceção” na contemporaneidade. O autor dirá que as mudanças no lugar de exceção provocaram mudanças no “laço social”, agora regido não mais pelo “clássico recalque”, mas sim pela “renegação” ou “desmentido”. Segundo afirma o autor, os exemplos destas mudanças são vistos no cotidiano, entretanto o texto traz, sem diferenciação, exemplos clínicos e trechos de filmes. Nestes filmes o autor identificará uma falha na ocupação de lugares de exceção, ou seja, no filme “Ken Park”, encontra pais incapazes de sustentar seus lugares frente aos adolescentes que, desorientados, permanecem numa errância de drogas, sexo, assassinato e suicídio. Estes pais, na visão do autor, deveriam ocupar um lugar distinto, que oferecesse direção, mesmo que não acatada pelo adolescente.

Uma “virada antropológica” seria aquela efeito das mudanças no “discurso social”; o que teria se modificado era a sustentação social da legitimidade deste lugar de exceção, ou seja, a manutenção do reconhecimento de que este lugar é necessário para que os sujeitos se desenvolvam como tais: um sujeito que não aceita limitações vindo de outros, que não admite “passar pela castração”, que não “aceita o lugar da falta”, não seria, de acordo com Lebrun, um “sujeito desejante”, estaríamos, então, frente à uma “nova economia psíquica”.

Elencamos, em prol da compreensão do leitor, as diversas mudanças que Lebrun aponta em nossa contemporaneidade: a cultura retirou a legitimidade da posição de exceção em nossa sociedade, esta era necessária para que os indivíduos recebessem orientações sobre como apreender o mundo. Estando agora em posições igualitárias, pais e filhos seguiriam, por tentativa e erro, a procurar seu lugar no mundo. Nos exemplos fornecidos estas tentativas passam sempre por drogas, sexo, assassinato, crimes, depressão etc.

Estes seriam os elementos “observáveis” das mudanças, mas temos outros que ocasionariam e fundamentarim estas mudanças, aqueles que tratam da metapsicologia dos indivíduos contemporâneos: a prevalência da renegação/desmentido ao invés do recalque e a prevalência do gozo ao invés do desejo. Temos uma retroalimentação entre estes pontos: a falta

95 de um terceiro que instauraria a “falta”, a “castração”, geraria indivíduos que utilizam mais o mecanismo do desmentido e que, por não terem passado pelo “processo inelutável da castração”, não tem acesso ao desejo, mas são escravos do gozo (visíveis através do uso de drogas, do sexo compulsivo, dos crimes).

Tudo isso, em todo caso, seria apenas efeito de uma prevalência destas subjetividades do gozo, do desmentido; Lebrun faz ressalvas ao longo de todo o texto destacando que não estaria descrevendo algo de realmente novo na estrutura do sujeito, a novidade é que agora a maioria dos sujeitos são assim, entretanto escreve todo um subcapítulo chamado “Fenomenologia dos neo-sujeitos”.

Neste são apresentados três pequenos relatos de caso que destoariam daquilo que “em geral encontrávamos não faz nem vinte anos” (LEBRUN, 2008, p. 217): a ausência de sintomas estruturados (histéricos ou obsessivos, por exemplo), o conflito com o desejo, e a neurose que teriam sido substituídos por “uma impossibilidade de entrar na fala, de fazer a menor escolha, com a presença incomoda de compensações aditivas, com um apelo adesivo ao outro” (LEBRUN, 2008, p. 217).

É no social que Lebrun buscará a explicação para estas mudanças: a força que antes impulsionava os sujeitos a aceitarem a alteridade, hoje teria se enfraquecido, a criança hoje veria a “possibilidade de – talvez até um convite a – não ter de crescer” (LEBRUN, 2008, p. 233). Nos deteremos longamente sobre este ponto na análise do texto, pois é sutil o modo como o autor distribui os papéis nestas mudanças contemporâneas: a criança parece ter escolha de rejeitar a alteridade colocada pelos pais, mas estes poderiam forçá-la na criança, além disso é o social, a cultura que daria legitimidade para qualquer uma das posições adotadas pelos sujeitos em questão; por enquanto nos limitaremos a acompanhar de modo um tanto superficial estas questões complexas.

O principal é ressaltar que na sociedade contemporânea o lugar de exceção não seria mais reconhecido/legitimado como necessário e os pais, portanto, não se sentiriam obrigados ou autorizados a ocupá-lo. A criança então seria deixada a sua própria sorte, e a “inscrição da falta” não ocorreria. Os sujeitos, então, permaneceriam acreditando que podem tudo realizar, obedecendo apenas sua própria vontade.

Por outro lado, aponta Lebrun, a não inscrição da falta deixa o sujeito no “gozo mortífero”, aqui associado a crimes e uso de drogas. O indivíduo, portanto, eventualmente tem de aceitar a castração caso queira “humanizar-se” mas, como este processo ocorre fora do tempo correto (já na idade adulta), seria muito mais difícil e doloroso, além de “revogável”.

96 O neo-sujeito aparece por fim próximo ao perverso pois tentará evitar a todo custo a “irredutível necessidade de uma renúncia para instalar a cultura e a lei” (LEBRUN, 2008, p. 250)

Documentos relacionados