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2. ESTADO DE ARTE

2.4 AVALIAÇÃO DE RISCOS

2.4.2 Risco da qualidade de água num SAA

A qualidade da água nos sistemas públicos de abastecimento é constantemente sujeita a ameaças desde a captação até à torneira do consumidor. As ameaças tornam-se tão mais importantes quanto mais próximas do consumidor estão, uma vez que, as barreiras aos riscos que possam ocorrer vão sendo sucessivamente menos efetivas à medida que dele se aproximam.

Num sistema de abastecimento de água, a qualidade da água pode ser comprometida em qualquer das suas componentes – por mais elementar que seja e, uma falha de qualidade no abastecimento a partir de uma rede de distribuição, pode ser extremamente crítica porque está próxima do ponto de consumo, onde não há, virtualmente, nenhuma barreira antes do consumo. Acresce e será ainda de referir que:

• Uma rede de distribuição pode compreender (dependendo da sua dimensão), extensão de tubagens muito variáveis e de diferentes idades e materiais;

• As condições operacionais e ambientais sob a qual as tubagens funcionam, podem variar significativamente dependendo da localização das tubagens dentro da rede; • Uma vez que as tubagens não são visíveis, é relativamente difícil e dispendioso a

avaliação do seu desempenho e deterioração, por esse motivo poucos dados de campo poderão estar disponíveis;

• Alguns fatores e processos que afetam o desempenho da tubagem ainda não são completamente compreendidos;

• É difícil determinar a validade e causa exata para a contaminação da água ou aparecimento de doenças por ingestão de água porque são frequentemente investigados depois de o evento terminar.

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Contudo, os sistemas de abastecimento de água além de apresentarem o risco de falhar devido a causas naturais, também podem falhar por causas antropogénicas associadas a ações não intencionais (erros operacionais ou de manobra) ou intencionais (atos de terrorismo) [ElBaroudy et al., 2006].

O objetivo principal de uma entidade gestora de abastecimento de água é o de providenciar aos consumidores o abastecimento de água ininterrupto com elevada qualidade estética e o mínimo de risco para a saúde. No entanto, por causa das potenciais ameaças na água bruta, tratamento e distribuição, o sistema de abastecimento e os consumidores estão expostos a uma elevada variedade de riscos. Além disso, mudanças climáticas, a evolução social e económica da sociedade e a emergência de novos contaminantes criam constantemente riscos nos sistemas de abastecimento de água. Como resultado, as entidades gestoras são obrigadas continuamente a adaptar-se, para uma eficaz gestão dos riscos e cumprimento dos objetivos comuns.

A Internacional Water Association (IWA), aponta que um abastecimento confiável de água potável é fundamental para a saúde pública e desenvolvimento económico da sociedade (TECHNEAU [2010b]). A OMS, conclui que um estudo detalhado do risco e uma abordagem da gestão do risco é a mais efetiva forma para assegurar a segurança da água de abastecimento. O estabelecimento do critério de aceitabilidade e tolerância ao risco no sector da água é um dos aspetos menos compreendidos na gestão do risco (TECHNEAU [2010b]).

Em Portugal, o Plano Estratégico de Abastecimento de Água e de Saneamento de Águas Residuais, PEAASAR II 2007-2013 (MAOTDR, 2007), definiu como um dos objetivos primordiais para este setor uma maior articulação entre os sistemas de produção, de transporte e de armazenamento e os sistemas de distribuição de água, constituindo as principais linhas orientadoras da potencialização da eficiência nos sistemas de abastecimento de água (Cardoso-Gonçalves, 2014).

Neste contexto uma entidade gestora de um sistema de abastecimento de água, deve: • Definir o cronograma e a estratégia de implementação do plano de gestão do risco

da qualidade da água;

• Aplicar e integrar a política da gestão do risco e os respetivos procedimentos às suas rotinas e procedimentos quotidianos;

• Verificar se cumpre integralmente com os requisitos legais e regulamentares, nomeadamente a legislação relativa à qualidade da água para consumo humano; • Assegurar que as tomadas de decisão incluem o desenvolvimento e

estabelecimento de objetivos é estes se encontram alinhados com os resultados da gestão do risco;

• Comunicar e consultar os diversos parceiros para assegurar que a estrutura da gestão do risco é apropriada.

• Implementar a gestão do risco de acordo com o plano de gestão do risco definido, suas práticas e processos.

Atualmente, em Portugal, e ao nível do ciclo urbano da água, existem alguns aspetos a ter em consideração, que podem constituir riscos significativos, principalmente para as pessoas, mas também para as atividades socioeconómicas, bens materiais, património

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construído e natural. Alguns fatores agravantes incluem a dinâmica climática e as perspetivas de aumento da temperatura, a redução da precipitação anual, aumento de intensidade de precipitação num curto espaço de tempo, e a subida do nível médio das águas do mar.

