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P RIMEIRA APROXIMAÇÃO À IDEIA DE RENOVAÇÃO DE DELIBERAÇÕES DOS

CAPÍTULO I – A RENOVAÇÃO NO ÂMBITO DA CONVALESCENÇA E

4. P RIMEIRA APROXIMAÇÃO À IDEIA DE RENOVAÇÃO DE DELIBERAÇÕES DOS

I. Enquadrada a renovação de deliberações dos sócios no âmbito da

impugnabilidade das deliberações e confrontada a figura com institutos afins, estamos em condições, assim o julgamos, de condensar as nossas conclusões até este momento através de uma primeira aproximação à ideia de renovação de deliberações dos sócios.

Certo é, porém, que a noção que agora se avance não poderá ter-se por definitiva. Com efeito, aconselha o método da Ciência do Direito que os verdadeiros conceito e natureza de qualquer instituto jurídico se extraiam do seu regime (cuja análise está ainda por empreender): não o invés. Avançar com o conceito final de renovação nesta fase derivaria numa inversão metodológica inadmissível e que, entre outros inconvenientes, comportaria o óbice de tentar o intérprete a interpretar o regime vigente de acordo com as suas pré-compreensões. Mal seria: a tanto obstariam os artigos 9.º e ss. do CC.

II. Com a ressalva agora efectuada, julgamos ser devido ainda, antes de

avançarmos a nossa primeira ideia de renovação de deliberações dos sócios, fazer um apanhado das noções que, entre a nossa doutrina, se têm aventado do instituto sub

judice69.

Numa primeira formulação, entende-se que, mediante a renovação, os sócios adoptam, sobre o objecto de uma deliberação anterior, uma deliberação nova que

absorve o conteúdo daquela70.

68Também assim, PAOLO REVIGLIONO, «La sostituzione delle deliberazioni invalide dell’assemblea di

s.p.a.», Quaderni di giurisprudenza commerciale, Milão, 1995, p. 83.

69 Para além dos autores citados no corpo do texto, de salientar ainda o texto de ANTÓNIO RIBEIRO,

«Brevíssimas Notas Acerca da Renovação de Deliberações Sociais», AA.VV., Ars Ivdicandi – Vol. II:

Direito Privado – Estudos de Homenagem ao Prof. Doutor António Castanheira Neves, org. por Jorge de

Figueiredo Dias, José Joaquim Gomes Canotilho e José de Faria Costa, Coimbra Editora, Coimbra, 2008, p. 655.

70CARNEIRO DA FRADA, «Renovação de Deliberações Sociais», cit., p. 287. De notar que, pelo menos

quanto às deliberações anuláveis, este autor reconhece à renovação um efeito sanante, embora em termos, para nós, algo contraditórios – ibidem, pp. 315 e 316, em especial nota 67, in fine. É ponto que retomaremos em detalhe, adiante.

Uma segunda orientação considera, grosso modo, que está em causa um processo de substituição de deliberações, salientando-se a invalidade da deliberação antecedente71. Acompanhando esta base, há quem vá mais longe, enaltecendo que à renovação possa ser atribuída eficácia retroactiva72, ou quem sublinhe ainda a necessidade de identidade de conteúdo entre as duas deliberações73.

Uma terceira posição, finalmente, sustenta expressamente que, no caso da renovação, se trata de um processo de sanação de deliberações dos sócios, através da reposição do requisito de validade em falta. Em tal formulação, a lei permitirá aproveitar o processado, exigindo-se apenas que se pratique o que está em falta e considerando-se, concomitantemente, que a repetição do iter formativo da deliberação é meramente eventual74.

III. O estado de desenvolvimento do presente estudo não nos permite ir muito

além de algumas das formulações acima enunciadas. Podemos é, desde já, e com o devido respeito, distanciar-nos de algumas concepções.

Assim sucederá, por um lado, com a terceira tese, residindo o diferendo na circunstância de se configurar a renovação como forma de sanação da deliberação dos sócios. Ora, como já temos vindo a referir, não atribuímos tal eficácia à deliberação renovatória. Antes, defendendo que a renovação é uma verdadeira deliberação, não podemos acompanhar a consideração de que se possa dispensar o processo formativo, bastando apenas a verificação do requisito em falta.

Quanto à segunda orientação, tivemos já a oportunidade de distinguir claramente a renovação da figura da substituição: pelo facto de renovação e substituição não se reconduzirem reciprocamente, também não podemos assentir totalmente naquela posição. Adicionalmente, justamente por a concessão de eficácia retroactiva não ser essencial à renovação, não cremos que tal menção deva ser considerada para efeitos do conceito da figura. Finalmente, pelas razões já conhecidas, distanciamo-nos ainda daqueles que exigem a identidade de conteúdo entre as duas deliberações.

71COUTINHO DE ABREU, «Comentário ao artigo 62.º», AA.VV., Código das Sociedades Comerciais em

Comentário, Vol. I (artigos 1.º a 84.º), coord. por Jorge M. Coutinho de Abreu, IDET/Almedina,

Coimbra, 2010, p. 706; ENGRÁCIA ANTUNES, Direito das Sociedades – Parte Geral, edição do autor, Porto, 2010, p. 308; e PINTO FURTADO, Deliberações…, cit., p. 837.

72ENGRÁCIA ANTUNES, Direito das Sociedades – Parte Geral, edição do autor, Porto, 2010, p. 308. 73COUTINHO DE ABREU, «Comentário ao artigo 62.º», cit., p. 706.

Finalmente, também não aderimos por inteiro à primeira noção. Com efeito, não apenas se reconhece, no caso de deliberações anuláveis, um efeito sanante à deliberação renovatória, como ainda parece fazer-se uma alusão à substituição ao referir-se que a segunda deliberação toma o lugar da primeira. E, assim sendo, valem as considerações já antes efectuadas, a propósito de cada tópico. Adicionalmente, temos dúvidas que se possa concluir pela existência de um fenómeno de absorção da primeira deliberação pela segunda, como resultará da análise do n.º 2 do artigo 62.º.

Assim, e tendo em conta (i) as posições defendidas ao longo deste Capítulo I, (ii) as críticas movidas às noções entre nós já existentes doutrina, e (iii) o carácter meramente provisório e eventual da noção a fabricar nesta fase, diremos que, por renovação de deliberações dos sócios, entendemos a adopção válida, pela assembleia

geral, de uma deliberação que, repetindo o conteúdo essencial de uma deliberação inválida, produz plenamente os efeitos jurídicos a que a anterior deliberação meramente tendia, os quais são exclusivamente imputáveis à nova deliberação.

CAPÍTULO II – APONTAMENTO SOBRE O DIREITO PRETÉRITO E SOBRE