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Reuniões dos sétimos e oitavos anos

No documento raquelsantiagodesouza (páginas 104-107)

4 ANÁLISE DOCUMENTAL COMO SE LEGITIMA, LEGALIZA E EXERCE A

5.3 Reuniões dos sétimos e oitavos anos

Relataremos as duas reuniões juntas, pois a coordenadora explicou que a estrutura era a mesma, assim como foi observado. Sobre a padronização das reuniões, Saraiva e Wagner (2013), mais uma vez, nos ajudam a entender o contexto quando nos relata sobre posicionamento de algumas famílias sobre esse formato de reunião:

As participantes usaram, então, o termo “robô”, para se referirem às atitudes dos diferentes integrantes da escola ao se comunicarem com as famílias. Na avaliação das participantes, esses sujeitos têm um padrão de atendimento, considerado pela instituição como padrão de qualidade, como, por exemplo, no caso da adoção de um discurso único e na forma burocratizada de atenção às demandas familiares. Entretanto, para as famílias esse padrão de qualidade é percebido como distanciamento e não envolvimento real com o problema do qual querem conversar. A comunicação, desde essa perspectiva, é ineficaz, segundo a opinião das participantes. (SARAIVA; WAGNER, 2013, p. 759).

A posição escolhida na sala era uma cadeira ao fundo para melhor observar as movimentações. Às 18 horas, a coordenadora sugeriu que aguardássemos mais dez minutos para que todas pudessem chegar. Assim, depois do tempo determinado, a coordenadora iniciou sua fala apresentando as pautas no slide e explicando-as. A primeira pauta se tratava de um resumo de fatos ocorridos no 3º bimestre, para que as responsáveis pudessem acompanhar o que havia acontecido. Um segundo momento de explicações tratou dos procedimentos do 4º bimestre, como recuperação e provas finais, e, um último momento, de entrega dos boletins. A coordenadora sempre se referia aos responsáveis por “mãe”, fato esse identificado e debatido na revisão bibliográfica como podemos constatar no trecho abaixo.

Outro aspecto que elucida também a comunicação padronizada é a forma como os professores, ou coordenadores se dirigem a elas, chamando-as apenas de “mãe” e não pelo nome. Parece, assim, que todas as mães são iguais em suas dúvidas e necessidades e que a escola está em um patamar diferenciado, tendo que ensinar e dar instruções às famílias. O fato de não serem chamadas pelo nome as deixa irritadas, pois distancia a relação com o interlocutor, no caso, o professor (SARAIVA; WAGNER, 2013, p. 761). Esse incômodo relatado pelo uso de “mães” revela uma percepção de padronização das formas de ser mãe e necessariamente das atitudes que essas mães devem tomar frente a questões da escola. Simone de Beauvoir (2016), no livro Segundo sexo, Volume 2, nos ajuda

a compreender as expectativas sociais frente a uma mãe e como essas expectativas constroem a relação entre família e escola, principalmente, no caso relatado.

Uma tal obrigação nada tem de natural; a natureza não poderá nunca ditar uma escolha moral; esta implica um compromisso; dar à luz é assumir um compromisso; se a mãe não o cumpre a seguir comete um erro contra a natureza humana [...] Afirmar que o filho é o fim supremo da mulher tem exatamente o valor de um slogan publicitário (BEAUVOIR, 2016, p. 326). Enquanto profissionais da educação, precisamos nos atentar para ações cotidianas que constantemente passam despercebidas no intenso dia-a-dia escolar. Cláudia Paz (2010) explicita a importância de compreendermos a naturalização do ser mulher e mãe de uma única forma: “A identidade de gênero feminino parece ser cristalizada no modelo materno, associado aos cuidados da casa e dos filhos/as, pois seu principal papel é ser mãe”.

