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Riscos de contaminação da água subterrânea

A qualidade da água subterrânea na ilha de Santiago é bastante variável tal como ficou bem evidenciado nas secções anteriores deste Capítulo 5, sendo os principais riscos resultantes da (1) contaminação difusa associada à agricultura; (2) drenagem de efluentes humanos; (3) actividade de pastoreio livre de bovinos e caprinos ao longo das ribeiras e junto à costa; e, (4) intrusão salina, provocada pela sobreexploração dos recursos subterrâneos junto à costa.

O grau de vulnerabilidade à contaminação também varia de unidade hidrogeológica para unidade, sendo maior na Unidade Recente pois trata-se de uma unidade superficial e muito permeável, do que nas Unidades Intermédias e de Base, que se encontram mais protegidas e são menos permeáveis.

Nos últimos anos em Cabo Verde, as entidades ligadas à produção, abastecimento e protecção dos recursos hídricos e a sociedade civil no geral, têm vindo a demonstrar crescente preocupação com a degradação dos recursos hídricos subterrâneos. De realçar que é cada vez mais clara a consciência dos responsáveis pela gestão dos recursos hídricos das limitações de ordem técnico-científica e económica com o objectivo de controlar os níveis de contaminação existente, sobretudo em zonas de grande pressão populacional. Assim, tem-se verificado as preocupações que têm vindo a ser apresentadas pelas Câmaras Municipais para o desenvolvimento de técnicas de estudo de vulnerabilidade à poluição de aquíferos, como uma ferramenta para a sua protecção. Por outro lado, estas medidas visam a compatibilização das actividades antrópicas e a capacidade do terreno em suportá-las, sem prejuízo da qualidade das águas subterrâneas.

5.4.1 Contaminação agrícola

A contaminação difusa produzida pela agricultura resulta da utilização de fertilizantes e pesticidas nos campos agrícolas para aumento da produtividade e combate das pragas. Os fertilizantes mais utilizados são os de tipo amoniacal - sulfato de amónio e o cloreto de amónio; e os de tipo nítrico - nitrato de sódio, nitrato de cálcio e nitrato de potássio. Da sua utilização resulta muitas vezes a acumulação nas águas subterrâneas de elevadas concentrações em macronutrientes, nomeadamente de diversos compostos nitrogenados (Fig. 5.29).

As análises químicas realizadas em ambas as campanhas demonstram a presença de nitratos na grande maioria dos pontos de água amostrados sendo que em algumas das zonas mais agrícolas o valor de nitratos já ultrapassa o valor máximo recomendável para água destinada a consumo humano (11,3 mg/l NO3-N). Das amostras de água subterrânea estudadas na 1.ª campanha de campo cerca de 96% apresentava concentrações positivas de nitratos (98% na 2.ª campanha). Destas amostras cerca de 15% excedia o valor máximo admissível para consumo humano.

Embora as concentrações médias de nitratos ainda não sejam elevadas numa grande parte da ilha e os problemas de contaminação mais graves tenham sido identificados, principalmente nas zonas agrícolas de Santa Cruz e de Santa Catarina, o facto de ser uma contaminação difusa e já dispersa pela ilha (mesmo em altitudes mais elevadas), é naturalmente motivo de preocupação crescente pois pode vir a colocar em causa a qualidade da água para abastecimento às populações.

Fig. 5.29. Distribuição do conteúdo de nitratos nas águas subterrâneas, com indicação dos pontos acima do valor máximo admissível para consumo humano (VMA = 11,3 mg/l).

5.4.2 Intrusão salina

O risco de intrusão salina é efectivamente a maior preocupação ambiental em termos de gestão de recursos de água doce na ilha de Santiago. Na parte Norte da ilha (zona do Tarrafal) e ao longo de toda a costa Este da ilha (com particular gravidade nas zonas de Santa Cruz e Achada Baleia), existem diversas condicionantes hidrogeológicas e humanas que têm provocado o aumento alarmante da salinidade nos recursos de água subterrânea, nomeadamente:

• a exploração excessiva dos recursos de água subterrânea para abastecimento doméstico e irrigação dos campos agrícolas por falta de alternativas;

• a existência de inúmeros meses (ou anos) sem precipitação;

• a recarga e renovação limitada dos recursos de água subterrânea nas zonas junto à costa;

• o rebaixamento pronunciado dos níveis freáticos sob o nível médio da água do mar; • a captação de níveis de fácies submarina com elevado teor de cloretos;

200000 210000 220000 230000 240000 UTM (m) 1 650000 16600 00 1670 000 16 80000 169000 0 1700 000 UTM (m ) I l h a de S a n t i a g o O c e a n o A t l â n t i c o O c e a n o A t l â n t i c o Nitrato (NO3-N) nas águas subterrâneas (mg/L):

0 a 2 2 a 5 5 a 11.3 11.3 a 15 15 a 20 20 a 70

• a elevada permeabilidade dos níveis aquíferos;

• o comportamento livre dos sistemas aquíferos sem qualquer confinamento que limite o avanço da intrusão salina;

• a exploração ilegal das areias e cascalho nos leitos das ribeiras para utilização como material de construção.

Do ponto de vista geoquímico esta salinidade é confirmada pelo aumento significativo da condutividade eléctrica das águas subterrâneas, devido ao aumento principalmente do conteúdo em cloreto e sódio (Fig. 5.30). No entanto, outros iões como o magnésio, o bicarbonato e o sulfato também aumentam significativamente de concentração nestas zonas afectadas pela salinização, criando limitações à utilização da água para consumo humano e agrícola. Refira-se que já existem inúmeros campos agrícolas abandonados devido à salinização dos recursos hídricos subterrâneos que normalmente eram utilizados na irrigação. Este abandono dos campos agrícolas leva ao desemprego e deslocação das populações, e tem um impacto nefasto na economia da ilha.

Fig. 5.30. Distribuição do conteúdo de cloretos nas águas subterrâneas com clara indicação de salinização dos recursos de água doce ao longo de toda a costa oriental da ilha.

200000 210000 220000 230000 240000 UTM (m) 1 650000 16600 00 1670 000 1 6 8 0000 169000 0 1700 000 UTM (m ) I l h a de S a n t i a g o O c e a n o A t l â n t i c o O c e a n o A t l â n t i c o 0 a 50 50 a 100 100 a 200 200 a 500 500 a 1000 1000 a 5000 Cloreto nas águas subterrâneas (mg/L):

O aumento da salinidade com o aumento do tempo de residência das águas subterrâneas e com a proximidade ao mar fica bem evidenciado na Fig. 5.31, onde estão representadas as evoluções dos iões maioritários, da condutividade eléctrica e do pH ao longo do vale de duas das principais ribeiras – a ribeira Grande do Tarrafal e ribeira Grande da Cidade Velha. Em ambos os casos é notável o aumento da concentração dos iões e da salinidade nas proximidades da linha de costa.

Fig. 5.31. Evolução dos principais indicadores geoquímicos de salinidade ao longo do trajecto das ribeiras.

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