Como exemplo, a diminuição da disponibilidade de água em meio natural pode acarretar escassez para fazer face à procura e ter um efeito negativo na qualidade das águas superficiais. Os aquíferos podem ser afetados pela intrusão salina em zonas costeiras, devido à subida do nível médio das águas do mar. O aumento da intensidade de precipitação num curto espaço de tempo pode provocar excesso de fluxo em águas residuais e unitárias, afetando negativamente a eficiência das estações de tratamento de águas residuais e podendo também agravar situações de cheias ou inundações.

Assim, assiste-se a um crescente interesse no estudo e avaliação do risco no ciclo urbano da água. Os diferentes riscos podem ser agravados pelas perspetivas de alterações climáticas, o que poderá originar tanto um agravamento das condições existentes, bem como despoletar a ocorrência de novos perigos ou novos fatores de risco que podem ocorrer nas diferentes e variadas componentes do ciclo urbano da água (Almeida et al., 2010).

É neste contexto que o Decreto-Lei 152/2017 de 7 de dezembro, aponta no seu artigo 14º-A para a necessidade de os sistemas de abastecimento incorporarem uma inventariação de riscos e a avaliação de risco deve seguir um metodologia sistemática de análise de perigos e avaliação de risco ao longo de todo o sistema de abastecimento de água, desde a área envolvente da captação até a torneira do consumidor, nos termos das recomendações da ERSAR, devendo ser atualizada com uma periodicidade mínima de cinco anos.

De modo resumido e genérico, estão representados na Tabela 2.1 as potenciais ameaças de um Sistema de Abastecimento de Água.

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Tabela 2.1 - Ameaças potenciais de um sistema de abastecimento de água

Função – Elemento Ameaça Potencial

Origem – Rio

Cheias

Descarga de efluentes domésticos Descarga de efluente industriais Derramamentos

Origem – Albufeira

Cheias Gado

Contaminação local Origem – Poços e furos

Contaminação mineral subterrânea Atividade humana

Contaminação local

Transporte – Adutoras e canais

Cheias

Aluimento de terras Temperaturas extremas Incorreta operação de válvulas Fatura de tubagem

Trabalhos em adutora sem pressão

Permeabilidade de compostos orgânicos do solo para o sistema Intrusão por baixa pressão (adutoras)

Sabotagem

Tratamento – ETA

Inundações

Contaminação química e biológica Falha no Processo de Controlo Falha no Equipamento Incorreta operação de válvulas Falha no alarme e monitorização

Recursos humanos inadequados ou insuficientes infra-estruturas inadequadas ou insuficientes Falha de energia Bombeamento – Elevatórias Inundações Aluimento de terras Terrorismo e Sabotagem Falha de Controlo

Incorreta operação de válvulas Falha de Equipamento Falha no alarme e monitorização Choque hidráulico

Avaria na elevatória em zonas sem reserva Recursos humanos inadequados ou insuficientes Infra-estruturas inadequadas ou insuficientes Falha de energia

Armazenamento – Reservatórios Contaminação

Reservatórios vazios devido a erro de comunicação

Fornecimento – Rede de distribuição Aluimento de terras Cargas Externas Características do Solo Ligações cruzadas/retorno

Retorno de água inadvertido dos edifícios

Retorno de água intencionado dos edifícios (sabotagem) Consumos anormalmente elevados (e.g.: incêndios, outros consumos)

Trabalhos em tubagem sem pressão Fatura de tubagem

Permeabilidade de compostos orgânicos do solo para o sistema Lixiviação de produtos químicos e de corrosão para a água

Crescimento microbiano na tubagem Intrusão por baixa pressão

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Em Cabo Verde, embora e de um modo geral as circunstâncias e as ameaças e os perigos sejam idênticas, variando apenas as magnitudes em função das diferentes estruturais existentes, o modo de analisar este tipo de questões ainda se encontra numa fase de desenvolvimento mais incipiente. Com efeito, não há na legislação em vigor uma assunção firme na vantagem e obrigatoriedade na consideração de uma análise de riscos neste tipo de sistemas. Apenas uma pequena referência mais recente diploma sobre os requisitos essenciais de qualidade de água destinada ao consumo humano (Decreto- Regulamentar nº5/2017 de 6 de novembro de 2017) que, no seu artigo 13º - Controlo Operacional, parágrafo 1 afirma que “e na medida do possível, avaliação e gestão de risco” deverá constituir um apoio ao referido controlo.

Ou seja, enquanto a legislação portuguesa aponta como obrigatoriedade a análise e gestão de risco, em Cabo Verde há apenas e ainda, a possibilidade deixando ao critério de cada entidade a sua análise ou não.

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