A apresentação do 3º bimestre se deu através de fotos e explicações das mesmas, igual para as duas séries, onde foram apresentadas fotos de uma premiação de Língua Portuguesa que a escola concorreu e foi premiada com um aluno do 6º ano, fotos do interclasse que trabalhou o tema do futebol e questões de gênero, com ênfase no futebol feminino e atividades extra.

A escola premia semestralmente alunas e alunos por bom comportamento e bom rendimento, de acordo com as notas, por turma. Assim, a aluna ou aluno que participa das aulas de forma ativa, faz as atividades e não conversa em excesso, ganha o título de aluna destaque daquela turma e daquele bimestre. A aluna ou aluno que atingir mais que 60% das notas em todas as matérias, ganha o título de aluna ou aluno estrela. Sobre esse sistema de premiação, Rubens Luiz Rodrigues (2013) nos ajuda a entender de onde surgem essas propostas pedagógicas, para que possamos pensar em suas consequências, continuidades e rupturas:

A cultura construída no interior das instituições escolares é resultado das relações entre os fatores “endógenos e exógenos à escola” e que, por isso, é “uma variável dependente das condições que entram em jogo na organização e funcionamento interior da escola, sendo influenciado pelo contexto social, econômico, político e cultural” (TEIXEIRA, 2003, p.179) (RODRIGUES, 2013, p. 156).

A escola absorve as questões da sociedade, já que essas caminham juntas, desse modo, é possível identificar no sistema de premiação da escola Leila Diniz aspectos que tanto criticamos na sociedade de mercado, que incentiva e valoriza a constante competição, a

hierarquização e a crença na meritocracia. A coordenadora enfatizou o incentivo que as crianças premiadas recebem ao ganharem a premiação. No entanto, não mencionou que as crianças não premiadas se sentem inferiorizadas. Parece-me mais grave o incentivo às notas, já que quem convive nos ambientes escolares percebe que as crianças buscam comparar suas notas por si só, exaltando e inferiorizando suas e seus colegas. A valorização exacerbada das notas deixa em segundo plano o processo de aprendizagem, o cuidado entre alunas e alunos e a valorização das múltiplas inteligências. Transporta as notas pra o fim desejado e não o meio de se aprender. Louro (2008) explicita essas características dos ambientes escolares quando nos diz:

Diferenças, distinções, desigualdades... A escola entende disso. Na verdade, a escola produz isso. Desde seus inícios, a instituição escolar exerceu uma ação distintiva. Ela se incumbiu de separar os sujeitos – tornando aqueles que nela entravam distintos dos outros, os que a ela não tinham acesso. Ela dividiu também, internamente, os que lá estavam, através de múltiplos mecanismos de classificação, ordenamento, hierarquização [...] é necessário que nos perguntemos, então, como se produziram e se produzem tais diferenças e que efeitos elas têm sobre os sujeitos (LOURO, 2008, p. 57). A coordenadora explicou para as responsáveis que antes essa entrega de premiação era feita para as responsáveis com a presença das alunas e alunos. No entanto, nesse bimestre a escola decidiu entregar os títulos para as alunas e alunos em sala, entendendo que essa era uma forma de incentivar as outras estudantes que ainda não haviam ganhado a se esforçarem mais. Assim, na reunião, foram mostradas as fotos de cada turma com as alunas e alunos destaque e estrela. As mães comentavam que suas filhas haviam ganhado uma vez, outras comentavam que nunca haviam ganhado e coisas do tipo.

Após esse momento, a coordenadora explicou como seriam os procedimentos de prova final e recuperação no último semestre, pediu para que as mães acompanhassem seus filhos e filhas, cobrando que eles estudassem mais, pois estavam passando por um momento decisivo. Nesse momento, muitas dúvidas surgiram e as responsáveis perguntaram uma serie de questões, a coordenadora se esforçou para respondê-las e, ao final, informou que cada professor iria entregar os boletins de cada turma. Assim, a entrega foi feita e a reunião finalizou.

No documento raquelsantiagodesouza (páginas 104-107)